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Como as políticas são garantidas pela tributação?
11 jul 2023
11 jul 2023

Como as políticas são garantidas pela tributação?

Como as políticas são garantidas pela tributação?

As políticas públicas são ações realizadas pelo Estado para garantir os direitos dos cidadãos e estão previstas na Constituição. De modo geral, elas possuem a função de promover o bem-estar social e, por isso, impactam a vida de todos nós. 

Nesse contexto em que cabe ao Estado assegurar garantias, qual é o papel da tributação? Ela é essencial, pois possibilita a arrecadação de recursos financeiros que serão destinados para diversos setores, incluindo a implementação das políticas públicas. 

Quer entender melhor a relação entre a cobrança de tributos e a garantia de direitos constitucionais? Então, continue com a gente que vamos explicar de um jeito fácil como a tributação é importante nesse processo. 

O projeto Tributos e Desigualdade é uma realização do Instituto Mattos Filho, produzido pela Civicus em parceria com a Politize!. Juntos, temos o objetivo de levar conhecimento e informações sobre a tributação no Brasil e seus impactos sobre a desigualdade.

→ Neste eixo do projeto, conversamos com a Luiza Guanabara, estagiária de direito tributário do Mattos Filhos e discutimos qual o papel da tributação no combate às desigualdades. Confere esse papo aqui:

Políticas públicas: obrigação ou escolha?

Como explicamos antes, as políticas públicas são um instrumento necessário para que o Estado alcance diversos objetivos. Dentre eles, podemos citar o “desenvolvimento nacional”, que tem como finalidade fazer o país crescer em áreas como o turismo, a pesquisa científica e a cultura. 

Você pode estar se perguntando: “pagamos tantos tributos só para isso?” A resposta é não. Algumas políticas públicas são obrigatórias por lei, como o desenvolvimento nacional que citamos ou qualquer outra que esteja prevista na Constituição. Além delas, há políticas que são definidas pelos planos de governo dos representantes eleitos.

Por isso, é tão importante analisarmos bem a proposta de cada representante antes de votar, já que todos deverão promover as garantias previstas na Constituição, mas cada um poderá escolher como desenvolver ações específicas que julgue necessárias para o bem-estar social. 

Como o dinheiro arrecadado por meio da tributação é destinado para as políticas públicas?

Todo o dinheiro utilizado para financiar essas políticas vêm do Tesouro Nacional, que é uma “poupança” do governo.  Ao longo do tempo, essa reserva será alimentada por meio das arrecadações anuais de tributos. Então, quando os tributos são pagos pelas pessoas e empresas, o dinheiro passa a ser do Estado.

No Brasil, a responsabilidade de cobrar e gerir os tributos é dividida entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios. Dessa forma, cada ente federativo possui sua própria receita. Ademais, há transferência de recursos entre os diferentes entes federativos – a União compartilha parte do valor arrecadado com os municípios, por exemplo. Isso faz parte da “repartição tributária das receitas” e possibilita que cada ente cumpra com suas responsabilidades, inclusive no que se refere à realização de políticas públicas. 

O dinheiro arrecadado não pode ser gasto de qualquer forma. Todo ano, o Poder Executivo e Legislativo elaboram um planejamento de gastos chamado de orçamento.  Ele ajuda a organizar os gastos e inclui as despesas obrigatórias que correspondem a uma obrigação legal, como o pagamento dos servidores públicos. Esses gastos são pré-determinados e não dependem do valor arrecadado. Ou seja, independente do valor que for arrecadado pelo pagamento de tributos, o Estado irá assumir estes gastos.

Imagem em preto e branco de uma Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização (CMO) para discussão de financiamento de políticas públicas.
Debates sobre financiamento de políticas públicas são feitos na Comissão de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização (CMO). Imagem: Agência Senado.

Além desses, há outros gastos que são definidos a partir do valor arrecadado por meio dos tributos. É o que acontece nas áreas da saúde e educação, por exemplo, que recebem um percentual do que foi pago pelos cidadãos e empresas ao Estado em forma de tributo. Vamos supor que o orçamento definiu que 10% do valor arrecadado será destinado para a educação. Consequentemente, a quantia que será destinada para o setor da educação dependerá do total arrecadado naquele ano.

