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Censura nas telenovelas durante a ditadura militar no Brasil

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A partir de 1964, o Brasil vivenciou uma longa ditadura militar, que durou mais de duas dรฉcadas. Durante esse perรญodo, a censura nas telenovelas e em outros setores culturais marcou profundamente a vida artรญstica e cultural do paรญs, impondo restriรงรตes e vigilรขncia severa

Vocรช jรก ouviu falar sobre a censura nas telenovelas brasileiras durante a ditadura militar? Quais temas eram passรญveis de serem censurados? Nesse texto, a Politize! irรก te explicar como funcionava a censura federal nas artes e como ela agiu nas telenovelas brasileiras.

O impacto da censura nas artes em geral

A censura federal se estendeu a diversos setores, incluindo jornais impressos e televisivos, revistas, mรบsicas, teatros, livros e a teledramaturgia nacional, com destaque para a censura nas telenovelas, impondo restriรงรตes a conteรบdos considerados inadequados pelo regime.

As telenovelas, desde a estreia da primeira em 1963, intitulada como “2-5499 Ocupado”, estavam presentes na comunicaรงรฃo e no entretenimento dos lares brasileiros, alcanรงando certa influรชncia.

Reconhecendo o impacto das telenovelas na formaรงรฃo de opiniรตes e na disseminaรงรฃo de ideias, o regime militar desenvolveu estratรฉgias rigorosas para controlar e limitar o conteรบdo exibido, demonstrando como a censura nas telenovelas foi usada como uma ferramenta de controle social.

Contudo, mesmo sob censura, algumas novelas se tornaram populares ao explorar temas sociais de forma contida, sugerindo que a repressรฃo tambรฉm influenciou a criatividade e o formato da teledramaturgia nacional.

A censura passou a monitorar de perto autores, atores, roteiros e enredos, buscando evitar a disseminaรงรฃo de temas considerados subversivos ou imorais pelos padrรตes do regime, que via essa prรกtica como uma forma de controle social e estabilidade polรญtica.

Para muitos apoiadores do regime militar, a censura era percebida como uma ferramenta necessรกria para conter a subversรฃo e preservar os valores tradicionais em um momento de instabilidade social e polรญtica.

Esses setores defendiam que a censura ajudava a evitar a disseminaรงรฃo de ideologias que eram vistas como uma ameaรงa ao regime, como o comunismo, em um contexto de Guerra Fria.

Alรฉm disso, havia quem considerasse que o controle sobre o conteรบdo artรญstico e midiรกtico era necessรกrio para preservar valores culturais e morais, impedindo que conteรบdos considerados imorais ou contrรกrios aos princรญpios tradicionais fossem amplamente difundidos.

Como funcionava a censura nas telenovelas durante a ditadura militar?

Primeiramente, รฉ importante frisar que censurar รฉ uma aรงรฃo polรญtica que busca controlar comportamentos e ideias, baseada em uma ideologia jรก estabelecida. A censura รฉ usada para proteger certos interesses de grupos na sociedade, sejam eles polรญticos, morais ou religiosos. Ela age limitando o que pode ser dito ou mostrado, de acordo com os valores desses grupos.

A censura, incluindo a censura nas telenovelas, foi instituรญda oficialmente na ditadura militar a partir de 1967, quando o entรฃo presidente Castello Branco sancionou a Lei nยฐ 5.250.

O governo justificava essas medidas como necessรกrias para preservar a estabilidade polรญtica e proteger a moralidade pรบblica, refletindo uma preocupaรงรฃo com a manutenรงรฃo da ordem em meio ao que era percebido como um perรญodo de instabilidade social e polรญtica.

A censura atuava como um mecanismo para evitar tumultos e divisรตes internas, protegendo a unidade nacional. O governo utilizava discursos oficiais e propagandas institucionais para reforรงar essa visรฃo. Setores da imprensa alinhados ao regime, como o jornal ‘O Globo’ e a revista ‘Manchete’, frequentemente reproduziam essa justificativa.

