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Por que os casos de violência escolar têm aumentado?

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professora negra a frente da sala diante de uma turma de crianças
Imagem: Nova Escola

Em março de 2023, um ataque a facadas a uma professora da rede estadual paulista terminou em morte e deixou quatro pessoas feridas. Essa notícia levantou o debate sobre a violência escolar nas salas de aula do país.

Diversas pesquisas indicam alta incidência de casos de agressão no ambiente escolar, sobretudo no Brasil. O caso despertou a necessidade da criação de políticas públicas voltadas ao combate da violência nas escolas. 

Neste texto, a Politize! te explica o que é violência escolar, quais são os tipos e traz alguns dados que mostram como o Brasil se comporta em comparação ao contexto mundial.

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Entenda o conceito de violência escolar

Antes de compreender o significado de violência escolar, vamos entender o conceito de violência.

A violência corresponde ao uso intencional da força ou poder em forma de ameaça, podendo ser contra si mesmo ou outra pessoa, grupo ou comunidade. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), os resultados de uma ameaça violenta podem ocasionar lesão, morte, dano psíquico, alterações do desenvolvimento ou privações.

A escola é o espaço de formação intelectual e cidadã e espera-se que este seja um lugar munido de proteção e segurança. Entretanto, o atual cenário brasileiro evidencia outra realidade. 

A violência está presente no ambiente escolar, manifestando-se de diversas formas. Essa violência é reflexo da vida social, sendo, muitas vezes, uma reprodução de violências do mundo social, baseadas em preconceitos contra minorias sociais.

Portanto, violência escolar corresponde ao uso da força e/ou agressividade dentro do contexto/ambiente escolar e pode se manifestar entre todos os atores sociais da comunidade escolar: estudantes, professores, coordenadores, responsáveis e demais funcionários.

As consequências destas ações têm efeitos em todos os envolvidos: tanto nas vítimas quanto nos autores. Os resultados vistos são: depressão, suicídios, distúrbios comportamentais, prejuízo às atividades em sala de aula e abandono escolar.

Veja também nosso vídeo sobre a atuação do MEC!

Tipos de violência escolar

A violência pode manifestar-se de diversas formas, desde a psicológica até a física ou a verbal. Dentro deste cenário, pode variar quem é agressor e quem é a vítima. Ou seja, qualquer membro da comunidade escolar pode se tornar vítima da violência.

Existem diversos tipos de violência que podem ocorrer dentro desse espaço, por isso, listamos alguns dos cenários possíveis de acontecer:

  • Violência de professor (agressor) para aluno (vítima): esse é um dos casos em que professores fazem uso de sua autoridade para executarem atos violentos contra alunos. Exemplo disso foi que, ao longo do século XX, esse tipo de violência era muito comum, quando castigo físico era utilizado quando um aluno se comportava mal ou não fazia o que foi pedido pelo professor;
  • Violência de aluno (agressor) para professor (vítima): nesse caso, pode ocorrer atos de violência física, psicológica e verbal, como proferir insultos e ataques dentro e fora da sala de aula, ameaças de morte e outros;
  • Exclusão de algum aluno de modo proposital: a exclusão é um tipo de violência psicológica e ocorre quando um grupo de alunos decide excluir um aluno das tarefas da turma, agindo como se essa pessoa não existisse, ao passo que ela se isola;
  • Violência sexual: este ato ocorre quando nota-se a presença de condutas sexuais indevidas no contexto escolar e ocorre de um aluno para outro aluno, de professor para aluno, de professor para professor, entre outros;
  • Bullying: são agressões intencionais, perseguições, apelidos depreciativos e/ou humilhação em público. Com este tipo de violência, o agressor consegue o controle físico e psicológico sobre a vítima. Atualmente, o bullying é considerado um dos tipos mais comuns de violência escolar e uma das causas de suicídio entre os jovens;
  • Violência entre professores: são ofensas e maus-tratos feitos de um professor ao outro, o que também inclui assédio, violência sexual, coerção, por exemplo;
  • Violência de pais e professores: consiste em toda ameaça e danos físicos causados pelos responsáveis dos estudantes aos professores, podendo ocorrer ou não em horário de aula.

Leia mais: Cyberbullying: o que é

Dados recentes sobre a violência escolar

Anualmente, os casos de violência escolar têm crescido na realidade brasileira.

No ano de 2022, entre janeiro e agosto, foram registrados mais de 100 boletins de ocorrência por lesão corporal e ameaça em escolas no Tocantins, tendo professores como 80% das vítimas.