Com isso, quanto maior a quantidade de obrigações para cumprir, parte significativa do dinheiro arrecadado possuirá destinação específica e maior será a dificuldade de fazer a divisão entre os gastos restantes – a organização dessa divisão é feita por meio do plano orçamentário. Assim, a definição do plano orçamentário gera disputas políticas, já que não é possível financiar todos os projetos de políticas públicas. Com isso, alguns projetos ou setores terão maior investimento que outros, mas é importante pontuar que todas as decisões devem sempre ser baseadas na Constituição. 

Aumento da arrecadação significa melhoria da economia? 

O valor total arrecadado é chamado de carga tributária e corresponde a uma parcela do Produto Interno Bruto (PIB). Então, é comum escutarmos que houve um aumento na arrecadação que, por consequência, gerou um crescimento do PIB no país. Isso significa que houve uma melhoria no cenário econômico?

Não necessariamente. A riqueza arrecadada pelo Estado não é diretamente proporcional ao desenvolvimento econômico, visto que ele depende de políticas públicas. A promoção dele depende de diversos fatores, como: boas condições de trabalho, proteção ao meio ambiente, acesso à cultura e ao lazer, ou seja, a promoção do desenvolvimento em todos os setores. Tais melhorias são possíveis apenas por meio de políticas públicas que garantam a existência e desenvolvimento efetivo de projetos nesses âmbitos. 

Sendo assim, a tributação é um meio que possibilita a implementação de políticas públicas, já que consegue arrecadar recursos para torná-las possíveis. Mas a garantia do desenvolvimento nacional ou econômico não depende somente da arrecadação de recursos, dependerá também da forma como esses recursos serão investidos, ou seja, quais políticas públicas terão maior ou menor financiamento e se serão bem implementadas ou não. 

É necessário, portanto, que haja uma gestão eficiente e responsável desses recursos, a fim de que eles sejam direcionados para as áreas prioritárias e sejam capazes de gerar resultados positivos para a sociedade como um todo.

Políticas Públicas e o cenário de desigualdade no Brasil

O Brasil possui a maior desigualdade de renda do trabalho entre os países da América Latina. Assim, algumas pessoas ganham muito mais do que outras apesar de trabalharem na mesma ocupação ou fazerem trabalhos semelhantes. Essa desigualdade pode ser observada em diversos níveis, como entre gêneros, raças, etnias, regiões geográficas, níveis de educação e setores econômicos, por exemplo. Somado a isso, o sistema tributário brasileiro regressivo – caracterizado pela concentração de tributos indiretos (aqueles que incidem sobre o consumo de produtos e serviços) – torna a cobrança proporcionalmente mais cara para pessoas com menor renda.

Nesse cenário, as políticas públicas podem ser utilizadas para promover melhorias efetivas, tanto no âmbito econômico quanto social. Como exemplo há políticas de redistribuição de renda que têm como objetivo reduzir a desigualdade. 

Imagem em preto e branco com multidão acompanhando a cerimônia de lançamento do novo bolsa família, política pública implementada pelo presidente Lula.
Cerimônia de lançamento do Novo Bolsa Família, política pública importante no contexto brasileiro. Imagem: Ricardo Stuckert/Palácio do Planalto.

Essa ação faz parte das políticas de assistência social, responsáveis por garantir que as famílias em situação de pobreza tenham o direito à sobrevivência assegurado pela Constituição e tenham sua autonomia promovida. Nesse contexto, a redistribuição de renda é uma ferramenta importante para auxiliar na inclusão social e no enfrentamento da pobreza. Um exemplo desse tipo de política é o Programa Bolsa Família, por meio do qual as famílias cadastradas recebem um valor mensal em dinheiro para garantir acesso aos direitos básicos. Além da distribuição de renda, o programa objetiva ter um impacto positivo na saúde, educação e no desenvolvimento das famílias beneficiadas. 

É possível que esse programa seja complementado por projetos estaduais. O Governo do Distrito Federal, por exemplo, criou uma política para potencializar o alcance do Programa Bolsa Família, chamado Plano DF Sem Miséria. Por meio desse plano, o Governo estadual complementa o valor que as famílias da região recebem para que elas alcancem um mínimo de cem reais per capita (cem reais por pessoa da família).

