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O que é a Lei Orgânica de um município?

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Com o aumento do interesse da população sobre a política, cresce também a curiosidade entre os cidadãos sobre diversos temas que antes eram deixados de lado. Uma pergunta cada vez mais comum é: o que é a Lei Orgânica do município?

Para compreender o que é a Lei Orgânica do município, é preciso entender a própria estrutura do Estado brasileiro. Isso porque, especialmente a partir da Constituição Federal de 1988, o Brasil adotou alguns formatos, a exemplo do republicanismo e a federação.

Federação brasileira e autonomia municipal

Imagem: Freepik.

O primeiro formato que devemos compreender é a República, que se relaciona com a forma de governo adotada. O Brasil optou pelo modelo republicano como modo no qual o poder político é estabelecido. Assim, diferentemente do que acontece em um Estado Monárquico ou Oligárquico, na República esse poder pertence ao povo, exercido direta ou indiretamente, por meio de seus representantes.

Relembre: Monarquia e República: qual a diferença?

O outro modelo mencionado é a federação, ligado à forma de Estado. Das duas opções usualmente escolhidas, Estado Unitário ou Estado Federado, o Brasil optou pela federação, que basicamente significa existir um ente central, a União, e outros descentralizados, por exemplo, os 27 Estados Federados, que gozam de certa autonomia e organização.

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Há uma Constituição da República (usualmente chamada de Constituição Federal), que trata de aspectos tanto da federação quanto especificamente da União, e as Constituições dos Estados, que devem respeitar os limites estabelecidos na Lei Maior, a Constituição Federal.

Esse tipo de federação é o que chamamos de federalismo de segundo grau (a forma mais básica) pois apenas a União e os Estados-federados possuem autonomia política. Bom, aqui começa um ponto importante do nosso debate. 

O Brasil adotou, a partir da Constituição de 1988 , o federalismo de terceiro grau. Nas federações de segundo grau, ainda que exista a presença dos municípios, eles não possuem autonomia política. Nas federações de terceiro grau, como ocorre em nosso país, nos três âmbitos – federal, estadual e municipal – é possível criar leis, organizar os serviços que lhe são próprios e garantir a sua autonomia política.

Dessa maneira, na esfera municipal, não existe uma Constituição, mas sim uma Lei Orgânica, que tem a “aparência” de uma Constituição para o município, já que é a norma própria de maior importância política, mas formalmente considerada simplesmente uma lei.     

Ufa! Acabamos a contextualização. Então, quando pensar em Lei Orgânica de um município, para relembrar do que se trata, você pode comparar – nas suas devidas proporções – com a Constituição Federal para a União e a Constituição Estadual para os estados.

Agora continuamos com algumas questões mais específicas das leis orgânicas.

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Lei orgânica municipal: requisitos e especificidades

Por se tratar de uma lei, ou seja, uma norma jurídica, devemos buscar o fundamento da Lei Orgânica na mais importante de todas elas: a Constituição da República Federativa do Brasil.

Em seu artigo 29, a Constituição Federal estabelece que “o município reger-se-á por Lei Orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição, na Constituição do respectivo estado”. Esse trecho destaca os requisitos formais para a aprovação da Lei Orgânica, bem como os requisitos da lei que busca modificá-la.

Apesar de os municípios terem certa autonomia política, a própria Constituição Federal fixa algumas exigências que devem ser respeitadas pelo legislador na elaboração da Lei Orgânica. Essas exigências acabam por limitar a autonomia municipal, criando assim um padrão nacional para os 5.570 municípios presentes em nosso país. 

Entre esses parâmetros previstos pela Constituição, e que devem ser observado por todos os municípios, estão: o tempo de mandato dos prefeitos (de quatro anos), a quantidade de vereadores por número de eleitores no município, o limite de gasto com remuneração dos vereadores (não mais que 5% da renda do município) e o julgamento do prefeito pelo Tribunal de Justiça.

