Malcolm X: uma vida de militância contra a opressão racial

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Malcom X. Foto: Getty/Bettmann.

Malcolm X (1925-1965) foi uma importante liderança negra que lutou pelo reconhecimento dos direitos da população afro-americana durante a era do Movimento dos Direitos Civis.

Para uma melhor compreensão dessa figura histórica, a Politize! traz para você um pouco da sua trajetória!

Veja também nosso vídeo sobre racismo estrutural e democracia!

Entendendo o contexto histórico: contra o que Malcolm X lutava?

Entre 1865 e 1968, os EUA conheceram um sistema de segregação instituído pelas Leis Jim Crow que tornaram a discriminação racial um fato onipresente.

A segregação promovia a separação racial em espaços privados e instituições públicas, a exemplo de banheiros, bebedouros, salas de espera, piscinas públicas, restaurantes e hospitais.

Ela impunha à população negra uma educação inferior à oferecida aos brancos e, durante sua vigência, a maioria das profissões que não exigiam qualificação técnica era ocupada por afro-americanos. Havia também a proibição do casamento interracial e de que a população afro-americana habitasse bairros brancos.

A violência foi uma marca do período que ficou conhecido pela prática de linchamentos. Além disso, o voto da população negra era obstaculizado por meio da imposição de taxas e de testes de alfabetização.

É contra esse contexto que a população afro-americana vai organizar uma resistência por meio da criação de associações civis, da veiculação de suas ideias através de uma imprensa negra, além da luta pela conquista de direitos civis.

Nas décadas de 1950 e 1960, forma-se o Movimento dos Direitos Civis que conta com nomes como Rosa Parks, Martin Luther King e Ida B. Wells. É nesse período que Malcolm X surge como uma importante liderança negra.

Veja também: Direitos Civis: afinal, o que são e como surgiram?

Afinal, quem foi Malcolm X?

Em 19 de maio de 1925, nascia Malcolm Little, como quarto filho de Louise e Earl Little. O casal era atuante na Associação Universal pelo Progresso dos Negros, instituição fundada por Marcus Garvey e conhecida por defender o movimento de “Volta Para a África”.

Em razão de suas atividades políticas, a família seria vítima da perseguição de supremacistas brancos. Ameaçados pela Ku Klux Klan, os Little são forçados a mudar-se de cidade e, em 1929, sua casa é incendiada pela Legião Negra.

Em 1931, o pastor batista Earl Little é golpeado na cabeça e deixado nos trilhos de um bonde para ser atropelado. O fato é dado como acidental, contudo, Malcolm X atribui a morte de seu pai a um ataque racista no livro “Autobiografia de Malcolm X”, escrito a partir de entrevistas concedidas ao escritor Alex Halley.

Oito anos depois, Louise Little é internada em um Hospital Psiquiátrico, onde permaneceu durante vinte e seis anos. Malcolm e seus irmãos são dispersados em lares adotivos.

Devido a problemas de disciplina, Malcolm é levado para uma casa de detenção aos treze anos. Nesse período, ele obtém excelentes notas, sendo eleito como presidente de turma. No entanto, ele passa a enfrentar o preconceito da comunidade branca em que foi inserido, conforme consta em sua autobiografia (HALLEY, 1992):

O que estou dizendo é que nunca passou pela cabeça deles que eu pudesse compreender tudo, que não era meramente um animalzinho de estimação, mas sim um ser humano. Não podiam admitir que eu tivesse a mesma sensibilidade, inteligência e compreensão de um garoto branco na mesma situação (…).

Certo dia, Malcolm fala para um professor que gostaria de tornar-se um advogado, obtendo a resposta de que deveria ser mais realista e considerar a carreira de carpinteiro. Esse ocorrido leva-o a abandonar sua aplicação aos estudos.

Em 1941, Malcolm passa a residir com sua meia-irmã Ella Collins em Boston. Nesse período, ele entra em contato com a vida noturna, posteriormente mudando-se para o Harlem em Nova York. É nesse momento que Malcolm entra em contato com o jogo ilegal, roubo e tráfico de drogas.

Em 1946, Malcom é preso após efetuar uma série de roubos a residências. Durante o encarceramento, ele começa a estudar através da biblioteca da prisão, fazendo leituras que teriam uma contribuição decisiva para seu aprimoramento.

Reginald Little, irmão de Malcolm, procurou apoiá-lo durante o cumprimento de sua pena, apresentando-lhe o Islamismo através da Nação do Islã. O grupo acreditava que seu fundador, W. Fard Muhammad, seria um profeta que teria encarregado Elijah Muhammad de continuar seus ensinamentos.

