Artigo Quinto

PUBLICADO EM:
22 de dezembro de 2020

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Parágrafo 4º – Jurisdição do Tribunal Penal Internacional

“O Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja criação tenha manifestado adesão”

JURISDIÇÃO DO TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL

O parágrafo 4º do artigo 5º da Constituição Federal trata da jurisdição do Tribunal Penal Internacional (TPI). Segundo ele, crimes contra a humanidade, quando cometidos em território brasileiro e com graves violações aos direitos humanos, poderão ser julgados pelo TPI, cuja autoridade é reconhecida pelo Brasil.

Quer saber mais sobre como a Constituição define a jurisdição do TPI e por que isso é tão importante? Continue conosco! A Politize!, em parceria com a Civicus e o Instituto Mattos Filho, irá descomplicar mais um direito fundamental nessa série do projeto “Artigo Quinto”.

Para conhecer outros direitos fundamentais, confira a página do projeto, uma iniciativa que visa tornar o direito acessível aos cidadãos brasileiros.

O QUE É O PARÁGRAFO 4º?

O parágrafo 4º do artigo 5º, promulgado pela Constituição Federal de 1988, estabelece que:

“O Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja criação tenha manifestado adesão”

 

A partir desse parágrafo, compreende-se queos crimes contra a humanidade – como genocídio, extermínio e escravidão – que tenham sido cometidos no Brasil podem ser julgados pelo TPI. O Estado brasileiro pode, inclusive, abrir mão de sua jurisdição e “entregar” a situação à Procuradoria-Geral do TPI, que analisará todas as circunstâncias sobre o cometimento de eventuais crimes contra a humanidade e procederá ao julgamento perante o Tribunal.

O TPI é uma corte internacional, criada pelo Estatuto de Roma (1998), que julga indivíduos que, diante de situações específicas, cometeram crimes com graves violações aos direitos humanos. 

Para que o TPI tenha jurisdição sobre determinado caso, é preciso que todos os mecanismos internos de combate àquele crime tenham falhado, visto que a sua jurisdição não se sobrepõe à jurisdição e à soberania internas. 

O julgamento pelo TPI não exclui os direitos do acusado ao contraditório e à ampla defesa, que são conquistas fundamentais dos Estados Democráticos de Direito modernos.

Segundo o Estatuto de Roma, são considerados crimes contra a humanidade quaisquer dos seguintes atos, quando praticados em contexto de ataque generalizado e sistemático contra uma população civil:

  • homicídio;
  • extermínio;
  • escravidão;
  • deportação ou transferência forçada de uma população;
  • prisão ou outra forma de privação de liberdade física grave, em violação das normas fundamentais do direito internacional;
  • tortura;
  • agressão sexual, escravatura sexual, prostituição forçada, gravidez forçada, esterilização forçada ou qualquer outra forma de violência no campo sexual de gravidade comparável;
  • perseguição de um grupo ou coletividade que possa ser identificado, por motivos políticos, raciais, nacionais, étnicos, culturais religiosos ou de gênero;
  • desaparecimento forçado de pessoas;
  • crime de apartheid; e
  • outros atos desumanos de caráter semelhantes, que causem intencionalmente grande sofrimento, ou afetem gravemente a integridade física ou a saúde física ou mental.

Lembrando que todos os crimes cuja competência possa ser do TPI são imprescritíveis, ou seja, poderão ser julgados a qualquer tempo, independentemente de quando ocorreram, considerando sua gravidade e sua relevância para a humanidade como um todo.

HISTÓRICO DA JURISDIÇÃO DO TPI

O TPI foi criado no ano de 1998 e tem sede em Haia, na Holanda. Surgiu como uma resposta aos genocídios ocorridos em Ruanda e na então Iugoslávia (hoje Bósnia) em 1992. Considerando que esses países não teriam condições de julgar os crimes humanitários perpetrados em seus países, o tribunal foi criado.

O Brasil esteve presente em todas as discussões que criaram o Estatuto de Roma. Em julho de 2002, o Congresso Nacional aprovou, seguindo os trâmites previstos pela Constituição Federal de 1988, o texto do tratado e, em setembro do mesmo ano, o Presidente da República na época, Fernando Henrique Cardoso, promulgou o Decreto n. 4.388/2002, inserindo o Estatuto de Roma no ordenamento jurídico brasileiro.

