Chapa eleitoral: características, formação e impacto político

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Entenda o papel da chapa eleitoral nas Eleições. Imagem: Freepik.
Entenda o papel da chapa eleitoral nas Eleições. Imagem: Freepik.

Em 8 de abril de 2022, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) formalizou a escolha do ex-governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSB), para compor a sua chapa eleitoral na disputa pela Presidência da República para as eleições de outubro do mesmo ano. Na outra ponta do espectro político, o atual Presidente, Jair Bolsonaro (PL), ainda mantém mistério acerca do seu companheiro nas eleições deste ano. 

Mesmo instituída há mais de um século, a “chapa” ainda é objeto de diversas dúvidas e questionamentos acerca de sua existência. Afinal, qual o seu papel? Para melhor entendermos o processo eleitoral, precisamos entender o que é uma chapa.

Leia também: Sistema eleitoral brasileiro: você sabe como são eleitos os políticos?

O que diz a legislação sobre a chapa eleitoral?

O conceito de chapa, à luz da legislação brasileira, é extremamente recente. De 1891, ano da primeira Constituição republicana, até 1965, quando foi instituído o atual Código Eleitoral, não existia nenhuma menção legal a esse instrumento. 

Isso significa que presidente e vice-presidente, por exemplo, concorriam em eleições separadas, sem vinculação necessária entre um e outro. Em alguns cargos, inclusive, nem existia a condição de um “vice” para a substituição em casos de vacância (vago). 

Porém, com o Código Eleitoral de 1965, criou-se a chapa para concorrer aos cargos do executivo, em todas as esferas federativas (presidente, governador e prefeito). O artigo 91, caput (“cabeça”, texto que vem logo após o número) afirma que:

Art. 91. O registro de candidatos a presidente e vice-presidente, governador e vice-governador, ou prefeito e vice-prefeito, far-se-á sempre em chapa única e indivisível, ainda que resulte a indicação de aliança de partidos.

Veja também nosso vídeo sobre a importância de um(a) vice-presidente!

Características da chapa eleitoral

A legislação brasileira deixa claro três características das chapas:

  1. A chapa é condição necessária para concorrer às eleições.

Sem a formação de uma chapa, não é possível registrar um candidato a presidente, governador ou prefeito para concorrer no pleito. Sendo assim, é preciso que a indicação de um candidato esteja sempre vinculada à de seu companheiro, sob pena de impugnação (invalidação). 

  1. A união dos candidatos deverá ser indivisível

Isto é, o eleitor não pode destinar um voto a um candidato de uma chapa e outro para de chapa distinta. O objetivo da legislação é justamente evitar confrontos entre candidatos eleitos, buscando sempre a harmonia dentro do executivo e da base governista. Além disso, a formação de chapas abre espaço para o pluralismo político e viabilização do governo eleito

  1. Não é necessário que a chapa se forme por membros de um único partido.

Outra regra que busca a pluralização da política. Aliás, chapas “mistas” são praticamente a regra no jogo político brasileiro. Aquelas formadas por candidatos de somente um partido, conhecidas como “puras”, estão usualmente presentes em partidos pequenos que não se aliaram com outros, ou quando um partido dominante se une com outros sem grande relevância. 

Outras regras

No mesmo artigo, mas no parágrafo 1.º (§1.º), é legislado também que: “o registro de candidatos a senador far-se-á com o do suplente partidário”.

O suplente dos senadores não implica em grandes poderes, e serve apenas como um substituto para caso o eleito tenha que se ausentar. Atualmente a “chapa” para o Senado contém dois suplentes, mas existem propostas legislativas para reduzi-la. 

Em outras legislações, como a Lei 9504/97, também podem ser encontradas regras e explicações acerca da formação de uma chapa eleitoral. No artigo 36, parágrafo 4.º (§4.º) dessa lei, há a regra de que o nome do candidato a vice, na propaganda eleitoral, deve estar sempre presente, em proporção visível e legível. 

Ou seja, não é possível “esconder” ou desconsiderar o nome do companheiro de chapa, até porque ambos estão concorrendo por apenas um voto. 

