Saúde e cidadania: a importância da participação popular no SUS

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Ex-presidenta Dilma discursa na 15ª Conferência Nacional da Saúde (Foto: Karina Zambrana – SGEP/MS)

Este é o primeiro texto de uma trilha de conteúdos sobre Saúde pública no Brasil. Confira os demais posts da trilha: 12345 6

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No Brasil, saúde e cidadania estão intimamente ligadas. Isso se dá a partir do princípio da participação popular do SUS, que permite que o cidadão comum tenha poder de influenciar na qualidade dos serviços do setor. Tal princípio, que tem sido um dos fundamentos do funcionamento do Sistema Público de Saúde, é explicado neste texto. Venha conferir!

O MOVIMENTO SANITARISTA E SUAS HERANÇAS

Você já sabe o que foi o Movimento Sanitarista? Formado por técnicos da saúde, intelectuais, partidos políticos e organizações sociais, ele foi de extrema importância na luta pela democracia na época da ditadura militar – começou nos anos de 1970 –, principalmente no que se refere ao direito à saúde.

Os ideais levantados por esse movimento foram compilados em um documento chamado Saúde e Democracia, que teve como uma das conquistas a realização da 8ª Conferência Nacional de Saúde, em 1986. Essa foi a primeira CNS aberta à sociedade. Tal evento entrou para a história como o momento em que foi feito esboço do Sistema Único de Saúde.

O QUE A LEI ORGÂNICA DA SAÚDE DIZ

Além de estipular os princípios que norteiam as ações do SUS, em seu artigo 7º a Lei Orgânica da Saúde garante o “direito à informação, às pessoas assistidas, sobre sua saúde” e a “participação da comunidade”.

A Lei nº 8.142 é mais específica quanto à participação popular e estipula as Conferências de Saúde e o Conselho de Saúde como as instâncias colegiadas às quais a sociedade civil tem direito (e dever) de comparecer. O termo “instâncias colegiadas” se refere à forma de gestão na qual uma decisão é tomada por um grupo. As pessoas que constituem esses órgãos detêm autoridade igual entre si e devem representar todas as categorias com direito de participação: prestadores de serviço, profissionais da saúde, representantes do governo e usuários do SUS.

Ainda é essencial que em meio aos representantes da população haja a participação dos grupos sociais historicamente sub-representados nos processos de tomada de decisão política: as minorias. Exemplos de minorias são a população LGBT, a população negra, povos indígenas, mulheres, entre outros. Estudantes, aposentados e moradores do campo também são grupos que geralmente se organizam para levar reivindicações mais específicas às suas necessidades até os órgãos competentes.

Mas afinal, qual a diferença entre o Conselho e a Conferência de Saúde?

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O QUE SÃO OS CONSELHOS DE SAÚDE?

São órgãos deliberativos – que têm capacidade de decisão – e de caráter permanente. Têm como função formular estratégias para as políticas públicas de saúde, assim como realizar o controle e execução de tais ações nas instâncias correspondentes (o que inclui fiscalização de aspectos econômicos e financeiros). Tais órgãos estão presentes nas três esferas do governo, entretanto os Conselhos Municipais se destacam.

Isso porque tais órgãos são essenciais para que o princípio de descentralização e comando único sejam colocados em prática. Como você viu, esse princípio objetiva que o município – por si só – tenha todas as condições para oferecer os devidos serviços de saúde, de forma soberana. Assim, as diretrizes do SUS conferem ao município grande responsabilidade, afinal, se as cidades conseguem controlar seus próprios serviços de saúde, o princípio de descentralização e mando único foi atingido totalmente.

Além disso, os Conselhos Municipais caracterizam o meio de contato mais direto com os usuários do SUS. A população não apenas consegue entrar mais facilmente em contato com essa instância, como também é melhor compreendida por ela. Afinal, é muito mais fácil o próprio município entender e julgar quais as necessidades de seus habitantes.

