Lixo radioativo. Imagem: Adobe Stock

O “brilho que fere”: entenda sobre o lixo radioativo

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Lixo radioativo. Imagem: Adobe Stock.
Lixo radioativo. Imagem: Adobe Stock.

Se você já viu “De volta para o futuro” (1985), com certeza vai se lembrar do elemento que o Dr. Brown utiliza para abastecer o DeLorean. No filme, o plutônio, que é um elemento bastante potente, é capaz de produzir energia suficiente para “viajar no tempo”. Nesse texto você aprenderá mais sobre o que pode acontecer na vida real, quando elementos com alta radiação (como o plutônio), são convertidos em lixo radioativo e descartados de maneira incorreta!

Você sabe, por exemplo, quais são as atividades que geram o lixo radioativo? Que o raio-x realizado em centros médicos todo ano tem como fonte de energia um elemento nuclear? Ou que o maior acidente radiológico aconteceu em solo brasileiro? Pois é, aqui você vai descobrir mais informações sobre o assunto.

Como o lixo radioativo é produzido?

São três atividades principais que geram o lixo radioativo ou lixo nuclear:

1) Laboratórios de exames clínicos: são gerados os resíduos radioativos hospitalares (que possuem radionuclídeos em quantidades maiores aos limites de isenção por órgãos competentes). Nesse caso, os aparelhos usam da energia radioativa para realizar suas funções. Os principais são instrumentos de exames médicos, como máquinas de raio-x e máquinas utilizadas para o combate do câncer, as de radioterapia.

2) Usinas nucleares: utilizam elementos radioativos para produzir energia, sendo o principal deles, nesse caso, o urânio. No processo para gerar eletricidade, o núcleo do átomo do urânio sofre uma quebra (chamada de fissão) e é desintegrado. Nesse momento, ocorre a liberação de resíduos radioativos, e podem transformar parte do urânio em outros elementos, como plutônio, césio, estrôncio e outros.

A energia liberada na fissão aquece um líquido, gerando vapor (quando está em alta pressão), movimenta as turbinas, que por sua vez movem um gerador de eletricidade. Após o aproveitamento da energia do elemento, o material que sobra da reação química deve ser armazenado em locais próprios e específicos.

3) Bombas nucleares: que já tiveram no passado um momento maior de ascensão em sua produção. A maioria dos processos que remetem a fabricação, manutenção e outra atividade com contato direto no procedimento de origem das armas e de bombas nucleares, geram resíduos radioativos.

Leia também: Armas nucleares: qual é o seu papel em conflitos políticos?

Quais os níveis de lixos radioativos que existem?

A partir da divisão do nível de radioatividade dos lixos, se faz um descarte adequado a cada tipo. São classificados em três níveis:

Lixo de baixa radioatividade: qualquer produto que tenha tido contato com material radioativo, como ferramentas, roupas de proteção, luvas, sapatilhas e material de laboratório. O seu descarte é em latas sem blindagem especial, guardadas em depósitos temporários, na maioria das vezes, em locais próximos de onde o lixo é produzido. Após, guardados em locais subterrâneos.

Lixo de média radioatividade: já aqui são compostos de filtros, recipientes usados de combustível nuclear, peças de reator e rejeitos químicos dos processos de mineração e enriquecimento de urânio. Geralmente, é guardado nos mesmos depósitos que o lixo de baixo nível, porém é necessário que seja descartado dentro de tambores blindados de concreto.

Lixo de alta radioatividade: esses produtos são os mais perigosos, é necessário um cuidado extremo. Entram nessa categoria: pastilhas gastas de urânio, usadas como combustível de reatores, e rejeitos líquidos oriundos da extração de plutônio para fabricação de bombas nucleares.

São colocados em piscinas de resfriamento próximos aos reatores das usinas, depois devem ficar isolados cercados com barreiras de aço, concreto e chumbo, por tempo indeterminado.

Qual o descarte correto?

