Tudo que você precisa saber sobre o que é Orientalismo

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Quadro artístico: A recepção do embaixador de Damasco.
Anonimo: A recepção do embaixador de Damasco, 1511, Louvre.

Orientalismo é o campo de estudo que tem por objeto o Oriente, e qual a primeira coisa que você pensa quando escuta a palavra Oriente? Se a sua resposta não for só uma, saiba que é isso mesmo! Essa região é uma região bastante complexa, mas acima de tudo, não é uma coisa só. Ficou curioso para saber mais sobre? 

Então vem com a gente que hoje a Politize! te explica tudo o que você precisa saber sobre Orientalismo.

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O que é Orientalismo?

O Orientalismo surgiu como prática acadêmica, entre os séculos XVIII e XIX. Nesse período, Grã-Bretanha e França, principalmente, controlavam territórios como: Canadá, Austrália, Nova Zelândia, colônias na América do Norte e do Sul, Caribe, grandes porções da África, Oriente Médio, Extremo Oriente e o subcontinente indiano.

O Orientalismo se torna então, dentro dessa perspectiva imperial, uma disciplina acadêmica que englobava o estudo das línguas, literaturas, religiões, filosofias, histórias, arte e leis das sociedades asiáticas, especialmente as antigas. O orientalismo pode também significar o entusiasmo geral por coisas asiáticas ou “orientais”.

Orientalismo vem da palava “Oriente”, nome criado para denominar o que estava ao Leste da Europa a fim de reunir vários territórios e culturas distintas em uma ideia única, para designar tudo aquilo que não fosse europeu. Esse é um ponto de vista que perdura até os dias de hoje, e que foi incorporado e adptado pelo resto do mundo e pelos próprios povos denominados “orientais”.

Isso levou estudiosos do Oriente a se questionarem e contar sua própria história. Partiremos então para a crítica ao Orientalismo.

Orientalismo como crítica

Edward Said, autor do livro “Orientalismo – O Oriente como invenção do Ocidente” defende a ideia de haver uma construção do que conhecemos hoje por “orientais”, e que tal construção foi feita a partir do Ocidente e seus impérios.

Said destaca que essa colonização era carregada de superioridade e de um senso de dever dos impérios britânico e francês de civilizar tais culturas atrasadas, em suas visões. É claro que além do senso de responsabilidade, havia o interesse em explorar esses territórios, seja por mão de obra ou extraindo recursos naturais.

O período de expansões territoriais nos séculos XVIII e XIX teve como consequência um grande enriquecimento cultural para a Europa, através de literaturas de viagem e relatórios científicos. O autor ressalta que foi um momento de descobertas de novos territórios que seria carregado de criações fantasiosas sobre o estilo de vida que pessoas desses países levavam, e até o uso de um tom julgador, que encarou essas culturas como promíscuas, involuídas e atrasadas em todos os sentidos.

A Europa se mantinha como centro privilegiado, onde podemos extrair da crítica de Said que não havia uma genuína troca, mas sim uma imposição cultural por parte dos viajantes e seus respectivos governos. Iam-se criando histórias e mitos que embasavam a perspectiva dos colonizadores.

Nesse cenário, é recriada a visão prévia e errônea dos países ao Leste, e seus contos e fantasias, além de um discurso bem difundido sobre os perigos que essas atuais nações carregam.

Em seu livro Orientalismo: O Oriente como invenção do Ocidente, Said traz o exemplo do autor francês Ernest Renan.

No trecho do compilado de obras de Renan, Oeuvres completes, Said nos mostra que Renan ressalta a “raça semítica”, em suas palavras, como parecendo incompleta e simples, o autor chega a dizer que “Essa raça (…) é para a família indo-européia o que um esboço a lápis é para uma pintura; falta-lhe aquela variedade, aquela amplitude, aquela abundância de vida que é a condição da perfeição.”

Renan, no trecho destacado, acaba por reduzir o Oriente, e mais especificamente os povos semitas, às características mais aparentes e facilmente criticáveis, e ignora completamente a profundidade de sua existência histórica. 

Esse é um exemplo trazido por Said de como os estudos orientalistas possuíam uma tradição de superioridade, repassada até os dias de hoje em alguma medida.

Outra particularidade que se pode extrair do parágrafo acima é a ideia, amplamente difundida dentro dos estudos orientalistas, de que o Oriente obteve seu ponto mais alto de glória no passado, e que por lógica, se encontraria em decadência. Isso então reforçaria o discurso de poder da Europa, onde ela própria se considera a região evoluída e superior.