Elijah Muhammad professava que os brancos seriam uma raça demoníaca, chamando-os de “demônios de olhos azuis”, e reivindicava a construção de um Estado separado para a população negra.

Os membros da Nação do Islã substituíam seus sobrenomes por um X como reação ao costume escravocrata de nomear a população escravizada com o sobrenome dos proprietários. O X representava a incógnita em relação ao nome real negado a esses indivíduos.

Por esse motivo, Malcom abandona o sobrenome Little e torna-se Malcolm X.

Após sair da prisão em 1952, Malcolm dedicou-se à Nação do Islã, tendo uma contribuição relevante para a expansão do grupo. Contudo, a partir da década de 1960, ele entrará em conflito com Elijah Muhammad.

A Nação do Islã possuía regras morais rígidas, que proibiam condutas como jogo, adultério e consumo de entorpecentes. Malcolm X descobre que Elijah Muhammad desobedecia a tais regras, mantendo relacionamentos com suas secretárias e cometendo atos de corrupção.

Veja também: Religiosidade como direito: do passado ao presente

Em 1963, Elijah Muhammad suspende Malcolm X de suas atividades na Nação do Islã por desobedecer à ordem de não comentar a respeito do assassinato de John F. Kennedy. No ano seguinte, Malcolm X oficializa seu desligamento da Nação do Islã.

Em 1964, Malcom X faz a peregrinação à Meca conhecida como Hajj e adota o nome de El-Hajj Malik El-Shabazz. Nessa viagem, ele entra em contato com movimentos de descolonização da África e realiza uma reformulação de seu pensamento.

Malcolm X funda duas organizações próprias: a Muslim Mosque Inc (Associação da Mesquita Muçulmana) e a Organização para a Unidade Afro-Americana. No entanto, ele não terá tempo suficiente para desenvolvê-las, pois a Nação do Islã planejava atentar contra sua vida.

Em 21 de fevereiro de 1965, Malcolm X é assassinado aos 39 anos durante um discurso para membros da Organização para a Unidade Afro-Americana. Seu corpo foi alvejado 16 vezes.

O que Malcolm X defendia?

Malcolm X foi um nacionalista negro que acreditava na importância da unidade negra e do controle da população negra sobre suas comunidades, defendendo que o combate ao racismo fosse uma luta internacional.

Malcolm X recusava o integracionismo e a postura de resistência não violenta adotada por outras correntes do Movimento dos Direitos Civis. Ele acreditava que a população negra tinha o direito de recorrer à violência como forma de autodefesa contra os ataques racistas que sistematicamente sofria. Segundo sua “Declaração de Independência” (1964):

Deveríamos ser pacíficos, cumpridores da lei — mas chegou a hora do negro americano lutar em legítima defesa sempre e onde quer que esteja sendo atacado de forma injusta e ilegal.

Nacionalismo Negro e Nação do Islã

Malcolm X pertencia à Nação do Islã, grupo atrelado ao Nacionalismo Negro, que defendia o orgulho negro, a autodeterminação negra, e o separatismo racial.

A Nação do Islã é considerada uma seita religiosa cujo sistema de crenças afasta-se das ideias pregadas pelo Islamismo ortodoxo. O grupo acreditava que a natureza dos homens brancos era inerentemente má e reivindicava a construção de um Estado separado para o povo negro dentro das fronteiras dos EUA.

Segundo Clark e Leaks, o conceito de separatismo e a concepção de que os brancos eram “demônios de olhos azuis” representam pontos vulneráveis no pensamento de Malcolm X, utilizados por seus opositores para acusá-lo de disseminar o ódio.

Conforme os autores, o pertencimento de Malcolm X à Nação do Islã limitava seu crescimento intelectual e fazia com que seu nacionalismo negro fosse estreito e sectário.

Pan-Africanismo e afirmação dos Direitos Humanos

A viagem para Meca e para a África, após o rompimento com a Nação do Islã, fará com que Malcolm X revise seus posicionamentos. Ele se torna um crítico do Imperialismo e do colonialismo e move-se em direção às ideias do Pan-africanismo.

Malcolm X passa a defender a conexão entre a busca por direitos por parte dos afroamericanos nos EUA com aquela vivenciada pelo povo negro na África e na diáspora africana. Ele internacionaliza a luta e amplia seu escopo de uma demanda por direitos civis para uma questão de direitos humanos.

