,

Saiba o que é antipunitivismo

Publicado em:
Compartilhe este conteúdo!
Imagem: Carta Capital

Você sabe o que é antipunitivismo? Neste texto vamos nos aprofundar no conceito e nos principais pensamentos antipunitivistas, vamos lá?

O ordenamento jurídico brasileiro prega que para determinadas condutas deve haver uma punição determinada. As penalidades são previstas em lei podem ir desde multa até uma pena privativa de liberdade. A pena de morte também é prevista no Brasil, mas apenas em casos muito específicos, como crimes cometidos em tempos de guerra.

O antipunitivismo surge, então, como um contramovimento às tendências coercitivas do Estado. Os antipunitivismo podem ser descritos como aqueles que não acreditam na punição como medida eficiente para combater as mazelas sociais e defendem a eliminação das prisões e do sistema prisional.

Veja também nosso vídeo sobre as causas para a crise do sistema prisional brasileiro!

O que é antipunitivismo?

O antipunitivismo, ou abolicionismo penal, pode ser descrito como o movimento que prega o fim do encarceramento como forma de controle social. Ele defende que o sistema carcerário é incapaz de ressocializar os presos e proteger a população, além de ser uma solução simplista para problemas sociais complexos como desigualdade social e uso de drogas.

Contudo, é importante ressaltar que o antipunivismo é uma corrente e não um pensamento único, de modo que a forma como essas ideias são defendidas podem variar de pessoa para a pessoa. Ao longo texto iremos trabalhar mais a fundo os diferentes argumentos do antipunitivismo e seus principais expoentes!

Saiba mais: Correntes de pensamento político: uma introdução

O que o antipunitivismo defende?

Sabemos que o antipunitivismo não é uma corrente única, mas vamos entender melhor o que o antipunivismo defende?

Em primeiro lugar, a pauta comum das diversas correntes do antipunitivismo é a crítica ao sistema penal que possui como foco castigar os culpados. Nesse sentido, Hulsman, uma das principais referências no debate abolicionista, aponta que a privação de liberdade é utilizada como uma forma de provocar sofrimento e segregar socialmente.

Hulsman leciona que o sistema penal é altamente ineficiente, pois é incapaz de ressocializar os encarcerados e de trazer segurança à população. Desconsidera promover um modelo sucessor, substituto, ao vigente na justiça criminal; seu empenho está nas instituições, em seus efeitos e funcionamento perante a sociedade.

Outro aspecto apontado pelos antipunitivistas é que o sistema de justiça é utilizado como ferramenta por e para alguns grupos em detrimento de outros. Nesse sentido, têm-se que a população de alto poder econômico, social e político possui vantagens quando comparada com a população mais vulnerável.

Esse quadro é caracterizado como seletividade penal. Quando analisamos os dados históricos e a composição carcerária do Brasil, a seletividade penal fica ainda mais escancarada.

Segundo dados de junho de 2022, a população carcerária brasileira é de 654.704, sendo cerca de 95% composta de homens. A maior parte dos encarcerados é proveniente de grupos que historicamente foram marginalizados como pretos e população oriunda de locais carentes.

Além disso, a maioria dos presos no Brasil não chegaram nem mesmo a completar o ensino médio. Chama a atenção, também, que os crimes mais cometidos são aqueles contra o patrimônio (como roubo e furto) e aqueles provenientes da Lei de Drogas. Para os estudiosos da criminologia, estes tipos penais se relacionam com desigualdade.

A pesquisadora em antropologia, Juliana Borges (2018), diz que o sistema carcerário brasileiro é responsável pela manutenção da desigualdade social e do racismo estrutural e sua atuação se dá por uma lógica punitivista.

A autora argumenta que, uma vez abolida a escravidão, para garantir o controle social, sobretudo sobre os grupos subalternizados estruturalmente, foi necessário legalizar outras práticas de hierarquização racial e social na sociedade.

Neste sentido, os antipunitivistas buscam refletir sobre a relação direta entre a estrutura de um passado colonial escravocrata e a criminalização da pobreza, vez que a população mais vulnerável é a que mais sofre com os efeitos do encarceramento.

Além disso, o antipunivismo defende que o sofrimento e a punição causadas pela privação de liberdade não evitam futuras práticas de crimes, da mesma forma que não trazem reparação para as vítimas. Portanto, o sistema penal e carcerário como o conhecemos estaria fadado ao fracasso.

Assim, o antipunitivismo busca defender uma sociedade que não foque na prisão e na vingança como forma de combater males sociais, pois acredita que o sistema atual é segregador e ineficaz na ressocialização e na solução dos problemas sociais que levam à criminalidade.

Para os antipunitivistas o foco deve estar não em punir o cidadão que comete um crime, mas sim em combater os problemas sociais que levam a criminalidade e repensar a lógica da criminalização e o porquê de alguns comportamentos serem criminalizados.

Principais propostas antipunitivistas

Os abolicionistas penais se baseiam em fundamentos multidisciplinares, principalmente derivados da sociologia, da criminologia e do direito para defender o antipunitivismo. Dentre os fundamentos mais comumente encontrados nas obras sobre o tema, temos:

  • A prisão incita a reincidência, pois o ambiente prisional é incapaz de ressocializar e em muitos casos pode piorar a situação do preso uma vez que as condições ali vivenciadas destroem a moral da pessoa;
  • Não há comprovação de que a pena de prisão previna crimes;
  • A pena restritiva de liberdade é desproporcional quando se tratam de crimes contra o patrimônio, evidenciando que a sociedade atual dá mais valor a bens materiais do que a vida;
  • É preciso parar de construir novos presídios e criminalizar novas condutas;
  • As prisões são desumanas e produzem violência e degradação nos valores culturais;
  • Os custos de manutenção do sistema carcerário são altíssimos e poderiam ser melhor investidos em outras áreas;
  • O que vem a ser caracterizado como crime e suas penas são definidos em uma estrutura hierárquica que acaba por ressaltar a desigualdade social, de gênero e étnica;
  • É necessário o investimento em políticas sociais e de descriminalização das drogas.

