Notícias falsas, polarização e eleições #NãoValeTudo

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Conheça o movimento #NãoValeTudo, que busca o uso ético das tecnologias nas eleições, e saiba o que notícias falsas e polarização têm a ver com isso!

Foto: Pexels

Ah, as notícias falsas. Já ouviu falar delas, não é? As fake news estão por todo lugar! Boatos, mentiras e factóides infestam as nossas linhas de notícias das redes sociais – os newsfeed -, os nossos aplicativos de mensagens instantâneas e até as conversas com amigos e família. Quem nunca ouviu um boato sobre alguma figura pública, um político profissional, uma possibilidade de candidatura à presidência que não é verdadeira, dinheiro desviado por uma pessoa quando não foi?

Pois, as notícias falsas estão diretamente relacionadas a outro fenômeno contemporâneo, no Brasil e no mundo. Aqui, manifesta-se mais intensamente desde 2014, no ano das eleições gerais. Chamamos o fenômeno de polarização, que consiste nessa atmosfera de combate nos discursos, em que as pessoas não conseguem discutir ideias, somente se atacam. Vamos entender o que notícias falsas têm a ver com a polarização, e esses dois fenômenos contemporâneos podem impactar  as eleições de 2018?

Antes disso, vamos entender o contexto do #NãoValeTudo, um movimento criado para discutir e encorajar o uso ético das tecnologias na eleição. O movimento foi criado pelo Instituto Tecnologia & Equidade, AppCivico, Idec, Internet Lab, Instituto Update, Transparência Partidária, Transparência Internacional e Open Knowledge Brasil. Você pode ler mais sobre o movimento neste conteúdo — sobre o que eles falam de notícias falsas e polarização, leia a seguir.

Leia mais: Tecnologia nas eleições: afinal, vale tudo? #NãoValeTudo

O movimento #NãoValeTudo

Na carta do movimento #NãoValeTudo

Nós não toleramos a produção e disseminação de notícias falsas. Quem as cria, promove a mentira e manipula os cidadãos em torno de interesses particulares e desonestos. Vinda por veículos tradicionais ou inovadores, a informação de qualidade deve ser um direito garantido a todas e todos os participantes de uma discussão política, seja qual for o lado. Nós acreditamos em informações cujas fontes estejam claras, cujos autores e veículos estejam evidentes. Desta forma, saudamos e encorajamos todas as iniciativas de verificação de fatos, dados e informações e de fortalecimento do jornalismo ético e transparente com suas posições políticas conduzidas hoje no Brasil.

Nós repudiamos a manipulação da percepção do público sobre a discussão política realizada a partir da criação e do uso de perfis falsos. Ao fazer crer que contas de redes sociais são controladas por usuários humanos reais e simular movimentações políticas sem lastro real, estas técnicas desviam o foco do debate, muitas vezes servem para inflar ou atacar a imagem de pessoas de forma artificial e desonesta.

O contexto da polarização no Brasil: desde 2014, com coxinhas e petralhas

“A polarização destrói a possibilidade de diálogo cívico, promovendo a desconfiança em relação àqueles que discordam. A polarização deve ser distinguida do conflito de ideias, valores e interesses, que reconhece a legitimidade de visões plurais e dissidentes sobre os mais diversos temas. A aceitação e a institucionalização de mecanismos de solução pacífica de conflitos estão entre as caraterísticas centrais da vida democrática.”

Sobrevivendo nas Redes, documento criado pelo Internet Lab, a Fundação FHC e o Monitor do debate político na internet.

É muito complexo explicar o que é polarização reduzindo o fenômeno a um só conceito, uma vez que muitas definições ainda são incompletas e nem sempre se encaixam no contexto político, que é a leitura perseguida por nós. Trazendo a discussão para a política, então, como a polarização ocorre no Brasil e no nosso dia a dia? Vamos dar alguns exemplos, voltando até 2014.

As eleições de 2014 tiveram numerosos episódios marcantes, principalmente em função das eleições presidenciais que ocorreriam naquele ano. Um dos fenômenos mais percebidos – e vivido pelas pessoas -, sem dúvidas, foi a completa divisão social por conta de crenças políticas. Ou era coxinha, ou era petralha – referindo-se aos então eleitores de e Aécio e de Dilma, respectivamente. De fato, às vezes nem era preciso ser eleitor de algum desses candidatos, mas a simples expressão de ideias já fazia cair um rótulo sobre o indivíduo.

Os debates eram calorosos, as conversas raramente se limitavam à discussão de ideias, ideologias, posicionamentos sobre políticas públicas e sobre qual forma de desenvolvimento se espera para o país. Com as redes sociais já amplamente usadas pelos brasileiros, houve também uma transposição das conversas para a plataforma digital, fosse com grandes textos no Facebook, no Twitter ou enviando correntes de informação – muitas vezes questionável do ponto de vista de veracidade – pelo Whatsapp. O clima era de hostilidade na internet e nas ruas. O principal prejudicado nesse contexto é o Brasil e os brasileiros, pois o debate político e as propostas dos candidatos e suas bases de apoio acabam sendo muito superficiais e simplistas.

