A imagem é uma colagem que mostra a marquise do congresso brasileiro com manifestantes.

Por que junho de 2013 marcou o Brasil?

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A imagem apresenta a Avenida Paulista lotada de manifestantes. Eles seguram placas e faixas. Uma delas, tem escrita a seguinte frase " Juntos mudando o Brasil".
Protestos de junho de 2013 se iniciam na Avenida Paulista. Imagem: Wikimedia Commons

As manifestações sucessivas que ocorreram em junho de 2013 marcaram a história política brasileira e foram as maiores do período pós-redemocratização. Iniciadas com protestos contra o aumento de R$0,20 em passagens de ônibus, trens e metrôs de São Paulo, as reivindicações logo foram crescendo e novas bandeiras e atores apareceram. 

Em pouco tempo, grande parte das capitais estaduais se tornaram palco para protestos. As pautas eram muitas, entre elas os gastos excessivos com a Copa de 2014, as condições de saúde, educação e transportes públicos, a PEC 37, a falta de representatividade política e a corrupção. 

O cenário foi múltiplo, com muitas questões sendo levantadas, surgimento de novas lideranças e o papel das redes sociais na articulação e organização dos movimentos. Essa convergência de elementos tornou junho de 2013 uma parte complexa da história brasileira, além de influenciar diretamente os caminhos políticos da nação nos anos seguintes.

Para saber mais sobre o que foi e o que aconteceu nesse período, é só acompanhar este texto que a Politize! preparou.

Brasil pré-junho de 2013 

O fenômeno vivido em junho 2013 é motivo de curiosidade mesmo muitos anos depois. Isso porque as manifestações que tomaram as principais cidades do país não davam indícios de que iriam ocorrer, pelo menos, não na proporção que foram observadas. 

Os anos anteriores foram marcados por crescimento econômico e políticas de geração de emprego e renda. No ano de 2013, o Brasil atingiu a menor taxa de desemprego, com 4,3%, segundo dados do IBGE. Esse número foi o mais baixo alcançado desde o início dos registros em 2002.

O Produto Interno Bruto também avançava com uma taxa de 2,3% naquele ano. O Brasil era a terceira economia que mais crescia, de acordo com o IBGE. Além disso, o país garantia a 7° posição como maior economia do mundo. 

Na política, os principais nomes do período não enfrentavam crises de governo, tendo até avaliações positivas. Dilma Rousseff (PT), então no seu primeiro mandato, tinha aprovação de 63% dos brasileiros, de acordo com a Pesquisa da Confederação Nacional da Indústria. 

Geraldo Alckmin, na época do PSDB, governador de São Paulo, tinha cerca de 52% de aprovação e preferência pela reeleição. Na capital, onde os protestos começaram, o mandato de Fernando Haddad (PT) teve aprovação de 34%.

Insatisfações da população

Para especialistas, como a socióloga Maria da Glória Gohn e o cientista político Rubens Figueiredo, o panorama da época, com crescimento econômico e aparente estabilidade política, não consegue explicar as ações que se sucederam naquele mês de junho. O estopim, o aumento das passagens, também não é uma justificativa única. O fenômeno observado acabou sendo maior que seu início e tem causas mais profundas e complexas.

O MPL, Movimento Passe Livre, que deu origem às manifestações, surgiu em Florianópolis como uma campanha pelo passe livre e em 2005, na Plenária Nacional pelo Passe Livre, foi batizado com esse nome. O movimento defendia a tarifa zero nos transportes públicos e se definia como horizontal, autônomo e apartidário. Ele conseguiu ter um alcance muito grande, chegando em várias cidades brasileiras e era formado principalmente por jovens.

Leia também: o que são movimentos sociais?

Apesar de ter se iniciado com o MPL e com reivindicações relacionadas ao transporte, outros fatores apareceram. A insatisfação política, descontentamento, indignação generalizada e a crise de representatividade eram apontados pelos manifestantes. Os políticos, partidos e práticas estabelecidas eram questionados e bandeiras partidárias não eram aceitas nos protestos. Estes fatos denotam características das reivindicações: crise na democracia representativa e, também, na legitimação das instituições.

Veja também nosso vídeo sobre as manifestações de junho de 2013!

