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Crise na Argentina: o que está acontecendo com a economia do país?

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Ultima atualização em 17 de setembro de 2019.


Macri discursa na Bolsa de Comércio de Buenos Aires. /Fonte: Fotos Públicas

A crise na Argentina tem sido um assunto recorrente na mídia nacional e internacional e diversas são as notícias sobre as oscilações econômicas do país. Mas você sabe o que tem afetado a economia argentina e quais os fatores dessa crise? Vamos entender neste post!

Veja também nosso vídeo sobre a crise da Argentina!

Contexto da crise na Argentina

A Argentina está atravessando uma intensa crise econômica que já dura aproximadamente 30 anos. Essa situação impulsionou, principalmente nos últimos anos, a desvalorização do peso argentino, uma alta taxa de inflação e pedidos de ajuda do país ao Fundo Monetário Internacional (FMI).

A crise teve origem na década de 1990, quando se iniciou o histórico déficit fiscal no país – ou seja, os gastos do governo eram maiores que a arrecadação. Isso significa que o dinheiro recebido pelo governo a partir dos impostos não era suficiente para custear as despesas de administração e dos investimentos do governo.

Para amenizar a situação, foram emitidos títulos da dívida pública, que são, basicamente, como empréstimos que a população faz ao governo para financiar a dívida. As pessoas que compram esses títulos estão fazendo uma espécie de investimento no governo para que ele possa arrecadar recursos e pagar suas contas. Em datas determinadas, as pessoas resgatam o dinheiro que investiram nesse título com o objetivo de obter lucros, pois o valor pode ter aumentado (ou não) devido principalmente às taxas de juros – ou seja, esse investimento também apresenta o risco de não haver retorno total do valor.

A crise na Argentina recentemente…

Em 2013, a economia argentina entrou em um período de estagnação, apresentando um crescimento econômico muito lento que, aliado à altas taxas de desemprego, agravou cada vez mais a crise fiscal, pois os gastos do governo se mantiveram mais altos que a arrecadação. Em outras palavras, essa estagnação, em conjunto com o desemprego, fazem com que as pessoas consumam menos – ou porque elas não têm dinheiro ou porque preferem guardá-lo devido às expectativas de inflação. Isso gera uma menor movimentação da economia e, portanto, uma menor arrecadação do governo, o que intensifica a crise fiscal.

Outro agravante da crise é o fato de que, historicamente, a Argentina possui uma baixa reserva de dólares, o que faz com que a moeda nacional (o peso argentino) se torne muito suscetível à desvalorização. Isso porque se o valor do dólar aumenta muito, o governo não possui uma quantidade de moeda suficiente para fornecer aos compradores de dólares e, por isso, deve obter mais moeda para estabelecer a equivalência do aumento, gastando mais dinheiro.

Além disso, como o país tem passado por uma estiagem – período longo sem chuvas – e nos últimos anos, o setor agrícola apresentou queda em sua produção. Como boa parte das exportações da Argentina são do setor agrícola, há uma dependência da economia nesse setor. Assim, quando a exportação de produtos agrícolas cai, a entrada de dólares no país diminuiu em grande medida.

Em 2015, o presidente Mauricio Macri assumiu o governo e, desde então, tem aplicado um plano de ajuste fiscal baseado nos cortes de gastos como uma tentativa de reduzir a dívida pública e alcançar um superávit primário. Para compreender os cortes que o governo argentino tem realizado com o objetivo de combater a crise, precisamos entender no que consiste um ajuste fiscal.

Ajuste fiscal: enxugando as contas do governo

Esse termo tão presente no dia-a-dia dos jornais é mais simples do que parece e diz muito à respeito a situação da Argentina. Ajuste fiscal é, basicamente, o corte de gastos do governo e o aumento de tributação, mas, normalmente, o segundo é menos utilizado nesta fórmula por ser impopular.

O governo argentino realizou o ajuste fiscal por meio do corte de subsídios, como o auxílio na energia elétrica, gás e transporte público, da criação de imposto direto sobre exportações e do corte de verbas ministeriais. O objetivo de Macri com essas medidas é reduzir a participação do Estado na economia, de forma a reduzir os gastos do governo e o déficit fiscal. Com esse dinheiro economizado, o governo visa a pagar a dívida pública argentina, freando seu crescimento ano após ano.

