Como inovar no governo? Aprenda com os laboratórios de inovação

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Muitas palavras nos vêm à mente quando ouvimos falar sobre o setor público em geral. E, na maioria das vezes, essas palavras são relacionadas à ineficiência, morosidade, corrupção e descontrole, mas você pode ter pensado em outras características, e negativas também. Não, isso não significa que somos todos pessimistas. Basta acordar e pegar o celular, o jornal ou ligar a televisão para perceber que nosso país passa por um momento turbulento. Em um país de Mensalão e Lava-Jato, a crise política parece ser mais a regra do que a exceção, gerando como principal consequência o descrédito em nossos próprios representantes.

É nesse contexto de desconfiança nos governantes que o tema deste texto surge, meio que na contramão, trazendo a inovação como esperança. O propósito aqui é apresentar o modelo de “Laboratório de inovação” como uma alternativa para se pensar problemas públicos, seja de dentro do Governo ou de fora. Para exemplificar este último caso, apresentaremos um pouco da atuação e dos desafios do Laboratório de Políticas Públicas que coordenamos com outros(as) alunos(as) da FGV-RJ.

O QUE É UM LABOTARÓRIO DE INOVAÇÃO?

Em primeiro lugar, o que significam, separadamente, as palavras “laboratório” e “inovação”? Podemos entender a primeira como um local onde se realizam experimentos com a finalidade de transformar hipóteses em teses, isto é, ideias abstratas em ideias concretas.

Inovação, por sua vez, expressa alguma ideia ou objeto que foge dos padrões pré-estabelecidos pela sociedade, ou seja, uma criação ou uma maneira diferente de atuar, agir e pensar. Dessa maneira, podemos entender que um laboratório de inovações nada mais é do que um espaço projetado para pensar e testar ideias que, caso tenham sucesso, possam ser posteriormente implementadas na Administração Pública.

Pode parecer confuso de início, até porque ainda não há nenhuma lei que regulamente a existência de um laboratório de inovação. Além disso, são poucos os exemplos que tratam, de fato, de uma estrutura semelhante a que temos hoje, ou seja, o próprio conceito desses laboratórios se trata de uma inovação.

Contudo, apesar de não existir um modelo fechado e institucionalizado nas leis brasileiras, alguns exemplos promissores no país já podem ser destacados. São eles: o GNova, o PENSA e o LAB.Rio, de dentro do governo. Ainda, no setor privado temos as figuras do Brazil Lab, da recém-criada Liga de Políticas Públicas da PUC e do próprio laboratório fundado por alunos da FGV-RJ. Exemplos esses que utilizaremos para deixar ainda mais clara a atuação e a importância dos laboratórios de inovação no setor público.

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LABORATÓRIOS DE INOVAÇÃO DENTRO DO GOVERNO

A ideia de morosidade e ineficiência que vêm junto da palavra Governo, em nossos imaginários, não está de todo errada. O medo de inovar, o comodismo com a conjuntura atual, a preocupação com a responsabilização pessoal e o possível abalo na estabilidade atrelada ao cargo público fazem com que os gestores continuem desempenhando as mesmas funções de 20 anos atrás. No entanto, não podemos apenas colocar na conta do Poder Executivo essa falta de iniciativa quando, na verdade, esse Poder segue aquilo que o Poder Legislativo dita por meio das Leis.

Contudo, nem tudo está perdido e não estamos fadados a esse destino trágico, os Laboratórios de Inovação na Administração Pública estão perto de se tornarem uma realidade. E isso não é uma mera esperança de universitários, o Deputado Federal Alessandro Molon apresentou no ano passado um projeto de lei denominado “PL da Eficiência” (PL 7.843/2017), que tem um capítulo inteiramente destinado aos Laboratórios.

Assim, a principal ideia do PL é de que essas instituições passem a ser de implementação obrigatória nos órgãos da Administração, como uma forma de maximização de sua eficiência. O projeto esteve aberto para consulta pública, através de uma plataforma digital de participação, que contou com o apoio e monitoramento do Laboratório de Políticas Públicas de alunos da FGV – RJ e logo será votado pelo plenário do Congresso.

Desse modo, o sonho de Laboratórios institucionalizados, disciplinados em lei e com uma roupagem jurídica adequada se torna cada dia mais próximo, e a mudança dos adjetivos pejorativos que acompanham o nome “Governo” também. No entanto, enquanto isso não ocorre, temos os exemplos das experiências promovidas pelo GNova, que é localizado na Escola Nacional de Administração Pública (ENAP) e é vinculado ao Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão; do PENSA, vinculado à Casa Civil da Prefeitura do Rio de Janeiro; e do LAB.Rio, também vinculado à Prefeitura do Rio.

