Accountability no cotidiano: como botar em prática?

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Anteriormente escrevemos sobre o que é accountability e como ele está presente em nossas vidas. Para relembrar, Segundo Espinoza (2012), o termo accountability pode ser traduzido como controle, fiscalização, responsabilização, ou ainda prestação de contas. Exercer accountability pode-se dizer é uma importante conquista do processo de democratização que o Brasil vem vivendo desde a década de 1980. Vamos entender como colocar em prática accountability no cotidiano, mais especificamente nos conselhos municipais?

ACCOUNTABILITY NO COTIDIANO: OS CONSELHOS MUNICIPAIS SOBRE EDUCAÇÃO

Trata-se da possibilidade de o cidadão fiscalizar e os agentes públicos prestarem contas de suas ações, ou seja, a transparência de cada uma das atividades que são desenvolvidas nos setores e pelos agentes da administração pública. Segundo Spinoza (2012), em alguns países, essa exigência estende-se às organizações da sociedade civil.

Mas de que forma podemos exercer a accountability no nosso cotidiano? Um elemento institucional bastante desenvolvido no Brasil são os conselhos, que estão presentes nas mais diversas áreas da gestão pública. Existem os conselhos de educação, conselho da saúde, conselho da merenda escolar, o conselho da assistência social, conselho de trânsito, conselho da juventude, conselho do turismo, entre outros. Esses conselhos existem, ou pelo menos deveriam existir, nas cidades e nos estados e, de forma geral, possuem características e funções semelhantes. São órgãos colegiados formados por representantes da comunidade local, com função de fiscalizar, acompanhar e propor políticas públicas nos municípios ou estados em que estão localizados.

Leia mais: Conselhos Municipais: 6 fatos importantes!

Para entendermos melhor, vamos analisar dois exemplos de conselhos que tratam sobre educação: conselhos municipais de educação (CME) e conselho de acompanhamento e controle social do Fundo de Manutenção e desenvolvimento da educação básica e valorização do magistério (CACS-FUNDEB).

ACCOUNTABILITY NO COTIDIANO: CONSELHO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO

Os Conselhos Municipais de Educação (CME) existem desde a Constituição de 1934, quando se criaram os Conselhos Estaduais de Educação. Mas, nessa época, eles tinham funções mais técnicas e de consulta aos agentes políticos e governos. Após a Constituição Federal de 1988, que deu autonomia aos municípios e estabeleceu a cidadania como um princípio fundamental da República, é que os conselhos estaduais e municipais passam a ter outra concepção.

Os municípios, a partir de então, puderam ter o próprio sistema municipal de ensino (SME) ou se agrupar com o estado ao qual pertencem. Se os municípios resolvem criar o seu SME, eles tem diversas funções segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996 (LDB):

  • baixar normas complementares para o seu SME;
  • autorizar e supervisionar as escolas do seu SME;  
  • zelar pela valorização do magistério;
  • contribuir para a gestão democrática das políticas e das instituições educacionais do município;
  • fiscalizar  a execução e propor políticas públicas educacionais,

Esses Conselhos Municipais de Educação são formados por pais, professores, alunos, membros de sindicatos e demais associações ou entidades que sejam importantes para as cidades nas quais estão inseridos. Não há uma regra básica de formação de CME quanto a quantidade de conselheiros nem quem deve participar, a lógica é quanto mais plural e representativo da sociedade local, melhor.

ACCOUTABILITY NO COTIDIANO: CACS-FUNDEB

Diferente dos Conselhos Municipais de Educação, o Conselho de acompanhamento e controle social do Fundo de Manutenção e desenvolvimento da educação básica e valorização do magistério (CACS-FUNDEB) surge somente em 1997 a partir da aprovação da Emenda Constitucional nº 14, de setembro de 1996. Sua regulamentação está na Lei 9.424, de 24 de dezembro do mesmo ano, e no Decreto nº 2.264, de junho de 1997 que cria o Fundo Nacional de Manutenção do Ensino Fundamental.

O Fundo Nacional de Manutenção do Ensino Fundamental é uma espécie de “super conta” que cada estado e município possui, na qual estão os recursos disponíveis para investimentos em educação. Para fiscalizar o uso desses recursos foi criado o CACS. Em 2007 foi aprovada a lei 11.494 que transforma o FUNDEF em FUNDEB, possibilitando realizar investimentos em toda a educação básica obrigatória, que vai dos 04 aos 17 anos.

