O que é um Plano Diretor? 

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Este é o segundo texto de uma trilha de conteúdos sobre Planejamento Urbano. Confira os demais posts da trilha: 

    1. Planejamento urbano no Brasil: um breve histórico
    2. Você está aqui
    3. Plano diretor: como é feito e para que serve?
    4. Plano diretor participativo: necessidade ou ilusão?  

Ao terminar de ler este conteúdo, você terá concluído 50% desta trilha 🙂

Você já ouviu falar em plano diretor? Não faz ideia do que se trata? Caso não saiba mesmo, é bom ler este artigo, já que ele pode fazer toda a diferença para o futuro da sua cidade.

Para oferecer qualidade de vida para todos, o ideal é que uma cidade cresça de maneira equilibrada, com definições prévias acerca das prioridades do município e das destinações de uso de seu território. 

É para esse fim que foi criada a exigência de elaboração do plano diretor. Trata-se do documento-base de orientação da política de desenvolvimento dos municípios brasileiros. O plano diretor está previsto na Lei 10.257/01, conhecida como Estatuto da Cidade. Todos os municípios com mais de 20 mil habitantes devem elaborar um plano diretor, o que engloba boa parte dos municípios e população brasileiros.

O que o plano diretor deve conter?

Evidentemente, o Plano deve ser acordado entre as partes interessadas, por isso seu conteúdo varia de município para município. Mas o Estatuto da Cidade determina que algumas delimitações devem estar presentes em qualquer plano diretor, como:

(i) Parcelamento, edificação e utilização compulsórios de imóvel

É muito comum que imóveis e terrenos em zonas urbanas brasileiras fiquem desocupados permanentemente ou na maior parte do tempo, colaborando para o déficit de habitação do país. 

É por isso que o município pode estabelecer um coeficiente de habitação e, a partir dele, obrigar os proprietários a tomar providências para mudar essa situação. Para isso, existem essas três possibilidades: o parcelamento, que consiste em lotear ou desmembrar parte das terras para criar novas edificações, com ou sem a abertura de novas ruas; a edificação, ou seja, a construção de algum imóvel em um terreno desocupado; ou a utilização do imóvel existente (ou seja, um imóvel desocupado deve ser ocupado).

(ii) Direito de preempção

O município pode determinar, pelo plano diretor, a delimitação de zonas especiais, sobre as quais ele terá preferência de comprar por  cinco anos, caso a  área seja usada para habitação popular ou outro fim de interesse coletivo.

(iii) Direito de outorga onerosa do direito de construir

Toda propriedade possui uma área máxima que pode ser construída, chamada de coeficiente de aproveitamento básico. Esse coeficiente deve ser respeitado para que as edificações não causem impacto negativo na infraestrutura do município. A outorga onerosa é uma contrapartida financeira para que o proprietário possa ser autorizado pelo município para construir além daquele limite. 

Por exemplo, se em uma determinada área é possível construir um prédio de apenas três andares, mas alguém quer construir um prédio de seis andares, é preciso pagar a outorga para ter o direito de construir o que excede o coeficiente. Os recursos da outorga onerosa, porém, não são usados para financiar a infraestrutura.

Leia também: Função social da propriedade

(iv) Direito de alterar onerosamente o uso do solo

Basicamente, os proprietários de algumas áreas da cidade têm direito a alterar o uso de suas propriedades, desde que paguem uma contrapartida. O município deve definir quais áreas serão contempladas com esse direito.

(v) Operações urbanas consorciadas

O município também deve delimitar quais áreas urbanas destinadas a operações consorciadas. Essas operações envolvem o poder público, proprietários, moradores e investidores e têm o objetivo de intervir em certas áreas da cidade para melhorá-las nos  aspectos urbanístico, social e ambiental.

