CID: entenda a Cooperação Internacional para o Desenvolvimento

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Prédio das Nações Unidas, em Nova York, no dia 22 de setembro de 2015, com os objetivos de desenvolvimento estampados e as bandeiras dos 193 países que acordaram consensualmente com eles (Foto: André Amaral | Wikimedia).

Você já ouviu falar de um projeto de uma ONG importante em sua comunidade? Já viu algum projeto que tivesse como foco a proteção de grupos vulneráveis ou o aumento da renda de uma determinada população? Ou então um projeto cujo objetivo seja preservar uma determinada área, ou até mesmo integrar imigrantes e refugiados em sua cidade? Pois bem, todas essas ações podem ser um produto ou podem estar recebendo incentivos da chamada Cooperação Internacional para o Desenvolvimento (CID).

De ajuda internacional à construção de parcerias, a evolução da (CID) reflete também uma luta para melhores condições de vida em todo o mundo. Com seus discursos, práticas, debates, agenda e atores envolvidos, a CID representa uma estrutura de atividades importantes. Ela atua na luta contra a pobreza, pela independência política e econômica dos Estados, contra alterações climáticas e pela proteção do meio ambiente, assim como no combate às violações de Direitos Humanos. Neste texto, vamos descobrir um pouco mais sobre a CID, seus principais conceitos, teorias, debates e atores envolvidos. Vamos nessa?

O QUE É A CID?

A CID representa o conjunto de ações promovidas por atores internacionais para gerar desenvolvimento sustentável, justo e inclusivo. Esses atores podem ser tanto entes públicos quanto privados. Como exemplos têm-se Estados Nacionais, organizações internacionais, organizações da sociedade civil, associações privadas, entre outros.

COMO A CID FUNCIONA NA PRÁTICA?

Deve-se ter em mente que a aplicação da CID se dá a partir de projetos e programas de desenvolvimento. Em geral, a coordenação de esforços dos atores da CID são para financiamento, articulação, concepção, execução, avaliação, monitoramento e prestação de contas de projetos e programas.

Em termos oficiais, considerando o Estado como ator formulador e financiador da cooperação, pode-se diferenciar:

O presidente Michel Temer participa da abertura da 10ª Cúpula do Brics (Foto: Cesar Itiberê | Agência Brasil).

Cooperação financeira:

Doação de dinheiro ou concessão de empréstimos por parte de organismos internacionais, bancos multilaterais e regionais, ou bancos e agências de desenvolvimento de países doadores.

Ajuda externa:

O Estado envia recursos financeiros a projetos e programas, independentemente do ator a receber o recurso (Estado nacional, organização da sociedade civil, municípios, associações privadas, entre outros).

Ajuda Bilateral ou Ajuda Oficial ao Desenvolvimento (AOD):

O Estado envia recursos financeiros diretamente a governos nacionais ou instituições multilaterais para a execução de projetos e programas.

Ajuda multilateral

Envio de recursos por parte de organizações internacionais, bancos regionais ou multilaterais a governos nacionais para a execução de projetos e programas. Outras instituições financeiras internacionais também podem realizar esse envio de recursos.

Cooperação técnica:

Compartilhamento de conhecimentos, experiências e boas práticas entre governos nacionais, podendo ter a participação de organizações internacionais na aplicação dos projetos.

Nota-se que os recursos enviados, sejam financeiros ou técnicos, não devem servir para financiar interesses comerciais ou políticos, como financiamento de atividades de partidos.

Líderes mundiais participam da Cúpula do G20 em Hamburgo (Foto: Beto Barata | CID).

COMO SURGIU A CID?

No Sistema Internacional, o desenvolvimento histórico da CID se deu primeiramente com a interação entre os países. Em seguida, foi acompanhado diretamente pelo processo de legitimação das relações multilaterais – dadas pelas associações de vários países – por meio do desenvolvimento de importantes Organizações Internacionais. Dentre elas se destacam as seguintes:

Além dessas organizações, alguns fóruns multilaterais – que são ambientes de discussão entre mais de três Estados – desempenharam papéis fundamentais. Aqui se destacam os seguintes:

  • o Movimento dos Não-Alinhados;
  • os diversos ‘Gs’: G-7, G-20, G-77; e
  • diferentes organizações de integração regional como a União Europeia, o Mercado comum do Sul (Mercosul), a União Africana, a Associação de Nações do Sudeste Asiático (ASEAN), entre outras.

A CID é dividida em duas modalidades: a Cooperação Norte-Sul (CNS) e a Cooperação Sul-Sul (CSS). Essa divisão reflete a existência de dois dos principais debates teóricos e práticos sobre qual é a melhor forma de cooperar.