Alรฉm disso, personalidades do meio polรญtico e militar, como o general Golbery do Couto e Silva, argumentavam que a censura era uma resposta necessรกria ao avanรงo de movimentos revolucionรกrios no paรญs.

Era, para eles, uma medida estratรฉgica para manter a ordem em um momento de forte polarizaรงรฃo polรญtica e combater ideologias vistas como uma ameaรงa ร  seguranรงa do paรญs.

A partir desta lei, seria considerada criminosa qualquer publicaรงรฃo de propaganda de “subversรฃo da ordem polรญtica e social”, alรฉm de publicaรงรตes que “atentem contra a moral e os bons costumes”, nas prรณprias palavras da lei.

Embora os impactos negativos da censura sobre a liberdade de expressรฃo e a produรงรฃo cultural sejam amplamente reconhecidos, setores da sociedade argumentavam que ela tambรฉm trouxe maior controle sobre conteรบdos considerados inadequados ou ofensivos ao pรบblico.

Esse tipo de justificativa era frequentemente utilizado para reforรงar a ideia de que a censura ajudava a proteger valores que, ร  รฉpoca, eram considerados fundamentais para a coesรฃo social.

Alรฉm das imposiรงรตes da lei citada acima, um รณrgรฃo do governo foi retomado (pois ele jรก existia durante a Era Vargas) para controlar principalmente as produรงรตes artรญsticas no Brasil: o Serviรงo de Censura de Diversรตes Pรบblicas. A partir de entรฃo, todas as criaรงรตes artรญsticas (mรบsica, teatro, telenovelas, etc) passariam pelo crivo dos censores.

De acordo com Emilla Grizende Garcia, o Serviรงo de Censura de Diversรตes Pรบblicas (SCDP) teria que validar ou nรฃo as mais diversas produรงรตes:

โ€œA principal atribuiรงรฃo era a de emitir โ€œlaudos tรฉcnicosโ€, pareceres, a fim de confirmar ou nรฃo a existรชncia do conteรบdo proibitivo. Realizada a apreciaรงรฃo da obra, ao constatar a presenรงa de conteรบdos imprรณprios, cortes eram realizados. Porรฉm, se a obra fosse considerada totalmente inadequada, esta sofria veto integral, a fim de impedir sua veiculaรงรฃo.โ€

Posteriormente, a censura no Brasil, especialmente a censura nas telenovelas, obteve um endurecimento a partir da promulgaรงรฃo do Ato Institucional nยฐ 5 (AI-5).

Decretado em fins de 1968, foi o mais repressivo de todos os Atos, resultando em um perรญodo de amplas restriรงรตes aos direitos polรญticos e liberdades individuais. Ainda assim, parte da populaรงรฃo apoiava tais medidas, considerando-as indispensรกveis para conter ameaรงas de ‘subversรฃo’ e assegurar a seguranรงa nacional.

Vale destacar que a censura nรฃo foi um fenรดmeno exclusivo do Brasil durante o perรญodo da Ditadura Militar. Em diversos paรญses da Amรฉrica Latina, como Chile e Argentina, regimes autoritรกrios adotaram prรกticas similares para controlar as produรงรตes artรญsticas e midiรกticas. Esses governos justificavam a censura como um mecanismo para combater ideologias subversivas e proteger a estabilidade interna, especialmente no contexto da Guerra Fria.

Texto: Censura nas telenovelas durante a ditadura militar no Brasil
Artistas protestam contra a Ditadura Militar. Imagem: GetArchive.

A censura prรฉvia

As produรงรตes da TV e do rรกdio precisavam, assim como outras criaรงรตes, passar pelo olhar atento dos censores. Cada roteiro ou script de programas de rรกdio e tv necessitavam desta anรกlise. Era a chamada censura prรฉvia e foi oficialmente decretada em 1970, afetando diretamente a produรงรฃo cultural, especialmente a censura nas telenovelas e outras obras televisivas.

A partir do advento da censura prรฉvia, especialmente no caso da censura nas telenovelas, os roteiros e atรฉ mesmo videotapes eram apresentados para a anรกlise do Serviรงo de Censura de Diversรตes Pรบblicas antes de serem levados ao ar. Este รณrgรฃo emitia um relatรณrio indicando o que nรฃo poderia ser exibido ao grande pรบblico, obrigando as emissoras a fazer os ajustes necessรกrios e evitando contratempos.

