O que são as escolas cívico-militares?

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Você já ouviu falar nas escolas cívico-militares?

Pois bem, o tema que constantemente sai e volta aos holofotes da mídia, tem gerado uma série de disputas no terreno da educação brasileira.

Dado os agitos, consequentemente, muitas dúvidas ficam pelo caminho: o programa foi cancelado? Quando foi criado? As escolas cívico-militares vão substituir os colégios militares?

Vem com a gente que a Politize! te explica tudo.

O que são escolas cívico-militares?

As escolas cívico militares são resultado de um decreto do poder executivo de 2019, Decreto Nº 10004 de 5 de setembro de 2019, que buscou implementar o Programa Nacional das Escolas Cívico-Militares (PECIM).

Àquela época, sob o governo de Jair Bolsonaro, o programa foi criado com o objetivo de alocar militares aposentados como funcionários auxiliares no dia a dia escolar.

De acordo com o texto do decreto, o programa foi criado com o objetivo primordial de melhorar a qualidade da educação básica no ensino fundamental e no ensino médio.

Veja algumas características das normas militares que costumam configurar a atuação da polícia militar.

Alunos em escola cívico-militar. Texto: O que são as escolas cívico-militares?
Escola cívico-militar em MG. Imagem: SEE-MG.

Em verdade, o projeto pretendia alinhar medidas de cunho militarizante conjunto ao cronograma regular de escolas públicas, seguindo, primordialmente, a LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação) e a BNCC (Base Nacional Comum Curricular), como já de praxe.

Dessa maneira, as escolas que optaram por adotar o modelo, contam com o auxílio de militares reformados, da polícia, forças armadas ou bombeiros, atuando como tutores e auxiliares administrativos.

Assim, os militares ajudam na disciplina e no estabelecimento de normas e dinâmicas no ambiente escolar, como:

  • Organizar a entrada e saída das salas de aula;
  • Regular os horários de intervalo;
  • Fiscalizar a padronização das vestimentas e aparências;
  • Prezar pelo cumprimento da hierarquia estabelecida;
  • Entre outras medidas já conhecidas das instituições militares.

De acordo com a SEDUC-SP, este é o principal ponto a ser considerado no panorama do projeto:

“O programa tem como objetivo dar mais protagonismo ao professor como gestor de classe e do seu tempo em sala de aula. O programa traz o militar como um suporte que auxilia os professores e alunos promovendo uma organização mais efetiva e harmônica entre os alunos difundindo valores humanos e cívicos que impactam diretamente no processo ensino-aprendizagem.” (SEDUC-SP, 2024).

É importante lembrar que o projeto assegura a autonomia dos estados da federação, sendo ele implementado apenas se os governos estaduais quiserem.

Além disso, o PECIM foi pensado como um complemento para as redes estaduais e municipais de ensino, não alterando os programas pedagógicos das escolas.

A contribuição dos militares ficaria apenas na parte administrativa, enquanto a parte docente e pedagógica segue nas mãos de professores e profissionais específicos das áreas.

Caso queira saber como funciona a organização dos órgãos educacionais, a Politize! tem esse texto bem completo.

É daí que surge o nome, inclusive, pois a escola teria atuação tanto da parte civil como da militar.

Dessa forma, o programa não substitui as escolas militares das forças armadas ou da polícia militar, que seguem seus próprios regimentos e são chefiadas pelas próprias instituições, e nem pretende substituí-las.

Contudo, em julho de 2023, o governo – dessa vez sob o mandato de Lula (PT) – revogou o decreto que havia criado o PECIM, encerrando, portanto, a continuidade do programa.

Embora tenha sido revogado, escolas que tenham adotado o programa nos anos de sua vigência foram permitidas de continuar a sua instituição regularmente.

Na verdade, a tentativa do governo Lula de findar o programa veio de uma demanda de sua base governista de desmilitarizar diversos setores que antes haviam sido chefiados por militares.

Mais à frente, vamos entender o contexto político que formulou e acabou com o PECIM.

Contexto político

Jair Bolsonaro (PL), ao longo de seu mandato, manteve proximidade discursiva com a pauta educacional, comumente mantendo um tom crítico para as instituições educacionais, sobretudo as universidades federais, as quais renderam episódios marcantes de protestos e conflitos com o então presidente.

Bolsonaro e seus ministros. Texto: O que são as escolas cívico-militares?
Bolsonaro e seus ministros. Imagem: Marcello Casal Jr, Agência Brasil

A gestão educacional em seu governo passou por momentos conturbados, como a redução no orçamento destinado ao MEC, a constante troca de chefia do ministério, as reformulações no ENEM e os inúmeros desafios impostos pela pandemia de COVID-19 (Valente & Pereira, 2023).

Contudo, uma de suas principais pautas governistas, o militarismo, ganhou margem dentro da gestão do MEC. A criação do PECIM se destacou como um de seus principais feitos.

O programa foi fruto de uma parceria do MEC com o Ministério da Defesa, concentrando em sua criação um grande número de militares – esses que compunham majoritária parte da equipe do governo à época.

Caso queira saber mais sobre a dinâmica dos ministérios na época do governo Bolsonaro, temos um texto prontinho te esperando.

A adesão ao programa foi lenta e gradual, dados do MEC registraram cerca de 213 escolas cadastradas em 2023, ano em que o programa foi descontinuado.

