Artigo Quinto

PUBLICADO EM:
15 de dezembro de 2020

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Parágrafo 3º – Aplicabilidade dos tratados internacionais

“Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais”

APLICABILIDADE DOS TRATADOS INTERNACIONAIS

O parágrafo 3º do artigo 5º da Constituição Federal trata da aplicabilidade dos tratados internacionais sobre direitos humanos. E o que isso quer dizer? Na prática, essas convenções e pactos — quando aprovados pelo Congresso Nacional conforme o rito especial próprio — serão incorporados ao ordenamento jurídico brasileiro com status constitucional, ou seja, serão equivalentes às Emendas Constitucionais que temos no Brasil.

Quer saber mais sobre como a Constituição define esta aplicabilidade e por que ela é tão importante? Continue conosco! A Politize!, em parceria com a Civicus e o Instituto Mattos Filho, irá descomplicar mais um aspecto constitucional fundamental nessa série do projeto “Artigo Quinto”.

Para conhecer outros direitos fundamentais, confira a página do projeto, uma iniciativa que visa tornar o direito acessível aos cidadãos brasileiros.

O QUE É O PARÁGRAFO 3º?

O parágrafo 3º do artigo 5º, promulgado pela Constituição Federal de 1988, define que:

“Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais”

 

Esse parágrafo da Constituição Federal trata da aplicabilidade dos tratados internacionais sobre direitos humanos. Isso significa que esses pactos e convenções são incorporados como Emendas Constitucionais, responsáveis por alterar um ou mais trechos da Constituição. 

Para que um tratado internacional faça parte de nosso ordenamento jurídico, ele precisa passar por algumas fases, sendo elas: assinatura, aprovação, ratificação, promulgação e publicação. Vejamos mais sobre essas etapas.

Depois de ter a assinatura do Presidente da República (geralmente é ele quem assina, mas o Ministro das Relações Exteriores e os embaixadores chefes de missões diplomáticas no Brasil também são autorizados a fazê-lo), demonstrando a intenção do Estado brasileiro de fazer parte do tratado, ele deve ser aprovado, em dois turnos, na Câmara dos Deputados e no Senado Federal. 

Lembrando que, para ter valor de Emenda Constitucional, o tratado precisa de três quintos dos votos em cada uma das casas legislativas. Sendo aprovado, o texto é publicado por meio de um Decreto Legislativo.

Em seguida, cabe ao Presidente da República ratificar o tratado, pela troca do instrumento de ratificação, em casos de tratados bilaterais, ou pelo seu depósito, no caso de tratado multilateral. Isso porque a assinatura do tratado não é suficiente para torná-lo vinculante, pois há ritos internos necessários em cada país. 

Assim, a “troca do instrumento de ratificação” refere-se à entrega formal de documentos entre dois países, confirmando que ambos cumpriram seus procedimentos internos para a ratificação. Já o “depósito” é a entrega formal do instrumento de ratificação a uma entidade ou organismo designado, geralmente em tratados com múltiplos signatários, para atestar sua adesão ao acordo.

A incorporação do tratado à legislação brasileira ocorre por meio de sua promulgação por Decreto Presidencial, o que equivale à demonstração de consentimento definitivo sobre seu texto. Havendo a aprovação pelo legislativo e a ratificação pelo presidente, o tratado internacional de direitos humanos é automaticamente incorporado ao nosso ordenamento jurídico, com status constitucional.

Vale dizer que, caso versem sobre direitos e garantias individuais, as disposições do tratado internacional terão valor de cláusula pétrea (direitos fundamentais protegidos na Constituição que não podem ser alterados ou revogados), nos termos do artigo 60, § 4º, inciso IV, da Constituição Federal, e não poderão ser alteradas por emendas ou leis que lhes sejam contrárias.

É importante destacar que esse processo de aprovação pelo Poder Legislativo é fundamental para consagrar esses tratados. Isso porque a assinatura do Presidente da República, isoladamente, não é suficiente para inserir esses acordos em nosso ordenamento jurídico, que depende da realização de todo o procedimento acima descrito.

