Poluição dos rios amazônicos: como ela impacta os povos indígenas?

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A poluição dos rios amazônicos é um tema amplamente debatido, mas você sabe de que forma ela acontece e quais comunidades estão entre as mais afetadas por seus impactos?

Diante da relevância do assunto e da proximidade da Conferência das Nações Unidas sobre as mudanças climáticas de 2025 (COP 30), que será realizada em novembro no Brasil, na cidade de Belém, vamos aprofundar esse debate.

Neste texto, vamos analisar como a poluição dos rios amazônicos impacta diretamente os povos indígenas e discutir suas principais consequências para a sociedade.

Este conteúdo integra a trilha do Projeto Amazônia Urbana, uma iniciativa que busca aprofundar o entendimento sobre os desafios e transformações ambientais das cidades na região amazônica.

Imagem de cima do Rio Amazonas. Texto: Poluição dos rios amazônicos: como ela impacta os povos indígenas?
O Rio Amazonas. Imagem: Wikipédia.

O que é a poluição dos rios amazônicos?

Para um rio se caracterizar como poluído, é necessário ter presença de substâncias ou elementos que modifiquem as suas particularidades químicas, físicas e biológicas. Além disso, precisa tornar-se impróprio para usos naturais, econômicos, culturais e sociais para um determinado grupo.

Essa definição é diretamente relacionada com a poluição presente nos rios Amazonas, Tapajós e Xingu, principais afluentes que servem como meio de subsistência para os povos originários. Com isso, as comunidades que dependem do rio, enfatizam a necessidade de uma fiscalização para prevenir o aumento da poluição dos rios amazônicos, essenciais para a manutenção da sobrevivência, cultura e economia da região.

As causas da poluição são várias, como:

  • Atividades agrícolas, industriais e urbanas;
  • Garimpo ilegal, que utiliza o mercúrio, por exemplo, para a extração ilegal do ouro;
  • Degradação ambiental;
  • Desmatamento;
  • Construção de barragens;
  • Ausência de estrutura de saneamento básico;
  • Contaminação química, através de agrotóxicos, microplásticos e produtos farmacêuticos;
  • Descartes inadequados de resíduos sólidos.
Texto: Poluição dos rios amazônicos: como ela impacta os povos indígenas?
Líder indígena Davi Kopenawa. Imagem: Christian Braga/ISA.

A relação dos povos indígenas com os rios

As relações dos povos indígenas consiste não só na sobrevivência, mas muitas vezes faz parte de uma coesão com a sobrevivência cultural e econômica.

Com isso, os povos indígenas Munduruku e Guajajara, por exemplo, apresentam uma cosmovisão na maneira de compreender a realidade que transcende divisões ocidentais entre natureza e cultura, humano e não humano. Nessa perspectiva, eles relatam que tudo no universo possui vida e propósito, assim como as árvores, os animais e, especialmente, os rios. 

Essas afirmações foram descritas no seminário “Bacias Hidrográficas na Amazônia: O Sagrado e a Defesa dos Rios dos Povos das Águas” (Movimento Xingu Vivo). Ao final do evento, foi enfatizado que os rios são como interlocutores ativos, com os quais as comunidades dialogam em um pacto de respeito mútuo.

De acordo com Silvia Benítez, gerente de segurança hídrica da The Nature Conservancy (TNC), as comunidades indígenas são as que mais querem proteger os rios porque são as fontes de alimentação, transporte e renda.

A presença de povos indígenas está diretamente ligada à preservação da floresta. Um levantamento do MapBiomas, divulgado em 2021, mostrou que as áreas mais preservadas do Brasil entre 1985 e 2020 foram as terras indígenas, mesmo em regiões ameaçadas como a Terra Indígena Yanomami, considerada essencial para a Amazônia segundo o Imazon. Essa proteção se relaciona com a forma como os yanomami entendem a natureza: para eles, a urihi (floresta, terra, território) é um presente de Omama (uma deidade ou entidade yanomami) a ser cuidado por gerações, e a terra onde vivem é chamada de “yanomae thëpë urihipë”, a “floresta dos seres humanos”.

