Lista aberta: 5 pontos para entender sistema aplicado no Brasil

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Lista aberta. Imagem: Stock.

Quando o assunto é eleições, existem inúmeras escolhas relativas ao seu funcionamento que parecem apenas minúcias distantes da realidade do eleitor. Por exemplo, refletir sobre o uso de um sistema de lista aberta não parece figurar como uma das nossas prioridades.

Entretanto, o sistema proposto e as normas estabelecidas para que um candidato seja eleito possuem uma importância muito maior do que uma simples questão burocrática. Isso porque a opção por uma lista aberta ou fechada, por exemplo, pode até influenciar o resultado das eleições.

Veja também nosso vídeo sobre como prever o resultado das eleições!

Por isso, conhecer os diferentes sistemas é essencial para a formação de uma consciência cidadã e de estratégias importantes na hora de votar. Em posts anteriores, a Politize! explicou o que são eleições majoritárias, proporcionais e mistas, denominações dadas para três grandes grupos de eleições que ocorrem pelo mundo.

Agora, vamos falar sobre as listas abertas e responder questões como: o que é uma lista? Como essa modalidade de voto se diferencia de outras existentes? Quais as suas implicações? Como elas são usadas no Brasil?

Leia também: Sistema eleitoral: qual é o melhor para o Brasil?

Listas: elemento do sistema proporcional

Para começarmos essa conversa, vamos primeiramente fazer um breve resumo sobre os três principais tipos de sistemas eleitorais. Seguindo a definição adotada pelo cientista político Jairo Nicolau, eles se dividem em majoritários, proporcionais e mistos, cada um com suas subdivisões, conforme representado no esquema abaixo.

Imagem: Reprodução/Letícia de Lucena Vaz.

De forma geral, esses grandes grupos de sistemas podem ser divididos em: majoritários, proporcionais e mistos.

Leia também: Eleições proporcionais: como votos viram cadeiras no parlamento?

Sistemas majoritários

Território é dividido em circunscrições. Essas são regiões dentro do território que apresentam uma quantidade de eleitores parecida. Para que isso aconteça, pode ser que essas regiões tenham um tamanho diferente, já que algumas delas são mais densamente povoadas, como grandes cidades, enquanto outras possuem habitantes mais espalhados, como no campo. Os candidatos mais votados em cada uma delas são eleitos.

É um sistema mais antigo (remonta ao ano de 1430) e por vezes criticado por favorecer as maiores legendas. Isso porque, apesar de os partidos menores representarem uma parcela do eleitorado, eles têm dificuldade de serem os mais votados em cada região e, portanto, conseguir ocupar cadeiras.

Para entender essa situação, vamos imaginar um país que tenha 4 circunscrições (A, B, C e D) e 3 partidos (X, Y e Z) e as votações nelas estejam distribuídas na tabela seguinte:

Imagem: Reprodução/Letícia de Lucena Vaz.

Note que o partido X foi o mais votado em 3 circunscrições e obteria essas 3 cadeiras. Já o partido Y foi o mais votado em uma circunscrição e obteria a cadeira restante. Enquanto isso, o partido Z, apesar de ter um percentual de votação igual ao Y, não teria conseguido se eleger. Essa situação exemplifica a crítica às distorções que o sistema pode gerar.

Essa forma de organização eleitoral, por outro lado, é defendida por gerar menor dispersão partidária. Isso corresponde a pensar em um lado positivo para a dificuldade que partidos menores enfrentam de se elegerem, já que, com o tempo, tais partidos acabam sendo extintos e se juntando a agremiações maiores com ideologias próximas.

Dessa forma, o país fica com um número total menor de partidos, o que pode facilitar as negociações entre eles. Alguns dos países que usam esse sistema são Reino Unido, Canadá e Estados Unidos (país que reconhecidamente tem apenas os Republicanos e os Democratas como partidos de maior expressão).

Leia também sobre o Partido Republicanos do Brasil: História do Republicanos: o verdadeiro Partido Conservador?

Sistemas proporcionais

Distribui cadeiras de forma proporcional à votação dos partidos em todo o território. Assim, voltando ao exemplo anterior, no lugar de cada uma das 4 circunscrições poder eleger apenas um candidato, os votos de cada um dos partidos em todas as regiões seriam somados.

Depois, seria necessário determinar o total de votos válidos nas eleições (nesse exemplo, ele corresponde apenas ao total de votos, já que não consideramos votos brancos e nulos). Esse número deve ser dividido pela quantidade de vagas em disputa, no caso 4. Com essa conta, obtemos o chamado quociente eleitoral.