HISTÓRICO DESSA GARANTIA

A criação de tratados internacionais de direitos humanos teve início com o fim da Segunda Guerra Mundial. Isso porque, após as atrocidades cometidas nesse período, ficou clara para a comunidade internacional a necessidade de estabelecer um padrão mínimo de proteção aos direitos humanos de forma universal. Além disso, mostrou-se relevante criar órgãos internacionais que pudessem, de fato, supervisionar os Estados e os responsabilizar por eventuais violações.

Com o passar do tempo, vários países passaram a prever essa garantia em seus ordenamentos jurídicos, e não foi diferente no Brasil. Nosso país também sentiu a necessidade de contemplar a aplicabilidade de tratados internacionais em nossa lei. Mais que isso, o Brasil entendeu ser necessário dar aos tratados de direitos humanos um tratamento diferenciado, colocando-os em um nível constitucional, motivo pelo qual surgiu o parágrafo 3º do artigo 5º.

Para inserir essa norma em nossa Carta Magna, foi criada a Emenda Constitucional n. 45, chamada de Reforma do Poder Judiciário, em 2004. Antes da Emenda, os tratados internacionais sobre direitos humanos tinham o mesmo peso de outros tratados, como aqueles que tratam de comércio entre os países ou direito do mar. A partir dela, foi compreendido que as convenções e os tratados internacionais sobre direitos humanos, uma vez aprovados pelo legislativo teriam o mesmo valor legal que as disposições da própria Constituição Federal.

APLICABILIDADE DOS TRATADOS INTERNACIONAIS NA PRÁTICA

A aplicabilidade de tratados internacionais de direitos humanos é assegurada a partir do momento em que o Presidente da República ratifica esses instrumentos, devendo, então, ser considerados pelo Poder Judiciário em suas decisões. 

Essa aplicação é supervisionada também pelas cortes internacionais responsáveis por cada um desses tratados, como, por exemplo, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos que observa o cenário em países signatários da Convenção Americana de Direitos Humanos.

Vejamos aqui alguns exemplos de tratados internacionais de direitos humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) e da Organização dos Estados Americanos (OEA) que o Brasil ratificou, envolvendo, por exemplo, (i) direitos civis e políticos (como o direito à liberdade de expressão, à liberdade religiosa e à privacidade); (ii) direitos econômicos, sociais e culturais (como o direito à saúde, à educação e à cultura); e (iii) direitos coletivos (como o direito à defesa de ameaça de genocídio e à proteção contra as manifestações de discriminação racial e de gênero):

  • Convenção Americana sobre Direitos Humanos;
  • Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos;
  • Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais;
  • Convenção contra o Genocídio;
  • Convenção e Protocolo relativos ao Estatuto dos Refugiados;
  • Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial;
  • Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher;
  • Protocolo Adicional à Convenção Americana sobre Direitos Humanos Referente à Abolição da Pena de Morte;
  • Protocolo Adicional à Convenção Americana sobre Direitos Humanos em Matéria de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais – Protocolo de San Salvador.

É necessário frisar que boa parte dos tratados ratificados não passou pelo procedimento previsto no § 3º do artigo 5º da Constituição. Nesses casos, o entendimento é o de que os tratados, ainda que sobre direitos humanos, não têm natureza de normas constitucionais e, por essa razão, submetem-se à Constituição, estando apenas acima das leis. 

CONCLUSÃO

Assim, chegamos ao fim de mais um texto do projeto “Artigo Quinto”. Aqui, pudemos analisar o papel do parágrafo 3º do artigo 5º na aplicabilidade de tratados internacionais sobre direitos humanos, que podem ser equiparados a Emendas Constitucionais.

  • Esse conteúdo foi publicado originalmente em dezembro/2020 e atualizado em setembro/2023 com objetivo de democratizar o conhecimento jurídico sobre o tema de forma simples para toda população. Para acessar maiores detalhes técnicos sobre o assunto, acesse o Livro do Projeto Artigo Quinto.

Referências:

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