CONFERÊNCIAS DE SAÚDE

As Conferências de Saúde são fóruns públicos realizados em intervalos de quatro anos que são divididos em três etapas: municipais, estaduais e nacional. Participam do evento todos os segmentos ali representados: entidades ligadas à saúde, prestadores de serviços, sociedade civil organizada e usuários do sistema público de saúde.

Para garantir o melhor funcionamento das Conferências de Saúde, existe série de normativas a serem seguidas – as quais são definidas no Regulamento da Conferência de Saúde. Quatro regras são essenciais para você entender melhor o evento.

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Quem pode ser delegado nas três etapas de Conferência da Saúde?

Qualquer pessoa que represente instituições governamentais, trabalhadores da saúde e usuários pode se candidatar a delegado. Se eleita, esta pessoa representará seu grupo na próxima fase da Conferência.

Existe uma proporção para a representação dos diferentes grupos?

Sim! O regulamento estipula que 50% dos delegados devem representar os usuários do sistema de saúde e suas coletividades organizadas; 25% dão voz aos trabalhadores da área da saúde e os últimos 25% são reservados aos delegados dos gestores e prestadores de serviço.

É importante destacar que existem prazos para a realização das diversas etapas da Conferência de Saúde. Essas datas são estipuladas pelo regulamento daquela edição da conferência. Caso um estado ou município tenha realizado uma Conferência fora da janela de tempo estipulada pelo regulamento, a Conferência não será válida e outra deverá acontecer.

Registro da 2ª Conferência Nacional da Saúde das Mulheres

Relatório da Conferência de Saúde

Cada Conferência deve redigir um relatório resumido – de no máximo 20 páginas – para encaminhar à etapa seguinte do evento. O documento deve ser elaborado pelo Relator Geral e pelo Relator Adjunto, os quais são indicados pelo Conselho de Saúde Nacional. Além do processo de realização da Conferência, o relatório deve conter um número máximo de diretrizes e propostas a serem encaminhadas ao próximo nível. Tais “diretrizes” e “propostas” dizem respeito às estratégias sugeridas pela Conferência em questão para lidar com os problemas identificados ou implementar melhorias.

Na 14ª CNS, por exemplo, realizada em 2011, os municípios podiam encaminhar sete diretrizes nacionais em seu relatório e cada diretriz conter 10 propostas. Já os estados e o Distrito Federal tinham um máximo de sete diretrizes a serem encaminhadas, cada uma delas podendo abranger cinco propostas que chegariam à etapa nacional da Conferência.

Imagine que cada etapa da Conferência funcione como um fórum para identificar as prioridades locais em relação à saúde. Como são definidas essas prioridades locais? O relatório municipal é “filtrado” na Conferência Estadual, que identifica quais os tópicos mais urgentes e/ou viáveis entre aqueles levantados pelos municípios. Só após essa análise e discussão é que o relatório estadual é redigido e encaminhado à CNS, que aprova ou não as propostas levadas até a última instância, também hierarquizando a ordem de prioridade na sua implementação.

Além desses aspectos, o regulamento ainda garante a publicização do relatório em todos os meios de comunicação disponíveis referentes à área da saúde, já que o documento é domínio público. Essa característica possibilita uma melhor fiscalização por parte tanto da população quanto do próprio governo, pois deixa claro quais são os problemas identificados por cada etapa da Conferência e as soluções nela estipuladas.

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Eixos temáticos das Conferências

Cabe ao regulamento da CNS estipular o tema central do evento e os eixos que se relacionam a ele. Por exemplo, a 15ª Conferência Nacional de Saúde, realizada em 2015, teve como tema “Saúde Pública de Qualidade para Cuidar Bem das Pessoas. Direito do Povo Brasileiro, que trouxe consigo oito eixos:

A definição desses eixos é a forma de Conferência ter certeza que o tema escolhido para aquela edição do evento realmente será tratado.