Porém, algumas correntes do abolicionismo admitem sanções como a compensação, mediação e conciliação, tendo, portanto, um foco na justiça restaurativa. Esse tipo de justiça busca focar seus esforços na reparação da vítima.

Uma construção mais moderna do antipunitivismo defende a figura do “manejo de conflito”, segundo o qual se buscaria dar a oportunidade dos envolvidos em um conflito de conversarem sobre a situação e encontrarem uma solução conjunta.

Contudo, a efetividade da abolição penal, depende, sobretudo, de uma mudança estrutural, pois o sistema penal e carcerário atual nada mais é do que a sistematização de uma estrutura que tem origens remotas.

Quem defende o antipunitivismo?

Quem defende o antipunivismo pode ser chamado de antipunitivista ou abolicionista penal. Dentre os defensores do antipunivismo temos alguns nomes famosos, sobretudo dentro da área acadêmica:

  • Thomas Mathiesen: teórico e professor norueguês. Ele é um dos maiores representantes do movimento abolicionista carcerário. Escreveu diversas obras sobre o tema como The politics of abolition e Prison on Trial.
  • Louk Hulsman: professor holandês, é um dos principais teóricos do antipunivismo. Ele entende o abolicionismo como prática que se exerce no presente pela recusa da liguagem do sistema de justiça criminal e pela resolução de situações-problema fora de sua esfera.
  • Ângela Davis: a autora norte-americana publicou obras tratando sobre o abolicionismo como “Estarão as prisões obsoletas?”, no qual provoca reflexões sobre o sistema prisional que tem como ênfase políticas repressivas de segurança.

Veja também: Angela Davis e Lélia Gonzalez: conheça duas teóricas do feminismo negro nos EUA e no Brasil!

Antipunitivismo versus Punitivismo

Se você chegou até aqui já deve saber quais as diferenças entre as correntes punitivistas e as antipunitivistas, mas vamos lá: A principal diferença entre as duas correntes é a forma como enxergam a pena.

O punitivismo defende que o Estado deve aplicar àqueles que atentam contra a lei penas e que estas penas devem ser proporcionais ao dano cometido. Defendem que para que a sociedade seja mais segura, é preciso que as penas sejam mais duras e que o medo de uma eventual punição é suficiente para impedir que crimes ocorram.

Já o antipunitivismo, como vimos, desacredita a eficiência da aplicação de penas, em especial a prisão, para formar uma sociedade melhor. O antipunitivismo defende que o sistema prisional e até mesmo o direito penal acabam por agravar a desigualdade social e ignoram os problemas sociais que levam as pessoas a cometerem crimes.

Leia mais: Desigualdade Social: um problema sistêmico e urgente

Sugestões de leitura

Quer entende melhor o sistema carcerário e os argumentos contra e a favor do antipunitivismo? Recomendamos a leitura das obras a seguir.

O primeiro grupo são obras de “literatura de cárcere”, isso é, que tratam a prisão como eixo central e definidor de toda a obra. Neste grupo, a relação da literatura com o sistema prisional é o argumento de toda a narrativa, que retrata, essencialmente, o cárcere, uma determinada sociedade e seus tipos humanos característicos.

Assim, dentre esse grupo recomendamos as seguintes obras: “Memórias do cárcere”, de Graciliano Ramos; “Recordações da casa dos mortos”, de Fiódor Dostoiévski; “Na prisão”, de Kazuichi Hanawa; “O último dia de um condenado”, de Victor Hugo; e “Estação Carandiru”, de Drauzio Varella.

O segundo grupo é composto por obras que tratam da representação do cárcere na literatura é a escrita que não relata apenas um determinado sistema prisional, mas o insere dentro de uma das tramas da história.

É o exemplo de “O estrangeiro”, de Camus; “O conde de Monte Cristo”, de Dumas; e “Diário de um ladrão” de Genet. Estas obras estreitam a nodosidade entre enredo e cárcere, porém a experiência em um sistema prisional se torna complementar no todo da narrativa.

E aí, conseguiu entender o que é antipunitivismo? Qual é a sua opinião sobre o tema? Deixe sua resposta nos comentários?

Referências:

GoCache ajuda a servir este conteúdo com mais velocidade e segurança

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Compartilhe este conteúdo!

ASSINE NOSSO BOLETIM SEMANAL

Seus dados estão protegidos de acordo com a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD)

FORTALEÇA A DEMOCRACIA E FIQUE POR DENTRO DE TODOS OS ASSUNTOS SOBRE POLÍTICA!

Conteúdo escrito por:
Graduando em Direito e criador da página @direitoeliteraturajf, onde é possível conciliar literatura, cinema, séries, música e direito. Tudo de um jeito simplificado e intrigante.

Saiba o que é antipunitivismo

23 abr. 2024

A Politize! precisa de você. Sua doação será convertida em ações de impacto social positivo para fortalecer a nossa democracia. Seja parte da solução!

Pular para o conteúdo