O que foi o integralismo brasileiro: conheça o movimento de extrema-direita

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Bandeira do integralismo brasileiro. Foto: Daniel Arroyo/Ponte Jornalismo.

Nas eleições de 2022 você ouviu bastante o slogan “Deus, Pátria e Família” como lema de um dos presidenciáveis dando ênfase às bases ideológicas do seu governo. O curioso é que esse slogan é uma expressão parte da nossa história. O integralismo Brasileiro foi conhecido como o maior movimento de extrema direita da história do Brasil

Inspirado no regime de Benito Mussolini, a versão brasileira do regime fascista, o movimento integralista buscou romper as tradições da velha política com um discurso autoritário, antiliberal e antidemocrático. Tinha como base o nacionalismo, o anticomunismo e a radicalização da religião cristã conservadora.

Neste texto vamos fazer um recorrido histórico e conhecer o que foi o integralismo brasileiro, seus principais personagens, sua organização e como funcionava o maior movimento organizado de extrema direita do Brasil.

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Integralismo Brasileiro: Fascismo tupiniquim

O integralismo brasileiro é considerado o maior movimento fascista da América Latina. A ideologia integralista nasceu dentro de um contexto de mudanças no país e no mundo a partir da década 1930, tais como o fim da Primeira Guerra Mundial, crises econômicas e avanço da Revolução Industrial. No campo político, ideias autoritárias como a Revolução Soviética e a ascensão de movimentos nazi-fascista na Europa, cresciam para fora da Europa.

No Brasil o contexto era também de mudanças sociais, políticas e econômicas. O imaginário brasileiro neste momento se moldava em busca de uma identidade nacional. Na política, a revolução de 1930 levada adiante por Getúlio Vargas colocou fim à República Oligárquica, mais conhecida como Café com Leite, dando lugar à Nova República.

É dentro desse contexto que o intelectual jornalista e escritor Plínio Salgado em retorno de uma viagem pela Europa e fascinado pelo regime totalitário fascista de Mussolini, colocou em ação o plano de criar uma versão tupiniquim do regime político fascista denominado Ação Integralista Brasileira.

O integralismo defendia a criação um Estado Integral de partido único, governado por intelectuais em uma estrutura hierárquica baseada na concepção doutrinária ultranacionalista liderada por Plínio Salgado que era reverenciado como chefe político e religioso.

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Ação Integralista Brasileira (AIB)

O movimento Ação Integralista Brasileiro nasceu em Outubro de 1932, contando com a participação e adesão de intelectuais brasileiros como o historiador Gustavo Barroso e o jurista Miguel Reale.

Através do documento denominado Manifesto de Outubro, o movimento iniciou suas atividades estabelecendo as bases ideológicas do grupo baseado no conservadorismo religioso, na crítica aos partidos políticos e na defesa dos princípios da autoridade e da moral cristã conservadora.

O integralismo brasileiro, defendia um Estado unitário nos moldes do regime fascista com a construção de um Estado Integral de partido único, autoritário e antiliberal. O documento aberto com a expressão “Deus dirige o destino dos povos” colocava a espiritualidade como eixo central de ação integralista e dava ao líder o status de chefe religioso.

Seguindo o modelo do fascismo italiano, o chefe nacional tinha o poder centralizado e não poderia ser contestado. A lógica de superioridade política e religiosa gerou o culto à personalidade de Plínio Salgado que era responsável por orientar, doutrinar, executar tendo poder total e permanente.

É importante ressaltar que antes da AIB, existiram alguns movimentos nacionalistas e conservadores como o Ação Social Brasileira (Partido Nacional Fascista), o movimento neomonárquico Ação Imperial Patrianovista Brasileira durante as décadas de 1920 e 1930 que podem ser denominados como pré-integralistas ou protofascistas.

Estima-se que o movimento integralista chegou a ter 160.000 membros entre 1932 e 1934, configurando o primeiro e maior partido de massa do país. Mas, de acordo com historiadores, havia certa dificuldade em contabilizar os membros apoiadores e, por isso, no final não passaram de 200 mil filiados.

O chefe: Plínio Salgado

O principal idealizador e líder do integralismo brasileiro foi o jornalista Plínio Salgado, que era considerado dentro desses grupos um intelectual conservador. Nascido em 22 de janeiro de 1895 no interior de São Paulo, desde jovem, era proeminente, autodidata, filho de um coronel e farmacêutico com uma professora primária.

Plínio Salgado. Foto: Integralismo Brasileiro.

Aos 35 anos realizou sua primeira viagem a Europa e, em visita a Itália, Plínio Salgado ficou fascinado com o regime fascista italiano. Segundo os historiadores, Plínio recebeu conselhos do Líder italiano que passou a apoiar a AIB no Brasil. Seu primeiro conselho era que Plínio deveria trabalhar as ideias, buscando forjar o sentido de uma nova sociedade e depois formar um partido político.