Veja também nosso vídeo sobre direitos humanos!

Além disso, ele abandona sua rejeição à união de progressistas brancos a revolucionários negros. Segundo Clark e Leaks, para ele, a forma pela qual pessoas brancas poderiam ajudar a causa negra não era juntando-se a organizações negras, mas sim atuando dentro de comunidades brancas a fim de transformar a mentalidade de seus pares.

Na já citada “Declaração de Independência” (1964), Malcolm X afirma que não haveria unidade entre brancos e negros, enquanto a unidade negra não fosse conquistada. Ele acreditava que o protagonismo do movimento negro deveria ser exercido por dirigentes negros.

Conforme preconizado pelo pensamento nacionalista negro, Malcolm X defendia que a economia e a política de comunidades negras deveriam estar nas mãos de pessoas negras, que deveriam administrar os negócios locais e eleger políticos que representassem seus interesses.

Aproximação do Socialismo

Segundo Reiland Rabaka, com a evolução de suas ideias, Malcolm X compreendeu que o capitalismo seria um impedimento tão grande para a libertação afro-americana quanto o racismo.

Segundo o autor, a mobilização de bens e serviços que Malcolm X acreditava necessários para a libertação negra apenas ocorreria com uma reorganização radical da sociedade, já que a manutenção da classe dominante dá-se através da exploração econômica e da opressão racial dos dominados.

Dessa forma, Malcolm X assume uma postura anticapitalista e realiza uma aproximação do Socialismo, considerando conjuntamente a realidade da luta de classes e da discriminação racial. Seu assassinato em 1965 impediu que pudéssemos conhecer o desenvolvimento integral de seu pensamento.

Veja também nosso vídeo sobre socialismo!

O legado de Malcolm X

O legado de Malcolm X expressa-se na influência de suas ideias na organização da militância negra durante as décadas seguintes.

Black Power

O pensamento de Malcolm X foi uma inspiração para o movimento Black Power, que promovia o orgulho racial, o autorrespeito e a autodeterminação negra.

Eles acreditavam que a população negra deveria assumir o controle político de sua comunidade e que para isso deveriam criar suas próprias organizações, negócios e escolas.

Panteras Negras

O Partido dos Panteras Negras foi criado em 1966, por Bobby Seale e Huey Newton, na esteira do assassinato de Malcolm X.

Através de seu Programa de 10 pontos (1967), defendiam o fim da brutalidade policial e o acesso a empregos, moradia e terra por parte da população afro-americana. Assim como Malcolm X, os membros acreditavam na legitimidade do uso de violência para autodefesa.

Absolvição de condenados pelo assassinato de Malcolm X

Em 1966, ano seguinte ao assassinato de Malcolm X, três homens foram considerados culpados pelo crime e condenados à prisão perpétua.

No entanto, dúvidas seriam levantadas sobre essa condenação. Muhammad A. Aziz e Khalim Islam, dois dos implicados no assassinato, apresentaram álibis confirmados por testemunhos de cônjuges e amigos.

O terceiro condenado pelo crime, Mujahid Abdul Halim, confessou o assassinato e afirmou que os outros dois homens eram inocentes.

Em 2020, a Netflix lançou a série documental “Quem matou Malcolm X?” que veiculava uma investigação sobre os detalhes do caso. Com sua repercussão, o promotor Cyrus Vance assumiu uma nova investigação em conjunto com os advogados de Aziz e Islam.

Em seguida, a biografia “The Dead Are Arising”, de autoria de Les e Tamara Payne, apontou William Bradley como um dos verdadeiros assassinos.

Conforme a nova investigação do caso, o FBI e a Polícia de Nova York retiveram provas, que, se apresentadas durante o julgamento, poderiam ter evitado a condenação de Aziz e Islam. Essa omissão fez com que dois homens negros e muçulmanos passassem mais de 20 anos na prisão.

Em 18 novembro de 2021, a juíza da Suprema Corte Administrativa de Nova York anulou as condenações contra Muhammad A. Aziz e Khalim Islam. Aziz declarou que a situação vivenciada por ele ainda é familiar à população negra na atualidade. Islam faleceu em 2009 antes de obter o reconhecimento de sua inocência.

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É redatora de conteúdo para web, sendo graduada em História e Direito pela UFF. Possui Especialização em Humanidades na Contemporaneidade pela UFRJ. Acredita em uma criação de conteúdo voltada para a educação sobre direitos humanos e que promova uma atuação social engajada.

Malcolm X: uma vida de militância contra a opressão racial

24 abr. 2024

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