O que é projeto de país? Conceito e importância

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Projeto de país. Imagem: Freepik.
Projeto de país. Imagem: Freepik.

Você já ouviu falar em “projeto de país”? Em época de eleições presidenciais costumamos ouvir mais esta expressão, em razão da apresentação dos programas de governo dos candidatos à presidência. Contudo, este é um tema que precisa ser lembrado e discutido pela sociedade no cotidiano da política e não só durante o período eleitoral, pois ele é essencial para o país e impacta as nossas vidas para além das eleições.

Mas o que é, afinal? Será que o Brasil tem um projeto? Neste artigo, vamos falar sobre projeto de país, sua importância, contexto histórico brasileiro, condições para sua construção e execução.

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Conceito e importância do projeto de país

De acordo com o Ministério da Infraestrutura[1], o Project Management Body of Knowledge (PMBOK) define projeto como “um esforço temporário empreendido para criar um produto, serviço ou resultado exclusivo”. Ou seja, um projeto é tudo aquilo que precisa ser feito para criar algo.

Dessa forma, um projeto de país é um plano com um conjunto de diretrizes e ações visando o progresso deste. O projeto é essencial para o desenvolvimento e o planejamento estratégico de um país, posto que para crescer e atingir resultados é preciso saber aonde se quer chegar, o que se quer criar.

Nesse sentido, é de extrema importância que um país tenha um projeto para se desenvolver plena e organizadamente. Mas para entender melhor o que é esse projeto e como ele se dá, temos que revisitar a história do país.

Assim, vamos resgatar brevemente o contexto histórico de formação do Estado brasileiro.

Contexto histórico do Brasil

O Brasil é um país de contradições e sua história comprova isso a todo momento. Lilia M. Schwarcz e Heloisa M. Starling, apontam que o Brasil se desenvolveu “a partir de ambivalências e contrastes”, sendo atualmente um país marcado por grandes “gaps sociais”, mas que também possui um dos sistemas de aferição de votos mais “modernos e confiáveis” do mundo.

Ao mesmo tempo que o país aparece na 10ª posição na lista das maiores economias[2] do mundo, apresenta uma extensa desigualdade social, estando também entre os dez mais desiguais do mundo. E assim se seguem as contradições…

Como já disse o sociólogo Caio Prado Jr, para compreender o Brasil contemporâneo precisamos ir às suas origens no período colonial. Nesse sentido, o sociólogo remonta ao início do século XIX como um importante período para o desenvolvimento brasileiro com “a transferência da sede da Monarquia portuguesa para o Brasil e os atos preparatórios para a emancipação política do país”, o que foi decisivo para a evolução do país e iniciou uma nova fase nos terrenos social, político e econômico.

Para ele, este é um período “chave” para a compreensão do Brasil contemporâneo. Segundo Prado Jr, o Brasil ainda possui elementos do passado colonial, posto que na economia há uma extensiva produção para os mercados do exterior, e no terreno social as relações sociais brasileiras, sobretudo as de classe, ainda conservam um “acentuado cunho colonial”.

Nesse sentido, o autor afirma que muitos dos problemas enfrentados pelo país atualmente são consequência direta do passado colonial e que somente a partir da solução destes é que se conseguirá solucionar tantos outros problemas também.

Assim, Prado Jr relembra que “o sentido da colonização brasileira” é o de uma colônia para fornecimento de gêneros tropicais ou minerais de grande importância para a Europa, tendo a economia brasileira se subordinado inteiramente a este propósito. Na agricultura, por exemplo, o autor ressalta que o elemento fundamental foi a grande propriedade monocultural trabalhada por pessoas escravizadas.

Este tipo de colonização se difere das colônias de clima temperado, como a dos Estados Unidos, que se caracterizaram pela pequena exploração do tipo camponês. Assim, no Brasil não se tem a figura do colonizador “trabalhador, o simples povoador”, mas sim “o explorador, o empresário de um grande negócio”, que somente se interessaria por um empreendimento de vulto. De acordo com o sociólogo, grandes áreas de terras foram concedidas aos colonos no Brasil.

Assim, a grande propriedade e a grande exploração são uma das características mais marcantes da organização econômica da colônia, o que, segundo o autor, trouxe consequências diversas e de toda ordem.

Para ele, a origem da concentração extrema da riqueza que caracteriza a economia da colônia está neste sistema de organização do trabalho e da propriedade. Desse modo, Prado Jr afirma que de todo esse cenário resultou a consequência, que para ele talvez seja a mais grave, que foi a forma como se deu a evolução econômica da colônia.