De modo geral, é sempre bom lembrar que lixos radioativos devem ser colocados em embalagens específicas com alta durabilidade, já que a radioatividade pode chegar a durar até 24 mil anos, como é o caso do plutônio. Para uma melhor explicação, esses elementos são analisados pelo tempo através da “meia-vida”, por exemplo, o césio e o estrôncio possuem meia-vida por volta dos 30 anos.

E o que isso significa? Quer dizer que, quando passar os 30 anos, a radiação que eles emitem vai ser reduzida pela metade (os elementos radioativos, citados neste parágrafo, são criados a partir dos rompimentos dos átomos do urânio durante a fissão nuclear).

Por causa das vidas tão longas dos elementos radioativos, é mais do que necessário que se pense na construção de depósitos sem que a manutenção dependa de vida humana para funcionar, e também em locais que não sejam afetados pelos possíveis abalos sísmicos (terremotos, tsunamis, qualquer atividade que poderia corromper a estrutura) que a Terra possa sofrer no futuro.

Nenhum país no mundo tem uma estrutura semelhante. O país que está cada vez mais próximo disso é a Finlândia. Batizado de Onkalo, o primeiro depósito permanente de lixo nuclear do mundo está ainda em construção, e dentro das suas promessas: previsão de durar 100 mil anos e rede de túneis com 35 quilômetros de extensão.

Um caso concreto de erro no descarte do lixo radioativo: “O brilho da morte”

Conhecido como o maior acidente radiológico do mundo, o acidente com Césio-137 foi em terras brasileiras, em Goiânia, capital do Estado de Goiás. Em setembro de 1987, catadores de sucata encontraram um aparelho de radioterapia abandonado em um terreno, que antes era localizado em uma das unidades do Instituto Goiano de Radioterapia.

Os catadores levaram pedaços da máquina para casa, com o fim de vender os pedaços, assim desmontaram e venderam as peças para um ferro-velho. No desmonte mais profundo das peças, os funcionários do estabelecimento encontram a cápsula com 19g de césio (fonte de energia da máquina).

A qual, com a luz do dia era branca e com menos luz, ficava com um brilho verde azulado. Por chamar muito a atenção o dono do local, levou a cápsula para a sua casa para mostrá-la a sua família e amigos, sem imaginar que aquilo era extremamente perigoso.

Logo, todos que tiveram algum tipo de contato com o material acabaram adquirindo alguma doença ou mal-estar, de acordo com o nível de contato que a vítima teve. Um dos casos fatais foi a filha de 7 anos do dono do ferro-velho, Leide das Neves Ferreira, que ingeriu um alimento sem lavar as mãos após estar contaminada com o Césio-137.

Desde o momento que a cápsula foi aberta, apenas 16 dias depois foi iniciado um plano de emergência liderado pela Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) com o nome de Operação Césio-137.

Toda a tragédia foi decorrente de um descuido na fiscalização do lixo radioativo do Instituto, e as suas consequências são vistas até hoje, as vítimas sofrem com doenças como hipertensão, câncer… após o incidente, quatro pessoas vieram a óbito por causa da Síndrome Cutânea Aguda.

Se você ficou interessado pelo caso, há um documentário disponível no Youtube que se chama O brilho da morte: 30 anos do Césio-137”, onde é contado a história do acidente através de entrevistas e falas dos sobreviventes.

E o que o lixo radioativo pode impactar na sociedade e no meio ambiente?

Como mostrado no caso do Césio-137 em Goiânia, o lixo radioativo pode causar o desenvolvimento de variadas doenças. Isso porque, quando a radiação entra em contato com o organismo de seres humanos, desencadeia a criação de radicais livres. Que por sua vez, em grandes quantidades, matam as células saudáveis causando alterações graves no organismo gerando: câncer, anemia; catarata; leucemia; infecções; hemorragia; problemas circulatórios e problemas respiratórios.

Assim como é prejudicial aos seres humanos, também é ao ecossistema. O resíduo gerado é tóxico e contamina a fauna e flora de um ambiente. Os impactos ambientais vão desde contaminação das águas e da atmosfera, até danos permanentes nos animais que vivem naquele local.

