Imagem de três pessoas jovens duas mulheres brancas e um homem, usando roupas sociais em frente um prédio empresarial espelhado

Empresa estatal: o que é, como funciona e oportunidades para juristas

Você sabia que o Brasil possui mais de 100 empresas estatais federais e centenas de empresas estaduais e municipais, atuando em setores estratégicos como energia, infraestrutura, saneamento, transporte, telecomunicações e serviços financeiros? Só no âmbito federal, essas organizações empregam mais de 430 mil pessoas e movimentam investimentos bilionários todos os anos.

Por trás da gestão dessas empresas, existe uma forte presença de profissionais do Direito. São advogados(as), especialistas em compliance, consultores(as) e analistas jurídicos que atuam para garantir que as operações dessas corporações respeitem a legislação, promovam a integridade e contribuam para a boa governança pública.

Apesar de relevantes, as carreiras jurídicas em empresas estatais ainda são pouco exploradas por jovens profissionais do Direito. Por isso, preparamos este texto para ajudar você a entender o que são as empresas estatais, como elas funcionam e quais são as oportunidades e desafios para quem deseja trabalhar nessas organizações.

O Guia das Carreiras Jurídicas, uma iniciativa do Instituto Mattos Filho em parceria com a Civicus e a Politize!, busca democratizar o conhecimento jurídico e orientar quem deseja explorar as diversas áreas do Direito, construindo uma carreira com propósito e impacto.

O que é uma empresa estatal?

Uma empresa estatal é uma organização na qual o Estado (União, estados ou municípios) detém controle acionário, ou seja, é o dono da maior parte das ações da empresa com poder de decisão sobre ela. 

Essas empresas podem prestar serviços públicos, atuar em setores estratégicos da economia ou desenvolver atividades que, por interesse público, o Estado considera relevante manter sob sua influência.

Elas se dividem em duas categorias:

  • Empresa pública (EP): capital 100% público. Exemplos: Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (Correios), Infraero, Caixa Econômica Federal;
  • Sociedade de Economia Mista (SEM): capital público e privado, com o Estado detendo o controle. Exemplos: Petrobras, Banco do Brasil, Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp).
    • Essas empresas permitem a participação de acionistas privados, que podem comprar suas ações na Bolsa de Valores;
    • Os acionistas têm direito de voto em decisões da empresa e também recebem parte dos lucros.

Muitas das estatais são instrumentos de política pública. Isso significa que elas não existem apenas para gerar lucro, mas também têm uma função estratégica definida pelo Estado para atender interesses públicos e promover o desenvolvimento do país.

Fachada do Banco do Brasil na Asa Norte, em Brasília – sede de uma das maiores empresas estatais do país, com vidro espelhado e símbolo característico: duas letras “B” entrelaçadas, formando um desenho que lembra um cifrão estilizado.
Legenda: O Banco do Brasil é uma das principais empresas estatais do nosso país do tipo sociedade de economia mista. Crédito: Flickr (Fernando Bizerra – Agência Senado)

Como funcionam as estatais?

Apesar de atuarem em mercados competitivos, as empresas estatais não são empresas privadas comuns. Elas são regidas por um conjunto específico de normas, que buscam conciliar interesse público, eficiência empresarial e transparência.

Essas empresas operam com autonomia administrativa e financeira, mas precisam atender aos princípios constitucionais da Administração Pública, conforme art. 37 da Constituição Federal: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.

Além disso, devem cumprir metas de transparência e governança corporativa e respeitar normativos específicos dos setores em que atuam (exemplos: ANEEL para energia, BACEN para instituições financeiras, ANATEL para telecomunicações).

O que os profissionais de Direito precisam saber sobre estatais?

Atuar juridicamente em uma empresa estatal exige um olhar muito mais amplo do que simplesmente aplicar as normas do Direito Empresarial tradicional. Isso porque as estatais ocupam um espaço jurídico complexo.

O que torna a atuação jurídica em uma estatal diferente?

