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Nilo Peçanha: quem foi o primeiro e único presidente negro do Brasil?

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Conhecido por ter sido o sétimo presidente do Brasil e primeiro e único presidente negro da história do país, Nilo Peçanha exerceu seu mandato de 14 de junho de 1909 a 15 de novembro de 1910, após a morte de Afonso Pena, de quem era vice.

Aqui, a Politize! te conta mais sobre o ex-presidente.

Quem foi Nilo Peçanha?

Nascido em 2 de outubro de 1867 em Campo do Goytacazes, no Rio de Janeiro, Nilo Procópio Peçanha foi presidente do Brasil por 17 meses e é considerado o patrono da educação profissional e tecnológica do Brasil.

Nilo foi filho de Joaquina Anália de Sá Freire, vinda de uma família de agricultores com ligações ao cenário político da região, e Sebastião de Sousa Peçanha, dono de uma padaria. Juntos, tiveram sete filhos.

No Rio de Janeiro, ele frequentou escolas públicas, e quando mudou-se para São Paulo, estudou na Faculdade de Direito do Largo São Francisco, mas se formou no Recife.

Em 1895, casou-se com Ana Castro Belisário de Sousa. Conhecida como Anita, ela era descendente de famílias aristocráticas e ricas de Campos dos Goytacazes.

O casamento foi um “escândalo social”, já que o noivo era um homem pobre. O relacionamento durou até o fim da vida de Nilo.

Imagem de Nilo Peçanha
Nilo Peçanha. Imagem: Governo do Brasil – Galeria de Presidentes

Trajetória política

A vida política de Peçanha começou no Rio de Janeiro em 1890. Veja abaixo sua trajetória:

  • 1980-1893: foi eleito para a Assembleia Nacional Constituinte, que redigiu a primeira Carta Magna da República. Após a virada do milênio, Nilo atuou na Câmara dos Deputados pelo Rio de Janeiro (diversos mandatos consecutivos até 1902;
  • 1903-1906: foi eleito ao cargo de senador e presidente de estado durante três anos (cargo equivalente ao atual governador);
  • 1906-1909: Nilo Peçanha, que era o vice de Afonso Pena, se torna presidente da República aos 41 anos, quando Pena morre de pneumonia. Ao assumir o cargo, ele se torna o primeiro presidente negro e o segundo mais jovem da história – seguindo Fernando Collor, que tomou posse aos 40 anos em 1990. Ele também se torna o sétimo homem a ocupar o cargo de presidente do Brasil;
  • 1912-1914: ao fim do seu mandato presidencial, retornou ao Senado pelo Rio de Janeiro;
  • 1914-1917: elegeu-se novamente presidente do estado do Rio de Janeiro e renunciou em 1917 para assumir o Ministério das Relações Exteriores durante a Primeira Guerra Mundial (1914-1918);
  • 1918: Mais uma vez elegeu-se senador federal;
  • 1921-1924: manteve-se no Senado e candidatou-se à presidência da República nas eleições de 1922, sendo derrotado por Artur Bernardes;
  • 1922: embora fosse apoiado por políticos pernambucanos, baianos, gaúchos e fluminenses, e boa parte dos militares, Artur Bernardes derrotou Peçanha nas eleições de 1º de março de 1922.

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Contexto político

Nilo Peçanha entrou para a política e alcançou a presidência durante a Primeira República (1889-1930), período marcado por um regime com forte influência das oligarquias estaduais, como as de Minas Gerais e São Paulo.

Embora hoje esse modelo seja amplamente criticado por práticas como o coronelismo e o clientelismo, seus defensores à época argumentavam que a estabilidade política exigia um pacto entre as elites regionais para evitar rupturas institucionais após a queda da monarquia.

Nessa época, a política funcionava com o pacto conhecido como “política do café com leite”, no qual São Paulo e Minas Gerais alternavam o controle do poder federal com café e pecuária, respectivamente.

O país estava iniciando um processo de industrialização no Sudeste, apesar de ainda ter um trabalho predominantemente agrário.

Existia grande instabilidade social e política, com revoltas importantes ocorrendo no início do século XX, como a Revolta da Vacina (1904) e manifestações urbanas contra a corrupção e o clientelismo. Além das manifestações sociais com influência anarquista do sudeste.

