Liberdade de expressão e Liberdade de imprensa: diferenças

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Foto: Narih Lee / WikiCommons

Algumas correntes filosóficas inspiradas em Hobbes consideram liberdade um valor negativo, já que ela não é necessariamente a presença de algo, de um direito, de uma verdade. A liberdade é a ausência de um valor: a impossibilidade de falar, de escrever, de se manifestar, de agir, de pensar. O adjetivo “livre” seria, portanto, um estado do ser humano e não uma condição permanente – as pessoas estão livres, e não são livres.

Valores que são muito caros à sociedade moderna, como a liberdade de expressão, surgiram apenas durante a Revolução Francesa. Apesar das vivências terríveis de cerceamento desse direito em ditaduras e momentos de autoritarismo, esses dilemas continuam existindo, com questões muito contemporâneas envolvidas.

Fora isso, de vez em quando os jornais brasileiros e internacionais, fora os jornalistas, clamam ter censurada a sua liberdade de imprensa. Corroborando, então, que a liberdade é um estado – mesmo após anos de tradição e de luta pela liberdade de imprensa, ela é interceptada por vezes e esse direito, interrompido.

Qual a diferença entre essas liberdades? Entenda melhor o assunto neste post do Politize!.

O QUE É LIBERDADE DE EXPRESSÃO?

A liberdade é um direito fundamental dos brasileiros, segundo a Constituição de 1988. No artigo 5º, que dispões sobre as garantias e deveres individuais e coletivos, são considerados invioláveis os direitos: “à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”.

Sugestão: Confira nosso post sobre Liberdade de expressão na Constituição brasileira

Quanto à liberdade de expressão, a Constituição garante a livre manifestação do pensamento e a livre expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença. É também um direito assegurado na Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, promulgada pela Organização das Nações Unidas.

Foto de protesto em São Paulo, a favor dos ciclistas e da inclusão das bicicletas na lógica do trânsito paulista.

A QUEM É ESTENDIDA A LIBERDADE DE EXPRESSÃO?

A todas as brasileiras, brasileiros e estrangeiros residentes no país. Em resumo, a todas as pessoas que estiverem em território nacional. Do banqueiro ao gari, do bancário ao professor, do ministro ao estudante. A liberdade de expressão é uma garantia fundamental ao exercício da cidadania, à participação social em ambientes como audiências públicas e conselhos municipais. Também se aplica a quaisquer ambientes sociais em que uma pessoa sinta vontade de se manifestar e ser respeitada independentemente do que for dito.

Liberdade de expressão e democracia

É a partir da reivindicação desse direito que surgiram as democracias modernas, em que não é permitida a censura a qualquer pessoa por parte do governo ou de qualquer entidade. Numa democracia, a ideia é que haja pluralidade de pensamento e, consequentemente, a manifestação de ideias, ideais e valores, levando a discussões e diálogos. Todas as vezes em que a liberdade de expressão começa a ser restringida, a diversidade de pensamento é afetada diretamente e, assim, começa a surgir o autoritarismo.

Liberdade de expressão no Brasil

No Brasil, o direito à liberdade de expressão era garantido desde a época do Império – apesar de, na prática, sua aplicação depender do chefe de Estado – e assim continuou até a Constituição de 1937, no governo de Getúlio Vargas. Mas, no momento em que houve o golpe do Estado Novo, o direito foi revogado. Só voltou a existir após a redemocratização, com a Constituição de 1946.

Durante a ditadura militar, apesar de na Constituição de 1967 ainda constar o direito à liberdade de expressão, ela era amplamente restringida. Nos anos mais duros da época, era coibida qualquer forma de manifestação de pensamento, credo e ideologia política. Esse direito só veio a ser reestabelecido e reintegrado com a Constituição Cidadã.

Foto: Bahia Notícias / WikiCommons

DECLARAÇÕES PRECONCEITUOSAS SÃO UMA MANEIRA DE SE EXPRESSAR?