Apesar de o primeiro laboratório citado continuar promovendo projetos, os outros dois não estão mais em atividade. Isso reforça a precariedade do vínculo que esses tipos de iniciativa têm, isto é, sem uma regulamentação federal os laboratórios ficam dependentes das prioridades dos gestores de cada estado e município.

E COMO SE DÁ A ATUAÇÃO DE LABORATÓRIOS DE INOVAÇÃO FORA DO GOVERNO?

Ao mesmo tempo que a ideia de laboratórios de inovação começa a ser debatida no âmbito da Administração Pública, surgem entusiastas de fora do Governo que buscam pensar ideias inovadoras para o setor público. Um exemplo disso é o Brazil LAB, que funciona como uma incubadora de inovações e visa conectar empreendedores com o setor público, criando casos de sucesso dessa relação entre inovadores e Governo.

Por outro lado, a universidade também participa da construção do conceito dos laboratórios de inovação. Em sua maioria, os projetos universitários voltados para pensar inovações no setor público ainda estão muito setorizados de acordo com cursos específicos e têm um viés mais teórico (pesquisas) do que prático.

Assim, o que se tem é uma série de grupos de estudo (Sociedade Brasileira de Direito Público, Hub UFRJ, Uerj.Reg, LABPP – Uerj, Liga de Políticas Públicas da PUC, dentre outros) de inovações no Direito Administrativo, em se tratando do curso de Direito. No caso do curso de Matemática Aplicada ou Ciência da Computação, por sua vez, tem-se o estudo de uso de dados para políticas públicas. Outro exemplo é o caso dos cursos de Ciências Sociais e de Economia, em que se atenta para os medidores sociais de impacto na sociedade, para não citar mais exemplos.

Dito isso, faltam grupos interdisciplinares para tratarem de inovações no setor público em um caráter mais pragmático, em complemento ao lado teórico. É nessa descrição que se encaixa o propósito do Laboratório de Políticas Públicas que criamos com demais alunos da FGV-RJ.

Também, cabe ressaltar que, diante dessa ampla gama de atuações e da ausência de uma regulamentação jurídica que viabilize o desenvolvimento pleno de projetos desse tipo, os Laboratórios de Inovação universitários são ainda mais sensíveis do que aqueles já instituídos na Administração Pública. A instabilidade e a dificuldade de delimitação de seus limites de atuação fazem com que sejam tratados de forma reticente, como toda e qualquer ideia que rompe com o comum.

Uma analogia que pode ser feita, pertinente no âmbito do ensino superior, é se imaginarmos um contexto brasileiro em que o conceito de empresa estivesse sendo desenvolvido ainda, e as primeiras empresas começando a ser criadas. O desenvolvimento de empresas juniores em universidades, tendo em vista essa situação proposta, seria o mesmo desafio enfrentado agora para o desenvolvimento de laboratórios de inovação em universidades, ou seja, trata-se de algo novo e pioneiro.

Leia também: o que faz um facilitador?

O QUE É UM LABORATÓRIO DE INOVAÇÃO?

O nosso Laboratório de Políticas Públicas surgiu de uma demanda dos estudantes da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro, uma vez que um dos objetivos da própria Escola é justamente o de formar lideranças para pensar o Brasil a longo prazo. Assim, em virtude de a Escola valorizar o debate sobre inovações e o setor público, percebeu-se a necessidade de um espaço para alinhar a teoria aprendida em sala à prática da realidade brasileira.

Nossa primeira aparição para o mundo exterior se deu em 2016 quando organizamos na faculdade a “Conferência Desafio Brasil”, uma grande reunião com diversos gestores públicos, entusiastas do terceiro setor e da iniciativa privada,  bem como professores que compraram essa ideia da inovação no setor público. Os 3 eixos principais do evento foram: governo digital, economia digital e educação na era da internet e contamos inclusive com a presença do Ministro da Educação como convidado de um dos painéis.

No ano seguinte, começamos a trabalhar já pensando na próxima conferência, no tema, no local, nos convidados e no meio dessas discussões chegamos à conclusão de que não queríamos ser um mero realizador de eventos que muito faz e nada efetivamente produz.

Nesse cenário, ao analisarmos o que realmente fazemos, acabamos nos definindo como um “viabilizador de inovações”. Dessa forma, somos ao mesmo tempo um grande Hub (incubadora) de inovações e um ente auxiliador na implementação dessas políticas públicas inovadoras. Além disso, uma de nossas novas vertentes passou a ser o fomento de novos Laboratórios de Inovação em diversas faculdades de modo a trazer cada vez mais jovens para pensar o setor público.

