O que a história da terra nos ensina sobre mudanças climáticas?

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Ao longo de sua história, a Terra passou por grandes eventos de extinção de espécies. Dentre eles, cinco são reconhecidos como eventos de extinção em massa, sendo chamados de “Big Five”. Todos os cinco foram causados, direta ou indiretamente, por mudanças climáticas. Em alguns casos, o resfriamento do planeta resultou na extinção de grande parte das espécies, já em outros, foi o aquecimento que desempenhou esse papel.

Gás carbônico sendo liberado de uma usina.
Gás carbônico sendo liberado na atmosfera em decorrência da atividade industrial. Imagem: Freepik

Vem com a Politize! entender o que essas mudanças no passado da Terra podem nos ensinar sobre as mudanças climáticas contemporâneas.

Mudanças climáticas x aquecimento global

A definição de mudanças climáticas é simples: são alterações nas tendências climáticas de longo prazo no planeta. Essas mudanças podem ser quanto ao aumento ou diminuição da temperatura média do planeta. Elas também estão relacionadas ao aumento ou diminuição dos regimes de chuvas, secas prolongadas ou eventos de glaciação.

O ponto aqui é: mudanças climáticas e aquecimento global não são sinônimos. Os termos são muitas vezes usados de forma intercambiável porque a mudança climática que estamos vivenciando é um aquecimento global.

Saiba mais: Efeito estufa, aquecimento global e crise climática: qual a relação?

As causas das mudanças climáticas também são variáveis. Elas podem ser resultado da atividade de seres vivos, como o atual aquecimento global provocado pela queima de combustíveis fósseis, processos internos naturais, como vulcanismo, ou eventos externos naturais, como os Ciclos de Milankovitch.

Ao longo da história da Terra, vários desses fatores – internos ou externos – causaram mudanças climáticas e resultaram em grandes extinções em massa.

Os cinco fins do mundo: as maiores extinções em massa

A Terra possui cerca de 4,6 bilhões de anos de história. A vida surgiu aqui há cerca de 3,5 bilhões de anos. Para se ter uma ideia, os humanos (Homo sapiens) só existem no planeta há cerca de 300 mil anos.

Toda essa história é datada, nomeada e dividida em Éons, Eras, Períodos, Épocas e Idades. Muitas extinções em massa marcam o fim de um Período e o início de outro, e são eles que dão nome às grandes extinções que veremos a seguir, da mais antiga para a mais recente.

1. Ordoviciano (443,8 milhões de anos atrás)

Impacto: cerca de 86% das espécies e 57% dos gêneros foram extintos.

Causas: um evento de glaciação seguido de uma deglaciação.

O que aconteceu: no Ordoviciano, a maior parte dos seres vivos era marinha. A hipótese mais aceita é de que essa extinção ocorreu em duas fases distintas.

imagem de trilobistas artóprodes marinhos.
Trilobitas são um grupo de arthropodes marinhos, atualmente extintos, e foram um dos grupos mais afetados na extinção do Ordoviciano. Na foto a espécie Ceraurus matranseris, do Canadá. Imagem: American Museum of Natural History

A primeira fase teria sido marcada por uma glaciação, que congelou a água do planeta e provocou uma queda nos níveis dos mares, alterando as correntes oceânicas. Quem sobreviveu a essas alterações climáticas levou um segundo golpe, onde um derretimento repentino das geleiras e outra mudança na circulação oceânica levou muitos grupos de seres vivos à extinção.

2. Devoniano (358,9 milhões de anos atrás)

Impacto: cerca de 75% das espécies e 35% dos gêneros foram extintos.

Causas: fatores internos como a ocupação do ambiente terrestre pelas plantas fizeram as taxas de carbono atmosférico cair (já que elas consomem CO2), diminuindo a temperatura do planeta. Nesse período também houve a formação dos solos, o que gerou um grande aporte sedimento nos oceanos e resultou na baixa oxigenação dos mares. A vida aqui ainda era predominantemente marinha e boa parte foi extinta.

O que aconteceu: extinções em massa nem sempre são rápidas e com uma única causa. A do Devoniano ocorreu ao longo de mais de 20 milhões de anos. Nesse período mudanças climáticas levaram a quedas periódicas e repentinas na biodiversidade.