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Como foi sua presidência?

Ao tomar posse, seu lema era “paz e amor”, uma tentativa de apaziguar os ânimos da oposição.

Em sua curta passagem pelo Palácio do Catete, criou o Serviço de Proteção aos Índios, órgão que antecedeu à atual Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai).

Peçanha também fundou a Escola de Aprendizes Artífices, primeira instituição de ensino técnico do país sem ligação com os militares. Esta escola é considerada a precursora do Centro Federal de Educação Tecnológica (Cefet).

E por causa disso em 2011 ele foi homenageado com uma lei federal que o tornou o patrono da educação profissional e tecnológica no Brasil.

Ele buscou, também, encontrar soluções para diminuir o problema de falta de habitação no país.

Seu mandato se encerrou em 15 de novembro de 1910.

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Como a questão racial afetou seu mandato?

A origem de Nilo foi um objetos de controvérsia na política. Humilde, ele foi o primeiro presidente negro do Brasil e diante das teorias racistas predominantes no início do século XX, segundo historiadores, ele sofreu com as consequências de um embranquecimento social.

Esse é um fenômeno histórico e social no Brasil, no qual há uma crença, muitas vezes implícita, de que a miscigenação com pessoas brancas europeias levaria à “melhora” da população, tanto em termos culturais quanto genéticos. Assim impondo que, em poucas gerações, a população brasileira seja majoritariamente branca.

Essa política chegou a ser apresentada internacionalmente no Congresso Universal das Raças de 1911 e apoiada por cientistas e intelectuais da época, que viam o fenômeno como necessário para o progresso do país.

Hoje, historiadores, como Petrônio Domingues, professor na Universidade Federal de Sergipe (UFS) (via BBC News Brasil), consideram o ex-presidente mestiço ou pardo, mas essa não era uma questão na época, dado que ele não se reconhecia como um afrodescendente.

Já a imprensa, segundo Domingues, usava a cor de sua pele como alvo de ridicularizações através de charges e anedotas, destacando como a sociedade via a ascensão de um homem mestiço como uma ameaça.

Com a ideia de branqueamento social, a elite brasileira tentou esconder sua imagem. “Fotografias oficiais e retratos eram manipulados para clarear sua pele e aproximá-lo dos padrões eurocêntricos, numa tentativa de apagar qualquer traço de diversidade racial em figuras públicas de prestígio”, disse o filósofo e sociólogo Paulo Niccoli Ramirez, professor da Fundação Escola de Sociologia de de Paulo (FESPSP) e da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) para a BBC News Brasil.

Como a questão racional impactou sua trajetória?

A questão racial impactou profundamente a trajetória política de Nilo Peçanha, obstáculos que enfrentou, bem como as estratégias que adotou em sua carreira. Entenda algumas delas abaixo:

  • Como já comentado aqui, Nilo foi alvo constante de ofensas racistas, sendo frequentemente ridicularizado na imprensa por sua cor de pele, e recebeu apelidos pejorativos como “mestiço do Morro do Coco”;
  • Negação pública da origem racial: fotos oficiais eram retocadas para esconder a cor de sua pele;
  • Influência na visão política: por sua origem humilde, tornou-se um defensor da liberdade e um político habilidoso na articulação, descrito como alguém que usava “malícia” para avançar;
  • Marco histórico e político: apesar das negativas e do racismo, sua eleição e atuação presidencial simbolizaram um avanço histórico na luta contra o racismo, tornando-se um marco importante para a representatividade negra na política do Brasil;
  • Estigma social e apagamento da identidade: a complexa sociabilidade da época fez com que a negritude de Nilo Peçanha fosse deliberadamente ocultada em biografias oficiais e negada por seus próprios familiares, refletindo um esforço coletivo da sociedade para esconder sua origem étnico-racial e reforçar uma narrativa de branqueamento.

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O que mais marcou o governo de Nilo Peçanha?