Segundo Prado Jr, foi uma “evolução cíclica”, com sucessivas fases de “prosperidade estritamente localizadas”, seguidas logo após de fases de decadência, padrão que se observa até a atualidade.

Para o autor, no conjunto, a colônia nunca teve uma organização econômica sólida e os esforços eram somente para manutenção do estritamente necessário, resultando no baixo padrão de vida da população em geral. A esse cenário, Prado Jr. acrescenta que com uma economia voltada para a satisfação das necessidades do mercado europeu e a influência político-institucional da coroa portuguesa, portanto, eurocêntrica, surgiu no Brasil uma burguesia com características particulares, num contexto capitalista igualmente peculiar.

O também sociólogo Florestan Fernandes (2006), traz que as representações ideais da burguesia brasileira se encerravam nela mesma, numa falsa consciência, agindo em essência de forma predominantemente “reacionária e ultraconservadora”, seguindo a tradição do mandonismo oligárquico. Para o autor, a burguesia brasileira nunca agia para empolgar os destinos da nação como um todo” (FERNANDES, 2006).

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Segundo Fernandes, a burguesia brasileira foi ganhando ao longo do tempo um maior controle interno da economia do país e uma maior liberdade na definição de uma política econômica para acelerar o desenvolvimento capitalista no Brasil. Contudo, ele pontua que este avanço não tornou o país independente. Persistiram as relações de dependência e dominação externa na economia, assim como em outras nações também tomadas como periféricas.

Fernandes acrescenta que o desenvolvimento capitalista brasileiro se deu com base em comportamentos “egoísticos e particularistas” por parte da burguesia, o que permitiu a continuação da dominação imperialista externa, bem como a constante exclusão da maioria da população. Isto posto, tem-se que “dependência e subdesenvolvimento” não foram impostos somente por nações dominantes, mas também pelas classes dominantes brasileiras, que optaram pelo capitalismo dependente como “realidade econômica e humana”.

Ademais, Fernandes reforça dizendo que o progresso do país não foi o objetivo central do desenvolvimento capitalista no Brasil, mas sim os “interesses egoísticos particulares” da burguesia, que se fundiam com os propósitos econômicos e extraeconômicos da dominação imperialista externa. E foi neste caminho, encerrado em exclusão e sem um projeto de país, que o Brasil se desenvolveu social e economicamente.

Condições para sua construção e execução

Como se pode ver, contextos políticos e correntes ideológicas influenciam diretamente na construção do projeto de país. Assim, um projeto pode ser guiado por ideais políticos de esquerda ou de direita.

No entanto, em geral, as classes dominantes ditam as diretrizes para as ações de governo de acordo com os seus interesses particulares, sobretudo no campo da economia, como ocorreu no Brasil ao longo de sua história. E é nesse sentido que se afirma que não há no país propriamente um projeto de país.

Antônio Delfim Netto, economista e ex-ministro dos governos militares[3], fez um apelo numa coluna de jornal: “UM PROJETO DE PAÍS, POR FAVOR”. Para ele, não há um projeto de país no Brasil, mas acredita que num sistema democrático é possível, por meio do consenso, “discutir e deliberar de maneira minimamente honesta e racional sobre o que os indivíduos supõem ser o melhor para a sociedade que habitam”.

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Delfim Netto afirma que nas eleições presidenciais de 2022 os candidatos devem cumprir “a missão de apresentar ao Brasil um projeto de desenvolvimento com começo, meio e fim, sem generalidades” a fim de reverter a dinâmica de baixo crescimento do país. O ex-ministro afirma, ainda, que a tarefa “não é trivial, e o sucesso, incerto”, e vai requerer “o convencimento da sociedade e o bom funcionamento da relação entre o Executivo, o Legislativo, e o Judiciário”.

Olívia Carolino e Rodrigo Suñe[4]do Instituto Tricontinental de Pesquisa Social, afirmam que a América Latina, como o Brasil, apresentam peculiaridades na questão das formações nacionais se constituindo numa “trincheira crucial na disputa entre a direita e os que buscam alternativas humanizadoras” e que os povos latino-americanos aspiram entrar na história “como protagonistas da construção nacional e da contrarrevolução da ofensiva neoliberal”, disputando “os rumos do processo que combina luta institucional, luta ideológica e luta de massas”.

Nesse sentido, para Carolino e Suñe, diante das recentes manifestações populares no continente, os povos latino-americanos apontam para a “necessidade da construção de um projeto de país que resolva os problemas da vida do povo e, ao mesmo tempo, faça a mediação com as questões estruturais da nossa formação social e econômica”.