Havia uma anseio por uma mudança no funcionamento do governo, de modo que o Estado funcionasse mais efetivamente para a população. Entretanto, a reforma política não foi algo desejado, pelo menos a princípio. O MPL, por exemplo, rejeitou essa ideia porque ela seria idealizada pelos políticos que eles estavam contestando.  

Outro elemento que marcou o período foi a ausência de uma liderança centralizada e organização dos movimentos. E não apenas isso, havia uma certa rejeição por lideranças verticalizadas e centralizadas, o que aponta para outra característica vista nas ruas: conjunto e manifestação de várias ideologias. 

“O movimento acontece “em se fazendo” e não via grandes planos de organizações com coordenações verticalizadas. Há processos de subjetivação na construção dos sujeitos em ação. Cada um leva seu cartaz em cartolina; uma nova mensagem pode gerar uma decisão tomada no calor da hora, em cima da demanda-foco”, explica Maria Glória Gohn.

“O gigante acordou”: primeira fase das manifestações de 2013

Como foi dito, o estopim para as manifestações foi o aumento para R$3,20 nas passagens de transporte público da cidade de São Paulo. O governador do estado, Geraldo Alckmin, e o prefeito, Fernando Haddad anunciaram o acréscimo de R$0,20 em 17 de maio e que ele começaria a valer 1° de junho. 

Entretanto, isso não foi exclusivo da cidade, outras capitais brasileiras também tiveram aumentos anunciados nos valores cobrados nos transportes públicos. Entre dezembro e maio daquele ano, Aracajú, Curitiba, Fortaleza, Goiânia, João Pessoa, Manaus, Natal, Recife, Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, Cuiabá e Vitória anunciaram os reajustes, que, também, estavam na faixa dos R$0,20. 

Esse encarecimento desagradou movimentos sociais ligados à gratuidade do transporte público, como o já citado, Movimento Passe Livre ou MPL. E foi essa organização que encabeçou as primeiras manifestações. A mobilidade urbana, focada na cidade de São Paulo, se tornaria a primeira das reivindicações da onda de manifestações que se seguiram em junho de 2013.

A primeira fase das manifestações durou cerca de 1 semana e começou no dia 6 de junho. Nesse dia, a Avenida Paulista recebeu cerca de 2 mil pessoas, convocadas pelas redes sociais pelo MPL. Quatro dias depois, no dia 10 de junho, e por meio das mesmas estratégias, o segundo protesto transcorreu na zona oeste de São Paulo. O número de participantes cresceu e nesse dia, cerca de 5 mil pessoas apareceram.

A partir do 3° dia de protestos, 11 de junho, os enfrentamentos com a polícia e as cenas de violência e vandalismo começaram a se acentuar e se espalhar pelas mídias, tanto tradicionais, como alternativas. No último dia desta primeira fase, ocorrido em 13 de junho, 20 mil pessoas, de acordo com a organização, caminharam do centro da cidade até a rua da Consolação com o objetivo de chegar na Avenida Paulista, mas foram impedidas pela força policial.

O encontro da massa de manifestantes com a Polícia Militar foi violento. Muitas pessoas saíram feridas, incluindo jornalistas e pessoas que passavam pelo local.

Vale ressaltar que a escalada de tensão ocorreu tanto entre os lados da polícia como dos manifestantes. Os Black Blocs, que ficaram muito famosos na época e identificados com roupas pretas e máscaras, representavam uma forma para preservar e proteger o movimento e os manifestantes. Eles são definidos como uma tática e foram inspirados em protestos de países como Canadá, Europa e Estados Unidos, que ocorreram no início do século. 

A dinâmica funcionava mais ou menos da seguinte forma: havia uma linha de frente entre os manifestantes e a polícia, além de um grupo que ficava na parte de trás. Esses dois grupos acabavam entrando em enfrentamentos com a polícia e reagindo a gás lacrimogêneo, balas de borracha e forças de dispersão. Além disso, atos de vandalismo como quebra de vidro de agências bancárias e pichação de prédios e monumentos também eram ações praticadas.