Ilustração de um peixe de armadura, Dunkleosteus terrelli, atingia cerca de 4 metros de comprimento e foi extinto no Devoniano. Imagem: Hugo Salais, publicada em Ferrón, Martínez-Pérez & Botella (2017).

3. Permiano (251,9 milhões de anos atrás)

Impacto: cerca de 96% das espécies e 56% dos gêneros foram extintos.

Causas: vulcanismo e aquecimento global.

O que aconteceu: Essa é a maior extinção da qual se tem registro. Na região onde conhecemos hoje como Sibéria, erupções vulcânicas liberaram grandes quantidades de dióxido de carbono (CO2) e sulfeto de hidrogênio (H2S). Os mares se tornaram mais ácidos e anóxicos (baixa oxigenação) e, na terra, um processo de aquecimento global elevou as temperaturas.

Mais uma vez, os organismos marinhos foram os mais afetados.

Fosséis do esqueleto de um réptil
Fóssil de um mesossauro (Mesosaurus tenuidens), um réptil marinho que viveu e foi extinto no Período Permiano. Imagem: Wikmedia commons

4. Triássico (201,4 milhões de anos)

Impacto: cerca de 80% das espécies e 47% dos gêneros desapareceram.

Causas: as causas foram múltiplas e ainda são debatidas. Acredita-se que erupções vulcânicas na Província Magmática do Atlântico Central, associadas a oscilações climáticas, variações do nível do mar e impactos de meteoros causaram essa grande extinção.

O que aconteceu: o vulcanismo e impacto de asteroides levaram a um efeito estufa, que escureceu da atmosfera e impediu a fotossíntese. As corrente oceânicas se estagnaram e os oceanos se tornaram anóxicos.

Fosséis de amonoides que se assemelham com corais encaracolados em uma pedra.
Fósseis de amonoides, moluscos extintos parentes dos polvos e lulas, um dos grupos mais afetados pela extinção do Triássico. Imagem: Encyclopedia britannica

5. Cretáceo-Paleógeno (66 milhões de anos atrás)

Impacto: cerca de 76% das espécies e 40% dos gêneros foram extintos.

Causas: vulcanismo e queda de um meteoro.

O que aconteceu: um intenso vulcanismo na região de Deccan, na Índia, fez com que as comunidades entrassem em crise. Além disso, a queda do famoso meteoro na península de Yucatán, onde hoje hoje é o México, levou à mais famosa extinção em massa que conhecemos.

Foi nessa extinção que os dinossauros (exceto as aves) e pterossauros desapareceram.

ilustração da aprência do pterossauro, um réptil voador, com asas, bico de passáro, e penas semelhantes a pelo.
Ilustração do pterossauro brasileiro Tupandactylus imperator. Pterossauros são répteis voadores, não dinossauros, que foram extintos no fim do Cretáceo. Imagem: Bob Nicholls, publicada na Revista Fapesp (2022)

É importante lembrar que a extinção de espécies é um fenômeno natural que ocorre o tempo todo no planeta. Faz parte da dinâmica da vida e da evolução das espécies. Contudo, as extinções acima, chamadas de extinções em massa, são definidas como períodos em que as taxas de extinção são muito mais elevadas do que o normal. Nelas, por cinco vezes, a Terra perdeu mais de 3/4 das suas espécies.

Da extinção do Permiano à sexta grande extinção em massa

Se você reparou bem, a extinção do Permiano foi causada por um aquecimento global. Naquele momento, os responsáveis foram os vulcões. Hoje, estudos vêm demonstrando que a Terra está a caminho de um processo bem parecido, principalmente quanto ao aumento nos níveis de CO2, da temperatura média global e da acidificação dos oceanos.

A queima de combustíveis fósseis e o desmatamento liberam CO2. Na atmosfera, esse gás é um dos responsáveis pelo efeito estufa. As temperaturas médias globais já aumentaram cerca de 1 °C desde 1850. Contudo, pelo menos um quarto desse CO2 libertado não permanece no ar, mas dissolve-se no oceano.

Leia mais: Ecoansiedade: o que é, como surgiu e como nos afeta?

Esse CO2 dissolvido na água torna os oceanos mais ácidos e, para alguns animais marinhos isso é um enorme problema. A acidificação reduz a disponibilidade de carbonato, elemento essencial na formação e crescimento de conchas e esqueletos carbonáticos.