Taxa de Juros: efeito Dominó

A taxa de juros corresponde ao lucro que se recebe por emprestar dinheiro ou que se paga por tomá-lo emprestado. A maioria das pessoas está habituada com esse termo quando se trata da relação entre pessoas e bancos, mas também é possível que ocorra entre o Estado e pessoas. Como assim? Bom, aqui vai um exemplo para explicar:

Quando o governo precisa de dinheiro para pagar suas contas, uma de suas opções, como já explicamos, é colocar à venda Títulos da Dívida Pública. Eles são papéis emitidos pelo Banco Central garantindo que, em um tempo determinado, aquele título vai valer o que foi pago com o acréscimo de um percentual – esse percentual é a taxa de juros.

A taxa de juros do país depende de dois fatores: da taxa de juros que está em vigor nos Estados Unidos (já que o dólar é a moeda de referência) e do chamado “risco país”, baseado em um ranking feito por agências especializadas, que mede o risco que aquele país possui em não pagar sua dívida, ou seja, de “dar o calote”. No caso argentino, a dívida pública já é tão grande que as agências de risco temem que o governo não consiga mais pagar, o que aumenta em muito o “risco país” – aumentando, assim, os juros que o governo precisa pagar a quem detém o título da dívida. Afinal, para o comprador, só compensa adquirir o título e se expor a um risco de não receber seu dinheiro de volta, se a “recompensa” (o juro) for alta.

Essa instabilidade econômica causa descrença na capacidade do governo de pagar a sua dívida, fazendo com que os investidores internacionais vendam seus títulos da dívida argentina, com medo de não receberem o valor que lhes é devido. Esse movimento é chamado de “fuga de capitais”, o que diminui mais ainda a disposição de dinheiro para o governo argentino poder fazer sua economia voltar a funcionar.

Para evitar essa “fuga de capitais”, o Banco Central Argentino, elevou a taxa de juros para 60%. Para você ter uma referência, nos EUA, a mesma taxa é de 1,75%, e no Brasil, mesmo com uma crise econômica, é de 6,5%. A lógica é de que, com um “prêmio” tão alto, valeria a pena para os investidores correr o risco do calote. Porém, essa medida foi pouca efetiva, pois a desvalorização do Peso continuou a crescer, apontando que a saída de capitais se manteve.

Por outro lado, esse aumento da taxa de juros gera recessão na atividade industrial e econômica do país, pois, como dissemos, essa mesma taxa é usada como base para se tomar empréstimos e, portanto, fica inviável para os industriais realizarem investimentos. Então, por exemplo, se o industrial desejar investir em seu maquinário, e para isso precisa pegar um empréstimo, ele deixará de fazê-lo, pois os juros tão altos aumentarão muito o custo desse investimento.

Sem investimentos, a economia não cresce, o que tem como consequência mais desemprego e diminuição da renda da população, que acaba consumindo menos. Assim, agrava-se a crise  do país como um todo. Esse é o efeito dominó!

 

Alta da inflação na Argentina

A inflação é um percentual que mede o aumento geral de preços numa economia e é um importante fator de intensificação da crise econômica, pois com o aumento dos preços, há uma queda no consumo, que é, por sua vez, um importante gerador de emprego e renda.

Existem muitos fatores que podem gerar inflação em um país – no caso argentino, são dois os mais relevantes: a fuga de capitais e a pouca oferta de produtos no mercado interno. A baixa disponibilidade de produtos no mercado faz com que os preços subam, pois eles passam a ser mais procurados – e quanto mais desejados, maior o preço – gerando um aumento da inflação. Além disso, frente à instabilidade econômica, muitos investidores e produtores passam a retirar suas empresas e fábricas de um país, fazendo com que o dinheiro saia do país. Esse fenômeno é conhecido como fuga de capitais, e faz com que muitos produtos e serviços deixem de existir, contribuindo também para que os preços do comércio e do mercado financeiro tornem-se mais altos.

Conforme falamos, o Estado pode tomar empréstimos da sociedade, podendo ser agentes nacionais e internacionais  Em primeiro lugar porque, com a fuga de capitais e a baixa reserva de dólares, o peso argentino fica desvalorizado, elevando o preço dos produtos importados, o que gera inflação. Isso ocorre porque se um produto possui algum insumo de origem estrangeira, por exemplo, ele vai precisar de um maior investimento para ser fabricado, já que a moeda argentina está desvalorizada e o dólar mais caro, elevando o preço final do produto e agravando  ainda mais a inflação e o consumo. Como consequência, o investimento no país diminui porque a produção torna-se muito mais cara e não há expectativas de aumento do consumo, fazendo com que o desemprego cresça e intensifique a crise.

Entenda melhor sobre política fiscal, monetária e cambial!