Todos já devem ter ouvido aquele ditado que diz: “a sua liberdade termina onde começa a do outro” e apesar de essa não ser uma verdade universal, é ainda bastante coerente nas discussões sobre liberdades interpostas. Nos últimos anos, vários movimentos sociais de minorias – que na verdade são maiorias em quantidade – reivindicam igualdade e rechaçam o tratamento que recebem: racistas, machistas, misóginos, LGBTfóbicos.

Por conta disso, casos de ofensas e discriminação têm tido repercussão social, midiática e até na justiça. Seja por meio de xingamentos em redes sociais, de ofensas e brigas, de assédios morais. Aí dois direitos entram em conflito: o direito à liberdade de expressão, de quem realizou essas falas, e o direito à vida – à crença, à religião, a ir e vir –, de quem as sofreu.

O que poucos sabem é que, assim como qualquer outra, a liberdade de expressão tem limites: é proibido o anonimato pela Constituição, a fim de que ninguém deixe de lidar também com as consequências do que fala, por exemplo. Assim como são proibidas ofensas que firam a dignidade da pessoa, sua integridade e imagem. Existe uma lei que tipifica racismo como crime; logo, piadas, xingamentos ou quaisquer formas de opressão a pessoas negras podem e devem ser punidas.

As leis e a justiça ainda estão aprendendo a lidar com crimes dessa natureza, pois por muito tempo não foram denunciados; o mesmo acontece quando esses crimes acontecem em esfera online. Em muitos desses casos no Brasil, as pessoas não ganham seu processo na justiça contra os xingamentos e ofensas discriminatórias que receberam, de forma anônima ou não – como quando o ex-candidato à presidência, Levy Fidelix, foi absolvido por ofender pessoas homossexuais. Por outro lado, a Justiça ao redor do mundo tem agido de forma a proteger a dignidade das pessoas ofendidas – como o Parlamento Europeu, que impôs sanções ao parlamentar que fez falas misóginas em sessão plenária.

Nenhuma forma de preconceito e discriminação é uma maneira de expressão; além de crime, é uma violação ao direito alheio – à vida, à liberdade, à segurança, que são direitos fundamentais.

Leia também: direito de resposta

Foto: Maria Objetiva / WikiCommons

O QUE É LIBERDADE DE IMPRENSA?

A imprensa brasileira sofreu muito na mão do governo, historicamente. Por conta disso, foram assegurados vários direitos relativos à informação, à liberdade e ao jornalismo na Constituição de 1988:

  • Nenhuma lei ou dispositivo pode vetar de qualquer forma a plena liberdade da informação jornalística;
  • É vedada toda censura – seja de natureza política, ideológica, artística.
  • E é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo que tenha sofrido. Estão sujeitos à indenização por dano material, moral ou à imagem.
Foto: Cleones Novais / WikiCommons

A liberdade de imprensa é para veículos de comunicação o equivalente ao que a liberdade de expressão significa a uma artista. Não há como exercer os fundamentos do jornalismo e da comunicação em geral sem ampla e irrestrita liberdade em fazê-lo. O jornalismo deve atender à sociedade civil ao noticiar, informar, denunciar, escrever, detalhar tudo aquilo que é ou pode vir a ser de interesse público.

A liberdade de imprensa é importante para toda a sociedade, porque veículos de comunicação devem ser capazes de denunciar e dar informações sobre escândalos de empresas estatais em seus jornais, sem que o governo os censure; da mesma forma, falar sobre lobby e irregularidades promovidas por empresas privadas. Assim como devem ter soberania investigativa e trazer à tona questões invisíveis, outras perspectivas e ser o mais honestos possível nas suas publicações.

Portanto, tem também o dever profissional de ouvir o máximo de versões possíveis dos fatos, entrevistar o máximo de fontes necessárias – não apenas as “oficiais”, como o governo – e reportar seu lado com a honestidade inerente à atividade jornalística. Porém, só consegue fazê-lo se for livre.

Liberdade de imprensa x Liberdade de expressão

Por isso, não se deve confundir liberdade de expressão com liberdade de imprensa, pois ambas têm naturezas distintas. Enquanto a liberdade de imprensa nasce da reivindicação de profissionais do jornalismo, que têm pautas baseadas na sua experiência na área, a liberdade de expressão é pautada na possibilidade de qualquer cidadã e cidadão em se manifestar – seja com uma ideia, ideal, história, arte, trabalho, protesto.