Principais avanços obtidos com as CNS

Além do próprio “rascunho” do Sistema Único de Saúde, elaborado na 8ª Conferência Nacional de Saúde, outras vitórias também foram conseguidas na última década através desses eventos. Entre tais conquistas destaca-se o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU), que consiste em um serviço pré-hospitalar de conexão entre as vítimas em situação de urgência e emergência e os recursos necessários para um atendimento completo.

Outra “invenção” de uma conferência é a Estratégia Saúde da Família, que atua como uma porta de entrada do SUS. A ESF “busca promover a qualidade de vida da população brasileira e intervir nos fatores que colocam a saúde em risco, como falta de atividade física, má alimentação e o uso de tabaco”, conforme explicado no Portal do Ministério da Saúde.

Ainda pode-se destacar o programa Rede Cegonha. Tal iniciativa tem como objetivo “estruturar e organizar a atenção à saúde materno-infantil no país e será implantada, gradativamente, em todo o território nacional, iniciando sua implantação respeitando o critério epidemiológico, taxa de mortalidade infantil e razão mortalidade materna e densidade populacional”, também segundo o Ministério da Saúde.

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COMO RELACIONAR SAÚDE E CIDADANIA NA PRÁTICA

Mesmo com todas as garantias legais que possibilitam o controle social do SUS, nada disso adianta se não houver um real engajamento da população. Falar de participação popular ou controle social nas políticas públicas de saúde não significa apenas a implantação de ações que lidem com desperdícios, desvios e corrupção. O controle social vai além da função de vigilância e envolve também o dever de cobrar e auxiliar na efetividade e no comprometimento daqueles que fornecem os serviços de saúde.

Para que isso aconteça, os cidadãos podem contar com outros meios além dos institucionais aqui mencionados, que seriam formas não institucionalizadas de participação e de realizar impacto nas atividades da saúde. Um exemplo desse modo de ação são os protestos – os quais podem não influenciar diretamente o Sistema de Saúde, mas muitas vezes causam impacto suficiente para que a pauta levantada pelo grupo chegue a um espaço onde decisões concretas possam ser tomadas.

Outra medida não institucionalizada de participação é o comparecimento a grupos educativos sobre assuntos relacionados à saúde, que podem ser organizados por cidadãos. Esses grupos são como aulões ou palestras, que têm o objetivo de explicar determinado assunto e informar a população, sendo uma ótima forma de compreender a relação entre saúde e cidadania.

Apesar de esses serem meios de participação “não institucionalizados”, isso não significa que eles sejam ilegais. Na realidade, o próprio relatório da 9ª Conferência Nacional de Saúde aponta como “importante que os movimentos populares criem e mantenham seus foros independentes e autônomos, buscando a discussão dos problemas e as soluções para as questões de saúde”.

Sei que nós falamos de bastante coisa nesse post, então que tal um infográfico para dar uma refrescada na sua memória e fazer você entender tudo de vez?

Registro da 2ª Conferência Nacional da Saúde das Mulheres

Com isso explicado, é fácil ver que os meios de participação popular na saúde são muitos. No momento, o essencial é que a população tome consciência disso e reivindique seus direitos, passando a participar cada vez mais dos processos decisórios do SUS.

Conseguiu entender como saúde e cidadania estão intimamente ligadas? Deixe suas dúvidas e sugestões nos comentários!

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Referências do texto: confira aqui onde encontramos dados e informações!

Participação popular e o controle social como diretriz do SUS: uma revisão narrativa

Participação popular e controle social no SUS

Participação popular no SUS

Participação social

SUS

 

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Conteúdo escrito por:
Assessora de conteúdo no Politize! e graduanda de Relações Internacionais pela Universidade Federal de Santa Catarina. Quer ajudar a tornar um tema tido como polêmico e muito complicado em algo do dia a dia, como a política deve ser!

Saúde e cidadania: a importância da participação popular no SUS

28 mar. 2024

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