Como a censura agia nas produรงรตes das telenovelas?

Para que uma novela fosse levada ao ar durante o regime da ditadura militar, era necessรกrio seguir alguns procedimentos:

  1. Anรกlise da sinopse: o autor de novela, primeiramente, escrevia uma sinopse, ou seja, um resumo do que a histรณria queria contar, bem como os perfis dos personagens. Muitas vezes, jรก na sinopse ร s tesoura dos censores agiam, por vezes descartando uma histรณria inteira;
  2. Primeiros capรญtulos: sendo aprovada a sinopse, o autor da telenovela precisaria entรฃo enviar os roteiros e as gravaรงรตes de pelo menos os dez primeiros capรญtulos. Esse momento era crucial para os censores perceberem o tom da telenovela e se havia algum tema que julgavam โ€œimoralโ€ para que a emissora jรก fizesse os ajustes necessรกrios;
  3. Certificado de liberaรงรฃo: passando pelos dois estรกgios iniciais, a obra ganharia um certificado da SCDP e, sรณ assim, seria exibida. Esse certificado deveria ser apresentado, diariamente, antes da abertura do programa, contendo, entre outras informaรงรตes, o horรกrio de exibiรงรฃo e a classificaรงรฃo indicativa;
  4. Roteiros e gravaรงรตes submetidos ร  censura durante toda a obra: mesmo a telenovela tendo sido aprovada em todos os estรกgios acima mencionados, ainda assim os roteiros da novela e as gravaรงรตes dos capรญtulos deveriam ser enviados para os censura durante todo o tempo em que a novela estivesse sendo exibida.

Casos de censura nas telenovelas brasileiras

Foram inรบmeras as telenovelas que sofreram censura em sua forma de contar a histรณria. Seja cortes em cenas especรญficas ou falas, ou ainda mais em novelas inteiras, as obras teledramaturgicas sentiram o impacto de serem produzidas sob um regime ditatorial. Conheรงa abaixo alguns exemplos de novelas censuradas:

Selva de Pedra (1972)

Janete Clair, autora dessa telenovela, ja era uma figura bastante conhecida do rรกdio e, aos poucos, comeรงou a fazer parte do mundo da produรงรฃo televisiva.

A trama contava a histรณria de um jovem do interior que, ao se mudar para o Rio de Janeiro com sua esposa Simone (Regina Duarte), se deixa seduzir pelo poder e por Fernanda (Dina Sfat), acionista de sua empresa. Ao descobrir os planos do marido, Simone finge sua morte e foge para o exterior, criando o principal conflito da trama.

A novela enfrentou restriรงรตes porque a censura considerou que o enredo sugeria bigamia, o que contrariava os padrรตes morais defendidos pelo regime. Como resultado, a autora precisou reescrever 22 capรญtulos em um รบnico fim de semana.

Apesar das mudanรงas, a novela manteve seu impacto, terminando com Cristiano e Simone juntos, enquanto Fernanda รฉ internada em uma clรญnica.

O Bem Amado (1973)

A novela escrita por Dias Gomes passou por โ€œmaus bocadosโ€ durante sua exibiรงรฃo. Com uma temรกtica forte acerca do impacto do coronelismo no Brasil, a trama trazia crรญticas ร  polรญtica e abordava temas como saรบde pรบblica em tom atรฉ mesmo irรดnico.

Porรฉm nรฃo era sรณ isso: diante dos usos constantes de termos como โ€œcoronelโ€ quando as personagens se referiam ao protagonista da histรณria, o prefeito Odorico Paraguaรงu (Paulo Gracindo) e โ€œcapitรฃoโ€, caso da personagem de Zeca Diabo (Lima Duarte), um matador profissional, fizeram com que a censura proibisse o uso desses conceitos.

