O lobby climático está presente nas principais decisões sobre o futuro do planeta. Leis ambientais, acordos internacionais e políticas de transição energética não nascem apenas de debates científicos, são moldadas também por interesses econômicos, corporativos e sociais que atuam nos bastidores do poder.
Embora o termo muitas vezes desperte desconfiança, o lobby climático pode ter efeitos positivos quando exercido de forma transparente, ampliando o diálogo entre governos, empresas e sociedade, ou gerar distorções graves quando usado para proteger setores poluentes e adiar medidas urgentes para conter a crise climática.
Este conteúdo integra a trilha do Projeto Amazônia Urbana, uma iniciativa que busca aprofundar o entendimento sobre os desafios e transformações ambientais das cidades na região amazônica.

O que é lobby climático?
O lobby climático pode ser definido como a atuação de indivíduos, instituições ou coalizões que se empenham para influenciar, direta ou indiretamente, as decisões relacionadas às mudanças climáticas. Essas decisões envolvem perguntas centrais: quais emissões serão reguladas, quais modelos de desenvolvimento serão incentivados e quais setores terão prioridade de transição.
No lobby direto, há contato com tomadores de decisão, reuniões com políticos, financiamento de estudos, divulgação de pesquisas ou convites para eventos relevantes. Já o lobby indireto molda a opinião pública e mobiliza apoio por meio de mídias sociais, campanhas e estudos de opinião.
Segundo a Escola da Câmara, o lobby é o processo pelo qual indivíduos ou grupos interessados em ações públicas buscam participar do processo estatal de tomada de decisões, defendendo seus interesses ou contribuindo para políticas públicas. Trata-se de uma prática legítima quando orientada pela transparência, pela legalidade e pela impessoalidade.
O lobby climático ganhou força com a ascensão da agenda global de mudanças climáticas e transição energética. Desde os anos 1990, setores ligados aos combustíveis fósseis, como o American Petroleum Institute, financiaram economistas e campanhas para adiar políticas de mitigação, influenciando decisões como a retirada temporária dos Estados Unidos do Acordo de Paris.
Estudos apontam que o lobby empresarial internacional se tornou peça-chave nas disputas sobre prazos, padrões técnicos e incentivos de transição. O que está em jogo vai além de regulamentações: trata-se da velocidade da transição energética, do modelo econômico adotado e de quem arcará com os custos.
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Como funciona o lobby climático nas políticas públicas?
O lobby atua em diferentes momentos do processo decisório. Antes da aprovação de leis, ele busca moldar detalhes de regulação, e após a aprovação, influencia a implementação por meio de decretos, portarias e consultas públicas.
Um exemplo é o Sistema Europeu de Comércio de Emissões (ETS), da União Europeia, cujo desenho inicial foi suavizado após forte pressão corporativa. Por outro lado, existem casos de lobby voltados à sustentabilidade: em 2022, mais de 150 CEOs europeus pediram à Comissão Europeia medidas mais rápidas em eficiência energética e fontes renováveis.
Associações empresariais, como a InfluenceMap, identificam que muitas corporações ainda mantêm impacto negativo líquido nas políticas climáticas, mas destacam avanços em transparência e governança climática, como os padrões Global Standard on Responsible Climate Lobbying e Climate Action 100+.
O lobby pode ser exercido por diversos atores sociais e econômicos, dividindo-se em três categorias principais:
- Lobby empresarial: voltado à defesa de interesses econômicos, como os de empresas de petróleo, gás, carvão e agronegócio;
- Lobby social: conduzido por ONGs e movimentos que buscam ampliar a justiça climática e promover políticas de baixo carbono;
- Lobby público: realizado por órgãos estatais e agências reguladoras, influenciando decisões internas do próprio Estado.
Essas formas coexistem e, no campo climático, podem cooperar ou competir. Enquanto o lobby empresarial foca na preservação de setores produtivos, o lobby social e público defendem sustentabilidade e inclusão.
Quando o lobby é legítimo e quando se torna prejudicial?
A linha entre influência legítima e influência indevida é uma das maiores tensões do debate sobre o lobby climático. Exercido de forma transparente e ética, ele pode qualificar o diálogo entre empresas, governos e sociedade. Porém, quando há opacidade e desequilíbrio de poder, o lobby pode gerar captura regulatória, ou seja, quando interesses privados moldam políticas públicas em benefício próprio.
O relatório Fuelling Delay revelou que interesses de combustíveis fósseis influenciam todas as etapas da diplomacia climática global, da estrutura fundadora da Convenção-Quadro da ONU sobre Mudança do Clima (UNFCCC) à redação dos textos finais das COPs.
