AÇÃO POPULAR
O inciso LXXII do artigo 5º da Constituição trata sobre a ação popular, um “remédio constitucional” que permite anular atos lesivos ao patrimônio público. Dessa forma, a ação popular é importante para a defesa dos interesses coletivos dos brasileiros.
Quer saber mais sobre como a Constituição define este direito e por que ele é tão importante, tal qual a sua história e como é aplicado na prática? Continue conosco! A Politize!, em parceria com a Civicus e o Instituto Mattos Filho, irá descomplicar mais um direito fundamental nessa série do projeto “Artigo Quinto”.
DESCOMPLICANDO O INCISO LXXIII?
O inciso LXXIII do artigo 5º da Constituição Federal de 1988 define que:
qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência
Esse inciso assegura que toda pessoa com título de eleitor possa recorrer à ação popular, sem despesas judiciais, com o objetivo de anular atos lesivos, estando entre eles os que são lesivos:
- Ao patrimônio público ou ao patrimônio de entidade de que o Estado participe. Segundo o Ministério Público Federal, patrimônio público é o “conjunto de bens, direitos e valores pertencentes a todos os cidadãos”. Assim, uma ação popular poderia ser utilizada para anular uma ordem da prefeitura para destruir uma praça pública sem justificativa plausível.
- À moralidade administrativa. Esse conceito diz respeito à conformidade dos atos da administração com a finalidade pública, de forma íntegra e honesta, independentemente de haver previsão legal específica proibindo determinado comportamento. Assim, uma ação popular poderia invalidar contratos públicos que beneficiaram uma empresa indevidamente.
- Ao meio ambiente. Atos que flexibilizam indevidamente ou desrespeitam leis de proteção ambiental podem ser anulados por uma ação popular.
- Ao patrimônio histórico e cultural. O Cristo Redentor, por exemplo, é um importante patrimônio histórico e cultural do Brasil. Se houver uma tentativa injustificada de destruir ou alterar a estátua, uma ação popular poderia ser movida para impedi-la.
Desse modo, a ação popular tem como função proteger o patrimônio público em sentido amplo (aqui compreendidos também o meio ambiente, o patrimônio histórico e cultural e a moralidade administrativa) de ameaças ou danos efetivos.
Seu objetivo é o benefício de toda a população, e não só o do autor da ação – por isso o nome “popular”: do latim populus, que significa “povo”. Além disso, basta o fundado receio de dano ao patrimônio público para que a ação possa ser proposta.
HISTÓRICO DA AÇÃO POPULAR
Embora com formato e propósito muito diferentes dos dias atuais, a figura da ação popular existe no Brasil desde a Constituição do Império, de 1824. Ela permitia que qualquer cidadão ajuizasse “ação popular” contra quem praticasse suborno (indução de agente do governo a praticar determinado ato em troca de dinheiro) ou peculato (desvio de dinheiro público).
Esse direito retornou ao texto constitucional no artigo 113, § 38, da Constituição de 1934, que assegurava que qualquer cidadão seria “parte legítima para pleitear a declaração de nulidade ou anulação dos atos lesivos ao patrimônio da União, dos Estados ou dos Municípios”.
Note que, apesar de similar a de hoje (mesmo sem haver nada na definição relacionado ao meio ambiente e ao patrimônio histórico), a Constituição daquela época não trouxe a expressão “ação popular”.
A partir de então, esse remédio constitucional fundamental manteve-se em todas as Constituições, exceto pela de 1937.
A IMPORTÂNCIA DO INCISO XLVIII
A ação popular está diretamente ligada ao exercício da cidadania e ao direito de acesso à justiça. Além disso, também tem relação com o direito à boa administração pública, que deriva dos princípios da “moralidade” e da “eficiência” da administração pública, constantes no artigo 37 da própria Constituição.
A partir da possibilidade de provocação do poder judiciário pelo cidadão comum para ver cumpridas as obrigações do Estado e preservados os interesses coletivos e o patrimônio público, estabelece-se um regime que permite a exigência imediata daquilo que seria dever de todos.
Portanto, com a ação popular, o cidadão age como verdadeiro fiscal dos atos praticados pelos seus governantes. É por meio dela que o cidadão poderá exercer sua cidadania de maneira plena, impugnando qualquer medida que possa causar ou esteja causando danos à toda a sociedade.
O INCISO LXXIII NA PRÁTICA
O direito à ação popular é regulamentado pela Lei n. 4.717/1965. Porém, a via da ação popular é ainda pouco utilizada pelo cidadão comum – até por não ser um instrumento amplamente conhecido, apesar de sua grande relevância.
É mais frequente que representantes de organizações, membros de partidos políticos e advogados ajuízem ações visando à proteção do patrimônio público.
Como exemplo de ações populares recentes, que ganharam destaque na mídia, tem-se:
- a proposta pelo deputado federal Jorge Solla para impedir a nomeação de Eduardo Bolsonaro ao cargo de embaixador do Brasil nos Estados Unidos; e
- a ajuizada pelo advogado Carlos Alexandre Klomfahs visando à suspensão do acréscimo de auxílio-alimentação à remuneração dos funcionários da Assembleia Legislativa de São Paulo.
CONCLUSÃO
A ação popular, estabelecida no artigo 5º da Constituição, é fundamental para a proteção do patrimônio público e o exercício da cidadania no Brasil. Garantindo aos cidadãos o direito de contestar atos prejudiciais ao patrimônio público, meio ambiente, patrimônio histórico-cultural e moralidade administrativa, a ação popular fortalece a democracia e promove a boa gestão pública. Seu conhecimento e uso eficaz podem resultar na prevenção de danos ao bem coletivo, tornando-a um instrumento de poder na mão do povo. O que você acha desse instrumento? Conte-nos nos comentários!
- Esse conteúdo foi publicado originalmente em outubro/2020 e atualizado em setembro/2023 com objetivo de democratizar o conhecimento jurídico sobre o tema de forma simples para toda população. Para acessar maiores detalhes técnicos sobre o assunto, acesse o Livro do Projeto Artigo Quinto.
Sobre os autores:
Fernanda Lopes de Alcantara Gil
Advogada de Contencioso e Arbitragem
Matheus Silveira
Membro da equipe de Conteúdo do Politize!
Mariana Mativi
Fontes:
- Instituto Mattos Filho;
- Artigo 5° da Constituição Federal – Senado.