Dessa forma, é possível perceber os elementos jurídicos que justificam a construção de uma chapa, mas existem também fundamentos históricos e políticos. 

A história da chapa eleitoral

Como dito anteriormente, a chapa eleitoral é um fator recente nas eleições para cargos majoritários, tendo o Brasil realizado mais eleições democráticas para presidente sem a sua existência do que com ela. 

Diante disso, foram diversas as ocasiões na história em que os eleitos eram ideologicamente distantes um do outro, ou até mesmo inimigos políticos. 

Tal evento aconteceu de forma mais notória em 1891, na primeira eleição republicana, realizada de forma indireta. Nela, o Marechal Deodoro da Fonseca foi eleito presidente, mas Floriano Peixoto, contrário politicamente ao proclamador da República, ganhou para vice. 

Os desencontros entre os eleitos eram tão intensos que o mandato de Deodoro foi praticamente composto por crises políticas e desentendimentos com o Congresso, o que motivou um golpe fracassado e sua posterior renúncia. O governo de Floriano, seu vice, teve características muito distintas do de seu antecessor, mas também enfrentou instabilidades. 

Sete décadas depois, em 1960, o Brasil elegeu o conjunto “Jan-Jan”, composto por Jânio Quadros e João Goulart (Jango), para ocupar os cargos de presidente e vice-presidente, respectivamente.

Apesar da semelhança no nome, possuíam ferrenhas divergências entre si. Jânio Quadros, antigetulista, praticamente não se comunicava com Jango, que fora Ministro do Trabalho de Getúlio Vargas

Prova disso é que quando o curtíssimo governo de Quadros terminou, durando apenas 7 meses, seu vice estava na China. A renúncia de Jânio desencadeou uma crise na democracia brasileira, 3 anos antes do golpe militar. O governo de Goulart, de características notoriamente trabalhistas, divergiu, e muito, do de seu antecessor. 

De certa forma, as chapas vieram para amenizar as arestas políticas, mas nem sempre puderam evitá-las. 

As chapas eleitorais na Nova República

Nos três casos da Nova República em que o Vice-Presidente teve que assumir permanentemente, houve marcante divergência ao governo anterior, antecedidas de fortes crises políticas. 

O primeiro civil eleito pós-ditadura militar, Tancredo Neves, não pôde assumir em decorrência do seu afastamento médico e posterior falecimento. José Sarney, eleito em conjunto na chapa, teve de chefiar um governo montado por seu companheiro, mas que pouco havia tido contato com o maranhense. A Nova República, oriunda de um período antidemocrático, já nasceu com turbulências.

Veja mais: O que são atos antidemocráticos sob 4 pontos de análise 

Poucos anos depois, quando Fernando Collor sofreu impeachment pelo Congresso Nacional, o mineiro Itamar Franco assumiu a presidência. A mudança radical não ocorreu somente no estilo ou ideologia, mas também nas políticas econômicas. Com Itamar, o Plano Real livrou a economia brasileira da inflação, diferentemente dos fracassados planos do seu antecessor. 

Por último, e mais recentemente, com a destituição de Dilma Rousseff, seu vice Michel Temer assumiu o Palácio do Planalto. Os desencontros entre ambos, aliás, já eram evidentes ainda no governo da petista, e se tornaram mais claros com o tumultuoso processo. O governo Temer, encerrado em 2018, pouco se assemelhou com o de Dilma, seja no aspecto social ou econômico. 

História e Política

Enfim, se as chapas foram criadas para evitar combates políticos desnecessários, nem sempre isso se evidenciou possível, o que não desmerece em completo o papel das uniões. 

A Causa disso pode ser explicada pela diversificação política na sua formação. Desde a primeira eleição direta para presidente com chapa, em 1989, apenas em uma ocasião o “cabeça” e vice eram do mesmo partido: a primeira, com Collor e Itamar, membros do PRN, com Franco logo retornando ao MDB. 

De 94 até 2018, todos os presidentes eleitos possuíam como vice alguém de um partido distinto. Fernando Henrique, do PSDB, venceu duas vezes com Marco Maciel do PFL (posteriormente Democratas e atual União Brasil). 

