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Vladimir Herzog: conheça a história do jornalista!

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Vladimir quando criança. Via: Instituto Vladimir Herzog.
Vladimir quando criança. Imagem: Instituto Vladimir Herzog

Conheça a história de Vladimir Herzog, jornalista de origem judaica que fugiu do regime nazista e foi morto pela Ditadura Militar brasileira.

Nasceu como Vlado Herzog em Osijek, na antiga Iugoslávia (a cidade hoje fa parte da atual Croácia), em 27 de junho de 1937. Filho de família judia, Herzog perdeu seus avós para o antissemitismo do nazismo. Fugidos da repressão, seus pais foram inicialmente se abrigar na Itália, mas posteriormente desembarcaram no Brasil.

Vladimir Herzog trabalhou como jornalista durante a vida e morreu nas dependências do DOI-CODI vítima de tortura e repressão. Após seu assassinato, emergiu uma intensa frente defendendo a redemocratização. Atualmente ele é lembrado nos livros de história.

Neste conteúdo, o Politize! te explica os principais pontos da história do jornalista Vladimir Herzog.

Veja também nosso vídeo sobre a ditadura militar!

Vida de Vladimir Herzog no Brasil

Após a chegada da família de Vladimir ao país, eles se instalaram em São Paulo e foi nessa cidade que ele cresceu.

Naturalizado brasileiro, formou-se em filosofia na USP (Universidade de São Paulo), mas já na época nutria amor pelo cinema e fotografia.

Na USP conheceria sua esposa, Clarice Chaves, estudante de ciências sociais, com quem se casaria em 1964, e depois passaria a ser chamada Clarice Herzog.

Apesar da formação em filosofia, ele seguiu a carreira de jornalista. Trabalhou no jornal Estadão por um tempo, e foi lá que ele começou a adotar a alcunha de ”Vladimir”, por acreditar que haveria menos estranhamento que seu nome de batismo.

Com o início da ditadura, vários amigos foram se exilar em outros países. Assim, devido ao início das repressões do período ditatorial e vendo seus amigos serem reprimidos, surgiu nele um descontentamento com o país.

E após Herzog receber uma proposta para trabalhar na BBC em Londres, ele decidiu se mudar para a Inglaterra, ficando lá de 1965 a 1968. Foi nesse período que seus dois filhos, Ivo e André Herzog, nasceram.

Carreira de Vladimir Herzog no Brasil

Acervo: Instituto Vladimir Herzog.
Acervo: Instituto Vladimir Herzog

Em 1969, ele volta ao Brasil e leciona na faculdade FAAP e na Escola de Comunicação e Artes da USP.

Trabalhou também por cinco anos na Revista Visão em sua editoria de cultura, onde colaborou com algumas matérias que ultrapassaram os limites da censura.

Um exemplo é a capa de uma edição que apresentava uma imagem de uma pessoa vendada com a seguinte pergunta “O que há com a cultura no Brasil?”, com o qual questionava a censura que a arte vinha sofrendo.

Além disso, participou da elaboração da parte cultural da edição “Assim se passaram dez anos” que se tratava da primeira década do regime militar.

Em seguida, foi convidado pelo então secretário de São Paulo, José Mindlin, a ser diretor de jornalismo da TV Cultura.

Vladimir era um entusiasta pelo cinema. Passou sua paixão por fotografia para os filhos e nas viagens em família era o fotógrafo oficial registrando os momentos em conjunto.

Seu primeiro documentário se chamava “Marimbás”, feito em 1963, e retratava a vida dos moradores mais pobres da praia de Copacabana que sobreviviam com os restos de peixes que os pescadores deixavam.

A sua escolha pelo tema já retratava sua vontade de ouvir e dar voz aos excluídos da sociedade nas suas produções audiovisuais.

Ele também planejava fazer um documentário sobre Canudos e chegou a ir ao local para fazer uma pesquisa de campo. Segundo sua esposa, ele se preparava para seguir a carreira de cineasta.

Contexto histórico de sua vida

Antes do regime militar iniciar, o Brasil vivia uma república democrática governada por João Goulart, mais conhecido como Jango. Ele tinha ideias mais progressistas, segundo a visão dos militares e conservadores, que na época não ecoaram muito bem.

Nesse período, havia grandes tensões geopolíticas por conta da Guerra Fria, momento em que o mundo se dividiu em dois blocos: capitalista, comandado pelos EUA; e socialista, liderada pela antiga União Soviética.

Com isso, grandes empresários, conservadores e militares começaram a afirmar que Jango era comunista. E a partir disso, com o apoio dos civis, que temiam o início de um regime socialista no país, o general Castelo Branco aplicou um golpe alegando que João Goulart era uma ameaça à segurança nacional.

Repressão durante a ditadura militar

Após a tomada ao poder pelos militares, criaram-se os Atos Institucionais (AI) que visavam alterar a constituição. Ao total, durante todo o regime militar, foram 16 atos, mas os mais notórios são o AI-2 e o AI-5.