Por esse motivo, o líder e o xamã yanomami, Davi Kopenawa, afirmou em entrevista à National Geographic, que os yanomami e os demais indígenas são os pilares que sustentam a vida no planeta.

Com o relato de Benítez e pelo conhecimento sobre as comunidades tradicionais, é notório entender que os rios são o centro da vida dessa população para a preservação da sua identidade cultural e a sobrevivência desses povos no território brasileiro. Essa relação é enraizada na história indígena ocasionando uma interdependência crucial para os seus costumes tradicionais.

Entretanto, essa relação dos povos indígenas com os rios pode diminuir ao longo dos anos devido aos novos dados divulgados. De acordo com o Censo 2022, realizado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), 53,97% da população indígena residiam em áreas urbanas, ocorrendo uma diminuição de concentração nas áreas florestais.

Leia mais: O que você precisa saber sobre os povos indígenas do Brasil

Floresta amazônica desmatada
Imagem: Greenpeace

As causas e consequências da poluição dos rios amazônicos 

No início do texto, citamos algumas causas que são consideradas as mais comuns na contribuição para a poluição dos rios amazônicos. Nesse tópico abordaremos cada motivo de uma forma mais clara e ampla para o entendimento da população.

Atividades humanas 

As atividades agrícolas, industriais e urbanas utilizam o mesmo mecanismo para a poluição dos rios: as descargas de produtos químicos (exemplos: metais pesados, pesticidas e fertilizantes) utilizados nesses setores cooperam para a eutrofização da água, que é o excesso de nutrientes que levam ao surgimento de algas e plantas aquáticas.

Garimpo ilegal 

É uma atividade predatória que não tem autorização e responsabilidade ambiental para a extração de metais preciosos, na qual o ouro é o mais procurado e valioso para esses exploradores ilegais. Nesses garimpos, é utilizado o mercúrio para a extração ilegal do ouro, e dessa forma, os rios são contaminados pelo metal pesado, tóxico para a vida aquática ecomunidades locais. Em síntese, essa prática comete dois crimes: a ausência de autorização legal para atuar na área e a utilização das terras indígenas, um fator que é vedado pela Constituição Federal.

Degradação ambiental 

É a causa mais genérica, pois está relacionada com as demais razões de poluição. No entanto, a degradação ambiental é a deterioração do meio ambiente, e isso acontece na precarização e danificação das condições ambientais.

Desmatamento 

O desmatamento é a remoção e o corte das florestas que estão presentes em uma determinada área. Esses fatores podem ocasionar erosão do solo, levando sedimentos e poluentes para os rios. De acordo com o Greenpeace, desde 1970, a Amazônia brasileira perdeu mais área florestal do que o tamanho da França.

Construção de barragens elétricas 

As barragens são construídas para gerar energia elétrica, através do desnível da  água dos rios. O exemplo é a hidrelétrica de Santo Antônio, localizada no rio Madeira. No entanto, existe um embate com o desenvolvimento econômico, já que essa prática afeta a dinâmica natural dos rios, interferindo na migração de peixes, na sedimentação e nos fluxos de nutrientes. Com isso, a consequência é o deslocamento de comunidades para outros territórios e a perda das áreas tradicionais.

Veja mais: O que é a Usina de Belo Monte?

Ausência de estrutura de saneamento básico 

O saneamento básico, regulamentado pela Lei 11.445/2007, define com um conjunto essencial de serviços, infraestruturas e instalações necessárias para promover a saúde, como o abastecimento de água, esgotamento sanitário, limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos, e a drenagem e manejo de águas pluviais urbanas.

Com a falta de estrutura de saneamento básico em determinadas áreas, o lançamento de esgoto sem tratamento adequado nos rios é inevitável e acarreta em poluição nos rios. Dessa forma, os rios podem ser proliferados por bactérias, vírus e parasitas que podem causar doenças para a população.

Contaminação química 

Essa causa pode ser denominada de poluição invisível, porque não é vista de uma forma concreta, mas ela está inserida dentro dos rios. Os exemplos mais comuns são os agrotóxicos, microplásticos e os produtos fármacos. Esses poluentes são descartados de uma forma inapropriada nas águas dos rios.