É bem verdade, contudo, que quase todas as moedas de países em desenvolvimento têm sofrido uma pressão de desvalorização em relação ao dólar, por conta do aumento da taxa de juros dos EUA, que tem atraído muitos investidores em busca da segurança de pagamento que os títulos americanos possuem.

Em segundo lugar, a baixa oferta de produtos no mercado interno está entrelaçada aos motivos que já citamos. Com o aumento do preço do dólar na Argentina, vale mais a pena para o industrial vender seus produtos no exterior, em dólar, que no mercado interno, pois com a mesma quantidade de dólares recebidos, ele poderá obter mais Pesos Argentinos. Ou seja, as indústrias argentinas começaram a exportar mais e vender menos dentro do país. Assim, pela Lei da Oferta e Demanda, o preço dos produtos no mercado interno aumenta, pois há menos produtos em oferta, mas a demanda é a mesma.

A atuação do FMI na crise argentina

Economistas afirmam que o governo argentino deve estabelecer medidas que estabilizem o câmbio do país para que possam, posteriormente, recuperar a credibilidade argentina no cenário econômico internacional. A queda do peso argentino em relação ao dólar foi a maior entre todos os países emergentes desde o início deste ano. Diante de todos esses problemas econômicos e sociais, a Argentina decidiu pedir ajuda ao Fundo Monetário Internacional – FMI.

Em junho de 2018, o país recebeu do FMI 50 bilhões de dólares em um acordo de financiamento com duração de 36 meses. Apesar de aparentemente essa ser uma boa notícia, o acordo gerou diversas manifestações contrárias por parte da população pelo país. Isso aconteceu pois quando um acordo com o FMI é firmado, a instituição exige que certas políticas sejam adotadas para que o país em crise volte a ter uma estabilidade econômica e recupere a credibilidade no mercado internacional.

Porém, essas políticas são medidas de austeridade para reduzir o déficit fiscal do país, ou seja, medidas que possuem objetivo de reduzir gastos públicos e, como geralmente impactam em áreas sociais, como na educação, saúde e previdência, geram descontentamento por parte da população.

Com a alta da inflação, o poder de compra da população argentina já havia diminuído, trazendo um índice alto de pobreza para o país. Acrescentando ainda as novas políticas adotadas, indicadas pelo FMI, a população se encontra em um novo estado de vulnerabilidade social, com o acesso à serviços básicos de direito sofrendo cortes de gastos.

Eleições argentinas 2019

Em 2019, ocorrem as eleições presidenciais na Argentina – realizadas em duas etapas, as primárias e as eleições gerais.  Assim, no dia 11 de agosto do mesmo ano, já ocorreram as Primárias Abertas, Simultâneas e Obrigatórias (PASO) – em que os principais candidatos foram Alberto Fernández e Mauricio Macri. 

Mas o que isso significa? A PASO é considerada uma modalidade única do planeta, criada em 2009, obriga todo o eleitorado do país a ir às urnas para escolher, entre os pré-candidatos, quais serão os candidatos à eleição presidencial. Como todos são obrigados a votar, é considerada como um “mega ensaio” do primeiro turno das eleições gerais. Assim, enquanto aqueles candidatos que possuem menos de 1,5% de votos em nível nacional são descartados da eleição geral, as primárias argentinas também sinalizam à sociedade e – principalmente – ao mercado quem são os favoritos ao cargo. 

O peronista Fernández derrotou Macri nas primárias com 47,4% dos votos, tornando-se o favorito à presidência. O candidato já declarou que considera o FMI como corresponsável pelo desastre econômico argentino. Assim, caso ganhe, já se espera que não siga o plano de emergência lançado em 2019 pelo presidente Macri – o presidente decidiu por adiar o pagamento da dívida externa e renegociar termos com o FMI. Assim, em 28 de agosto, a Argentina declarou reperfilamento da dívida, o que para muitos especialistas é apenas outro termo para moratória.

Para além disso, no início de setembro, também foi determinado pelo Banco Central que as entidades financeiras devem pedir autorização antes de remeter dólares ao exterior.  O objetivo principal das medidas é impedir que as reservas internacionais deixem o país e, assim, estabilizar o mercado monetário e financeiro do país. 

No dia 27 de outubro está marcado às eleições gerais.  Como você pode ver, o cenário econômico argentino ainda é de grande incerteza e, dependendo do resultado da eleição, um novo plano econômico pode entrar em vigor no país.

Conseguiu entender como está a crise na Argentina? Deixe suas dúvidas e sugestões nos comentários!

Referências

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