Foto: Cleones Novais / WikiCommons

POR QUE A LIBERDADE DE IMPRENSA É IMPORTANTE?

Nenhuma democracia sobrevive sem uma imprensa livre e nenhuma ditadura sobrevive com uma imprensa livre.” – Jorge Pedro Sousa

A principal função do jornalismo é agir em prol da sociedade, tendo um compromisso único com o interesse público. Uma imprensa séria fornece as informações, os fatos, as verdades necessárias para que o público tire suas próprias conclusões e se “autogoverne” – expressão dos jornalistas e teóricos Bill Kovach e Tom Rosenstiel. A ideia de liberdade de imprensa deriva dos Estados Unidos da América, que valoriza muito a questão. Prova disso é que a primeira emenda da Constituição estadunidense proíbe qualquer censura e sanção tanto à liberdade de imprensa, como à de expressão.

Cabe à imprensa, livre, ser a voz dos “sem voz”, de denunciar irregularidades e injustiças. De buscar aquilo que nem sempre está às claras e, para isso, precisará investigar. Sem liberdade em contrariar interesses, seja de pessoas importantes, de empresas poderosas ou de governantes, o jornalista não conseguirá exercer essa parte da sua função profissional.

Foto: Romain Bréget / WikiCommons

Brasil: um país perigoso para ser jornalista

A imprensa é a vista da nação. Por ela é que a Nação acompanha o que lhe passa ao perto e ao longe, enxerga o que lhe malfazem, devassa o que lhe ocultam e tramam, colhe o que lhe sonegam, ou roubam, percebe onde lhe alvejam, ou nodoam, mede o que lhe cerceiam, ou destroem, vela pelo que lhe interessa, e se acautela do que a ameaça. (…) Um país de imprensa degenerada ou degenerescente é, portanto, um país cego e um país miasmado, um país de idéias falsas e sentimentos pervertidos, um país que, explorado na sua consciência, não poderá lutar com os vícios, que lhe exploram as instituições.” – Rui Barbosa

A liberdade de imprensa diz respeito, também, à segurança do jornalista em exercer a sua profissão. O jornalista tem o direito de sair às ruas sem medo de ameaças de sanções e até pior, de morte. De acordo com o Comitê de Proteção aos Jornalistas (CPJ), em 2014, o Brasil era o 11º país mais perigoso para se exercer a profissão. A organização Repórteres sem Fronteiras coloca o Brasil como o 104º país na Classificação Mundial de Liberdade de Imprensa (2016), de 180 países.

Em 2015, oito jornalistas foram mortos e outros 64 foram agredidos enquanto exerciam a profissão. O levantamento feito pelo CPJ — que chama 2015 de “um ano cruel” — revela um total de 116 registros de violações à liberdade de expressão, o que inclui também casos de ameaça e intimidação, entre outros.

Apesar de diferentes, a liberdade de expressão e de imprensa têm em comum a vontade em exercer a cidadania e em diversificar o discurso público. Ambas são igualmente poderosas e importantes, mas como se viu, nenhuma liberdade é um ganho permanente e sim, um estado. Devemos estar sempre atentos e não deixar nossa liberdade ser cerceada por quem quer que seja!

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Conteúdo escrito por:
Sou uma jornalista brasileira procurando ouvir ideias e histórias originais, peculiares e corajosas. Trabalhando como estrategista de marcas, desenvolvo narrativas que buscam emanar o que há de mais autêntico e verdadeiro nas pessoas, marcas e negócios, criando conexão através da emoção e identificação. Hoje, minha principal atuação é como estrategista de marcas na Molde, construindo marcas que redefinam realidades e gerem impacto. Como profissional autônoma atuo com a gestão de marca do estúdio de design de produto HOSTINS—BORGES, colaboro regularmente com a FutureTravel, uma publicação digital baseada em Barcelona, e preparo palestrantes no TEDxBlumenau como voluntária desde 2016.

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26 mar. 2024

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