Lula, citado no início, se uniu com José Alencar (em 2002, no PL, e 2006, no PRB) para a composição de sua chapa. A outra petista, Dilma, tinha Temer, do MDB, ao seu lado. Por fim, Jair Bolsonaro contou com Mourão, à época no PRTB, para vencer as eleições em 2018. 

Com um sistema partidário tão fragmentado como o brasileiro, com 32 partidos, são raras as vezes em que uma chapa purista consegue se firmar e possuir visibilidade. 

O impacto político das chapas nas campanhas

Os impactos da formação de uma chapa começam muito antes da formação do governo eleito, iniciando-se na própria campanha eleitoral.

Seguindo as regras do TSE, quanto mais partidos com representantes no Congresso Nacional se unirem a um candidato, mais tempo de rádio e televisão ele terá. A formação de uma chapa se mostra, dessa forma, essencial para angariar apoio político e partidário, principalmente com a promessa de cargos no executivo. 

A própria escolha de um nome para vice já influencia no jogo eleitoral. Citado no início do texto, o ex-governador Alckmin se tornou essencial para a consolidação de uma provável federação partidária entre o PT e o PSB (novo partido do paulista), uma espécie de “evolução” mais rígida das coligações. 

Já Bolsonaro, na tentativa de garantir o tempo de propaganda que o “Centrão” possui, analisa nomes de importantes políticos para a repaginação de sua chapa, com a iminente saída do seu companheiro de 2018. 

Veja também nosso vídeo sobre o centrão!

O impacto político das chapas em um provável governo

Posteriormente, após eleito, a presença de um partido na chapa impacta diretamente na distribuição de cargos e nos apoios políticos. 

Analisando-se a chapa Dilma-Temer, por exemplo. O apoio do MDB foi fundamental na perpetuação do segundo governo do PT e, após seu “desembarque” para a oposição, o impeachment se tornou cada vez mais provável. Além dos inúmeros ministérios e secretarias que possuíam naqueles anos.

E, por falar em impeachment, aqui no blog você encontra um artigo completo sobre como se dá o processo de impeachment. Vale a pena conferir.

O atual governo Bolsonaro também pode ser utilizado como exemplo. Dentre os partidos que mais possuem força e cargos ministeriais, o Progressistas (antigo PP) se destaca. Sendo assim, supõe-se que Bolsonaro escolha algum membro desse partido, que já possui Ciro Nogueira como número 2 no governo. 

Leia também: Processo de cassação da chapa Dilma-Temer no TSE: entenda

Papel das chapas

Diante desses pontos, torna-se claro o papel que as chapas eleitorais possuíram e possuem no jogo partidário brasileiro. A formação de uma chapa gera efeitos que vão muito além dos 45 dias do período eleitoral e, se forem efetivas, poderão durar por 4 anos. 

A história política brasileira sempre nos reservou elementos de surpresa nas campanhas políticas, e muitas delas tiveram envolvimento com a escolha para o companheiro na urna. Aliado ou inimigo, não se pode desmerecer o papel que um vice pode possuir, e a chapa é um excelente instrumento para garanti-lo. 

E aí, conseguiu compreender melhor o que são as chapas eleitorais e qual o seu papel no processo eleitoral? Deixe um comentário!

Referências:
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1 comentário em “Chapa eleitoral: características, formação e impacto político”

  1. pergunta:
    numa composição de chapa para prefeito. Quantos partidos podem fazer parte da coligação? Apenas dois? E numa aliança entre tres partidos, os vereadores poderiam ter seu “santinho” vinculado como com a chapa a prefeito? obrigado da atenção.

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Conteúdo escrito por:
Gaúcho, jovem de 18 anos, estudante na faculdade de Direito. Interessado por política, cidadania e inclusão social e confio no potencial transformador da educação.
Chiodelli, André. Chapa eleitoral: características, formação e impacto político. Politize!, 30 de maio, 2022
Disponível em: https://www.politize.com.br/chapa-eleitoral/.
Acesso em: 11 de dez, 2024.

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