Regras para definição de um domicílio eleitoral

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Urna eletrônica. Imagem: Nelson Júior/ TSE.

Acabou no dia 18 de agosto o prazo para que eleitores solicitassem a realização do voto em trânsito e a transferência temporária de domicílio eleitoral.

Com isso, vem à tona mais uma vez o funcionamento do sistema eleitoral brasileiro, especialmente no que tange ao domicílio eleitoral – um debate muito em voga atualmente, por ser um ano eleitoral. Afinal de contas, o que é o domicílio eleitoral? Que regras o definem? Como funciona no caso de candidatos?

Para responder a essas e outras questões, trazemos a vocês o texto Regras para definição de um domicílio eleitoral.

Veja também outros textos que tratam do papel do eleitor, como: Participação Política: o que é e qual sua importância?

O que é domicilio eleitoral?

É extremamente comum a confusão entre os conceitos de domicílio civil e domicílio eleitoral, uma vez que o termo domicílio acaba levando ao entendimento de que “é onde o indivíduo mora”. Contudo, a diferença é significativa entre o conceito estabelecido no Código Civil e no Código Eleitoral.

Para o primeiro, segue-se o preceito, em teoria, ligado ao senso comum, que associa o conceito de domicílio ao local de residência de alguém. Para o Código Civil, “domicílio é o local em que a pessoa se estabelece com ânimo definitivo”, com a possibilidade de haver diversos locais ligados a alguém.

Já para a Justiça Eleitoral, o domicílio é único – podendo ser um local onde o eleitor possua “vínculo político, familiar, afetivo, profissional, patrimonial ou comunitário”. Lá será a circunscrição onde o cidadão exercerá parte de seus direitos políticos, seja como eleitor (onde ele votará), seja como candidato (onde ele poderá concorrer a algum cargo) [GONDIM, 2014].

É, portanto, um conceito mais amplo, já que os tipos de vínculo do indivíduo com o local onde será estabelecido seu domicílio eleitoral podem ser diversos – mesmo havendo pontos importantes que devem ser destacados, como a necessidade de se morar em determinado município/estado para tal estabelecimento.

Deve-se ressaltar também a sua importância para a própria Justiça Eleitoral, que organiza aqueles que irão participar de eleições com base em seus domicílios eleitorais respectivos (daí o fato de haver apenas um por pessoa!) [MOREIRA, 2013]. Por exemplo, é com base nesses dados que se determina a realização ou não de um segundo turno para eleições de prefeitos (cidades com mais de 200 mil eleitores ou não)[GONDIM, 2014].

Veja também nosso vídeo sobre o calendário eleitoral de 2022!

Regras para definir um domicílio eleitoral

Para a determinação de um domicílio por parte da Justiça Eleitoral, é preciso que algumas regras sejam respeitadas – como “estar morando na localidade há pelo menos três meses”, com transferências podendo ser realizadas apenas “após um ano”, de modo que se garanta estabelecimento e mudança definitiva do indivíduo em determinado local[4]. A residência pode ser comprovada mediante a apresentação de documentos como “contas de luz, água ou telefone, nota fiscal ou envelopes de correspondência”.

Sendo respeitados esses prazos, é necessária a comprovação de um vínculo com a localidade na qual se deseja estabelecer o domicílio eleitoral – vínculo este que pode ser bem amplo, indo de relações familiares a patrimoniais, passando por sociais, políticas, profissionais, entre outras, como já demonstrado[5].

É pré-condição a existência de vínculos reais (mesmo que brandos) com determinado local, uma vez que se busca contribuir para escolha dos representantes locais ou almejar uma vaga entre estes.

Veja também nosso infográfico sobre o calendário eleitoral de 2024!

Acesso nosso infográfico completo no nosso Pinterest!

Posso morar em um lugar e votar em outro?

Para atender àqueles que não se encontram em seus domicílios eleitorais, durante os períodos de votação, foi criada a modalidade do voto em trânsito. Este é separado em duas categorias – quando o cidadão está fora de sua cidade, mas dentro de seu estado e quando está fora de seu estado.

Na primeira situação, estará qualificado a votar para presidente, senador, deputado federal e deputado estadual/distrital; na segunda, apenas para presidente. Esse tipo de votação é feito apenas em anos de eleições gerais (nacionais).

Para tanto, o cidadão deve realizar a solicitação “pessoalmente nos cartórios eleitorais”, tendo de se dirigir, no dia da votação, às capitais ou municípios com mais de 100 mil eleitores – onde será realizada a votação.

Cede-se também a transferência temporária de domicílio a:

– “presos provisórios e aos adolescentes que cumprem medida socioeducativa”;

– “integrantes das Forças Armadas, da Polícia Federal, da Polícia Rodoviária Federal, da Polícia Ferroviária Federal, das polícias civis e das polícias militares”; e

– “equipes do Corpo de Bombeiros e de guardas municipais que estiverem em serviço por ocasião das eleições” [TSE, 2022].

Domicílio eleitoral e transferência

Como já mostramos aqui na Politize!, a transferência de domicílio eleitoral acontece mediante algumas regras – regulamentadas no Art. 38. da resolução Nº 23.659, de 26 de Outubro de 2021 -, sendo elas: a realização do pedido de transferência dentro do prazo determinado em lei (i); a limitação de um ano entre transferências (ii) [7]; morar no local há pelo menos três meses (iii); e “regular cumprimento das obrigações de comparecimento às urnas e de atendimento a convocações para auxiliar nos trabalhos eleitorais” (iv).

O pedido de transferência, dessa forma, deve ser realizado no cartório eleitoral do local para o qual se deseja mudar o domicílio, acompanhado de documentos que comprovem o novo local de residência. Assim, o processo será encaminhado a um juiz, que verificará sua validade.