Esses termos utilizados por Dias Gomes em sua novela atingiam diretamente os militares, principalmente por serem usados em personagens tidos como โ€œnegativosโ€ da novela. Deste modo, de acordo com o pesquisador Nilson Xavier, os diretores tiveram que apagar o รกudio de dezenas de citaรงรตes ao coronel em 15 capรญtulos jรก gravados.

Roque Santeiro (1975)

Esse รฉ um dos casos mais emblemรกticos da censura na teledramaturgia durante a ditadura militar: a novela escrita por Dias Gomes foi censurada por completo poucas horas antes de entrar no ar.

A trama jรก tinha cerca de 10 capรญtulos prontos para serem exibidos e mais algumas dezenas de capรญtulos gravados quando, na noite da estreia, a TV Globo recebia o comunicado que nรฃo poderia exibir a obra.

Na visรฃo da censura, a novela continha โ€œofensa ร  moral, ร  ordem pรบblica e aos bons costumes, bem como achincalhe ร  Igreja”. Em tempos de ditadura, temas relacionados ร  religiosidade ou mesmo ofensas ร  moral seriam vรญtimas das tesouras dos censores.

Naquela ocasiรฃo, o Jornal Nacional, sob a apresentaรงรฃo de Cid Moreira, leu um editorial explicando ao pรบblico a proibiรงรฃo da exibiรงรฃo, alรฉm de mostrar um posicionamento contrรกrio da emissora quanto ร quela censura, ainda que de forma velada:

โ€œDesde janeiro que a novela Roque Santeiro vem sendo feita, seria a primeira novela colorida do horรกrio das oito da noite. Todos os cortes determinados pela censura foram feitos. Depois de examinar detidamente os capรญtulos gravados, o Departamento de Censura decidiu: a novela estava liberada, mas sรณ para depois das dez da noite. Assim mesmo, com novos cortes e cortes que desfiguravam completamente a novela. Assim a Rede Globo, que atรฉ o รบltimo momento tentou vencer todas as dificuldades, vรช-se forรงada a cancelar a novela Roque Santeiro.

Texto: Censura nas telenovelas durante a ditadura militar no Brasil
Cid Moreira em montagem com emblema de ‘Roque Santeiro’ (1975). Imagem: TV Globo.

Despedida de Casado (1977)

Essa foi mais uma novela censurada por completa, ou seja, nem chegou a ser exibida pela TV. Poucos dias antes de estrear, a trama que estava sendo escrita por Walter George Durst nรฃo pรดde ser exibida, a comeรงar pelo prรณprio tรญtulo, que, mesmo sendo aprovado inicialmente pelos censores, poderia atentar aos bons costumes.

Assim como o caso de Roque Santeiro dois anos antes, “Despedida de Casado” jรก tinha cerca de 30 capรญtulos gravados, mas, por trazer em seu enredo um tema ainda tabu, que era a separaรงรฃo de casais, o governo militar considerou que a exibiรงรฃo da novela ia contra os princรญpios morais e polรญticos defendidos ร  รฉpoca.

Walter George Durst, na ocasiรฃo, demonstrou-se descontente com o corte na รญntegra de sua obra e apresentou algumas declaraรงรตes contrรกrias ร  aรงรฃo, conforme Nilson Xavier disponibilizou em seu site, o Teledramaturgia:

โ€œ[…] Despedida de Casado nรฃo era contra o casamento. Eu quis mostrar a crise em que caem os casais depois daquela fase Romeu e Julieta, mas sobretudo eu mostrava que essas crises podem ser superadas. As soluรงรตes para isso, eu as busquei em grande parte nos casos do psiquiatra Paulo Gaudรชncio, que inclusive foi colocado como personagem da novela (Dr. Lalo, interpretado por Clรกudio Marzo)โ€.

Escrava Isaura (1976)

Um clรกssico livro de Bernardo Guimarรฃes foi adaptado para a TV pelas mรฃos de Gilberto Braga. Porรฉm, a grande questรฃo com a censura foi o uso sistemรกtico da palavra “escravo” pelas personagens da novela.

Para que a trama pudesse continuar sendo exibida, Braga precisou substituir o termo “escravos” por “peรงas” e, assim, evitar maiores problemas com a censura.