A situação fica mais grave quando se trata dos recifes de corais. Eles abrigam cerca de 25% de todas as espécies marinhas, e têm seu esqueleto de carbonato de cálcio dissolvido em águas mais ácidas. Estudos como o de Kline et al. (2018) já demonstram os efeitos negativos nesses ecossistemas.

Comparações com a grande extinção do Permiano são inevitáveis. Se as taxas atuais de emissão de CO2 forem mantidas, a estimativa é de que até 2100 o aquecimento da parte superior dos oceanos chegará a 20% da temperatura estimada para o final do Permiano. E, até 2300, entre 35 e 50%. No Permiano, esse aquecimento levou cerca de um milhão de anos para ocorrer. Hoje, em pouco mais de 300 anos, já estamos atingindo as mesmas temperaturas.

E agora, José? A festa acabou…

As notícias não transmitem otimismo. Compreender os impactos das mudanças climáticas em tempo real é desafiador, assim como entender eventos históricos, como a pandemia da COVID-19, quando estamos imersos neles. Uma perspectiva histórica facilita a análise.

Quando falamos sobre grandes extinções e mudanças climáticas do passado, tudo parece instantâneo. “Todos os dinossauros não avianos foram extintos no fim do Cretáceo com a queda do meteoro“. Não, não foi assim. O planeta foi mudando e as populações entrando em declínio, em processos que podem ter durado milhares de anos. A queda do meteoro foi o golpe final.

O problema, para nós, é que não há tempo para um distanciamento histórico. Segundo o último relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), o aquecimento global antrópico vem aumentando as temperaturas em cerca de 0,2°C por década. É provável que o aquecimento global atinja 1,5 °C entre 2030 e 2052.

Se conseguirmos limitar o aumento da temperatura média global em 1,5 °C, as consequências serão menos severas que se ultrapassarmos esse limiar. Os riscos de secas e déficits de chuva são maiores com um aumento de 2 °C do que quando comparados ao aquecimento global de 1,5° C, assim como os riscos de chuvas intensas, ciclones tropicais, perda de calotas polares, de biodiversidade e aumento dos níveis dos mares.

Segundo Song et al, (2021), em um estudo publicado na revista nature, um aumento de 5,2 °C na temperatura média global é o limiar que resultaria em uma sexta extinção em massa comparável às cinco grandes extinções pelas quais o nosso planeta já passou.

Leia também: Estado de emergência climática: entenda os impactos das mudanças climáticas

Mas nem tudo está perdido (ainda)

Imagem com um globo terrestre no centro embaixo de um pedaço de madeira equilibrando o gás carbônico em uma extremidade e uma folha no outro lado.
Imagem ilustrando a meta de equilibrar as taxas de emissão de carbono com as taxas de remoção de CO2 atmosférico. Imagem: Freepik

Medidas estão sendo tomadas para frear o aquecimento global e limitar o aumento da temperatura em 1,5 °C. A ideia é atingir um valor líquido zero de CO2 (quando as taxas de emissão são iguais às taxas de remoção de C02 da atmosfera) até 2050. Nesse cenário as medidas não são individuais, e por isso o papel dos governos a nível global é essencial.

Segundo a ONU, para reduzir as emissões de CO2 são necessárias transformações em diversos setores. São eles: o de alimentos, eletricidade, transporte, indústria, construção e uso do solo. Além disso, a intensificação de medidas políticas eficazes rumo à energia limpa e um financiamento significativo e coordenado são essenciais para frear as mudanças climáticas.

Contudo, como o aquecimento global é uma realidade e já está causando alterações no planeta, medidas de adaptação às mudanças climáticas são necessárias. Em especial, para os populações com maior risco climático, políticas de redução de danos precisam ser pensadas e colocadas em prática.

Quer saber o que o nosso país está fazendo a respeito? Entenda o que é a Política Nacional sobre Mudança do Clima (PNMC)

E aí, os políticos que você vota têm propostas para combater e mitigar os efeitos das mudanças climáticas? Conta para a gente no comentários!

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Conteúdo escrito por:
Paleontóloga, licenciada em Ciências Biológicas, mestre em Geociências e doutoranda em Zoologia pelo Museu Nacional do Rio de Janeiro, onde pesquiso sobre tartarugas fósseis. Escrevo ciência, meio ambiente, a história da vida na Terra e a nossa relação com o planeta.

O que a história da terra nos ensina sobre mudanças climáticas?

23 abr. 2024

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