Artigo Quinto

PUBLICADO EM:
3 de novembro de 2020

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Inciso LXXV – Indenização por erro judiciário

"O Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença"

INDENIZAÇÃO POR ERRO JUDICIÁRIO: VOCÊ SABIA QUE TEM ESSE DIREITO?

Já parou para pensar no que acontece caso a Justiça cometa um erro judiciário? Bem, esta situação está descrita no inciso LXXV do artigo 5º da Constituição Federal, que prevê que, caso isso aconteça, caberá ao Estado indenizar e compensar a vítima de tal equívoco.

Quer saber mais sobre como a Constituição define este direito e por que ele é tão importante? Continue conosco! A Politize!, em parceria com a Civicus e o Instituto Mattos Filho, irá descomplicar mais um direito fundamental nessa série do projeto “Artigo Quinto”.

Para conhecer outros direitos fundamentais, confira a página do projeto, uma iniciativa que visa tornar o direito acessível aos cidadãos brasileiros.

O QUE É O INCISO LXXV?

O inciso LXXV do artigo 5º, promulgado pela Constituição Federal de 1988, define que:

“o Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença”

Assim, são duas as situações em que o Estado deverá indenizar um cidadão: 

  • quando o poder judiciário condena alguém criminalmente, mas faz isso de maneira equivocada; 
  • quando alguém é mantido na prisão além do tempo sentenciado, o que, por mais incrível que possa parecer, acontece com inadmissível frequência. 

Em ambos os casos, o Estado, como forma de reparar os danos sofridos, deve indenizar a vítima desses erros praticados por seus agentes.

A IMPORTÂNCIA DESSA GARANTIA

O ser humano, ao viver em sociedade, deve seguir padrões e normas que garantam o bom convívio de todos. Caso não o faça, o indivíduo fica sujeito à aplicação de diversas sanções impostas pelo Estado, inclusive as que restringem a sua liberdade, como a prisão. 

Contudo, como o Poder Judiciário é composto por seres humanos falíveis, há casos nos quais quem age em desacordo com as normas estabelecidas, de forma errônea, é o próprio Poder Judiciário, por exemplo, quando condena de forma equivocada um cidadão.

Os casos de erro judiciário não se restringem às hipóteses de privação de liberdade. Entretanto, embora o texto constitucional não faça essa especificação, entende-se que o inciso LXXV do artigo 5º trata de ofensa grave, proveniente de erro na persecução penal e na sentença criminal.

Pensemos em uma situação hipotética na qual um erro judiciário acarreta uma condenação à prisão. Quando o Estado – baseando-se em decisões equivocadas – priva o cidadão de exercer seu direito de liberdade, ele causa prejuízos e sofrimentos a essa pessoa. 

Você deve concordar que é absolutamente injusto que alguém seja privado de sua liberdade por conta de um erro judiciário, assim como um cidadão – que pode, amanhã, ser eu ou você – ser condenado e preso por um crime que jamais cometeu.

Por isso mesmo, os processos judiciais devem observar uma série de regras legais que governam a produção de provas e as sentenças devem ser fundamentadas com a devida clareza.

Ademais, também por isso existe o direito a recursos no processo – sempre com vistas a minimizar os riscos de decisões equivocadas. Mas, mesmo que esses riscos possam ser reduzidos por meio dos direitos ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa, entre outros, a justiça é feita por seres humanos falíveis, sendo sabidamente impossível neutralizar por completo o risco de erros.

Portanto, como forma de “equilibrar a balança”, o inciso LXXV do artigo 5º estabelece que, nesses casos, o Estado seja obrigado a ressarcir de forma moral e material os prejuízos sofridos pelo cidadão, indenizando-o. Isso  é de fundamental importância para a boa realização da justiça e para a manutenção de sua credibilidade perante os cidadãos.