Em seu mandato de um ano e cinco meses, Nilo Peçanha conseguiu alcançar diversos feitos como:

  • ​​Criação do Ministério da Agricultura, Comércio e Indústria, destinado a regular e promover as atividades produtivas do país;
  • Fundação do Serviço de Proteção aos Índios (SPI), órgão pioneiro na assistência aos povos indígenas;
  • Promoção do ensino técnico-profissional, com a criação das Escolas de Aprendizes Artífices, precursoras dos atuais Institutos Federais, para formar mão de obra qualificada para a indústria em expansão;
  • Investimentos e modernizações em infraestrutura: continuou a ampliação da malha ferroviária especialmente nas regiões Nordeste, Sudeste e Sul; expandiu o saneamento da capital e da Baixada Fluminense; reformou os Correios e Telégrafos e ampliou a rede telegráfica; introduziu mudanças no fornecimento de luz elétrica no Rio de Janeiro;
  • Ampliação do treinamento militar e estímulo a pesquisas agrícolas, fortalecendo a mobilização cidadã e o avanço científico em setores estratégicos;
  • Crescimento econômico importante, com o PIB brasileiro crescendo em média 6,4% durante seu mandato, um dos maiores da história do país até então;
  • Contexto político tenso, marcado por sua oposição a lideranças conservadoras como Pinheiro Machado e pelo rompimento da tradicional aliança entre os estados de São Paulo e Minas Gerais na escolha sucessória, o que gerou uma disputa eleitoral acirrada em 1910 entre Marcelo Hermes da Fonseca e Rui Barbosa, com a vitória do primeiro.
Nilo Peçanha segurando a cabeceira de uma cadeira de madeira, em pé.
Nilo Peçanha. Imagem: Wikimedia Commons

Críticas a respeito de sua atuação política

As principais críticas à atuação política de Nilo Peçanha estão relacionadas a:

  • Ruptura com o Partido Republicano Conservador: seu governo carregou divergências com líderes influentes como Pinheiro Machado, chefe do Partido Republicano Conservador, o que gerou instabilidade política durante seu mandato e fragilização das oligarquias tradicionais da Primeira República;
  • Enfraquecimento do arranjo oligárquico café-com-leite: causou uma ruptura com a hegemonia política entre São Paulo e Minas Gerais. Apesar de historicamente importante, gerou críticas na época por ser um sistema considerado essencial para a estabilidade política.

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Casamento polêmico

Outro ponto de controvérsia foi seu casamento com Ana de Castro Belisário Soares de Sousa, a Anita. Ela veio de família rica de Campos dos Goytacazes, neta de um visconde e bisneta de dois barões.

Muito diferente de Peçanha que nasceu no Campos dos Goytacazes, no norte fluminense, filho de um padeiro e de uma filha de agricultores. Com seis irmãos, teve uma infância pobre em um sítio.

A família se mudou para a cidade quando Peçanha chegou à idade escolar. Foi no meio urbano que seu pai ganhou o epíteto pelo qual seria conhecido, virou “Sebastião da padaria”.

Os pais e demais familiares de Anita eram contra um casamento entre ela e Peçanha, então cortaram relações com ela. O casamento aconteceu em 6 de dezembro de 1895.

Morte e legado

Longe de sua vida política, Nilo Peçanha faleceu em 1924 aos 56 anos, no Rio de Janeiro, vítima de um complicações cardíacas decorrentes da doença de Chagas.

Após sua morte, adeptos a sua política passaram a ser chamados de “nilistas”, devido ao seu nome Nilo. Eles apoiavam a habilidade política e mão de ferro para consolidar seu poder.

As cidades de Nilópolis, Rio de Janeiro, e Nilo Peçanha, na Bahia, foram nomeadas em sua homenagem.

Gostou de conhecer a história de Nilo Peçanha? Continue explorando figuras históricas brasileiras em nossos conteúdos!

Referências:

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Conteúdo escrito por:

Erica Yazigi Roumieh

Jornalista e defensora dos direitos humanos, acredito que uma boa comunicação e acesso a informação podem mudar o mundo. Sou paulista e descendente de árabe. Meu coração dividido por essa duas culturas é inteiramente apaixonado pelas pessoas e pelas artes.
Roumieh, Erica. Nilo Peçanha: quem foi o primeiro e único presidente negro do Brasil?. Politize!, 29 de setembro, 2025
Disponível em: https://www.politize.com.br/nilo-pecanha/.
Acesso em: 29 de set, 2025.

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