Sua tese, portanto, em resumo, é a que orientalistas principalmente do século XIX, contribuíram para construir a imagem negativa que temos do Oriente hoje.

Perspectivas de autores não ocidentais sobre o orientalismo

Anouar Abdel-Malek aponta que orientalistas consideram o Oriente e os orientais como um ‘objeto’ de estudo, que é passivo, não participante e não soberano em relação a si mesmo. O autor também afirma que o trabalho científico dos estudiosos de diferentes países orientais não foi levado em consideração como referência para os estudos europeus.

Outra crítica feita pelo autor é a concentração de tesouros pertencentes aos países da Ásia, África e América Latina em grandes centros europeus, como o Museu Britânico e os museus Cernuschi e GuimIet em Paris. 

Estima-se que há pelo menos 140.000 manuscritos árabes que estão fora de seus territórios, e praticamente fora do alcance de pesquisadores árabes, que muitas vezes trabalham através de bases indiretas sobre sua própria história e cultura.

Já o autor palestino A. L. Tibawi levanta a questão do preconceito religioso que existe junto ao estudo do orientalismo pelo Ocidente. Inclusive, não houve nenhum avanço expressivo em direção a uma melhor compreensão, principalmente do Islã, até tempos recentes.

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Algo também interessante que Tibawi percebe sobre tal preconceito religioso, é o que ele descreve como algo talvez inconsciente, que é o pensamento de que o islamismo deve se alinhar com o pensamento europeu moderno, mas que nunca é levantada a hipótese da Europa se adaptar ao Islã.

O professor da FGV, Salem Nasser, destaca que o conceito “oriental” foi tão bem implementado pelos colonizadores, que mesmo quem se encontra no Oriente Médio por exemplo, hoje se autodenomina oriental e ao seu espaço local como Oriente Médio.

Essa tendência de considerar a narrativa do Ocidente sobre qualquer matéria se dá porque estamos inseridos na configuração mundial em que o Ocidente detém o poder há tanto tempo, que nos acostumamos a tomar sua visão sobre o mundo como verdadeira.

Por fim, o professor destaca que o Oriente não conta a si mesmo, não possui voz própria. O conhecimento sobre tal “local místico” se dá através do que o Ocidente nos diz sobre ele.

Consequências do Orientalismo como prática imperialista

A visão imaginativa de mundo criada pelos ocidentais entre “nós” e “eles” cria uma distinção, onde há um lado que se considera como civilização evoluída e racional. Já o “outro” é encarado como o bárbaro, místico, atrasado como civilização e conflituoso.

Esse é um posicionamento que reforça e ajuda a construir um falso conceito, negativo, sobre o Oriente Médio.

As consequências disso são práticas como a xenofobia e o preconceito religioso. Conflitos recentes que obrigaram muitas pessoas do Oriente Médio a migrarem para países da Europa alimentou ainda mais o traço racista que a região europeia carrega. 

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Outros países como Estados Unidos herdaram a visão eurocêntrica e transformaram o orientalismo. Hoje podemos dizer que ele acontece também através de discursos de ódio contra nações asiáticas e orientais, no geral.

O que o orientalismo nos deixou foi uma tendência a considerar a narrativa ocidental acima de qualquer outra, porque estamos inseridos na configuração mundial em o Ocidente detém o poder há tanto tempo, que nos acostumamos a tomar sua visão de mundo como verdadeira.

Essa foi uma breve introdução para você entender melhor o que existe por trás das relações internacionais atuais tão complexas, e para ajudar e desmistificar certezas que temos porque nos foram impostas, e não porque realmente tem compromisso com os vários lados das demais histórias e realidades que existem em nosso mundo!

Ficou curioso para saber mais? Comenta o que você acha que poderíamos trazer sobre o tema em um próximo texto, ou deixe sua dúvida nos comentários!

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Conteúdo escrito por:
Brasiliense desbravando Curitiba, graduada em Relações Internacionais, em vias de concluir especialização em Direito e Relações Governamentais pelo Centro Universitário de Brasília. Acredita que a melhor forma de ajudar as pessoas é espalhando conhecimento. Knowledge is power! (Mas Cersei Lannister discorda).

Tudo que você precisa saber sobre o que é Orientalismo

30 abr. 2024

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