Todos esses recursos devem ser investidos em manutenção e desenvolvimento do ensino e valorização dos professores. Para isso existe o CACS-FUNDEB que é um conselho que deve fiscalizar a arrecadação e uso desses recursos dentro dos limites da lei, por parte das Prefeituras e Governos Estaduais. Cada CACS-FUNDEB deve estar formado, em âmbito municipal, por no mínimo:

  • 9 (nove) membros;  
  • 2 (dois) representantes do Poder Executivo Municipal;
  • 1 (um) representante dos professores da educação básica pública;
  • 1 (um) representante dos diretores das escolas básicas públicas;
  • 1 (um) representante dos servidores técnico-administrativos das escolas básicas públicas;
  • 2 (dois) representantes dos pais de alunos da educação básica pública;
  • 2 (dois) representantes dos estudantes da educação básica pública, um dos quais indicado pela entidade de estudantes secundaristas.
  • Essa é a formação mínima podendo cada município incluir mais representantes.

Esses dois conselhos, como se pode ver tem, entre outras funções a função de fiscalizar a ação do gestor público na educação e são formados por representantes da comunidade local. Os CACS-FUNDEB são obrigados a existir em cada cidade do país e reunir-se periodicamente sob pena de o município não receber recursos. Já os CME não são uma obrigação legal, mas sim uma possibilidade. Nesse contexto, hoje, no Brasil, existem 2.048 municípios que formaram seu SME e tem seus conselhos ativos em funcionamento.

Um exemplo simples para que você leitor possa entender é a cidade de Santa Maria no interior do Rio Grande do Sul. Esse município formou seu próprio SME em  1997 e conta com 20.408 alunos matriculados na educação básica municipal e tem um CACS-FUNDEB criado em 2007 e é responsável por fiscalizar um total de R$ 73.800.480,19, sendo que 81,40 % (44.280.288,11) foi usado com folha de pagamento dos professores e 18,60 % (29.520.192,08) utilizado em outras despesas de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino (MDE).  Os membros dos dois conselhos dessa cidade devem pensar e fiscalizar o uso desses recursos.

Agora que você já sabe como funciona, que tal pesquisar no seu município ou no site de sua prefeitura se esses órgãos existem e se estão funcionando? Além disso, porque não exercer accountability e participar do CME ou do CACS-FUNDEB de sua cidade? Se há a possibilidade de participação e de fiscalização, por que não participar?

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Referências:

CASTRO, Jorge Abrahão de. Financiamento da educação pública no Brasil: evolução dos gastos. In: GOUVEIA, Andréa Barbosa; PINTO, José Marcelino de Rezende; CORBUCCI, Paulo César. Federalismo e políticas educacionais na efetivação do direito à educação no Brasil. Brasília: IPEA, 2011, p. 29-49.

MONLEVADE, João Antônio. Construção da complexidade do financiamento da educação pública no Brasil. In: PINTO, José Marcelino de Rezende; Souza, Silvana Aparecida de. (Org.). Para onde vai o dinheiro? Caminhos e descaminhos do financiamento da educação. 1ed. São Paulo: Xamã, 2014, p. 11-20.

DAVIES, Nicholas. Controle estatal ou social das verbas da educação? In: PINTO, José Marcelino de Rezende; Souza, Silvana Aparecida de. (Org.). Para onde vai o dinheiro? Caminhos e descaminhos do financiamento da educação. 1ed. São Paulo: Xamã, 2014, p. 133-146.

BRASIL. Lei n. 11.494, de 20 de junho de 2007. Regulamenta o Fundo de Manutenção e desenvolvimento da educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação. Brasília, 2007.

BORDIGNON. Genuíno. Gestão da Educação do Município: Sistema, Conselho e Plano. São Paulo: Ed L, 2009.

BORIN. Gládis; LUNARDI, Elisiane Machado; KANTORKI, JoceleSistema Municipal de Ensino e a Autonomia dos Conselhos Municipais de Educação. In: DALLA CORTE. M. G. (Org.). Políticas Públicas e Conselhos Municipais de Educação: Interlocuções com o Pró-Conselho. São Leopoldo: Oikos, 2015.

Consulta ao cadastro dos conselhos de Acompanhamento e Controle Social do Fundeb; Sistema de Informações sobre orçamentos públicos em educação; Sistema de Informações sobre orçamentos públicos em educação: Relatórios MunicipaisPrograma Formação Pela EscolaIBGE: Nota técnica estimativas da população dos municípios brasileiros.

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Conteúdo escrito por:
Professor Municipal em Farroupilha (RS), graduado em Letras pelas Unisinos e especialista em Direito Educacional.

Accountability no cotidiano: como botar em prática?

18 abr. 2024

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