A pesquisa identificou quatro mecanismos principais de influência:
- Regras fundadoras da UNFCCC que permitem bloqueios a avanços;
- Domínio do discurso político nacional, marginalizando especialistas e sociedade civil;
- Atuação dentro das COPs, moldando linguagem e ambição dos acordos;
- Promoção de narrativas corporativas, que justificam o uso continuado de combustíveis fósseis.
Brice Böhmer, coordenador da Transparência Internacional, alertou que 15% dos participantes da COP29 não divulgaram suas afiliações, muitos ligados ao setor fóssil. A organização recomenda regras de conflito de interesse, divulgação pública de vínculos e participação ampliada da sociedade civil para restaurar a legitimidade do processo.
O lobby empresarial e o “lobby verde” no Brasil
No Brasil, o termo “lobby” ainda é associado a práticas de corrupção, mas estudos mostram que ele é um elemento estrutural da política energética. Pesquisa revelou que o lobby corporativo da bioenergia e do agronegócio molda políticas públicas desde o Proálcool (1970) até o RenovaBio, consolidando o setor como “motor verde” da transição energética.
A atuação de entidades como a UNICA (União da Indústria de Cana-de-Açúcar) demonstra como a influência empresarial define regulações, assegura subsídios e difunde narrativas de sustentabilidade. Ainda assim, pesquisadores alertam para o risco de contradições: as mesmas práticas que promovem inovação podem reforçar desigualdades rurais e comprometer a transparência.
Artigo da USP propõe um debate sobre atividade política corporativa, conceito que reconhece as empresas não apenas como agentes econômicos, mas também atores políticos capazes de moldar leis, normas e narrativas. O desafio, segundo os autores, é separar o lobby legítimo, que fortalece o diálogo democrático, da captura indevida, que distorce o interesse público.
A influência empresarial também se estende aos espaços multilaterais. Nas conferências da ONU sobre o clima, lobistas participam de eventos paralelos, delegações e discussões técnicas. A COP29 registrou mais de 1.700 representantes do setor fóssil, recorde histórico.
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Empresas justificam essa presença como parte da transição energética “viável e realista”. Entretanto, organizações ambientais alertam que o desequilíbrio reduz a ambição dos acordos. A Transparência Internacional defende mecanismos de transparência obrigatórios e gestão de conflitos de interesse para evitar que as negociações climáticas sejam dominadas por interesses econômicos.
ESG, sociedade civil e novas formas de influência
O avanço da agenda ESG (ambiental, social e governança) redefiniu o papel do lobby climático. Profissionais de relações governamentais e investidores passaram a intermediar o diálogo entre empresas e Estado para alinhar metas de sustentabilidade, reduzir riscos e promover regulamentações mais robustas.
Ao mesmo tempo, cresce o lobby da sociedade civil, protagonizado por ONGs, movimentos comunitários e redes de juventude que defendem uma transição justa e participação democrática nas decisões climáticas.
Entre as organizações do Brasil, podemos citar:
- Observatório do Clima (OC): coordena uma ampla rede de organizações e produz dados de referência sobre emissões de gases de efeito estufa e políticas ambientais, sendo uma das principais vozes de incidência em nível nacional;
- Instituto Talanoa: especializado em análises e advocacy sobre governança climática, mercado de carbono e orçamento público, influenciando decisões estratégicas no Executivo e Legislativo;
- ARAYARA.org : lidera campanhas e ações judiciais contra combustíveis fósseis, atua na mobilização social e pressão política por uma transição energética justa e sustentável.
Fóruns internacionais como a COP e o G20 Social se tornaram espaços de disputa simbólica e política sobre o futuro das políticas ambientais globais.
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Se você gostou do conteúdo, conheça o Projeto Amazônia Urbana, uma iniciativa da Politize! em parceria com o Pulitzer Center. O projeto busca ampliar o olhar sobre os desafios das cidades amazônicas, promovendo conteúdos acessíveis e didáticos sobre urbanização, justiça climática e participação cidadã na região. Acompanhe essa jornada!
Referências
- Escola da Câmara – O que é lobby?
- Exame – Lobby climático é um grande negócio, mostra estudo
- Forbes – Oil And Gas Giants Spend Millions Lobbying To Block Climate Change Policies
- G1 – Quem são os lobistas que atuam nas COPs
- Jornal da USP – Bastidores da transição energética: lobby verde e política climática no Brasil
- JOTA – Relações governamentais e sustentabilidade: o papel do lobby na transição climática
- London School of Economics – What is climate change lobbying?
- Transparência Internacional – Fuelling Delay: How Fossil Fuel Interests Shape Global Climate Negotiations