Contudo, podemos dizer que o maior comprometimento do Estado brasileiro com o Estatuto de Roma e, por consequência, com a jurisdição do TPI ocorreu em dezembro de 2004. Foi neste momento que o Congresso Nacional aprovou a Emenda Constitucional (EC) n. 45, que inseriu o parágrafo 4º no artigo 5º da Constituição, assegurando a jurisdição do TPI como garantia de resposta a crimes contra a humanidade.

O legislador constituinte derivado, portanto, conferiu relevância maior ao combate e à persecução de situações que poderiam ensejar crimes contra a humanidade. Desse modo, passou a prever a jurisdição do TPI na Constituição.

A IMPORTÂNCIA DESSE DIREITO

Os direitos humanos são de extrema relevância para o Brasil, afinal, temos a dignidade da pessoa humana como princípio fundamental e norteador da República. Por isso, assegurar esses direitos é um dos objetivos e dos deveres do Estado brasileiro.

A jurisdição do TPI é mais uma forma de garantir que esses direitos e essas garantias fundamentais sejam respeitados, bem como que autores de crimes contra a humanidade sejam devidamente responsabilizados. 

Nesse sentido, nada mais correto que o Estado brasileiro respeitar, cumprir e criar mais um mecanismo multilateral voltado ao integral respeito a todas as garantias protetivas dos direitos humanos, com vistas a prevenir e reprimir violações em massa a esses direitos.

Além disso, a adesão nacional à jurisdição do TPI foi um passo simbolicamente significativo para o Brasil, pois representa o seu compromisso em cooperar com outras nações e Estados para alcançar um mundo mais justo e livre de violência. É uma mensagem política relevante, que destaca a cooperação e a harmonia na busca por objetivos civilizatórios compartilhados. 

JURISDIÇÃO DO TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL NA PRÁTICA

Até XX/2023, houve apenas quatro condenações transitadas em julgado perante o TPI:

  • Thomas Lubanga Dyilo, condenado a 14 anos de prisão por recrutar crianças com menos de 15 anos de idade para lutar em conflitos étnicos no Congo;
  • Germain Katanga, condenado a 12 anos de prisão por crimes de guerra e por ataques à população civil, saques e destruição da propriedade alheia;
  • Ahmad Al Faqi Al Mahdi, condenado a nove anos de prisão por ataques contra monumentos históricos e religiosos em Timbuktu, no Mali; e
  • Jean-Pierre Bemba Gombo, condenado a um ano de prisão e a pagar 300 mil euros em multa por instigação a falsos testemunhos em outro caso que também tramitou perante o TPI, em que ele próprio foi absolvido das acusações por crimes de homicídio, estupro e saques na República Centro-Africana.

Outras investigações e processos foram instaurados, tendo alguns deles sido arquivados pelo TPI, encerrados após o falecimento dos réus e outros seguidos para julgamento, estando ainda pendentes de resolução final. Vale destacar que os casos levados ao TPI são extremamente complexos e, por isso, os julgamentos tendem a ser longos e demorados.

O Brasil já teve a honra de ter uma representante sua entre os juízes do tribunal internacional: a Dra. Sylvia Helena Steiner, desembargadora federal aposentada, que cumpriu mandato de nove anos como juíza no TPI entre os anos de 2003 e 2012. 

Além disso, tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei (PL) n. 301/2007, que tem por objetivo definir detalhadamente quais tipos de condutas podem ser consideradas violação ao direito internacional humanitário. Ele também cria normas de cooperação entre o Brasil e o TPI, facilitando, assim, a comunicação entre o nosso país e as autoridades internacionais vinculadas ao Tribunal, algo que já ocorre com outros países. 

CONCLUSÃO

Agora que você já sabe como a Constituição define a jurisdição do Tribunal Penal Internacional, que tal disseminar esse conhecimento? Compartilhe esse conteúdo com seus amigos e dê sua opinião nos comentários! 

  • Esse conteúdo foi publicado originalmente em dezembro/2020 e atualizado em setembro/2023 com objetivo de democratizar o conhecimento jurídico sobre o tema de forma simples para toda população. Para acessar maiores detalhes técnicos sobre o assunto, acesse o Livro do Projeto Artigo Quinto.

Autores:
  1. Gabriel de Carvalho Borges Toledo Machado
  2. Inara Chagas
  3. Mariana Mativi

Fontes:
  1. Instituto Mattos Filho;
  2. Artigo 5° da Constituição Federal – Senado;

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