Além disso, a tributação pode ser utilizada como ferramenta de política regional, pois devido à extensão do país, há algumas desigualdades entre as regiões, o que gera a necessidade de uma ação estatal para promover melhorias. O Estado pode diminuir a cobrança de tributos, conceder isenções ou incentivos fiscais para empresas de uma determinada região, por exemplo, para promover o desenvolvimento daquele local. 

Um exemplo de tratamento tributário diferenciado com objetivo de  reduzir a desigualdade regional é a Zona Franca de Manaus, que é uma região incentivada do ponto de vista tributário que foi criada em 1967 com a finalidade de viabilizar a criação de um pólo industrial, comercial e agropecuário na Amazônia por meio da criação de incentivos fiscais. Entre os benefícios fiscais que são concedidos para a Zona Franca de Manaus está, por exemplo, a possibilidade de venda de matérias-primas extrativas vegetais que são encontradas na região da Amazônia Ocidental com isenção de IPI.

Imagem em preto e branco com placa da região escrita Zona Franca, remetendo à política pública de isenção
Isenções fiscais feitas na região da Zona Franca possibilitaram desenvolvimento da região. Imagem: AFEBRAS.

O mesmo ocorre com a produção, já que é possível que o tributo sobre um produto seja reduzido a fim de promover o aumento da oferta nacional. Um exemplo desse tipo de tratamento tributário diferenciado é o fato de que o Regulamento do IPI, que é o imposto que incide sobre a saída de produtos industrializados, prevê expressamente que o Poder Executivo pode alterar as alíquotas desse imposto com vistas a garantir o atendimento de políticas públicas. Nesse sentido, bens que são essenciais para o atendimento dos direitos sociais, como ônibus por exemplo, são sujeitos a uma alíquota zero de IPI, ou seja, não são tributados pelo IPI.

Conclusão 

No contexto social que vivemos, é importante que a gente saiba quais são as garantias previstas na Constituição para os cidadãos. Além de considerar que o Estado foi criado para servir ao bem-estar coletivo e beneficiar toda a sociedade. Dessa forma, é dever do Estado agir com objetivo de promover políticas públicas para diminuir a desigualdade e promover o desenvolvimento nacional. 

Com isso, o planejamento de políticas públicas e fiscais é essencial para que o orçamento público seja utilizado para alcançar uma sociedade livre, justa e igualitária. Gilberto Bercovici, em seu livro Condição Econômica e Desenvolvimento: Uma leitura a partir da Constituição de 1988, afirma que o “governar”, após a criação do chamado Estado Social, é mais do que gerenciar fatos é, principalmente, planejar o futuro por meio das políticas de médio e longo prazo. Isso evidencia a importância da gestão adequada do orçamento público e da implementação de políticas públicas, tanto para melhorar a vida das famílias na atualidade quanto das futuras gerações.

Assim, essas políticas são importantes para o presente e futuro do país e, consequentemente, a tributação se torna uma ferramenta essencial nesse contexto, visto que é por meio da arrecadação de tributos que as ações governamentais serão financiadas. Além disso, ela também possibilita que o Estado faça uma gestão da economia, já que o aumento ou diminuição da carga tributária possibilita a promoção de determinadas regiões e produtos ou ao desestímulo do consumo e produção de bens considerados prejudiciais. 

A forma como os tributos são cobrados também afeta a desigualdade no país. Buscando promover melhorias, a Constituição garante que o imposto sobre a renda seja cobrado de forma progressiva. É sobre isso que vamos falar no próximo post do projeto! Continue acompanhando o nosso site, Youtube e Spotify para saber mais!

→ Neste vídeo, apresentamos de forma simples e didática qual o papel da tributação no combate à desigualdade. Clique no play para começar:

Autores
  1. Amanda Casseb Reis Ramos
  2. Isabele Monteiro Zeitune
  3. Leonardo Linck Squillace
  4. Luiza Linardi Guanabara
  5. Mariana Mativi
  6. Marina da Silva Costa
  7. Pamela Vieira de Souza Ramagnoli
  8. Pâmela Larissa Miguel Gottardinie
  9. Raimundo Vinicius
Fontes
  1. Instituto Mattos Filho;
  2. Como os serviços públicos são financiados?
  3. O que é transferência de renda?

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