Por isso, é muito importante que as áreas afetadas por lixos nucleares sejam isoladas e, preferencialmente, que os botijões sejam guardados em locais subterrâneos, para que o impacto seja mínimo.

Veja também nosso vídeo sobre ecocapitalismo!

E o Brasil em relação ao tema?

No Brasil, em questões de geração de energia nuclear, temos apenas duas usinas em operação: Angra I e Angra II, ambas estão localizadas na cidade de Angra dos Reis, no estado do Rio de Janeiro. Uma reportagem do O Globo de 2014 afirmou sobre a saturação dos depósitos de rejeitos radioativos das usinas.

Em 2020, através dos dados trazidos da Agência Brasil, houve a tentativa da Eletronuclear (braço da Eletrobras, dona das Usinas) de transferir os rejeitos para a Unidade de Armazenamento Complementar a Seco para Combustíveis Irradiados (UAS), que ainda estava em construção.

O pedido foi negado pela Justiça Federal em outubro de 2020, alegando que não havia licenciamento ambiental adequado. Segundo uma matéria publicada no Jornal da USP, a geração anual média de rejeitos das usinas é no total 1.390 tambores e de 400 litros. As piscinas para armazenar o combustível queimado tinham capacidade até 2021 (OKUNO, Emico; 2019).

Em 2022, abriu-se o aval para a transferência de combustíveis usados da Angra I para a UAS, localizada na central nuclear de Angra dos Reis.

Leia também: Questão nuclear: o que o mundo tem a dizer sobre isso?

Inclusive, já houve outra usina brasileira que gerava resíduos nucleares, mas nesse caso, era a partir do tratamento químico da monazita, uma areia que quando purificada se torna terra rara (são essas últimas que auxiliam na fabricação de matérias para ressonâncias, imãs e sensores nucleares).

Era a empresa Nuclemon, ou Usina de Santo Amaro, que foi desativada em 1990 depois de funcionar por mais de 50 anos na região de Interlagos, em São Paulo. O que ainda é discutido até os dias de hoje são os resíduos gerados quando ela estava em operação, que ficaram guardados com um descarte incorreto, sem segurança eficaz e em locais com prédios e moradias próximas.

Segundo uma notícia da Revista Exame, existem ainda 1.179 toneladas de rejeitos radioativos, guardados em velhos galpões na zona sul da capital. Nas quais, 590 toneladas são do material “Torta II”, que segundo a matéria “ é um rejeito extraído no tratamento químico da monazita, um fosfato que combina metais pesados de terras raras, urânio e tório”.

Até o momento, agentes municipais e autoridades públicas não conseguiram entrar em um consenso no futuro destino destes rejeitos, já que ninguém quer assumir a responsabilidade de algo nocivo à saúde humana.

Leia também: E se o Brasil desenvolvesse armamento nuclear?

Próximos passos, qual o futuro do lixo radioativo?

A ascensão de pautas – dentro de altos órgãos governamentais, organizações internacionais e grandes corporações – como fontes energéticas renováveis e agendas em prol do meio ambiente, mostram um futuro esperançoso para a sociedade.

Veja também nosso vídeo sobre saúde e meio ambiente!

No caso do Brasil, podemos mostrar que há prospecção de novas usinas para acompanhar a Angra I e II, a construção da Angra III já está acontecendo e o planejamento é de entrar em operação no ano de 2031. Ademais, o governo prevê a construção de mais uma Usina, na região Sudeste e Centro-Oeste do país (Globo, 2021).

O que acontecerá com o lixo gerado a partir das novas usinas nucleares brasileiras? E a de outros países que também lutam por novos locais para despejar os resíduos? Você acredita que se um descarte perfeito for criado será o fim de todos os problemas?

Deixe nos comentários, queremos saber a sua opinião sobre a questão do lixo radioativo!

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Conteúdo escrito por:
Formada em Relações Internacionais pela PUC-SP, com interesse pelas temáticas de justiça ambiental, direitos humanos e setor cultural brasileiro. Acredita que através da difusão de conhecimento é possível impactar positivamente indivíduos, e consequentemente, a sociedade.

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