Diante disso, durante o desenvolvimento de nossos produtos, percebemos a necessidade de realizar cruzamentos de conhecimentos, criando assim uma equipe mais interdisciplinar possível, recebendo alunos (as) de todos os cursos da faculdade.  

Isso porque, no decorrer de dois anos de trabalho, tivemos projetos mais diversos possíveis, abarcando desde iniciativas tecnológicas que trabalham diretamente com o desenvolvimento de plataformas e coletas de dados até a realização de pareceres com embasamento jurídico e econômico.

Diante disso, um de nossos produtos desenvolvidos em 2017 foi um relatório de contribuição à consulta pública de um Contrato de Impacto Social (será tema de um próximo texto!) para o governo do Estado de São Paulo. A ideia central dessa iniciativa é fazer com que a forma de contratação com a administração pública e principalmente a forma de remuneração diante do cumprimento do contrato se dê com base na real modificação do cenário social para o qual a empresa foi contratada para atuar. Gerando assim uma economia para os cofres públicos e uma maior eficiência em suas políticas públicas, uma vez que o governo só pagará o referido valor acordado quando (e se) houver uma efetiva modificação na realidade.

Dentro dessa iniciativa apresentamos um parecer jurídico sobre a redação e as cláusulas que foram inseridas no edital de licitação e no contrato, como uma forma de identificar qual modelo jurídico seria melhor tanto para o setor público como privado. Analisamos ainda o âmbito econômico no intuito de identificar quais seriam os incentivos para os particulares assinarem um contrato diante do qual seu pagamento é incerto. Por fim, abordamos o aspecto social, uma vez que esse contrato, por ser uma experiência, seria aplicado apenas à uma parte da população, enquanto a outra não seria afetada por tais medidas. Assim fizemos uma análise tanto sobre a sua viabilidade de implementação no cenário brasileiro, quanto sobre os efeitos colaterais de implementação dessa medida.

Portanto, esse projeto teve um impacto duplamente positivo. Primeiro, porque esse modelo de contratação é uma inovação por si só e nós conseguimos colaborar para sua implementação no Brasil, visto que será o primeiro Contrato de Impacto Social feito no país. E, segundo, porque afetará 175 escolas no Estado de São Paulo com o único intuito de reduzir a evasão escolar.

No entanto, também desenvolvemos projetos próprios: um de nossos projetos mais criativos e espontâneos é o “Brasil Inovador”, que nada mais é do que um “Tinder”, uma plataforma virtual que liga gestores a empreendedores para suprir suas demandas, ou seja, um facilitador na relação inovadores – gestores públicos.

Tal iniciativa é uma ideia inteiramente pensada e desenvolvida pelo LAB, enquanto alguns alunos do Direito eram responsáveis por analisar como seriam feitos tais contratos, os alunos da Matemática eram os nossos programadores da plataforma. Isso porque esse encontro entre governo e iniciativa privada não era feita de maneira automática pelo nosso site, assim como o “Tinder” o faz. No nosso caso, nossos membros analisavam e mapeavam as características de cada um dos personagens fazendo com que esse “casamento” fosse o mais perfeito possível, de acordo com as especificidades  de cada um e não de forma automática e aleatória.

Analisando as nossas diversas vertentes de atuação, uma pergunta que todo final de semestre nos assola é o clássico “O que nós somos? Pra onde vamos?” e a cada vez que essa pergunta surge, temos uma resposta completamente diferente. Isso porque o conceito de inovação é fluido e pouco delimitado, o que faz com que se tenha várias perspectivas distintas, para as quais não existe um certo e um errado, existe apenas uma vontade de fazer e de impactar.

Por isso, este artigo é não só explicativo, mas também um apelo. Ajude a gente a construir esse conceito de inovação e acompanhe os desdobramentos dessa aventura de alguns universitários que buscam causar algum impacto na Administração Pública pensando de maneira diferente. Juntos podemos criar um caminho mais fácil para pensar inovações em Governo, juntos podemos criar um caminho mais fácil para implementar inovações em Governo, juntos podemos fazer um Governo melhor, porque o setor público não pode permanecer pouco atrativo, desincentivando o empenho de jovens inovadores em melhorar uma parte da realidade brasileira.

Conseguiu entender o que são laboratórios de inovação, como o LAB? Deixe suas dúvidas e sugestões nos comentários! 

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Conteúdo escrito por:
É aluna de Direito da FGV-RJ é diretora-executiva do Laboratório de Inovação em Políticas Públicas e diretora acadêmica do Centro Acadêmico Mario Machado. Se interessa por assuntos iminentemente políticos, como: eleições, financiamento de campanhas, partidos políticos e ainda sonha em ingressar no legislativo.

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23 abr. 2024

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