Também para o cientista político Luiz Felipe D’Ávila[5], um dos problemas do Brasil é a ausência de um projeto de país. Segundo D’Ávila, existem apenas “projetos de poder”, prevalecendo interesses imediatistas sobre os interesses nacionais, o que arruina “a esperança no futuro, a confiança nas instituições e a credibilidade do sistema politico”.

Assim, é preciso combater individualismos e instabilidades nos governos. O cientista político afirma que “em momentos de polarização e de tensão, o País precisa de líderes capazes de construir pontes”. Nesse sentido, ele traz que a eleição de 2022 deverá ser pautada pela “capacidade de unir a Nação em torno de um projeto de País” e que esta será vencida “pela construção de alianças em torno de propostas concretas para fazer o Brasil voltar a crescer, prosperar, gerar empregos e combater as desigualdades sociais”. Para D’Ávila, esta é uma “oportunidade única” para exercitar “a capacidade de construir pontes entre a sociedade civil, o Congresso e o governo em torno de uma agenda para o País”.

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Já para Eduardo Fernandez Silva[6], ex-diretor da Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados, não basta haver um “projeto de país”. Segundo Silva, os “programas de governo” apresentados pelos candidatos nas eleições “não inspiram e não são seguidos”, sendo os seus compromissos, comumente, desconhecidos da população.

O ex-diretor afirma que é necessário que o projeto de país seja construído “mediante um amplo debate que leve a congregar apoios”, com isso, ele deve conter “objetivos críveis”, que “melhorem a qualidade de vida da maioria, principalmente dos mais carentes”. Assim, o projeto deve ser “correto” para o povo. Por exemplo, não seria “correta” a proposta de “retomar o crescimento”, já que poderia acontecer de “a economia ir bem e o povo, mal”.

Silva aponta ainda que os objetivos do projeto de país também devem ser alcançáveis. Nesse sentido, não seria factível, por exemplo, melhorar a qualidade de vida da população no prazo de um mandato presidencial. Por outro lado, promessas de longo prazo também não motivariam os eleitores. Assim, os objetivos alcançáveis em um mandato devem ser bem expressos pelas lideranças para cativar os brasileiros. Para o ex-diretor, “um desses objetivos deve ser superar a polarização atual, unir a população” em torno de projetos concretos e claros.

Assim, para se construir e executar um projeto de país é preciso que este tenha instituições fortalecidas, Poderes harmônicos entre si, consenso social e uma democracia solidificada. Além disso, os objetivos do projeto devem ser atingíveis.

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Afinal, o Brasil tem um projeto de país?

Diante do exposto, seja qual for o espectro ideológico, vê-se que há uma concordância de que o Brasil não tem um projeto de país e que este deve superar a polarização política e ser construído a partir de um consenso social, buscando o desenvolvimento do país com qualidade de vida para a população.

Lembrando que, sendo o povo quem escolhe seus governantes, é o povo quem escolhe o projeto de país também. Por isso, é de extrema importância que nas eleições os eleitores olhem para os projetos apresentados pelos candidatos em seus programas de governo e escolham aquele que esteja em sintonia com seus ideais, bem como com o bem-estar do povo.

E aí?! Ficou mais claro para você o que é um projeto de país e o papel da população na construção deste? Deixe aqui pra gente nos comentários.

Referências

[1] Ministério da Infraestrutura. Definição de Projeto. Acesso em: 27/06/2022.

[2] CNN Brasil. Com dado do 1º tri, Brasil fica em 9º lugar em crescimento do PIB em ranking com 32 países. Acesso em: 27/06/2022.

[3] Agência Sindical. UM PROJETO DE PAÍS, POR FAVOR – DELFIM NETO. Acesso em: 27/06/2022.

[4] Brasil de Fato. 130 anos de República e um país que insiste em nascer. Acesso em: 27/06/2022.

[5] Estadão. Projeto de País. Acesso em: 27/06/2022.

[6] Estadão. Brasil: qual o projeto de país? Acesso em: 27/06/2022.

  • FERNANDES, Florestan. A revolução burguesa no Brasil: ensaio de interpretação sociológica. 5 ed. Globo: São Paulo, 2006.
  • PRADO JR, Caio. Formação do Brasil contemporâneo (colônia). 6 ed. Brasiliense: Brasília, 1961.
  • SCHWARCZ, Lilia Moritz; STARLING, Heloisa Murgel. Brasil: uma biografia. São Paulo: Companhia das Letras, 2015.

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Conteúdo escrito por:
Baiana de Salvador, mas uma cidadã do mundo! Graduada em Direito e Serviço Social, mestre em Política Social e doutoranda em Ciências da Sustentabilidade. Ama arte, política e estudos sobre desigualdade social e desenvolvimento sustentável. <3

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