Socioambientalismo: justiça social e conservação ambiental conectadas

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Conjuntos de experiências, somados aos debates ambientais e políticos mais críticos, revelaram em meados da década de 1980 que questões sociais e ambientais são, na verdade, complementares e não adversários. Essa aproximação entre os movimentos ambientalistas e os movimentos sociais deu origem ao socioambientalismo.

A Politize! explica nesse texto a importância desta visão integrada entre os movimentos que defendem justiça social e preservação ambiental. Os impactos dos movimentos socioambientalistas são indispensáveis, por exemplo, no combate à crise climática. Continue a leitura para entender o porquê!

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Imagem: Pixabay

O que é socioambientalismo

O termo “socioambiental” se refere a problemas e processos sociais, inclusive às responsabilidades dos seres humanos, e suas relações com o meio ambiente. A separação entre homem e natureza não é real, nem funcional. Essa distância entre humanidade e meio ambiente cria problemas para ambos.

Compreender, portanto, as questões socioambientais é, também, reconhecer que a sociedade integra a natureza e que a nossa qualidade de vida deve ser pensada incluindo uma diversidade de contextos que englobam outras realidades sociais, mas também os animais e os vegetais.

Rachel Carson, bióloga e ecologista, escreveu em 1962 o livro “Primavera Silenciosa” (Silent Spring) argumentando, sob a perspectiva socioambiental, sobre a não neutralidade de ações e do desenvolvimento de conceitos como “tecnologia“, “padrões de produção e de consumo” e “desenvolvimento econômico“.

Ambientalismos

Os movimentos ativistas de preservação do meio ambiente surgiram no Brasil na segunda metade do século XX. A Conferência de Estocolmo, realizada em 1972 pela Organização das Nações Unidas (ONU) é um marco histórico. Foi a primeira grande reunião de chefes de Estado para discutir a questão ambiental. Contudo, o campo político, de maneira geral ainda não levava a sério o movimento ambientalista. As ONGs brasileiras só começaram a surgir na década de 1980 e as primeiras correntes do ambientalismo se dividiram entre conservacionistas e preservacionistas.

Conservacionismo

Corrente ideológica que defende o uso controlado dos recursos, acreditando que a natureza pode ser explorada de forma equilibrada e sustentável. “Conservação”, nas leis brasileiras, significa proteger recursos naturais, usando-os racionalmente e garantindo sua existência para as futuras gerações.

Preservacionismo

Essa corrente propõe que certas áreas naturais ou espécies devem ser protegidas de todos os tipos de exploração humana, mantendo o ambiente intocado o máximo possível. Tende a compreender a proteção da natureza, independentemente dos interesses utilitários e do valor econômico que possui determinado recurso natural. A preservação é fundamental quando há risco de extinção – seja de uma espécie, de um ecossistema ou de um bioma.

Socioambientalismo

É uma vertente recente do ambientalismo que luta pela compatibilização entre as demandas dos movimentos sociais e o meio ambiente preservado. Surge como alternativa ao preservacionismo e ao conservacionismo – que se distanciam das lutas por justiça social e pela inclusão da sociedade na conservação da biodiversidade.

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Ativismo socioambiental

Conheça alguns ativistas socioambientais abaixo.

Chico Mendes e o movimento dos seringueiros

Chico Mendes, seringueiro e sindicalista, nasceu em Xapuri, no Acre, em 1944. Começou seu ofício como seringueiro seguindo os passos da família. Com o tempo, Chico percebeu que a sobrevivência dos seringueiros dependia da defesa da floresta contra os novos empreendimentos econômicos, que buscam obter lucro a partir da derrubada de árvores.

Chico Mendes. Imagem: Wikipédia

O Movimento dos Seringueiros e a trajetória de Chico Mendes se relacionam diretamente à defesa da Amazônia e à garantia de direitos dos povos que vivem na floresta. Esse movimento se fortaleceu durante intensa exploração dos recursos naturais na região amazônica entre 1970 e 1990 com o objetivo de executar projetos que envolviam desmatamento, construção de estradas e invasão de terras dos povos tradicionais.

Os trabalhadores que extraem o látex das seringueiras vivem há décadas em relação respeitosa com a floresta. Em seu trabalho as árvores não são derrubadas. A coleta do látex é uma atividade sustentável que precisa da floresta em pé.

Diante do avanço das fronteiras agrícolas e da pecuária na Amazônia, fortemente incentivada pela ditadura militar, os seringueiros passaram a perder suas terras em disputas contra grandes fazendeiros e madeireiras. Diante disso, os seringueiros começaram a se organizar em torno de uma estratégia de resistência conhecida como “empate”, método pacífico que consiste em reunir a comunidade e cercar com os próprios corpos as áreas ameaçadas de desmatamento.

A luta de Chico Mendes o tornou uma referência na conservação da natureza, inclusive internacionalmente. As ameaças de morte contra o ambientalista se intensificaram e, em 22 de dezembro, ele foi assassinado.