Um exemplo foi a Expedição Silent Amazon, empreendida em 2019, que percorreu 1,5 mil km de rios, entre o Amazonas e seus afluentes, coletando amostras para identificar tais contaminantes. Foram encontrados defensivos agrícolas, os agrotóxicos provenientes das utilizações de plantio, e substâncias que compõem os farmácos.

Descartes inadequados de resíduos sólidos 

De uma forma clara, essa causa é a mais conhecida pela população, e consiste em lixos que são jogados nas águas. De acordo com informação da Secretaria Municipal de Limpeza Urbana de Manaus, uma média de 27 toneladas de lixo são retiradas das águas todos os dias.

Texto: Poluição dos rios amazônicos: como ela impacta os povos indígenas?
Avaliação clínica na aldeia Sawré Muybu, TI Sawré Muybu, Pará, 2019. Imagem: Paulo Basta / Fiocruz.

Os impactos da poluição para os povos indígenas 

De acordo com o grupo de pesquisa “Ambiente, Diversidade e Saúde” da Fiocruz, houve uma análise de 88 peixes que fazem parte da área dos três territórios indígenas: Yanomami, Sawré Muybu (do povo Munduruku) e Sete de Setembro (do povo Suruí, em Rondônia) e todos os peixes analisados estavam contaminados por mercúrio.

Além disso, os direitos territoriais e as mudanças de vida dos povos originários também são afetados. Com os desmatamentos, invasões de grileiros, a perda da biodiversidade e os conflitos por disputa territorial são os exemplos que contribuem para a violação dos direitos fundamentais da população indígena.

Nessa perspectiva, a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas (UNDRIP) estabelece que os povos indígenas têm o direito de manter e fortalecer a sua relação espiritual com a suas terras, territórios e recursos naturais. Sabendo que a água é um bem comum essencial para a dignidade humana e recurso para a vida na Terra.

Estrada e Maquinário Ilegais na TI Yanomami na Amazônia
Estrada e Maquinário Ilegais na TI Yanomami na Amazônia. Imagem: Greenpeace.

Casos específicos de impacto e comunidades indígenas acometidas

Conforme o MapBiomas em 2022, entre 2010 e 2021, a área de garimpo saltou 625% em Terras Indígenas no Brasil. Os territórios mais atingidos foram dos Kayapó (11,5 hectares), dos Munduruku (4,7 mil hectares) e dos Yanomami (1,5 mil hectares). Todos esses dados são em consonância com a destruição das terras dos povos originários que foram afetados por causa do garimpo ilegal. Essa atividade não tem a regulamentação necessária para exercer essa prática, ao contrário do garimpo legal, que é permitido se manuseado da forma correta.

Veja também: Garimpo ilegal na Amazônia: como chegamos até aqui e o que pode ser feito

A presença do garimpo ilegal para a extração do ouro é perigoso para os fatores sociais, ambientais e hídricos. Nessa perspectiva, um levantamento da HAY (Hutukara Associação Yanomami), realizado em parceria com o ISA (Instituto Socioambiental), mostrou que o problema cresceu 54% apenas em 2022 na Terra Indígena Yanomami, devastando 5.053 hectares no território

Dessa forma, com a utilização do mercúrio para separar o ouro dos outros componentes, a água é contaminada e prejudica o consumo para beber e pescar os peixes, esses que são contaminados pelo mercúrio.

De acordo com a pesquisa da Fiocruz, divulgada em 2024, grande parte da população de nove aldeias Yanomami, localizadas no Estado de Roraima, estão contaminadas por mercúrio consequência da atividade de garimpo ilegal de ouro.

Além de afetar a saúde da população tradicional, o garimpo ilegal aumenta o desmatamento das áreas preservadas, ocorre a sedimentação de rios, o aumento de grilagem de terra e o crescimento da violência no bioma.

Texto: Poluição dos rios amazônicos: como ela impacta os povos indígenas?
Comunidades ribeirinhas e aldeias indígenas ampliam acesso à água potável. Imagem: Aflora.

