Cotas de gênero e Fundo Eleitoral: Uma retrospectiva histórica

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Quantidade de mulheres em cargos políticos permanece menor em relação à de mulheres
na sociedade
Imagem: Senado Federal

Este é um texto produzido pelo Eixo de Produção Textual Politize! Mulheres, um projeto feito por e para mulheres, que produz conteúdo com temáticas relevantes para o universo feminino.

Historicamente repelidas da vida política, as mulheres conquistaram o direito ao voto apenas em 1932, bem mais tardiamente do que os homens e, ainda hoje, encontram dificuldades para participar das tomadas de decisões dos grandes poderes e da criação de políticas públicas do país. 

De acordo com a Enciclopédia jurídica da PUC-SP, verifica-se que, por meio da incapacidade civil, o direito brasileiro, criado em uma sociedade dominada por homens brancos, oprimiu e impôs inferioridade jurídica às mulheres, silvícolas ou qualquer outro membro da sociedade que não fosse homem, branco e com poses. Nessa época, o Estado não olhava para esses outros como cidadãos, conferindo reconhecimento de cidadania e proteção jurídica apenas àqueles homens.

E, ainda, pelo quadro podemos ver a porcentagem de votantes na primeira república no Brasil:

PARTICIPAÇÃO ELEITORAL NO BRASIL – 1872 – 1945

AnoVotantes% da população total
18721.097.69810,8
18861117.0220,8
1894290.8832,2
1906294.4011,4
1922833.2702,9
19301.890.5245,6
19456.200.80513,4

A quantidade de mulheres em cargos políticos permanece significativamente menor em relação à de mulheres na sociedade. Isso porque, de acordo com a Agência Senado, por meio de dados do IBGE, mais da metade da população brasileira (51,13%) é feminina, e elas representam, segundo o Tribunal Superior Eleitoral, 53% do eleitorado. No entanto, ocupam hoje menos de 15% dos cargos eletivos.

Veja mais: Combate à violência política de gênero: denúncia e apoio à vítima

O vislumbre da correção para o problema: a criação de leis

De acordo com a retrospectiva realizada pela Câmara dos Deputados, a fim de diminuir esse estado de sub-representatividade, o Brasil vêm adotando, desde os anos 90, uma série de normas eleitorais que visa aumentar a quantidade de mulheres candidatas e eleitas, principalmente em eleições proporcionais, ou seja, para as casas legislativas (Câmara Municipal, Assembleia Estadual e Congresso Nacional).

A primeira lei de ação afirmativa para as mulheres, em eleições proporcionais, de acordo com o Planalto, foi a Lei 9.100/95, que previa que, no mínimo, 20% da lista de candidatos de cada partido ou coligação deveria ser preenchida por candidatas mulheres e valia apenas para as Câmaras Municipais. 

Dois anos depois, segundo o Planalto, em 1997, foi instituída a Lei 9.504/97 ou Lei das Eleições, aumentando o percentual mínimo de candidaturas para 30%, transformando essa reserva de vagas em legislação permanente e expandindo o escopo das ações afirmativas, que passaram a valer também para as Assembleias Estaduais e para a Câmara dos Deputados.

A despeito do avanço, a Lei das Eleições de 1997, definiu, segundo a Agência Senado, que a porcentagem de reserva de vagas deveria incidir sobre a lista potencial e não sobre a quantidade final de candidatos. Dessa forma, os partidos aproveitaram a brecha da legislação que determinava apenas a reserva, mas não o preenchimento, e não completavam as vagas, deixando-as no todo ou em parte vazias. Buscando corrigir essa falha, doze anos depois, de acordo com o Planalto, a Lei 12.034/09 deu novo texto à política, tornando obrigatório o preenchimento do percentual mínimo de 30% para candidaturas femininas, o que resultou em um aumento expressivo do número de candidatas mulheres.

Assista também ao nosso vídeo sobre representatividade feminina na política

O início do sucesso a partir das legislações

Tal regulamentação de 2009, foi capaz de estimular consideravelmente o número de candidaturas femininas, no entanto, o número de mulheres eleitas para as Casas Legislativas não aumentou na mesma proporção. Além da dificuldade em se candidatar, as mulheres também enfrentam desafios, no que diz respeito ao apoio interno nos partidos. 

Em outras palavras, a quantidade de recursos e verbas destinadas às campanhas femininas eram muito pequenas, diminuindo substancialmente as chances de sucesso e eleição das pretendentes aos cargos legislativos. Ademais, houve lacunas para a criação de candidaturas fraudulentas, isto é, aquelas para apenas preencher os requisitos legais, sem integrarem de fato a corrida eleitoral.

Assim, de acordo com o Supremo Tribunal Federal, a Lei 13.165/15, produto final da Reforma Política de 2015, previa que os partidos, obrigatoriamente, empenhassem recursos nas campanhas de mulheres. Embora destinada a incentivar o repasse de recursos, a redação da Lei ficou muito aquém do esperado, destinando um mínimo de 5% dos recursos de campanha e um limite, que não poderia ultrapassar 15% de todos os recursos do Fundo Partidário destinados a esta finalidade. Na prática, portanto, acabou por instituir uma desigualdade formal entre homens e mulheres na política: o mínimo de 30% das mulheres teria acesso, pelo Fundo Partidário, a, no máximo, 15% dos recursos.