A organização Nova Escola, associação sem fins lucrativos voltada para educação, entrou em contato com 5.300 professores de todo o território nacional e registrou que 80% disseram já ter sido vítimas de algum tipo de agressão, sendo a maioria violência verbal, seguido de violência psicológica e ao menos 7% dos profissionais já teriam sido agredidos fisicamente.

A violência ocorre não só contra educadores, mas também entre os próprios alunos. Uma das professoras entrevistadas pela Folha de São Paulo conta que, ao tocar o sinal para o intervalo, ela segue para o pátio junto aos alunos, o que não precisava ser feito antes da pandemia de Covid-19, quando podia seguir para a sala dos professores, como de costume. Porém, desde janeiro de 2022, os docentes deixaram de ter seus 15 minutos de descanso, pois precisam estar com os estudantes a fim de evitar brigas.

Este não é um caso isolado, segundo a Secretaria da Educação de São Paulo, após a volta das aulas presenciais, somente nos dois primeiros meses de 2022 foram registrados 4.021 casos de agressões físicas nas unidades estaduais. Números alarmantes, pois são 48,5% a mais do que o mesmo período de 2019, último ano de aulas presenciais antes da pandemia de Covid-19.

De acordo com dados do Placon (Plataforma Conviva), sistema em que são registradas as ocorrências escolares, em média são 108 ocorrências de agressão física a cada dia letivo nas quase 5.000 escolas de São Paulo.

Além das agressões físicas, também houve crescimento de 52% de ocorrências de ameaça e 77% de casos de bullying nas escolas estaduais de São Paulo em relação a 2019.

Segundo o levantamento global da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), divulgado ainda em 2019, o Brasil está entre os índices mais altos do mundo no ranking de agressões contra professores. Foram entrevistados 250 mil professores e líderes escolares de 48 países ou regiões. De acordo com os estudos, concluíram que:

  • No Brasil, há o ambiente mais propício ao bullying;
  • 28% dos diretores escolares brasileiros testemunharam situações de intimidação ou bullying entre alunos. Este é o dobro da média da OCDE;
  • Semanalmente, 10% das escolas brasileiras registram episódios de intimidação ou abuso verbal contra educadores, ao passo que a média internacional é de 3%;
  • Em 2017, 12,05% dos professores disseram ter sido vítimas de agressões verbais ou de intimidação de alunos pelo menos uma vez por semana. A média global é de 3,4%.

Veja mais: 14 causas do abandono escolar no Brasil

Ainda, os tipos de violência mais comum executadas contra professores são:

  • Agressão verbal: 48%;
  • Assédio moral: 20%;
  • Bullying 16%;
  • Discriminação: 15%;
  • Furto/roubo: 8%;
  • Agressão física: 5%;
  • Roubo ou assalto à mão armada: 2%.

Ao passo que os tipos mais comuns de violência contra estudantes são: 

  • Bullying: 22%;
  • Agressão verbal: 17%;
  • Agressão física: 7%
  • Discriminação: 6%
  • Furto/roubo:4%;
  • Assédio moral: 4%
  • Roubo ou assalto à mão armada: 2%.

Afinal, quais são as causas dessa violência?

As análises de questões que envolvem a violência escolar geralmente são feitas sob a ótica social e/ou psicológica. Entretanto, não é possível definir uma única causa para esta questão: o problema da violência é profundo e complexo.

Há um conjunto de motivos que podem explicar a violência nas escolas, as causas são variadas e dependem do contexto que as instituições estão inseridas.

Especialistas acreditam que o aumento do número de casos de violência nas escolas é reflexo da pandemia. Isso porque durante o ensino remoto, período em que as escolas estavam fechadas, parte das crianças e adolescentes teriam desaprendido a ouvir e controlar emoções, por exemplo.

“A violência é um destes fenômenos que vêm se agravando a partir da pandemia. Agora que as aulas voltaram de forma presencial essa violência acaba eclodindo aqui. Esse adolescente demonstra essa violência que talvez já estava inserido, já se manifestava em outros contextos, acaba emergindo aqui”, comentou o psicólogo Lázaro Júnior em entrevista ao G1.

A alta incidência dos casos de violência em ambiente escolar é o que tem chamado a atenção de especialistas. Ao lembrar de casos de bullying e brigas, o professor Dácar aponta que:

“Infelizmente, pela falta de estrutura, a escola, em vez de ajudar a reduzir os impactos que essa violência teria sobre os adolescentes, acabam potencializando, exatamente porque não é um ambiente adequado”, aponta o professor em depoimento dado ao jornal da USP.