A resposta do governo e movimentos sociais 

O Programa Cisternas é um exemplo de programa desenvolvido pelo Governo Federal, para que as pessoas em situação de vulnerabilidade na região amazônica tenham acesso à água de qualidade para o seu consumo

Além disso, foi assinado em 2025 o que amplia o programa Áreas Protegidas da Amazônia e permite um apoio para a população local. Seguindo os avanços pela proteção ambiental, nesse mesmo ano foi anunciado R$ 825,7 milhões para combater o desmatamento e recuperar a biodiversidade nas áreas que foram destruídas

Outro exemplo de iniciativa é o Fundo Amazônia, um mecanismo de financiamento climático brasileiro e que desde a sua criação, em 2008, ajudou a manter importantes projetos de proteção e desenvolvimento sustentável na Amazônia.

Entretanto, em 2025, o Congresso Nacional aprovou o PL 2159/2021, um projeto que enfraqueceria em alguma medida o licenciamento ambiental, já que permite obras com alto risco de impacto voltado a empreendimentos considerados estratégicos para o governo. O PL ainda está tramitando e segue em discussões.

Saiba mais: Saiba o que é o novo marco do licenciamento ambiental no Brasil

Em agosto de 2025, durante a homenagem à 4ª Marcha das Mulheres Indígenas, lideranças indígenas fizeram um apelo ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva para vetar o projeto de lei, que é chamado por grupos de interesse de “PL da Devastação”. A presidente da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (FUNAI), Joenia Wapichana, ressaltou que, ao tirar o poder do Estado de fazer avaliações sobre o impacto ambiental, o projeto de licenciamento traz insegurança territorial.

Durante a sessão solene, a deputada federal Célia Xakriabá (Psol-MG), defensora dos direitos indígenas, defendeu a busca de por acordo que privilegie o direito dos povos ancestrais e que acabe com os conflitos em terras indígenas. Ela mencionou que levará o debate para a COP 30, realizada em 2025 no Brasil, no mês de novembro e em Belém-PA.

Dentre os movimentos sociais, o Greenpeace é uma organização ambiental que defende os ecossistemas e os povos que dependem da natureza. Estão atuando há mais de 30 anos no Brasil, e utilizam ações pacíficas para expor os problemas e dialogar com a sociedade brasileira. Outros que podem ser mecnionados é o Observatório do Clima e a Fundação Amazonas Sustentável (FAS).

Nõ só movimentos sociais, mas personalidades, como religiosa norte-americana Dorothy Stang, dedicaram boa parte de sua trajetória em defesa da região Amazônica. Sua atuação foi em defesa dos trabalhadores rurais da Região Xingu, no Pará. Outro nome é Chico Mendes, um seringueiro, sindicalista, ativista político e ambientalista importante para o desenvolvimento da região e para os povos da floresta.

Leia mais: O que são ONGs?

As soluções possíveis 

Aqui vão algumas ações que podem contribuir para a redução e proteção do meio ambiente:

  • Educação ambiental em escolas e universidades;
  • Destinação de verbas orçamentárias para ações de políticas ambientais e territoriais;
  • Fortalecimento de Órgãos ambientais, como IBAMA, ICMBio, INCRA e o FUNAI;
  • Programas para Áreas Protegidas de Conservação;
  • Aplicação dos processos de responsabilização pelos crimes ambientais;
  • Demarcação dos territórios dos povos indígenas e comunidades tradicionais.

E aí, gostou de saber mais sobre os rios amazônicos e como ela impacta os povos indígenas? Restou alguma dúvida? Se sim, deixe nos comentários!

Se você gostou do conteúdo, conheça o Projeto Amazônia Urbana, uma iniciativa da Politize! em parceria com o Pulitzer Center. O projeto busca ampliar o olhar sobre os desafios das cidades amazônicas, promovendo conteúdos acessíveis e didáticos sobre urbanização, justiça climática e participação cidadã na região. Acompanhe essa jornada!

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Conteúdo escrito por:

Luis Gustavo Oliveira Marques

Sou baiano, estudante de Direito e defensor pelos direitos das minorias. Eu gosto de conteúdos ligados aos Direitos Humanos, Política, Ciências Sociais e Filosofia.
Marques, Luis. Poluição dos rios amazônicos: como ela impacta os povos indígenas?. Politize!, 18 de setembro, 2025
Disponível em: https://www.politize.com.br/poluicao-dos-rios-amazonicos/.
Acesso em: 2 de nov, 2025.

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