(vi) Direito de transferir o direito de construir

O plano diretor pode prever que o proprietário de algum imóvel urbano exerça o direito de construir em outro lugar quando seu imóvel for considerado necessário para fins de: implantação de equipamentos urbanos e comunitários; preservação (quando o imóvel for considerado um patrimônio histórico, por exemplo); implementação de programas de habitação de interesse social.

Essas questões são indispensáveis em qualquer plano diretor. Mas é claro que ele pode (e em muitos casos deve) abranger outras matérias importantes. Por exemplo: quais áreas do município serão destinadas para preservação ambiental? Qual será o planejamento da prefeitura para a mobilidade urbana? Como resolveremos a questão da habitação? E o saneamento básico, como é que fica? Tudo isso pode, e deve, constar em um plano diretor.

Leia mais: Meio ambiente e os municípios: os principais desafios

E quais foram os resultados dos planos diretores atuais?

Foto: Marcelo Horn/ GERJ / Fotos Públicas (14/06/2013).

O Estatuto da Cidade foi aprovado em 2001. Mas, em 2009, oito anos após a sua aprovação, nem todos os municípios com mais de 20 mil habitantes haviam elaborado o plano diretor (dos mais de 1600 municípios nessa situação, 200 ainda não tinham plano diretor na época). Isso pode se dever à própria complexidade da tarefa, que pode demandar uma expertise que nem todos os municípios possuem.

Já nas cidades onde um plano diretor foi discutido e aprovado, os resultados são mistos. Segundo avaliação do Ministério das Cidades, muitos planos diretores falharam em estabelecer como cada parte do território municipal deve ser utilizada.

Veja também nosso vídeo sobre reforma tributária e desigualdade:

Habitação

A habitação é mencionada na maior parte dos planos, mas o problema é a falta de meios para tornar efetivas as medidas previstas. Ou seja, cresceu o discurso favorável ao direito da moradia, mas na prática falta sua implementação. Por exemplo, mais de 80% dos planos mencionam a criação de zonas especiais de interesse social (ZEIS), mas nem metade desses planos definem a localização dessas zonas. 

Outro problema é que não é comum existir uma articulação clara entre o plano de habitação do município e seu orçamento. Como as previsões orçamentárias não são concretas, fica mais difícil implementar o plano.

Saneamento

O saneamento ainda não é suficientemente tratado pelos planos. Faltam estratégias claras para que o crescimento dos municípios seja acompanhado pelo crescimento do acesso à água tratada e esgoto. 

Mobilidade urbana

Já na mobilidade urbana, os planos ainda priorizam os meios de transporte motorizados e deixam de lado os deslocamentos a pé e de bicicleta. O uso da bicicleta aparece mais vinculado a questões ambientais. Estas, por sua vez, não são tratadas de forma integrada com as demais questões urbanas. 

É como se existissem uma agenda verde (ambiental) e uma agenda marrom (urbana) e as duas fossem coisas diferentes. O desafio é fazer com que os municípios encarem ambas as agendas como parte de um mesmo processo.

O primeiro plano diretor da maior cidade do Brasil, São Paulo, foi criticado por não ter estabelecido cronogramas e metas, o que na prática tornou-o letra morta. Isso aconteceu mesmo com a previsão de que o prefeito pode ter seu mandato cassado por improbidade administrativa em caso de não cumprimento do plano. O primeiro plano expirou em 2012. Apenas em 2014 foi sancionado o novo plano, com previsões para os próximos 16 anos.

O que se revela, portanto, é que falta planejamento de longo prazo para os municípios brasileiros, e o plano diretor, apesar de já ter significado um avanço para a política urbana no Brasil, ainda não conseguiu vencer o imediatismo, a especulação imobiliária e problemas de gestão municipal. Espera-se que as lições da primeira leva de planos diretores possam fortalecer os próximos.

E como o plano diretor é feito? A população pode participar? Veremos isso melhor no próximo texto!

Referências:

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Conteúdo escrito por:
Bacharel em Relações Internacionais da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).

O que é um Plano Diretor? 

10 abr. 2024

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