Plínio já participava de grupos que caracterizavam a ascensão da direita na década de 1930. Mas foi através do jornalismo com a criação do jornal “A Razão” e do grupo de estudos Sociedade de Estudos Políticos (SEP), de discussão de cunho nacionalista, conservador e revolucionário que antecedeu a formação de um novo movimento nos moldes de Mussolini.

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Com o apoio da intelectualidade nacionalista e admiradora do fascismo, Plínio dá inicio ao movimento integralista brasileiro no dia 7 de outubro de 1932. A ligação religiosa com o slogan Deus, Pátria e Família passava a ser um dos principais sustentáculos do integralismo brasileiro.

O segundo líder: Gustavo Barroso

Na adesão do movimento da AIB, alguns personagens importantes da história brasileira se tornaram líderes e figuras fundamentais no desenvolvimento da doutrina do integralismo. Um deles é o historiador Gustavo Barroso.

Gustavo Barroso. Foto: Integralismo.org

Gustavo Barroso se tornou o segundo nome mais importante dentro da AIB, nomeado comandante-geral das milícias e membro do Conselho Superior. É membro da academia de letras e tem mais de 70 obras publicadas. Participou nos círculos autoritários e conservadores como principal representante do antissemitismo brasileiro.

Para ele, os judeus eram os responsáveis pelos problemas econômicos do Brasil e atribuía a eles a degradação da sociedade. Pelas características diversas da sociedade brasileira, defendia a raça brasileira.

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O terceiro: Jurista Miguel Reale

O terceiro nome na hierarquia integralista era Miguel Reale, atual membro da academia de letras. Foi posteriormente reconhecido como o pai do Novo Código Civil Brasileiro de 2003, por ter sido ele responsável pela elaboração da nova codificação.

Foto: Integralismo.org.

Na época, Miguel Reale era um jovem militante que participou do movimento político-militar liderado por Getúlio Vargas, na chamada Revolução Constitucionalista, que culminou no fim da República do Café com Leite.

Para Miguel os verdadeiros inimigos eram o liberalismo e capitalismo transnacional. Seu pensamento refletia o modelo fascista do Estado Integral, com a crença baseada em um governo de partido único, nacionalista com base em uma sociedade hierarquizada.

Essas três lideranças constituíram a tríade do pensamento do movimento integralista brasileiro. Segundo os historiadores Leandro Gonçalves e Odilon Caldeira Neto, os três possuíam suas particularidades, mas “o que os unia, sem dúvida, era o conservadorismo e a atuação política.” (p. 28).

Organização do movimento Ação Integralista Brasileiro (AIB)

A estrutura da AIB era totalmente hierárquica e burocrática, com órgãos a nível nacional até a organizações de bairros. Os cargos eram definidos por Plínio Salgado, que tinha plenos poderes para escolher e destituir as lideranças, além de serem obrigados a jurarem completa submissão ao líder.

Extraído de: O fascismo em camisas verdes [recurso eletrônico: do integralismo ao neointegralismo

A parte mais controversa dessa estrutura foi a formação de uma milícia denominada Forças Integralistas (FI). Uma organização paramilitar sob o comando de Plínio Salgado. Nessa estrutura, todos os jovens integralistas com idades de 16 a 42 anos eram obrigados a inscrever-se e após treinamento jurarem completa submissão e fidelidade aos superiores hierárquicos e a causa integralista.

A milícia deixaria de existir publicamente após o decreto de Lei de Segurança Nacional promulgado em 1935, por Getúlio Vargas com a interdição da milícia e a transformação dessa em em uma associação esportiva. Esse evento se tornaria uma data memorável lembrada no dia 7 de Outubro pelos integralistas como a “Noite dos tambores silenciosos”.

Os negros e indígenas no integralismo brasileiro.

As características culturais de formação da sociedade brasileira, fez com que os integralistas defendesse a miscigenação e a formação da “raça brasileira”. Mas a presença de negros foi condicionada ao reconhecimento da importância desse na construção da nação sem, contudo, abrir mão da supremacia branca.

Já o reconhecimento do indígena fez parte principalmente da ideologia integralista interpretada como a raiz da “alma brasileira”. A utilização parcial da cultura indígena para fundamentar a raça, partia de uma concepção racista do indígena como selvagem e de aculturamento do branco “civilizado”.

Extraído de: O fascismo em camisas verdes [recurso eletrônico: do integralismo ao neointegralismo

O papel da mulher no integralismo brasileiro.

Embora com limitações, as mulheres eram incentivadas a participar do movimento integralista, embora com papéis bem formatados. As profissões estimuladas as mulheres eram aquelas consideradas extensões do lar como enfermeiras, secretárias e carreiras referente à educação.

Veja também: Participação das mulheres na política brasileira!