Vandana Shiva

Mulher sorrindo, com um adesivo na testa. Texto: Socioambientalismo: justiça social e conservação ambiental conectadas
Vandana Shiva. Fonte: Wikimedia Commons

Vandana Shiva, doutora em física e ecofeminista indiana, fundou diversas organizações para mobilizar, ao redor do mundo, agricultores na defesa de seus direitos. Suas contribuições também visam o fortalecimento do ecofeminismo e do ativismo ambiental. No fim do século XX ela impulsionou o movimento “Navdanya“, para lutar contra as tentativas de patentear as sementes e defender a biodiversidade.

Ailton Krenak

Nascido em Minas Gerais, ativista, ambientalista, escritor e líder indígena, Ailton Krenak participou da Assembleia Nacional Constituinte para a formulação da Constituição Brasileira de 1988. Pintando todo o rosto de jenipapo, vestido com um terno branco, discursou sobre o histórico de violências sofridas pela população indígena e os retrocessos de seus direitos.

No mesmo ano participou da fundação da União dos Povos Indígenas e, no ano seguinte, participou da Aliança dos Povos da Floresta: um dos marcos do socioambientalismo. O movimento que buscou o estabelecimento de reservas naturais na Amazônia possibilitando a subsistência econômica através da extração do látex e da coleta de outros produtos da floresta.

Ailton Krenak. Texto: Socioambientalismo: justiça social e conservação ambiental conectadas
Ailton Krenak. Imagem: Fotos Públicas. Créditos: Rafa Neddermeyer/Agência Brasil

Foi o primeiro indígena eleito para a Academia Brasileira de Letras. Enquanto ativista e escritor ressalta a interconexão íntima entre meio ambiente e tradições indígenas e destaca a urgência de defender e conservar a natureza. Esta bandeira de luta, assim como a de Chico Mendes, reflete a essência do socioambientalismo.

Saiba mais: Justiça ambiental: o que é isso?

Justiça social e conservação ambiental

O termo “socioambientalismo” assumiu maior clareza de significado a partir de análises sociológicas sobre as pautas ambientalistas e da observação dos conflitos gerados em comunidades visando a exploração de recursos, territórios e por políticas ambientais coerentes com as políticas sociais.

Os direitos socioambientais são conquistas firmadas no contexto neoconstitucionalista, por meio do reconhecimento de novos direitos, chamados direitos difusos e coletivos, que vão além do individual, englobando os interesses de toda a sociedade.

O socioambientalismo compreende que o ser humano e o meio ambiente mantêm uma relação de troca mútua, mas reconhece a maneira única como os povos e comunidades tradicionais enxergam e interagem com o meio ambiente em que vivem. Essa importância dos povos tradicionais para a preservação das florestas ficou comprovada, com dados, por meio de estudo realizado pelo Instituto Socioambiental.

O desenvolvimentismo está em crise devido às negligências com as questões ambientais, essenciais para a vida na Terra. Esse modelo prioriza o crescimento econômico, mas impõe sérias limitações aos direitos socioambientais, afastando-se cada vez mais da sustentabilidade.

Entenda: O que é o desenvolvimentismo?

O futuro é socioambiental?

Como os impactos do ativismo socioambiental podem auxiliar na crise climática?

O aumento da conscientização sobre a conexão entre o bem-estar social e a preservação ambiental destaca a necessidade de revisão de paradigmas e de formulação de políticas socioambientais eficientes. O ativismo socioambiental é capaz de transformar o futuro ao influenciar as políticas globais e promover educação, além de inovações para combater a crise climática.

Os movimentos socioambientais buscam aumentar, portanto, a conscientização pública sobre as mudanças climáticas, instruindo as pessoas sobre a necessidade de estilos de vida mais sustentáveis e do consumo responsável.

Para o enfrentamento de desigualdades sociais, raciais, étnicas, de gênero e geracionais durante a crise climática, Mariana Belmont, especialista em racismo ambiental, destaca a necessidade de criação e implementação de políticas de longo prazo para democratização do acesso à terra, além de políticas habitacionais, de urbanização e regularização fundiária destinadas às populações vulnerabilizadas.

Você sabia que, além de um campo de ativismo, o socioambientalismo tem se consolidado enquanto ciência autônoma e transdisciplinar? É possível cursar graduação (e pós-graduação) em Ciências Socioambientais, aprofundar seu conhecimento e construir um futuro socioambiental não só enquanto cidadão, mas também como cientista!

Diga nos comentários se você conhece outras figuras importantes para o socioambientalismo e quem são!

Referências:

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Conteúdo escrito por:
Feminista, ambientalista, poeta, ativista pelo veganismo popular, graduanda em ciências socioambientais pela UFMG, cozinheira amadora e advogada com especialização em políticas públicas para a redução da desigualdade. Gosto de conversar sobre economia política, comida, saúde e bem viver.
Rath, Carolina. Socioambientalismo: justiça social e conservação ambiental conectadas. Politize!, 15 de novembro, 2024
Disponível em: https://www.politize.com.br/socioambientalismo/.
Acesso em: 1 de dez, 2024.

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