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Na Esplanada dos Ministério, no dia do julgamento do impeachment da ex-presidente , manifestantes contra e a favor da decisão de impeachment. Foto: Ricardo Stuckert | Insituto | 17/04/2016

Como vemos esse cenário de polarização hoje? Existe ou não? É tão visível ou está subentendido em alguns momentos? O processo de polarização de crenças passar por uma série de fatores. Dentre eles estão as notícias falsas, a desinformação em massa – mesmo vivendo uma sociedade hiperconectada -, incluindo a atuação de robôs (!) nas redes sociais que muitas vezes buscam potencializar os movimentos em massa e “causar discórdia”. Os resultados desses fatores podem causar instabilidade inclusive no processo democrático, como as eleições de 2018 – e é exatamente isso que queremos evitar.

“Além de enfatizar as diferenças e esconder os consensos, a polarização do debate político faz com que os lados criem caricaturas uns dos outros. A disposição para compreender os argumentos que mobilizam os membros de cada um dos polos sobre o outro é muito restrita – por trás das denominações pejorativas “coxinhas” e “mortadelas”, há uma visão preconcebida e simplória sobre o lado ideologicamente oposto.” – Sobrevivendo nas Redes.

Vamos falar da relação entre polarização e notícias falsas, e sobre como isso pode ser influenciar a nossa democracia?

Notícias falsas e a atmosfera da desinformação

As notícias falsas são uma questão antiga, como demonstramos neste texto. Boatos espalhados a fim de difamar pessoas públicas em prol de um interesse é uma prática de séculos. O que há de novo na seara das notícias falsas? Precisamos pensar sobre como lidamos com as redes sociais, seus algoritmos e o nosso relacionamento com a tecnologia, inclusive como novos produtores de conteúdo. Como lidamos com o viés de confirmação, que pode ser explicado por meio da pós-verdade. E como lidamos com os robôs, que podem ser usados a fim de causar e potencializar discussões e discórdias online, desestimulando a conversa política civilizada e qualificada.

Sobre as redes sociais. Como se sabe, as redes sociais têm algoritmos que a operam, a fim de determinar quais conteúdos são os mais relevantes para você e fazer com que essas informações cheguem a você de fato. A nossa hiperconexão nas redes sociais faz com que recebamo inclusive notícias por meio dessas plataformas – em 2016, 72% dos brasileiros liam notícias nas mídias sociais.

O grande debate sobre os algoritmos de redes sociais é: eles nos conectam com o que queremos ler, queremos saber, com páginas e pessoas que já pensam como nós e com conteúdos que tiveram maior investimento em campanhas pagas. Isso traz à mesa a questão do viés de confirmação, que é o nosso comportamento em buscar conteúdos que confirmem as nossas próprias crenças e opiniões, sem buscar saber outros pontos de vista contraditórios. Pior do que isso, os algoritmos têm reforçado um fenômeno que se destacou em 2016 – principalmente no contexto das eleições presidenciais estadunidenses e do Brexit, a saída do Reino Unido da União Europeia – que se chama pós-verdade. Pós-verdade é um termo que designa a situação em que as pessoas não se importam mais com a verdade; mas em ler algo que reafirme o seu ponto de vista. Isto se transforma em algo mais importante do que o fato de se tratar de  uma mentira ou de uma verdade.

As redes sociais têm o seu lado positivo, em levar informação a uma massa gigantesca de pessoas; e esse é exatamente o seu perigo, considerando que as informações não passam por filtros quando estão nessas plataformas. Sobre o assunto, na pesquisa Sobrevivendo nas Redes, reflete-se: “as redes sociais têm um enorme potencial para fomentar o debate público, permitindo a participação massiva e direta da população. Esse potencial de massificação, porém, tem sido acompanhado pela polarização do debate político, que é reforçada pela própria maneira como acessamos informações e notícias na plataforma”.

Como mencionamos neste texto sobre notícias falsas, a internet colocou o cidadão comum no centro de tudo: todo mundo pode produzir e disseminar conteúdo por meio dos seus perfis nas redes. Seja ele verdadeiro ou não, estando em seu contexto original ou não. Essa falta de filtro faz com que informações cheguem a nós de maneira crua, sem serem contextualizadas, o que por si só já é um problema; faz também com que seja possível criar factoides, caluniar e injuriar organizações, movimentos, políticos profissionais, pessoas públicas e comuns.

Outro fator relevante é que, de alguma forma, diferentemente das relações pessoais e “ao vivo”, na internet nós despersonalizamos o outro: “nos reduzimos a uma única persona pública, interpretamos um único papel simplificado, que nos aproxima daqueles com quem concordamos e nos afasta de quem discordamos em geral, embora pudéssemos concordar em questões específicas. Tal descontextualização nos simplifica e nos dessensibiliza”, de acordo com o Sobrevivendo nas Redes.