Ações violentas são desencadeadas por motivos diversos, por isso, deve-se levar em consideração a própria realidade vivenciada pelos indivíduos, como o convívio doméstico, familiar e social.

Além dos efeitos pós-pandemia, constata-se que a crescente da violência é resultado da ausência de educação contra formas de intolerância, sobretudo, contra minorias. Dessa forma, violências encontradas na vida social são reproduzidas dentro do ambiente escolar, como o racismo e a LGBTfobia. Segundo Castro Alves, em entrevista ao Correio Braziliense, os currículos escolares deveriam incluir matérias sobre direitos humanos, cidadania e cultura de paz, além disso, acredita que a saúde mental dos alunos não deve ser mais um tabu.

Na avaliação de Betina Barros, pesquisadora do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, ataques aos ambientes escolares não eram comuns no Brasil, porém, a frequência teria aumentado a partir de 2018. São diversos os fatores que tornaram a violência mais presente no cotidiano escolar, alguns que entram nessa lista são:

  • Isolamento social: os estudantes estariam vivendo os efeitos pós pandemia, resultado de meses convivendo fora das salas de aula e dependendo apenas da tecnologia para interações sociais; 
  • Exposição à violência: algumas crianças e adolescentes estiveram expostos a violência e maus-tratos nos espaços familiares;
  • Tecnologia: o acesso à internet sem mediação de um responsável teria tornado mais fácil o consumo de fóruns da internet, sobretudo na deep web, que disseminam ideias e conteúdos violentos;
  • Polarização: a partir desse período, 2018, passou-se a notar uma polarização entre a adoção ou não de medidas sanitárias durante a pandemia, além de uma polarização social e política no país, o que serviu de combustível para ideias extremistas entrarem em pauta.

Veja também nosso vídeo sobre o que é polarização!

Plano de combate à violência escolar do MEC

Após o caso do estudante de 13 anos que matou uma professora a facadas em São Paulo, o Ministério da Educação (MEC) propôs a criação de um grupo interministerial para tratar de ataques nas instituições de ensino.

De acordo com o atual ministro da educação, Camilo Santana, a proposta tem como objetivo elaborar um programa de combate à violência e terá a participação dos municípios e das unidades da Federação.

O espaço escolar é essencial para o desenvolvimento da criança e do adolescente, como afirma a pedagoga Tamires Alves ao jornal da USP. Por isso, a pedagoga reitera que é preciso pensar em estratégias para mudar esse quadro.

Para Telma Vinha, professora do Departamento de Psicologia Educacional da Unicamp, o problema é a falta de políticas públicas de enfrentamento ao aumento da violência nas escolas, pois, segundo ela, as ações adotadas após a volta das aulas presenciais focaram mais na recuperação de aprendizagens do que em problemas socioemocionais enfrentados pelos estudantes. Além disso, Vinha diz que os professores também precisam de formação e apoio socioemocional para lidar com esta situação.

O Secretário Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, Ariel de Castro Alves, acredita que casos de violência escolar devam ser tratados por uma rede de proteção social, a fim de adotar a medida mais adequada, formada por: educadores da escola, psicólogos, assistentes sociais, policiais, promotoria e vara da infância e juventude. O secretário diz, ainda, que dentre as medidas deveriam estar: orientação para responsáveis e programas de atendimento de saúde mental, por exemplo.

E aí, conseguiu entender o que é considerado violência escolar? Conta para a gente nos comentários!

Referências:

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4 comentários em “Por que os casos de violência escolar têm aumentado?”

  1. Antonio Claudio Druzian

    Parabéns pelo excelente artigo, Layane.
    Posso dizer que consegui obter uma visão panorâmica do fenômeno e me senti mais seguro para me aprofundar no tema.
    Continue o maravilhoso trabalho.
    Sucesso!

  2. Giovani F. de Almeida

    Tema bastante relevante, parabéns pela iniciativa. Acredito que a violência nas escolas está vinculada a falta de competência da sociedade para lidar com o assunto e maior tolerância entre as pessoas, ou seja, devemos aceitar as diferenças como um todo e perceber nossas próprias falhas como seres humanos. Nesse sentido, trazer a tona estes problemas falando sobre estas questões só contribui para um melhor convívio social. O assunto é super atual e nunca pode ser esquecido por todos. Parabéns a Politize!

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Conteúdo escrito por:
Faço parte da equipe de conteúdo da Politize!. Cientista social pela UFRRJ, pesquisadora na área de Pensamento Social Brasileiro, carioca e apaixonada pelo carnaval.

Por que os casos de violência escolar têm aumentado?

15 abr. 2024

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