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Importância democrática da lei orgânica

Em síntese, as leis orgânicas dos municípios são normas que regulam a vida política na cidade, sempre respeitando a Constituição Federal e a Constituição do Estado em que o município está inserido, sendo um importante instrumento para forçar o poder público a assumir obrigações de interesse local em favor da população.

O espaço para inovações na legislação não é muito amplo, haja vista a existência de barreiras previstas na legislação federal e estadual a serem observadas, mas ainda assim é considerado um avanço democrático a sua existência, já que antes da Constituição de 1988 havia uma restrição maior à autonomia municipal.

Participação popular na lei orgânica

Talvez você esteja se perguntando: é possível modificar a Lei Orgânica da minha cidade? A resposta é SIM! A própria Constituição Federal, por meio do artigo 29, garante a participação popular no processo legislativo municipal.

Conforme o texto constitucional, é possível propor e modificar leis, o que inclui a Lei Orgânica, desde que pelo menos 5% dos eleitores do município manifestem-se, reunindo assinaturas, em favor de um projeto de lei. A Câmara Municipal deverá receber o projeto de autoria popular, processar e votar.

Como exemplo, na cidade de Formiga, no interior de Minas Gerais, um projeto de iniciativa popular alterou a Lei Orgânica do município. Os parlamentares haviam aprovado um aumento de 10 para 15 vereadores. Contrária ao acréscimo, a população recolheu 6.355 assinaturas das 2.623 assinaturas necessárias. A proposta de iniciativa popular foi recebida e aprovada pelos parlamentares, o que fez a Câmara Municipal de Formiga voltar a ter 10 vereadores.

Outra notícia boa é sobre a possibilidade de propor projetos de leis e coletar assinaturas de apoio com a ajuda da tecnologia. Como exemplo, existe a plataforma Mudamos, que busca auxiliar os cidadãos através de uma participação mais ativa no processo de elaboração das leis. 

Enfim, a Lei Orgânica é uma forma de regular a autonomia de cada município e, através dela, podemos  alterar uma lei que nos afeta diretamente, desde que seja de interesse público dos moradores da cidade.

E aí, conseguiu entender o que é a Lei Orgânica de um município? Já conhecia essa lei? Comenta aí! E não esqueça de deixar suas dúvidas e sugestões nos comentários!

Referências:
  • BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 23 ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2008.
  • BRASIL. Presidência da República. Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm. Acesso em: 26 set. 2018.
  • CÂMARA, Miguel. PEC Popular: Reflexões sobre a efetivação da democracia participativa no Brasil. João Pessoa: Ideia, 2016.
  • CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição. 7 ed. Coimbra: Almedina, 2003.

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2 comentários em “O que é a Lei Orgânica de um município?”

  1. Texto esclarecedor, mas continuo com uma dúvida cruel.. Por que os Municípios e o Distrito Federal não tem Constituição e sim uma normativa que em uma análise ampla é vista como uma lei mas dentro do município é vista como constituição? Seria para delimitar mais o poder do município? mas e como ficaria o federalismo de terceiro grau?
    O caso fica ainda pior quando olhamos pensamos no Distrito Federal que exerce função de estado e município mas é regido por uma lei orgânica e não uma constituição… No parágrafo primeiro do artigo 25 lê-se que compete aos Estados oque não foi vedado a ele ,ou seja, oque sobrou das competências da União e no artigo 30 existem 9 incisos que delimitam claramente as competências do município.. Dessa forma o município teria seu poder mais delimitado que os outros entes da federação? Estou começando meus estudos jurídicas e apreciaria muito a solução da minha dúvida inicial.

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Conteúdo escrito por:
Redator voluntário do Politize! Nordestino, advogado e servidor público federal, é formado em Direito pela UFPB, onde despertou o interesse por pesquisar e publicar trabalhos acadêmicos na área de Constituição e Democracia.

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26 abr. 2024

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