Foto: Matthew Quay | UnsplashSobre a sociedade polarizada e as notícias falsas. Para entender esse contexto, precisamos definir que notícias falsas podem ser aquelas “notícias” em formato jornalístico que carregam falsas informações em seu conteúdo. Mas não se limita a isso. O ruído das fake news é extenso pois se trata também de informações tiradas de contexto; uma notícia de quatro anos atrás sendo “apropriada” para os dias atuais, por exemplo.

Movimentos com ideologias, que pregam uma série de ideais e estão adentrando a política partidária, usam as tecnologias à sua disposição a fim de fazer propaganda e disseminar as suas próprias crenças, opiniões e ideologias. Até aí, não haveria problema nenhum, afinal, diversos partidos políticos, políticos profissionais e movimentos têm páginas em redes sociais e sites para divulgar seus próprios conteúdos. O grande problema existe quando o conteúdo que parece ser de um jornal ou de uma fonte minimamente objetiva em suas afirmações, mas, na verdade, são informações que visam à persuasão do leitor e argumentam em prol de uma causa, crença ou movimento específico. Isto é, enganar o leitor quanto ao seu propósito.

Sobre os robôs. Essa pode ser a parte mais complexa da situação  – o que faremos com mais detalhes num próximo texto. Alguns robôs usados na internet “pregam a discórdia”. Existem dois tipos de robôs que atuam dessa forma: algoritmos computadorizados e que “agem por si só”; e uma espécie de “ciborgue”, que combina a tecnologia dos algoritmos com a atuação de pessoas por trás das telas.

Exemplificando um caso comum: uma discussão no Twitter, seja envolvendo perfis de alta relevância pública ou não. Às vezes você vai discutir com perfis que estão ali apenas para desestabilizar o eixo da discussão e minar negativamente o que poderia ser um debate propositivo, o que pode , desestimular  as pessoas de falar sobre política ou quaisquer assuntos que dizem respeito ao interesse público. Há um podcast do Braincast sobre “como os bots influenciam na nossa percepção da realidade” que traz uma boa discussão sobre o tema.

Como combater as notícias falsas e a polarização na democracia?

Podemos lutar contra esta maré entendendo, principalmente, o que é a desinformação, no que ela consiste e como evitá-la. Isto é, como estar bem informado no mundo da informação? Além de checar sempre a fonte de informações, as datas de publicações e questionar as pessoas sobre a procedência daquele vídeo, foto ou “corrente no Whatsapp”, estar sempre de olho em agências que se especializaram em checar informações – bons exemplos são o Aos Fatos e a Agência Lupa, parceiras no movimento #NãoValeTudo, inclusive.

Outra questão que devemos pensar é sobre como os atores da arena política têm responsabilidade não só em não reproduzir notícias falsas e não criá-las. É preciso que partidos políticos, pré-candidatos e pessoas envolvidas no processo ajam de maneira a combater a desinformação e a fim de qualificar o debate político. Promover o uso ético da tecnologia nunca foi tão necessário e pode ser determinante em todo o processo democrático das eleições. Nas redes sociais, nos almoços de família, na mesa de bar com os amigos e nas campanhas políticas, a tecnologia deve ser usada para ampliar, qualificar e criar um debate saudável, respeitoso e orgânico da internet e de todos os meios à nossa disposição. Além disso, a fim de sempre melhorar e ampliar a nossa democracia, que façamos esse uso ético dos meios digitais para a conscientização de votos e das eleições de 2018.

Confira também este vídeo sobre como utilizar a tecnologia durante as eleições:

Conseguiu entender o que é polarização e a sua relação com as eleições e as notícias falsas? Deixe suas dúvidas e sugestões nos comentários!

Aviso: mande um e-mail para contato@politize.com.br se os anúncios do portal estão te atrapalhando na experiência de educação política. 🙂

Referências do texto: confira aqui onde encontramos dados e informações!

Rafael A. F. Zanatta, pesquisador em Direito e Sociedades Digitais, mestre em Direito e Economia Política pela International University College of Turin e mestre em Sociologia Jurídica pela Universidade de São Paulo – USP, onde foi coordenador do Núcleo de Direito, Internet e Sociedade. Graduou-se em Direito na Universidade Estadual de Maringá – UEM

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Conteúdo escrito por:
Sou uma jornalista brasileira procurando ouvir ideias e histórias originais, peculiares e corajosas. Trabalhando como estrategista de marcas, desenvolvo narrativas que buscam emanar o que há de mais autêntico e verdadeiro nas pessoas, marcas e negócios, criando conexão através da emoção e identificação. Hoje, minha principal atuação é como estrategista de marcas na Molde, construindo marcas que redefinam realidades e gerem impacto. Como profissional autônoma atuo com a gestão de marca do estúdio de design de produto HOSTINS—BORGES, colaboro regularmente com a FutureTravel, uma publicação digital baseada em Barcelona, e preparo palestrantes no TEDxBlumenau como voluntária desde 2016.

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28 mar. 2024

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