Essa lei foi, então, alvo da Ação de Inconstitucionalidade (ADI) 5617. Só em 2018, o Supremo Tribunal Federal (STF) finalizou o julgamento da ADI e definiu ser inconstitucional esse dispositivo da minirreforma eleitoral. A maioria dos ministros inferiu que se deve equiparar o patamar legal mínimo de candidaturas femininas ao mínimo de recursos de fundo partidário a serem destinados, que deve ser interpretado como de 30% do montante do fundo alocado em cada partido para eleições majoritárias e proporcionais. E, em caso de haver percentual mais elevado ao mínimo de candidaturas femininas, os recursos devem ser alocados, pelo menos, na mesma proporção.

Importantes conquistas também foram registradas em 2021 e 2022. A Emenda Constitucional 111, promulgada em setembro de 2021, determina a contagem em dobro dos votos dados a mulheres e pessoas negras no cálculo da distribuição dos recursos dos fundos partidário e eleitoral nas eleições. Já em abril de 2022, outra emenda constitucional foi promulgada pelo Congresso, a Emenda Constitucional 117, de acordo com dados do Planalto. Esta incluiu na Constituição a aplicação de percentuais mínimos (30%) de recursos do fundo partidário nas campanhas de mulheres e em tempo de propaganda gratuita no rádio e na televisão, segundo o Jornal El País. 

Veja também: Cotas de gênero em eleições proporcionais: como funcionam

Como melhorar esse cenário?

Apesar de todas as iniciativas, o Brasil ainda está longe de alcançar a igualdade política de gênero. A estagnação persiste, em grande parte, devido a desigualdades estruturais subsistentes, a escassez de estímulo e apoio ao engajamento político das mulheres e à aplicação inadequada da legislação existente.

Assim, é necessário criar medidas para possibilitar o monitoramento e a punição mais contundentes do descumprimento de cotas para mulheres e de incidências de violência política, adotar regras para garantir a colocação favorável de candidatas femininas em listas partidárias, aprovar legislação para promover a liderança feminina em órgãos partidários e reservar cadeiras para representantes mulheres nas Assembleias Legislativas, Câmara dos Deputados e Câmaras Municipais. 

Vitória! Houve aumento da candidatura feminina nas eleições de 2022…

De acordo com dados do Senado, o número de candidaturas femininas cresceu para 18% na Câmara dos Deputados, visto que 91 das 513 vagas no parlamento foram ocupadas por mulheres eleitas. 

É a primeira vez que haverá a ocupação de vagas do Congresso Nacional, por mulheres transgêneros e indígenas!  

São as deputadas:

  • Erika Hilton, do partido PSOL/SP, com aproximadamente 256 mil votos;
  • Duda Salabert, pelo PDT/MG, com cerca de 208 mil votos;
  • Sônia Guajajara, do PSOL/SP, obteve, em média, 156 mil votos;
  • Célia Xakriabá, pelo PSOL/MG, com 101 mil votos;
  • Silvia Waiãpi, do PL/AP, com mais de 5 mil votos.

Segundo as informações da Câmara dos Deputados:

“O PL e a federação PT, PCdoB e PV são os partidos com mais mulheres e as duas maiores bancadas da Câmara dos Deputados.” – Câmara dos Deputados

E em oito estados as mulheres foram eleitas com a maioria dos votos, sendo elas:

  • Bia Kicis, do PL/DF;
  • Caroline de Toni, pelo PL/SC;
  • Natália Bonavides, partido PT/RN;
  • Yandra de André, do União/SE;
  • Silvye Alves, pelo União/GO;
  • Dra. Alessandra Haber, partido MDB/PA;
  • Socorro Neri, do PP/AC;
  • Detinha, partido PL/MA.

Esses dados demonstram que as mulheres estão ocupando mais os espaços de decisão e sendo bem votadas. Contudo, ainda assim, o Brasil é um país, em que a participação da mulher no Parlamento é inferior à média do mundo de 26,4%, pela UIP – União Interparlamentar, composta por 193 países, dados do Congresso em foco. 

Deste modo, AVANÇAREMOS! No sentido de aumentar, de forma mais efetiva, a representação feminina na política brasileira, ocupando os espaços de poder e, consequentemente, será possível contribuir na construção de uma democracia mais sólida e representativa. 

Referências:

Agência Senado – Mulheres na política: ações buscam garantir maior participação feminina no poder
Câmara dos Deputados – Bancada Feminista aumenta 18,2% e tem duas representantes trans
Câmara dos Deputados – Voto feminino foi conquistado depois de uma luta de 100 anos
CNN Brasil – Representação Feminina na Câmara dos Deputados cresce 18%
Congresso em foco – Brasil é apenas o 152º em ranking mundial de participação feminina na política
El País – Na semana da reforma política, Câmara deixa quase tudo como está
Enciclopédia jurídica da PUC-SP – Direito e Política
Planalto – Emenda Constitucional Nº 111, de 28 de Setembro de 2021
Planalto – Emenda Constitucional Nº117, de 5 de Abril de 2022
Planalto – Lei Nº 12.034, de 29 de Setembro de 2009
Planalto – Lei Nº 9.100, de 29 de Setembro de 1995
Planalto – Lei Nº 9.504, de 30 de Setembro de 1997
Senado – Candidaturas Femininas Crescem, mas representação ainda é baixa 
Supremo Tribunal Federal – Ação Direta de Inconstitucionalidade 5.617 Distrito Federal

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Conteúdo escrito por:
Coordenadora do Eixo de Produção Textual do Projeto Politize! Mulheres. Embaixadora politize! Ouro Preto, em Ouro Preto/MG. Membra do projeto Politize! Mulheres. Graduada em Engenharia Civil, pela Universidade Federal de Ouro Preto. Participou de projetos de cunho social como: Rotaract, DCE e WeLab by Heineken.

Cotas de gênero e Fundo Eleitoral: Uma retrospectiva histórica

30 abr. 2024

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