Plínio Salgado dizia que o trabalho fora do lar e a busca por satisfazer os desejos materiais era a principal causa da destruição das famílias. Por isso exaltava a feminilidade e o papel da maternidade como principal função da mulher, que era a de preparar e educar as futuras gerações da pátria.

Foto: Diário de Pernambuco

Simbolismos, Protocolos e Rituais do Integralismo Brasileiro

A valorização das formalidades exteriores através de protocolos comportamentais era fundamental para doutrinação integralista. A utilização de símbolos e rituais servia para enfatizar a disciplina e a obediência aos chefes e às estruturas autoritárias.

Os rituais e simbologias integralistas colocavam o indivíduo em um ciclo de repetição mística em um processo de disciplinamento social. O modelo de saudações, a forma de andar e de se comportar, as celebrações sociais como casamento ou natal eram reformulados e regulados pelo “Os Protocolos e Rituais da A.I.B.”.

O que mais se destacou foram a utilização de uniformes com camisas verdes (nome pelo qual ficaram conhecidos), e a valorização de canções políticas e rituais. O símbolo escolhido de representação do movimento integralista foi a letra grega sigma — ∑ — que simbolizava a ideia de soma, de Estado único e de integralidade.

No manual contemplava rituais de iniciação de crianças e jovens, a forma de se comportar na sociedade e até a cerimônia dos cortejos fúnebres. O esporte era considerado uma ferramenta fundamental no disciplinamento, assim como as celebrações principais: Vigília da nação, a Noite dos tambores silenciosos e Matinas de abril.

Se cumprimentavam com o braço estendido expressão do ideal nacionalista, saudando com a palavra “Anauê” assimilação do idioma indígena tupi que significava “você é meu parente”. Como nos fascismos europeus, havia uma preocupação com o simbolismo e um forte apelo ao nacionalismo.

Foto: Revista Fórum

Para os historiadores essas características contribuíram para criar um traço de unidade do movimento. A imprensa e propaganda integralistas eram fortemente utilizadas na doutrinação e como uma ação fundamental de arregimentação do movimento.

Seguindo os moldes dos movimentos fascistas europeus, o integralismo brasileiro utilizava a doutrinação missionária, baseada na disciplina, uniformização, rituais e símbolos no intuito de atrair cada vez mais adeptos, através de discursos nacionalistas, uma estética com demonstrações em desfiles nas ruas e a forte organização do grupo.

No entanto, as ações do movimento integralista não demorou muito em revelar sua face violenta. A militarização de seus membros levou os integrantes a vários embates com grupos antifascistas. A frustração política do movimento posterior ao apoio ao Golpe do Estado Novo, levou os camisas-verde, ao revanchismo e ao extremo de um levante armado.

A revolta entre os camisas verdes levou a a preparação de ações armada contra o governo. Uma fase de conspirações, seguida de fracassos, que finalizou com a intentona integralista com a tentativa de assalto a várias instituições, golpe e assassinato de Getúlio Vargas.

A tentativa de golpe frustrada levou vários membros do grupo a morte, a prisão e a clandestinidade. Plínio Salgado foi exilado em Portugal e proibido de retornar durante o período Vargas. Embora desarticulado e na ilegalidade, o integralismo brasileiro não desapareceu. Muitos adeptos mantiveram os ideias integralistas durante todo o exilio do líder.

Posterior ao seu retorno a tentativa de restruturação e articulação do movimento se dará a partir de reorganização através da conformação de um partido político. A renovação dos valores com forte apelo a religiosidade abrirá caminho para o cenário político e a consolidação de uma extrema direita que tentará a todo custo desvencilhar do seu passado fascista sem contudo abrir mão do autoritarismo à moda tupiniquim.

E aí, gostou? Quer entender um pouco mais sobre como o integralismo brasileiro atuou na política brasileira e ainda repercute em nossos dias atuais. Aguarde o próximo texto!

Referências:

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1 comentário em “O que foi o integralismo brasileiro: conheça o movimento de extrema-direita”

  1. Ronaldo Bezerra da Silva

    Quando o Código Civil Brasileiro – Lei 10.406 de 10/JAN/2002 – Foi promulgado, o Prof. Miguel Reale, (era de autor das obras Filosofia do Direito e Introdução à Ciência do Direito e outras) já falecera de há muito tempo. Foi o filho Miguel Reale Junior que participou da sua formatação. Na Câmara dos Deputados, contou com a participação essencial do deputado pernambucano Ricardo Fiuza

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Conteúdo escrito por:
Graduada em Relações Internacionais e licenciada em História. Mestranda em Estudos Contemporâneos da América Latina pela Faculdade de Ciências Sociais no Uruguai (UDELAR) e pela Universidade Complutense de Madrid, (UCM) na Espanha.

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22 abr. 2024

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