“Queremos hospitais padrão Fifa”: segunda fase das manifestações

A segunda fase de manifestações começou no dia 17 de junho e levou para as ruas ainda mais demandas. Nessa fase, os protestos se expandiram para outras cidades e juntaram ainda mais pessoas do que São Paulo. 

Os protestos não começaram a se espalhar pelas capitais brasileiras à toa. Em 16 de junho iniciava-se a Copa das Confederações, com jogos em diversas cidades, e foram esses locais os novos palcos para a 2° onda de manifestações. 

Entre as pautas levantadas nessa fase estão os gastos excessivos com a Copa do Mundo de 2014, a qualidade de hospitais, escolas e transporte público, a PEC 37, que vetava o poder de investigação independente do Ministério Público, voto distrital e repúdio aos partidos políticos.

Veja também nosso vídeo sobre Copas do Mundo e política brasileira!

Protestos chegam a Brasília

O dia em que Brasília foi alcançada pela onda de manifestações também foi o ápice das manifestações daquele junho. Em 17 de junho, milhares de manifestantes saíram do Museu da República em direção ao Congresso Nacional, eles foram às ruas em apoio aos protestos ocorridos em São Paulo e contra os gastos em eventos esportivos. 

O dia ficou marcado pela ocupação da marquise do Congresso Nacional, onde ficam a Câmara dos Deputados e o Senado, após alguns participantes furarem o cordão de isolamento da Polícia Militar.

As palavras de ordem dos jovens no protesto indicavam certo descontentamento com a classe política. Entre os gritos entoados estavam:  “Fora Feliciano”, “Não, não me representa”, “Esse Congresso é a vergonha do Brasil”. 

Leia mais: invasão ao Congresso

Protestos atingem o ápice

Além de Brasília, os protestos em cidades como Rio de Janeiro, Fortaleza, Salvador e Belo Horizonte, que receberam jogos da Copa, começaram a receber visibilidade. De 18 a 20 de junho, milhares de jovens e integrantes de movimentos sociais foram às ruas. 

No Rio, os protestos se estenderam para a baixada fluminense, região metropolitana do estado. Em Fortaleza, 10 mil manifestantes foram às ruas antes e depois do jogo entre Brasil e México. 

Em 20 de junho, a maior manifestação do movimento ocorreu. De forma simultânea, em 130 cidades brasileiras, cerca de 1,5 milhão de pessoas, segundo os levantamentos da polícia e da mídia, foram às ruas.

“Vem pra rua”: a terceira fase das manifestações

Nessa fase, que durou até o fim do mês, as manifestações, que antes agregavam várias pautas e ideologias, começaram a ter suas inclinações diferenciadas. Isso significa que protestos com objetivos e pautas específicas apareceram. A redução de pedágios, a PEC 37 e o Programa Mais Médico foram algumas dessas mobilizações. 

Em São Paulo, por exemplo, 30 mil pessoas saíram às ruas, em 22 de junho, em uma pauta contra o Projeto de Emenda Constitucional 37, que propunha a limitação do poder investigatório do Ministério Público. Os protestos contra os gastos com a Copa não cessaram. No mesmo dia, cerca de 70 mil pessoas levantaram essa bandeira em meio ao jogo entre México e Japão.

As manifestações foram cessando, mas suas consequências ainda ecoam na política brasileira. Além disso, esses protestos tiveram consequências imediatas. 

Veja também nosso infográfico sobre Junho de 2013!

Você pode conferir o infográfico na íntegra na nossa pasta no Pinterest!

O saldo das manifestações de junho de 2013

Algumas das reivindicações levantadas foram atendidas. Em 19 de junho, o município e o governo de São Paulo voltaram atrás nos aumentos das passagens de transporte público. Posteriormente, essa revogação alcançou outras cidades, como o Rio de Janeiro.

A reforma política também entrou em pauta. Em 24 de junho, a então presidente, Dilma Rousseff, propôs uma Constituinte para essa temática, que, de acordo com o projeto, seria submetida a plebiscito popular. 

A PEC 37, que erradicava o poder de investigação do Ministério Público, também foi derrubada. Em 25 daquele mês, a Câmara dos Deputados rejeitou a proposta de emenda.