O cancelamento se deu mediante contestações do legislativo e de membros internos da gestão vigente do MEC, alegando, principalmente, a ineficácia do programa em melhorar os indicadores de ensino.

Deputados da base aliada de Lula articularam o decreto que deu fim ao PECIM, demandando mais qualidade aos profissionais regulares das escolas, tanto o corpo docente como funcionários administrativos.

Além disso, o programa acumulou denúncias ao longo de sua implementação, sobretudo de abusos e uso inadequado de violência por parte dos militares tutores, conforme apurado pela seguinte reportagem do UOL.

É importante destacar que alguns estados, apesar da descontinuidade do programa, continuaram com a implementação, sendo os principais exemplos os governadores Tarcísio de Freitas, de São Paulo, e Romeu Zema, de Minas Gerais.

Zema e Tarcísio foram entusiastas do programa. Além da proximidade política com Bolsonaro, ambos defenderam a criação de escolas cívico-militares como um ponto de avanço para a melhoria da qualidade do ensino em seus respectivos estados.

Tarcísio, por exemplo, segue com a implementação das escolas no ano de 2025. Se aproveitando da brecha concedida pelo governo federal de continuidade do programa aos estados que já haviam iniciado a implementação, a Assembleia Legislativa de São Paulo votou a favor do seguimento do programa. Para o ano de 2025, são previstas mais 45 unidades, segundo informes do governo.

O programa seguirá basicamente o que já havia sido instituído, com a secretaria de educação ficando responsável pelo currículo, formação dos professores e adequação dos prédios. Ressalta-se, ainda, que os militares em atividade nas escolas deverão estar desarmados.

Em Minas Gerais, apesar de o governador Zema ter sinalizado para a continuidade do projeto, em agosto de 2025 o TSE de Minas vetou o prosseguimento do programa para novas escolas.

Impactos

Como se pode observar, os conflitos em torno do tema é grande, uma vez que diz respeito não apenas as questões da educação, mas, principalmente, aos aspectos ideológicos que conformam o entendimento em torno da militarização do ensino.

Existem críticas e argumentos favoráveis em meio ao debate sobre a adesão do programa. Contudo, é importante destacar a preocupação manifestada de diversos representantes da classe docente e administrativa das escolas.

Uma das principais críticas dirigidas ao programa é a substituição do papel de autoridade e legitimidade dos professores.

Tais críticas também se dirigem ao cerceamento de liberdades individuais e aos aspectos ideológicos contidos por trás da inserção de atividades caracteristicamente militares no cotidiano da escola, como a padronização das vestimentas e dos cortes de cabelo, por exemplo.

Além disso, alega-se que poderia haver perseguição a professores e estudantes que se posicionassem criticamente contra às instituições militares.

Em discussão na audiência realizada pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais em 2025, deputados relembram que a própria LDB já tem instituída funções e deveres aos professores como mediadores disciplinares do espaço escolar, não cabendo colocar militares, sem experiência educacional prévia, no cotidiano da escola.

O que, por sequência, na visão de Ximenes et al (2019), poderia acarretar em uma quebra com princípios da Constituição, como a garantia da autonomia das gestões de cada escola.

Professores em sessão na Câmara Legislativa de São Paulo. Foto: UBES
Professores em sessão na Câmara Legislativa de São Paulo. Imagem: UBES

Outra crítica recorrente é a de que os estados não teriam orçamento suficiente para implementar a contratação dos novos funcionários escolares, retirando os investimentos de seus respectivos fins – como é o caso das instituições militares, como a polícia militar e o corpo de bombeiros – bem como realizar as adaptações necessárias nos prédios e efetuar a compra dos uniformes e roupas que os estudantes teriam de usar.

Por outro lado, um dos argumentos favoráveis ao programa é o de que a disciplina e a ordem instaurada pela presença dos militares colaboram com um ambiente mais pacífico e menos violento.

Em pesquisa publicada no International Journal of Educational Development, Araújo et al (2025), recolheram evidências de escolas cívico-militares em Goiânia que apresentaram aumento nos indicadores de qualidade após aderirem ao programa de militarização. Os números no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) não apenas melhoraram, como os indicadores de violência escolar diminuíram.

Tal evidência corrobora com outros números que comumente mostram que alunos de escolas militares (os Colégios Militares e os Colégios da Polícia Militar), possuem desempenho elevado em exames admissionais das universidades pelo Brasil afora, bem como em outros medidores de desempenho.

Embora seja importante lembrar que o PECIM não pretende transformar escolas estaduais nos colégios das Forças Armadas e da Polícia Militar, instituições essas que possuem um aporte financeiro muito mais robusto e consolidado do que tem as escolas estaduais dos governos.

Referências:

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Conteúdo escrito por:

Juliano Dias Guimarães

Mestrando em Sociologia na Universidade de São Paulo. Bacharel e Licenciado em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Bacharel em Ciências Humanas, também, pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Interessado pelas sociologias da cultura e das artes. Educador em constante formação!
Guimarães, Juliano. O que são as escolas cívico-militares?. Politize!, 6 de outubro, 2025
Disponível em: https://www.politize.com.br/escolas-civico-militares/.
Acesso em: 7 de out, 2025.

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