O primeiro, o AI-2, criou o bipartidarismo onde o Arena (Aliança Renovadora Nacional) era a favor do governo e o MDB (Movimento Democrático Brasileiro) era o partido de oposição. Dessa maneira, todos os outros partidos foram eliminados.

Já o segundo foi o AI-5, o mais repressivo do regime, que dentre outras coisas censurou qualquer um que se opunha ao governo e suspendeu o direito ao Habeas Corpus. Com isso, foi tirado grande parte do poder ao judiciário, fortalecendo, consequentemente, o executivo, para poderem tomar mais decisões autoritárias sem interferências.

Leia mais: Ditadura Militar no Brasil: resumo, origem e presidentes!

Censura aos meios de comunicação

A repressão contra jornalistas e a imprensa ocorreu desde o início do regime. O jornal Tribuna da Imprensa já havia recebido ao menos seis visitas do coronel Carlos Pinto antes do AI-5, e o proprietário Hélio Fernandes, ao longo da ditadura, foi preso várias vezes chegando a ter seus direitos políticos cassados.

A partir de 1969, o periódico começou a sofrer censura prévia, tendo censores instalados em seu prédio, se estendendo a esse estado por dez anos. Por nunca ter aceitado as censuras, Fernandes sempre tentava publicar suas notícias apesar da situação vigente.

Por conta disso, o jornal Tribuna da Imprensa foi o que mais sofreu intervenções, obtendo cerca de 20 apreensões de materiais. Entretanto, segundo o sociólogo Gláucio Ary Dillon Soares, a época de maior cerceamento de liberdade de expressão e proibicionismo foi no governo de Médici, se estendendo com Geisel e tendo um declínio rápido a partir de 1975.

Ary também conclui que a censura era usada como proteção de Estado, sendo uma grande ferramenta para esconder seu próprio autoritarismo e dar ao governo uma aparência democrática. 

O controle poderia vir de diferentes formas:

  • por maneira escrita em bilhetes e telefonemas anônimos;
  • por acordos, em que os militares diziam o que poderia ser publicado;
  • envio das matérias à delegacia regional da polícia federal ou para Brasília, onde os militares examinariam os conteúdos dando o aval de publicação ou não.

Alguns só sofriam cortes e outros eram completamente vetados. Esses tipos de censura foi variando por jornal, período e presidente vigente. 

Como a imprensa lidou com a censura

Estadão durante a censura. Imagem: Reprodução/Estado de S. Paulo
Imagem: Reprodução/Estado de S. Paulo

O simbolismo foi uma grande artimanha da imprensa para conseguir passar pelo veto do censor. Eram críticas sobre o regime que vinham quase como mensagem subliminar.

O Jornal Brasil em uma de suas edições escreveram ao topo “Hoje é o dia dos cegos” falando da Santa Luzia, padroeira dos cegos, mas na verdade eles queriam se referir ao AI-5. 

Além disso, Alberto Dines, editor chefe na época, ao escrever sobre a previsão do tempo disse:

“Tempo negro. Temperatura sufocante. O tempo está irrespirável. O país está varrido por fortes ventos. Máx.: 38°C em Brasília; Mín.: 5°C nas Laranjeiras”. Esse trecho fazia uma clara metáfora à ditadura.

A temperatura máxima se referia ao Ato Complementar n°38, que decretava o recesso do Congresso Nacional; e a temperatura mínima ao AI-5. E os locais aludem aos dois centros executivos.

Eles usavam simbolismos também para explicitar a censura e preencher os espaços em branco deixados pelos vetos. O jornal Estadão publicou poemas de Luiz Camões e o Jornal da Tarde publicou meia página só de receitas, ao invés dos noticiários que foram censurados.

Morte de Vladimir Herzog

Meses antes de sua morte, Vladimir se filiaria ao Partido Comunista Brasileiro (PCB), como forma de se aliar a algo para contrapor o regime.

Ao contar para sua esposa, ela o questionou, apreensiva da razão dessa decisão, e ele disse:

É uma questão de momento. A situação política no Brasil é grave. Só há dois movimentos organizados que podem se articular para combater a ditadura – a Igreja e o Partido Comunista. Eu sou judeu. Só tenho uma opção“.

Na mesma época, o comandante do II Exército, general Ednardo D’Ávila Mello, começou a suspeitar que havia comunistas infiltrados no governo de São Paulo, e assim surgiu a Operação Jacarta que visava eliminá-los.

Essa operação foi inspirada no ditador da Indonésia Suharto que, em meados da década de sessenta, matou milhares de pessoas que ele julgava por subversiva ao regime. No Brasil, tinham por objetivo assassinar 2 mil pessoas; dentre elas jornalistas, militantes, intelectuais, professores, religiosos, entre outros.