Para esse exemplo, o quociente eleitoral é 4000 dividido por 4, o que corresponde a 1000 votos. Assim, cada partido que tenha obtido ao menos 1000 votos obterá uma cadeira, a qual será ocupada pelo seu candidato mais votado. A distribuição, portanto, ficaria assim:

Imagem: Reprodução/Letícia de Lucena Vaz.

É claro que, em situações reais, nem sempre o número de votos e de cadeiras ocupadas é exatamente o mesmo percentualmente. Casos mais complexos podem acontecer, por exemplo quando existem sobras eleitorais, o que é comum no sistema de lista aberta. Mesmo assim, o exemplo simplificado pode ilustrar as diferenças do sistema proporcional em relação ao majoritário.

Podemos perceber nesse caso que, ainda que um partido não consiga a maioria dos votos em cada região, mas consiga uma votação menor espalhada pelo país, ele ainda pode conseguir ser eleito (caso do partido Z).

Esse sistema foi criado na metade do século XIX, em um contexto de ampliação do direito ao voto e criação de novos partidos, o que gerou a necessidade de pensar na representação de minorias ideológicas, ponto pelo qual é elogiado. Em contrapartida, gera maior dispersão entre partidos, como explicado na seção anterior. Alguns países que usam esse sistema são Brasil, Portugal e África do Sul.

É dentro do sistema proporcional que está a lista aberta, como veremos a seguir.

Sistemas mistos

Buscam combinar características dos dois anteriores. Nesse sistema, pode acontecer de parte dos deputados serem eleitos segundo uma lógica majoritária e outra parte segundo uma lógica proporcional, de acordo com o estabelecido em cada país. Essa proposta foi criada na Alemanha após a Segunda Guerra Mundial, onde continua em vigor. Também é adotado na Nova Zelândia e na Coreia do Sul.

Observação: É importante ressaltar que todos os sistemas têm seus pontos positivos e negativos que se adequam à realidade de cada país, não havendo aqui a pretensão de rotulá-los como melhores ou piores.

Listas abertas, fechadas e mistas

Como vimos no esquema acima, a existência de listas é uma das modalidades dos sistemas proporcionais. Nesse caso, os partidos apresentam listas de candidatos e a eleição é organizada de forma a buscar assegurar que os partidos obtenham um número de cadeiras proporcional à quantidade de votos que seus candidatos conquistaram em conjunto.

Existem três tipos de lista:

Listas fechadas: os partidos apresentam listas com uma ordem já estabelecida entre os candidatos, de forma que os eleitores votam apenas nos partidos. Esses votos são somados e determinam quantas cadeiras o partido vai obter de acordo com as fórmulas eleitorais em vigor. Se o partido obtiver três cadeiras, os três primeiros colocados na lista apresentada são eleitos. Esse sistema dá mais visibilidade ao partido.

Listas abertas: os partidos apresentam seus candidatos sem ordem pré-estabelecida. Quando se determina quantas cadeiras o partido vai ocupar, os candidatos mais votados do partido são selecionados para os cargos. Essa configuração dá maior visibilidade aos candidatos.

Listas flexíveis: os partidos apresentam listas em uma ordem pré-estabelecida, mas os eleitores podem escolher se votam apenas no partido (mantendo a ordem e funcionando de forma igual à lista fechada) ou em candidatos específicos (podendo mudar a ordem da lista).

O funcionamento das listas é resumido no infográfico abaixo:

Imagem: Reprodução/Letícia de Lucena Vaz.

Lista aberta no Brasil: e os votos de legenda?

Segundo Jairo Nicolau, a lista aberta passou a ser adotada no Brasil a partir das eleições de 1945, sendo que o sistema proporcional já estava em vigor desde 1932. Tal tipo de voto é usado para os cargos de deputado federal, deputado estadual e vereador (todos os cargos legislativos, exceto pelo de senador que faz parte do sistema majoritário).

Na seção anterior, apresentamos como na lista aberta os eleitores votam apenas nos candidatos, o que pode ter feito você se questionar, polifã, o que acontece quando o voto é dado apenas no partido. Essa, de fato, é uma opção para o voto no Brasil que o diferencia de outros países que adotam a lista aberta, como o Chile e a Finlândia.

Tal tipo de voto é conhecido como “voto de legenda” e ele é contado apenas para a distribuição de cadeiras do partido, sem ser repassado para um candidato específico. Assim, um eleitor que vote apenas no partido mostra não ter preferência por um candidato específico e pode contribuir para que a legenda assegure mais cadeiras, as quais serão ocupadas pelos candidatos que já tiverem mais votos individuais.

O caso dos “puxadores de voto”

Vamos supor que, em uma eleição em um sistema de lista aberta com 50 mil eleitores, existam três partidos (cada um com cinco candidatos) e cinco cadeiras em disputa. As suas votações ocorrem conforme o esquema abaixo:

Imagem: Reprodução/Letícia de Lucena Vaz.