Para eles, o perรญodo de escravizaรงรฃo foi algo negativo para o paรญs e, por isso, atรฉ mesmo deveria ser tirado das pรกginas dos livros didรกticos, que dirรก ser tratado em uma telenovela no horรกrio das 18h, isso de acordo com as prรณprias palavras de Gilberto Braga.

O impacto da censura nas artes em geral

Alรฉm das telenovelas, outros gรชneros artรญsticos tambรฉm enfrentaram desafios semelhantes. O cinema, por exemplo, viu o surgimento de movimentos como o ‘Cinema Novo’, que usava alegorias e simbolismos para criticar as injustiรงas sociais.

O Cinema Novo surgiu no contexto da ditadura militar como resposta ao cinema tradicional. Com o lema โ€œuma cรขmera na mรฃo e uma ideia na cabeรงaโ€, os cineastas usavam desta arte para criticar a ordem vigente, o industrialismo cultural e que ela dialogasse com o Brasil da รฉpoca.

Um grande exemplo รฉ Glauber Rocha, com seus filmes “Deus e o Diabo na Terra do Sol” e “Terra em Transe”. O regime mantinha um rรญgido monitoramento sobre produรงรตes artรญsticas e culturais.

No teatro a censura tambรฉm buscou agir, peรงas de autores como Augusto Boal precisaram driblar a censura com estratรฉgias semelhantes ร s das novelas, utilizando-se de humor e metรกforas para abordar questรตes polรญticas e sociais e assim ter seus textos aprovados.

Mas afinal, o que os censores queriam evitar?

Durante a ditadura militar, os censores tinham como prioridade vetar conteรบdos que questionassem o regime ou abordassem questรตes sociais sensรญveis, conforme vimos alguns exemplos acima.

Crรญticas ร  corrupรงรฃo, abuso de poder e repressรฃo eram frequentemente cortadas, assim como referรชncias a desigualdade social e lutas de classe. Novelas que apresentassem personagens marginalizados ou realidades urbanas complexas enfrentavam dificuldades para serem exibidas.

Temas relacionados ร  moralidade tambรฉm eram alvo constante da censura. Assuntos como sexualidade, adultรฉrio e emancipaรงรฃo feminina eram considerados “perigosos” para os valores tradicionais.

Produรงรตes como “Verรฃo Vermelho” (1969), escrita tambรฉm por Dias Gomes precisaram adaptar cenas que sugeriam liberdade sexual, enquanto diรกlogos sobre divรณrcio ou direitos das mulheres frequentemente sofriam cortes. Esse controle impunha limites ao que poderia ser retratado na TV.

Atรฉ mesmo crenรงas religiosas ou culturais eram analisadas com rigor. Representaรงรตes que nรฃo refletissem os ideais da Igreja Catรณlica ou que abordassem prรกticas espirituais alternativas eram vistas como ameaรงas ร  moralidade.

Alรฉm disso, personagens que exibissem comportamentos ou linguagens fora do padrรฃo esperado enfrentavam revisรฃo. A censura, assim, buscava moldar as telenovelas para reforรงar os valores estabelecidos pelo regime.

Criatividade sob vigilรขncia: o impacto da censura nos roteiros

Como vimos, a censura durante o regime militar levou autores de novelas a adaptar suas histรณrias para atender ร s exigรชncias da รฉpoca. Tramas inteiras, como ‘Roque Santeiro’ e ‘Despedida de Casado’, precisaram ser reformuladas, e diรกlogos considerados ‘inadequados’ foram ajustados antes da gravaรงรฃo.

Apesar das restriรงรตes, os autores desenvolveram maneiras de abordar temas polรชmicos de forma indireta, usando metรกforas e subtextos para manter uma conexรฃo com o pรบblico.

O que observava รฉ que essas mudanรงas muitas vezes desfiguravam as intenรงรตes originais dos autores, dificultando a abordagem de temas sociais ou polรญticos de maneira explรญcita, o que obrigava a “recalcular a rota” da histรณria.