COOPERAÇÃO INTERNACIONAL E OS CONCEITOS NECESSÁRIOS PARA ENTENDÊ-LA

Para entender a dinâmica da Cooperação Internacional para o Desenvolvimento, é necessário entender as divisões e classificações elaboradas pelos atores internacionais – que são Estados e organizações internacionais – ao longo dos anos. Com base na definição de desenvolvimento – que é um tanto subjetiva e leva em consideração fatores como o PIB da nação –, diferentes organizações classificam os países. Essa classificação é feita conforme os níveis de desenvolvimento – ou o status – em que cada um dos Estados se encontra. Ao mesmo tempo, diferentes ideias de cooperação levaram a diferentes formas de atuação em cada um dos países. Não entendeu? Adiante a gente explica.

As diferentes formas de classificar os países

No período da Guerra Fria (1947-1991), o mundo era dividido entre países de Primeiro, Segundo e Terceiro Mundo. O Primeiro Mundo seria o mundo capitalista, identificado principalmente pelos países hegemônicos – ou seja, com mais poder no cenário internacional – e considerados “desenvolvidos”. Esses Estados eram os localizados na América do Norte e na Europa Ocidental, incluindo também o Japão e a Austrália.

Já o Segundo Mundo seria constituído pelos países socialistas. Aqui entravam tanto aqueles que faziam parte da União Soviética quanto aqueles independentemente socialistas. São exemplos desses últimos China, Coreia do Norte, Cuba, Vietnã, a antiga Iugoslávia e outros países do Leste Europeu, como a Polônia.

Por sua vez, o Terceiro Mundo incluía os países considerados “subdesenvolvidos” e em desenvolvimento (ou emergentes). Assim, faziam parte do Terceiro Mundo os países da América Latina, Ásia e África. Outra ideia que andava junto com a classificação de Terceiro Mundo era a de “neutralidade” e dos chamados Não-Alinhados. Esses seriam os países que não se posicionavam em relação às disputas entre capitalismo e socialismo.

Com o fim da Guerra Fria, da União Soviética e do modelo comunista até então existente, deixou-se de usar o termo Segundo Mundo e, sucessivamente, Primeiro e Terceiro. Hoje, duas terminologias concorrem no campo da CID:

  • Centro, Semiperiferia e Periferia. No “Centro” constam os países desenvolvidos, na semiperiferia os “emergentes”, e na periferia os “subdesenvolvidos”;
  • Países do Norte – países desenvolvidos – e Países do Sul – inclui nações subdesenvolvidas e emergentes industrializadas.

Essa última classificação é a mais utilizada pelos atores da CID atualmente, inclusive para distinguir as modalidades da Cooperação: Cooperação Norte-Sul; Cooperação Sul-Sul; Cooperação Triangular ou Trilateral.

Presidente Michel Temer faz o discurso de abertura da 72ª Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (Foto: Beto Barata/PR | Agência)

Como era visto o desenvolvimento no início da CID?

Nos primeiros anos da CID, desenvolvimento significava crescimento econômico. Além da classificação dos países por regiões geoeconômicas e geopolíticas, os primeiros anos da CID – as décadas de 1950 e 1960 – deram início a importantes discussões sobre o significado de desenvolvimento e como ele era medido. Nesse sentido, a variação anual do Produto Interno Bruto (PIB) e outros indicadores derivados dele – como o PIB per capita e o Produto Nacional Bruto (PNB) – passaram a ser utilizadas para medir o crescimento econômico dos países. O Banco Mundial, por exemplo, publica relatórios sobre o tamanho das economias baseados no PIB per capita.

Nessas primeiras décadas foram realizados diversos diagnósticos sobre os países. Esperava-se identificar as principais necessidades para que eles atingissem um crescimento econômico significativo. Tais diagnósticos influenciaram investimentos na “industrialização” dos países, tida na época como uma verdade necessária ao desenvolvimento. Os principais investimentos deveriam ser em tecnologia e infraestrutura física; bem como de reestruturação social e de instituições, implementando valores e princípios mais alinhados à noção desenvolvimento. Nesse sentido, a ideia de “modernidade” dos principais agentes investidores do Norte era tida como o único caminho possível para o desenvolvimento.

CID QUESTIONADA: DESENVOLVIMENTO OU DEPENDÊNCIA?

Outra discussão importante sobre o desenvolvimento, quando falamos das relações entre Estados, envolve a linha que separa desenvolvimento de dependência. Ao longo dos anos, questionou-se a eficácia e a capacidade da CID em gerar e auxiliar o desenvolvimento Além disso, nasceram dúvidas sobre se a CID reforçava as relações de dependência ou não. Afinal, o caminho do Norte seria o único caminho possível?