Junho de 2013 trouxe respostas às exigências populares. Entretanto, algumas dessas ações foram desfeitas ou não prosseguiram durante os anos subsequentes. A Constituinte, por exemplo, foi descartada e nenhuma outra proposta nesse sentido surgiu posteriormente. Além disso, com relação ao preço das passagens, elas subiram em outros momentos. Em 2014, elas foram de R$3,00 para R$3,50 e em 2020 chegaram ao valor de R$4,40.

Contexto internacional 

O cenário internacional não pode ser esquecido quando se fala das manifestações que ocorreram no Brasil. Desde o início de 2010, vários protestos populares aconteciam pelo mundo, tanto em países democráticos como em governos autoritários. 

Os denominadores comuns eram a participação de jovens, ocupação de vias públicas e marchas. Nos Estados Unidos, a insatisfação com as desigualdades sociais e a queda da renda e o desemprego levaram ao movimento conhecido como Occupy Wall Street

No Oriente Médio, as manifestações que causaram a Primavera Árabe, tomaram países como Egito, Líbia, Tunísia, Iêmen, Síria e Marrocos e reivindicavam mais liberdade e modelos de governo mais democráticos.

Saiba mais: o que foi a Primavera Árabe?

A crise econômica e o modelo econômico motivaram a tomada de praças em várias cidades espanholas. Organizados pelas redes sociais, a série de manifestações ficou conhecida como Movimento dos Indignados

Redes sociais e cobertura midiática em junho de 2013

Um elemento primordial nos protestos de junho de 2013 era a utilização das redes sociais e das mídias. Elas serviram tanto para organizar manifestações, quanto para fazer a cobertura do que estava acontecendo. 

A popularização das redes sociais, em especial o Facebook, proporcionou uma possibilidade maior de interação, articulação e participação política. Nesse momento, as redes começaram a constituir um importante instrumento para realização e desenvolvimento de ativismo. 

Além disso, foi possível o surgimento de mídias alternativas. Se antes, apenas grandes jornais e emissoras, como a Rede Globo e o Estadão, teriam o poder total sobre a narrativa dos acontecimentos, isso mudou. Naquele momento, novos agentes começaram a aparecer cobrindo e transmitindo ao vivo os protestos. Fazendo isso, eles se tornavam, também, novas fontes de informação. 

A Mídia Ninja, por exemplo, surgiu e ganhou visibilidade no contexto das manifestações, fazendo cobertura dos protestos e trazendo abordagens que a mídia tradicional não alcançava. 

Legado das manifestações

Após junho de 2013, a avaliação de “ótimo e bom” da presidente Dilma Rousseff tinha caído para 30%, antes era 57%. Mas esta não é a única consequência daquele mês. O ano de 2013 é considerado um dos mais importantes para a política brasileira e a sequência de acontecimentos que  sucederam o mês de junho o fazem ser chamado de “o mês que não acabou”. 

Junho de 2013 foi um marco para uma nova era política. Após ele, vieram a operação Lava Jato, o impeachment de Dilma Rousseff(PT) e a eleição de Jair Bolsonaro (PL). A cientista política Deysi Cioccari aponta que esse “foi um movimento que certamente alterou a forma política brasileira e deu origem a novos líderes políticos”. Novas demandas surgiram nos protestos, o que acabou por dar fundamento para novos segmentos políticos.  

Saiba mais: o que é bolsonarismo?

O Movimento Brasil Livre (MBL) e o Vem Pra Rua, por exemplo, surgiram após esse período e exerceram grande influência na política nacional. Sérgio Praça, também cientista político, defende que essas “organizações [foram] importantes para o movimento conservador brasileiro”. O conservadorismo aflorou no país nos últimos anos e foi protagonista nas eleições de 2018. 

Além disso, Cioccari destaca o papel das redes sociais. Para ela, certas pautas estavam no ideário da população, mas só encontravam repercussão nas redes sociais. As mídias sociais, então, começaram a ser um espaço para a amplificação de vozes.

E aí, conseguiu entender sobre as manifestações de junho de 2013? Deixe sua opinião nos comentários!

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Conteúdo escrito por:
Cearense, estudante de Jornalismo na UFC e alumni da AIESEC. Amo esportes e trabalhos voluntários.

Por que junho de 2013 marcou o Brasil?

30 abr. 2024

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