Imagem representando uma condenação à prisão por erro judiciário | Artigo Quinto
Imagem representando uma condenação à prisão por erro judiciário | Artigo Quinto

A INDENIZAÇÃO POR ERRO JUDICIÁRIO NA PRÁTICA

Ao longo do texto, compreendemos que, quando ocorre um erro em uma condenação, a vítima da injustiça tem direito a indenização. Mas quais são as leis e as diretrizes que definem essa garantia na prática?

Além da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), temos o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (1969), do qual o Brasil é signatário. Segundo ele, nas situações em que um novo fato até então desconhecido (que comprove cabalmente o erro por parte da Justiça) é apresentado a um caso que já havia sido julgado, a vítima deverá ser indenizada pelo Estado. 

Já na legislação brasileira, além da Constituição, a indenização por erro judiciário é tratada no Código de Processo Penal (CPP), em seu artigo 630. Há, também, outro tipo de indenização, descrita no Código Civil, que deve ser pontuada neste texto: a indenização por ofensa à liberdade pessoal.

O artigo 954 do Código Civil prevê três situações que podem ser consideradas ofensivas à liberdade pessoal: 

  • (i) cárcere privado; 
  • (ii) prisão por queixa ou denúncia falsa e de má-fé; e 
  • (iii) prisão ilegal. 

Quando esse tipo de ofensa ocorrer, a vítima deve ser indenizada por todos os danos sofridos. Isso inclui o dano material, que pode envolver, por exemplo, a perda de um emprego e/ou a redução da renda familiar, e o dano moral pelas lesões aos direitos da personalidade do condenado, como a lesão à integridade psíquica ou física e ao direito à honra.

Como sabemos, o reconhecimento de direitos e a limitação dos poderes do Estado e de seus agentes é um processo histórico constante e ainda em evolução, sendo que os órgãos estatais e as autoridades têm uma tendência a ser refratários a controles e a reparações por ações estatais indevidas ou equivocadas. Essas circunstâncias fazem com que, com muita frequência, no Brasil e em outros países em desenvolvimento, muitos erros judiciários permaneçam ignorados ou sem a devida reparação. 

Essa realidade é incompatível com um Estado Democrático de Direito! E, em verdade, até mesmo países mais desenvolvidos convivem permanentemente com questionamentos em face de erros judiciários e da necessidade de reparações devidas a cidadãos que tenham sido vitimados por essas inaceitáveis injustiças. 

Nos Estados Unidos, em 1992, um grupo de advogados e pesquisadores criou o Innocence Project, que visa à reforma do sistema de justiça criminal por meio da reversão de condenações injustas, usando análises de DNA como provas de inocência. 

Em tantos anos de atuação, o projeto já conseguiu reverter mais de 300 condenações de inocentes, inclusive de condenados à pena de morte, que é admitida em alguns dos estados. 

Em 2016, o Innocence Project chegou também ao Brasil e, além de buscar reverter condenações injustas pela Justiça brasileira, promovendo assistência jurídica gratuita para inocentes, busca fomentar o debate sobre as causas dessas injustiças e propor maneiras de preveni-las.

Imagem representando a indenização por erro jurídico | Artigo Quinto
Imagem representando a indenização por erro jurídico | Artigo Quinto

CONCLUSÃO

Neste texto, analisamos o papel do inciso LXXV do artigo 5º na garantia dos direitos fundamentais do cidadão. Restou claro que a necessidade de reparação por erros judiciários é um dos pilares da legitimidade da própria Justiça sendo, portanto, de crucial importância para que se dê efetividade ao acesso à justiça de todo cidadão em um Estado Democrático.

  • Esse conteúdo foi publicado originalmente em novembro/2020 e atualizado em setembro/2023 com objetivo de democratizar o conhecimento jurídico sobre o tema de forma simples para toda população. Para acessar maiores detalhes técnicos sobre o assunto, acesse o Livro do Projeto Artigo Quinto.

Sobre os autores:

Natália Fraifeld

Estagiária de Propriedade Intelectual e Tecnologia da Informação

Inara Chagas

Membro da equipe de Conteúdo do Politize

Mariana Mativi

Fontes:

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