Em momentos de crise, a descrença na capacidade dos países do Sul em gerar desenvolvimento autônomo (por si mesmos) levaram às chamadas condicionalidades na cooperação Norte-Sul. Ou seja, os países do Norte passaram a exigir reformas, principalmente econômicas, como condição para a concessão de empréstimos e doações aos países do Sul. As reformas mais polêmicas envolviam pacotes de privatizações, liberalização do mercado de capitais, aumento da taxa de juros para atrair investimentos internacionais e redução de barreiras tarifárias para permitir o livre comércio. A partir dos anos 2000 e com o fortalecimento das relações Sul-Sul, grande parte dos atores da CID passaram a incorporar princípios da Cooperação Sul-Sul. Entre eles se destacam a ausência de condicionalidades e o favorecimento de modalidades como a cooperação técnica.

Veja mais sobre a diferença entre crescimento econômico e desenvolvimento neste artigo do Politize! sobre desenvolvimento sustentável.

COOPERAÇÃO INTERNACIONAL PARA O DESENVOLVIMENTO: AJUDA OU PARCERIA?

Outro debate importante sobre a CID diz respeito ao entendimento do que é cooperar. Questiona-se a divisão que coloca de um lado os países do Norte como atores financiadores da Cooperação Norte-Sul – como uma forma de ajuda oficial ao desenvolvimento e de outro os países do Sul, subdesenvolvidos e emergentes – apenas “beneficiários” da cooperação. A Cooperação Sul-Sul, por outro lado, prega que as transações devem constituir uma relação em que parceiros encontram benefícios mútuos ao cooperar. Nessa cooperação, ambos projetam seus interesses e participam de forma horizontal da formulação, aplicação e revisão de propostas.

Esse debate guiou o processo de institucionalização da CID, levando-se em conta os jogos de poderes globais e regionais. De um modo geral, os planos de reconstrução da Europa no pós-Segunda Guerra Mundial e a descolonização da África, Ásia e Caribe e no Pacífico entre 1950 e 1970 deram início e definiram diversos aspectos atuais da CID. Além desses, também foram importantes os modelos nacionais de desenvolvimento como alternativa ao modelo neoliberal que os países do Norte colocavam como condição de cooperação, assim como os movimentos de autoindentificação do Sul Global.

COOPERAÇÃO INTERNACIONAL PARA O DESENVOLVIMENTO: DEBATES AINDA VIVOS

Apesar das tentativas de coordenar os esforços da CID, alguns debates permanecem vivos e questionam sua validade. Destacamos aqui três deles:

  1. A forma de classificação e o tratamento dos países do Sul como beneficiários/receptores ao invés de parceiros. A OCDE, por exemplo, ainda utiliza apenas o PIB per capita para gerar a lista dos países candidatos ao recebimento da AOD;
  2. Se a cooperação – principalmente a Norte-Sul – estaria gerando processos de desenvolvimento internos e autossuficientes ou de dependência dos países do Sul em relação aos do Norte; e
  3. A eficácia. Questiona-se se os projetos realmente geram retorno à sociedade e também como isso é medido. Atualmente, busca-se resgatar e desenvolver novas ferramentas de gestão, como a criação de metas e indicadores mais claros para que seja firmada uma gestão orientada por resultados.

Resumindo, a Cooperação Internacional para o Desenvolvimento (CID) é um campo estratégico de atuação dos países. Não se trata apenas da simples colaboração entre as nações. Nessa área, os diferentes atores – como Estados, organizações internacionais e instituições da sociedade civil – articulam-se para desenvolver projetos que visam impactos econômicos, sociais e ambientais. Por meio dela, espera-se resolver problemas globais como a pobreza extrema, o desrespeito aos Direitos Humanos, e degradação de importantes ecossistemas no mundo.

Conseguiu entender como funciona a Cooperação Internacional para o Desenvolvimento (CID)? Deixe suas dúvidas e sugestões nos comentários!

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Referências do texto: confira aqui onde encontramos dados e informações!

GIFE – Participação da sociedade civil é fundamental para atingir nível de desenvolvimento estabelecido pela ONU

ICTSD – Os antecedentes da reforma do Fundo Monetário Internacional

IPEA – Repensando a cooperação internacional para o desenvolvimento

ONU – Novo relatório da ONU avalia implementação mundial dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM)

Oxford – International Cooperation Theory and International Institutions

RETS – O marco de desenvolvimento pós-2015 exige aquilo que faltou nos ODM: Participação e supervisão cidadã

Scielo – Histórico ambiental: desastres ambientais e o despertar de um novo pensamento

The Guardian – IMF’s four steps to damnation

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Conteúdo escrito por:
Graduado em Relações Internacionais pela Universidade Federal de Santa Catarina. Apaixonado pelos temas de desenvolvimento internacional, direitos humanos e migrações.

CID: entenda a Cooperação Internacional para o Desenvolvimento

17 mar. 2024

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