Curiosamente, a censura nas telenovelas tambรฉm levou a uma evoluรงรฃo nas tรฉcnicas narrativas, forรงando autores a encontrar formas mais criativas de abordar temas polรชmicos. Metรกforas, ironias e diรกlogos aparentemente inofensivos passaram a carregar mensagens ocultas, tornando as novelas mais sofisticadas em sua comunicaรงรฃo com o pรบblico.

Essa necessidade de se adaptar ร s limitaรงรตes acabou moldando a teledramaturgia brasileira, que desenvolveu uma linguagem prรณpria para abordar questรตes sociais de maneira indireta, sem perder as caracterรญsticas do gรชnero.

Apesar disso, os autores demonstraram grande criatividade ao driblar os censores. Para abordar temas polรชmicos, usavam metรกforas e subtextos, alรฉm de muita ironia, criando histรณrias que sugeriam crรญticas ao regime de forma indireta. Personagens caricatos ou situaรงรตes aparentemente inofensivas se tornavam veรญculos para comentรกrios sociais sutis, permitindo que as novelas mantivessem relevรขncia e conexรฃo com o pรบblico, mesmo sob vigilรขncia.

Tudo isso moldou teledramaturgia brasileira, influenciando o estilo narrativo das novelas. Esse perรญodo evidenciou o papel das novelas como resistรชncia cultural e como espaรงo de diรกlogo velado em tempos de repressรฃo, assim como outros setores artรญsticos como o cinema, teatro, mรบsica.

Consideraรงรตes finais

Regimes autoritรกrios frequentemente utilizam a censura como ferramenta para controlar informaรงรตes e promover uma ideologia oficial, alegando, em muitos casos, a necessidade de proteger a ordem e a estabilidade polรญtica.

Com as telenovelas nรฃo foi diferente: observou-se que, com a audiรชncia que as mesmas sempre tiveram no nosso paรญs, era preciso monitorar de perto o que o pรบblico veria na tela da TV e, deste modo, evitar possรญveis influรชncias ou ideias contrรกrias ร  ditadura militar.

Essas histรณrias, mesmo sob vigilรขncia rigorosa, evidenciam como a censura nas telenovelas marcou a produรงรฃo artรญstica da รฉpoca e como a arte conseguiu encontrar formas criativas de driblar as limitaรงรตes, embora nem sempre as intenรงรตes originais fossem plenamente preservadas.

A teledramaturgia brasileira daquele perรญodo nรฃo sรณ entreteve, mas tambรฉm se afirmou como um espaรงo de diรกlogo silencioso e resiliente. Esse legado reforรงa a importรขncia da cultura como um pilar essencial para a construรงรฃo de uma sociedade mais consciente e conectada.

Vocรช jรก conhecia essas histรณrias sobre a censura nas telenovelas brasileiras? Lembra de alguma novela ou personagem que tenha enfrentado restriรงรตes na รฉpoca? Compartilhe sua opiniรฃo ou conte outras histรณrias que vocรช conhece nos comentรกrios!

Referรชncias

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1 comentรกrio em “Censura nas telenovelas durante a ditadura militar no Brasil”

  1. ร‰ importante respeitar os valores sociais sem abrir mรฃo da liberdade artรญstica, afinal, muitas novelas trazem crรญticas e debates essenciais para a sociedade. Eu nรฃo conhecia essas histรณrias sobre a censura nas telenovelas brasileiras e achei interessante entender como isso aconteceu ao longo do tempo. E pensar que quase revivemos a ditaduraโ€ฆ Ufa!

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Conteรบdo escrito por:

William de Miranda Paixรฃo

Professor de Histรณria e, no momento, coordenador pedagรณgico de uma escola pรบblica na cidade de Indaiatuba/SP. Admirador das artes e teledramaturgia, apaixonado por Histรณria Cultural. Atuo tambรฉm como formador de professores na รกrea de Histรณria
Paixรฃo, William. Censura nas telenovelas durante a ditadura militar no Brasil. Politize!, 24 de marรงo, 2025
Disponรญvel em: https://www.politize.com.br/censura-nas-telenovelas/.
Acesso em: 20 de abr, 2025.

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