Dessa forma, vários jornalistas foram convocados a se apresentarem para interrogatório no DOI-CODI (Destacamento de Operações de Informações – Centro de Operações de Defesa Interna), dentre eles Vladimir Herzog. 

No dia 24 de outubro de 1975, dois agentes do governo foram em seu ambiente de trabalho convocá-lo para prestar depoimento. No dia seguinte, ele acordou cedo e se encaminhou para o local de forma voluntária; chegou pela porta da frente, se identificou e foi orientado a aguardar.

No depoimento, negou qualquer tipo de envolvimento com o PCB, então as sessões de tortura se iniciaram. O amarraram, espancaram, deram choques elétricos e enquanto a tortura acontecia eles perguntavam nomes de jornalistas envolvidos com o partido.

Ao fundo, a rádio tocava em som estridente, para que o barulho do ocorrido fosse abafado e os próximos jornalistas que seriam torturados não pudessem ouvir. 

Vlado não resistiu as intensas torturas e veio a óbito no dia 25 de outubro de 1975. Preocupados com a possível repercussão de sua morte, visto que ele era uma figura conhecida e que se apresentou espontaneamente, os militares forjaram um suicídio.

[Alerta de imagem a seguir que pode gerar desconforto!]

Imagem: Instituto Vladimir Herzog
Imagem: Instituto Vladimir Herzog

Prenderam ele em uma janela amarrando um pano em seu pescoço e chamaram um perito do IML para registrar a cena. Porém, eles não se atentaram de que a grade era menor que o jornalista, então não seria possível haver enforcamento.

Além disso, eles tinham uma política de nunca deixar nenhum tipo de instrumento passível de uso para atentados suicidas. Na preparação para o funeral, o rabino Hanry Sobel percebeu marcas de estrangulamento, e com isso concluiu que Herzog não se suicidou.

Dessa maneira, o corpo ao invés de ser velado em área separada, como manda a tradição judaica em casos de suicídio, foi encaminhado para o sepultamento no cemitério Israelita do Butantã. Isso acabou sendo mais um ato que contestava o suposto suicídio.

Revolta e justiça

Seis dias após o assassinato, foi organizado um ato ecumênico na Catedral da Sé que reuniu cerca de 8 mil pessoas. O secretário de segurança estadual, Erasmo Dias, tentou impedir o cerco bloqueando as vias da cidade.

Entretanto, mesmo assim, as pessoas saíram de seus veículos e se encaminharam a pé até a praça. Havia vários militares com cachorros prontos para dispersar a aglomeração, no entanto, a missa ocorreu normalmente e houve gritos na escadaria pedindo a redemocratização.

Esse foi o primeiro ato de protesto depois do AI-5 em favor da democracia. Houve uma tentativa de passeata silenciosa pelos manifestantes, mas logo foi dispersada com bombas de gás lacrimogênio.

Uma peça importante pela luta por justiça ao caso de Vladimir foi Clarice, sua esposa. Ela processou a União e ganhou o processo em 1979 que constava que o responsável pela morte do seu marido foi o Estado.

Mas apenas em 2013 ─ 38 anos depois de seu assassinato ─ o laudo de óbito foi retificado. Até então figurava como suicídio, mas após a correção ficou reconhecido como maus tratos e tortura pelo II Exército nas dependências do DOI-CODI.

Impactos e dias atuais

Atualmente, ele continua sendo lembrado e com isso foram criados prêmios, instituições e mostras.

O Prêmio Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos teve sua primeira edição em 1979 e tem por objetivo premiar profissionais da comunicação que visam trabalhar em defesa de direitos fundamentais como democracia, cidadania, direitos humanos e sociais.

Em 2009 foi criado o Instituto Vladimir Herzog por Ivo Herzog, seu filho. A instituição possui os mesmos valores do prêmio e surgiu como forma de compartilhar a história e registros do jornalista a fins de pesquisa e conhecimento público.

Outra iniciativa foi a do Itaú Cultural, que criou a exposição Ocupação Vladimir Herzog que ficou disponível para visitação por quase seis meses em 2019, porém atualmente é possível conhecer um pouco do acervo no site.

Além disso, geralmente ele é sempre citado nas escolas quando estudam o período da Ditadura Militar na disciplina de história.

Todos esses meios de salvaguardar a memória de Herzog são formas de fazer com que o cidadão brasileiro conheça parte de sua história e saiba como a liberdade e democracia são importantes.

Essa é a história de um homem que viveu em dois momentos históricos de supressão de direitos; em um primeiro momento, perdeu os avós e sua cidadania, e no outro, perdeu a vida. 

“Quando perdemos a capacidade de nos indignar com as atrocidades praticadas contra outros, perdemos também o direito de nos considerar seres humanos civilizados”.

Vladimir Herzog

E aí, compreendeu a história de Vladimir Herzog? Deixe sua opinião ou dúvida nos comentários!

Referências:


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23 abr. 2024

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