 É muito importante apontar, porém, como faz Gondim (2014), que: “Solicitar a mudança de domicílio eleitoral para outro município com o objetivo de votar em algum candidato específico que está concorrendo naquela região configura um crime eleitoral chamado fraude em transferência”.

Domicílio eleitoral para candidaturas

Como dito anteriormente, o domicílio eleitoral serve não apenas ao propósito dos eleitores, mas dos candidatos – sendo importante para que todos realizem parte de seus direitos políticos.

Não é incomum, porém, que os domicílios eleitorais de candidatos sejam trocados como parte de estratégias de campanha, que podem ir desde a ambição de se eleger mais deputados em grandes colégios eleitorais (como São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais), através dos mecanismos de distribuição de cadeiras no parlamento em eleições proporcionais, até a formação de palanques estaduais para candidatos específicos, entre várias outras.

Veja também nosso vídeo sobre como escolher um bom candidato!

Para tanto, os candidatos devem observar as mesmas regras do restante dos eleitores, com o adicional de que, como descrito no artigo 9 da Lei 9504/07: “para concorrer às eleições, o candidato deverá possuir domicílio eleitoral na respectiva circunscrição pelo prazo de seis meses e estar com a filiação deferida pelo partido no mesmo prazo (Redação dada pela Lei nº 13.488, de 2017)”.

Contudo, casos relacionados a candidatos costumam ser menos rígidos, com a maior parte das mudanças de domicílio sendo aceitas. Como ressalta Eduardo Alckmin, advogado especialista em Direito Eleitoral, em geral, “basta que se demonstre a existência de vínculo com aquela comunidade. E aí o eleitor fará sua parte: saber se aquela pessoa tem ou não condições de governar aquela comunidade“.

Casos famosos de transferência de domicílio eleitoral por parte de candidatos

A mudança de domicílio eleitoral por parte de candidatos aconteceu (e ainda acontece) bastante em períodos eleitorais no Brasil, entre os motivos estão a tentativa de aumentar a bancada na Câmara dos Deputados, por meio de puxadores de voto; garantir palanques; e conveniências pessoais.

Em alguns casos, essas mudanças chamaram muita atenção, como em 2009, quando o então deputado federal pelo PSB, Ciro Gomes, mudou seu domicílio eleitoral do Ceará para São Paulo, em meio a rumores de que disputaria o governo do estado (AGENCIA, 2009; VEJA, 2010).

Outro caso famoso foi o de José Sarney que, após um mandato como presidente, mudou seu domicílio eleitoral no começo da década de 1990 do Maranhão para o Amapá para buscar uma vaga no Senado.

Porém, o ano de 2022 apresentou muitos casos interessantes, sendo válido ressaltá-los aqui:

  • Damares Alves, que passou seu domicílio eleitoral do Paraná para o Distrito Federal, a fim de disputar o Senado;
  • Heloísa Helena alterou seu domicílio eleitoral de Alagoas para o Rio de Janeiro, em busca de uma vaga de deputada federal;
  • Marina Silva mudou seu domicílio eleitoral do Acre para São Paulo, onde disputará uma vaga na Câmara dos Deputados; Tanto Marina quanto Helena, ambas fundadoras do partido Rede Sustentabilidade, “têm a missão de ajudar a legenda a superar a cláusula de barreira — as duas concorrerão a deputada”, atuando nas eleições como puxadoras de voto[9].
  • Sergio Moro tentou mudar seu domicílio eleitoral do Paraná para São Paulo, visando as eleições legislativas. A mudança foi impedida pelo Tribunal Eleitoral de São Paulo;
  • Tarcísio Freitas mudou seu domicílio eleitoral para São Paulo, onde concorrerá a governador e dará palanque ao concorrente à reeleição à presidência, Jair Bolsonaro.

Lembrando que a questão do domicílio eleitoral é apenas uma das tantas que envolvem o processo eleitoral no Brasil, sendo esse um excelente período para destrincha-los, uma vez que passamos por uma das mais importantes eleições da história do Brasil. Se você ficou curioso, veja também alguns deles: Lista aberta: 5 pontos para entender o sistema aplicado no Brasil,Teste público de segurança: entenda como funciona, Conheça as propostas dos presidenciáveis nas eleições de 2022, Propaganda Eleitoral: conheça as regras para as eleições.

E aí, ficou alguma dúvida sobre as regras para definição de um domicílio eleitoral? Deixa nos comentários!

Referências:

[1] GONDIM, 2014. O cidadão não poderá realizar tal mudança de forma recorrente num curto espaço de tempo – a mudança observa o chamado ânimo definitivo.

[2] E como ressalta Moreira (2013).

[3] Com exceção de “servidora ou servidor público civil e militar ou de membro de sua família, por motivo de remoção, transferência ou posse” e “indígenas, quilombolas, pessoas com deficiência, trabalhadoras e trabalhadores rurais safristas e pessoas que tenham sido forçadas, em razão de tragédia ambiental, a mudar sua residência”.

[4] Estratégia comum nas eleições proporcionais de lista aberta, onde um candidato com uma grande quantidade de votos ajuda outros candidatos do partido a se elegerem, uma vez que fazem com que a legenda cumpra com o coeficiente eleitoral e ganhe mais cadeiras no coeficiente partidário. Para saber mais sobre como funciona desse sistema, acesse a trilha de conteúdos do Politize! sobre o sistema eleitoral.

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Conteúdo escrito por:
Estudante de Ciência Política na Universidade de Brasília (UnB) e redator voluntário. Entusiasta do estudo de História, Economia e Filosofia, acredita no poder transformador que tanto a educação quanto a política podem exercer numa sociedade!

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30 abr. 2024

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