Dividindo o número de votos pelo número de vagas em disputa, obtemos o chamado quociente eleitoral (no caso, 50 mil/5= 10 mil). Esse é o número de votos que o partido precisa atingir para conseguir eleger um candidato. Assim, caso ele tenha 10 mil votos, consegue uma cadeira, 20 mil consegue duas e assim por diante.

Novamente, buscamos simplificar a situação nesse exemplo e evitar as sobras, que tornariam o cálculo mais complexo. Assim, o partido A, por ter 30 mil votos, ficaria com três cadeiras. Já B e C, com 10 mil votos cada, ficariam com uma cadeira cada. Esses cargos seriam ocupadas pelos candidatos mais votados de cada um, no caso candidatos 1, 2,3, 6 e 11.

Nessa situação, o candidato 1 é o chamado “puxador de votos”, por possuir uma votação que destoa da obtida pelos outros candidatos, a qual corresponde a mais de 50% de todos os votos na disputa. Sozinho, ele conseguiu que seu partido obtivesse três cadeiras, sendo que ele irá ocupar uma delas e dois de seus correligionários, apesar de terem alcançado uma votação muito menor, ocuparão as demais.

O que se destaca é o fato dos candidatos 7, 8, 12 e 13, apesar de terem uma votação consideravelmente maior que a de 2 e 3, não terem sido eleitos, o que gera críticas a esse tipo de situação.

Exemplo de tal cenário aconteceu nas eleições para deputado federal de 2010, quando Tiririca (PR-SP), famoso pela carreira como palhaço, se elegeu e, a partir da lógica da lista aberta, auxiliou outros dois colegas de partido a obterem cargos. Outra situação ocorreu em 2018 com a eleição de Eduardo Bolsonaro (à época, PSL-SP) também para o cargo de deputado federal.

Veja também nosso vídeo sobre os partidos políticos brasileiros!

Cláusula de desempenho individual

Em 2015, o questionamento desse tipo de situação no sistema de lista aberta resultou na elaboração do Art. 108 da lei 13.165, o qual estabelece que, para ser eleito, um candidato precisa obter pelo menos 10% do quociente eleitoral.

A medida ficou conhecida pelo nome cláusula de desempenho individual”. Na prática, ela coíbe os casos de “puxadores de voto” ao estabelecer um resultado mínimo a ser atingido pelos postulantes, independentemente da votação geral de seu partido.

Voltando ao exemplo trazido na seção anterior, considerando que o quociente eleitoral era 10 mil votos (50 mil votos totais divididos pelas 5 vagas em disputa), um deputado precisaria obter pelo menos 10% de 10 mil votos para ser eleito, ou seja, 1 mil votos.

Assim, os candidatos 2 e 3 do partido A não poderiam ser eleitos e as cadeiras restantes deveriam passar por um cálculo conhecido como sistema dos divisores. Tal procedimento resultaria na eleição de um candidato do partido B e outro do C, no caso 7 e 12, os dois com a segunda maior votação em seus respectivos partidos.

Situação semelhante aconteceu nas eleições de 2018, quando a cláusula de desempenho individual já foi aplicada. Segundo a Agência Brasil, por esse mecanismo, oito deputados federais foram barrados de ocuparem cargos por não atingirem o mínimo de votos individuais requerido, sendo sete deles do PSL e um do partido Novo.

No mesmo ano, a proposta foi questionada pelo Partido Ecológico Nacional (atual Patriota), o qual avaliou a medida como uma “ofensa direta ao regime democrático” e uma regra que “causaria um enorme desperdício de votos válidos”. A contestação foi manifestada pela Ação Direta de Inconstitucionalidade 5.920, votada pelo Supremo Tribunal Federal em março de 2020.

No entanto, o argumento não foi acatado pela corte, prevalecendo o entendimento de que a medida seria uma forma de “valorização da representatividade” que não iria contra o estabelecido pela Constituição. Dessa forma, a legislação continuará sendo aplicada no pleito de 2022 para a escolha de deputados federais e estaduais, cargos eleitos pelo sistema proporcional de lista aberta.

E aí, polifã? O que você achou do sistema de lista aberta? Já tinha ouvido falar sobre ele? Quer saber mais sobre o assunto? Para continuar aprendendo, confira nossos conteúdos sobre a eleição de vereadores e deputados estaduais e federais.

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Conteúdo escrito por:
Graduanda em jornalismo pela UFG, é curiosa e sempre busca saber um pouco mais do mundo. Apaixonada por educação e política, dá para entender porque quis fazer parte da equipe do Politize!, né?!

Lista aberta: 5 pontos para entender sistema aplicado no Brasil

30 abr. 2024

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