  • Natureza híbrida da empresa estatal
    Profissionais do Direito precisam compreender que a estatal:
    • Opera no mercado, em concorrência com empresas privadas em muitos casos;
    • Mas também está sujeita aos princípios do Direito Público.
  •  Limites e deveres impostos pelo controle estatal
    Embora tenham autonomia administrativa, as estatais são controladas:
  •  Complexa teia normativa
    Estatais devem seguir, além do Código Civil e do Direito Empresarial:
    • Lei das Estatais (Lei nº 13.303/2016);
    • Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei nº 14.133/2021);
    • Legislação setorial (energia, transporte, financeiro, saneamento, telecomunicações);
    • Normas de governança corporativa;
    • Normas internacionais (para aquelas que atuam em comércio exterior ou contratos firmados com empresas e parceiros de outros países).
  •  Gestão de riscos jurídicos em áreas sensíveis
    Muitas estatais atuam em áreas altamente expostas a riscos jurídicos:
    • Setores regulados, como energia elétrica, telecomunicações, transporte e serviços financeiros, que exigem constante acompanhamento de normas e decisões das agências reguladoras;
    • Contratações públicas, incluindo processos de licitação e execução de grandes contratos de obras, serviços e fornecimento, sujeitos a fiscalização intensa e a riscos de questionamentos administrativos e judiciais;
    • Parcerias público-privadas (PPPs) e concessões, que envolvem estruturas contratuais complexas, compartilhamento de riscos e controles rígidos;
    • Execução de programas sociais e políticas públicas, com necessidade de garantir legalidade, transparência e respeito a direitos fundamentais.

Considerando todos esses pontos, o(a) advogado(a) de uma estatal precisa conseguir conciliar duas lógicas:

  • A lógica empresarial (agir com eficiência, inovar, competir no mercado);
  • A lógica pública (agir com transparência, respeitar a legalidade e o controle de órgãos públicos).

Possibilidades de atuação nas estatais 

A atuação jurídica em uma empresa estatal é multifacetada e envolve mais do que o tradicional contencioso (disputas e conflitos). Além de assessorar juridicamente a administração e os negócios da empresa, profissionais do Direito participam diretamente da implementação de políticas públicas, da governança corporativa e da prevenção de riscos.

Conheça as principais áreas para advogados(as):

Departamento jurídico interno

O jurídico interno é o núcleo que dá suporte legal a todas as atividades da empresa. Profissionais dessa área:

  • Elaboram pareceres jurídicos para orientar a tomada de decisão da administração;
  • Analisam contratos complexos (com fornecedores, parceiros privados e entes públicos);
  • Gerenciam o relacionamento com órgãos de controle externo.

Aqui, o(a) advogado(a) precisa dominar tanto Direito Público quanto Direito Empresarial, além de ter uma visão de negócio alinhada ao interesse público.

Compliance e Integridade Corporativa

Após casos como a Operação Lava Jato, os programas de compliance se tornaram essenciais nas estatais. Nessa área, o(a) advogado(a) atua diretamente no(a):

  • Desenvolvimento e implementação de programas de integridade;
  • Realização de due diligence de terceiros (fornecedores, parceiros);
  • Monitoramento de riscos de corrupção e fraude;
  • Condução de investigações internas;
  • Treinamento de colaboradores em ética e integridade corporativa.

É uma área que exige proatividade, visão de risco e forte alinhamento com padrões internacionais de compliance.

Licitações e Contratos Administrativos

Mesmo quando operam em regime concorrencial, estatais devem seguir regras próprias de contratação.

Assim, cabe aos profissionais do Direito:

  • Elaboração de editais de licitação;
  • Análise jurídica de propostas;
  • Acompanhamento da execução contratual;
  • Prevenção e gestão de litígios decorrentes das contratações.

É uma área onde o conhecimento de Direito Administrativo é absolutamente central.

Direito Societário e Governança

Em especial nas sociedades de economia mista, profissionais jurídicos atuam fortemente em atividades como:

  • Assessoria aos Conselhos de Administração e Fiscal;
  • Participação em assembleias de acionistas;
  • Gestão da governança corporativa e transparência;
  • Suporte no cumprimento das obrigações societárias.

Para atuar na área, é preciso conhecimento sobre Direito Societário, regulação do mercado de capitais (quando a empresa for listada) e boas práticas de ESG (ambiental, social e governança).

Relações institucionais e regulatórias

Empresas estatais operam em setores regulados, ou seja, não seguem apenas as regras do mercado. Seu funcionamento precisa atender a um conjunto rigoroso de normas, sendo supervisionado por agências reguladoras.

Por isso, o jurídico precisa:

  • Monitorar mudanças regulatórias;
  • Representar a empresa em processos administrativos perante agências reguladoras;
  • Negociar e acompanhar acordos regulatórios;
  • Garantir conformidade regulatória em todas as operações.

Essa atuação exige profundo conhecimento da legislação setorial e habilidade para dialogar com o poder público.

Advocacia Trabalhista

Empresas estatais também figuram entre os grandes empregadores do país e lidam com um volume relevante de demandas trabalhistas. Nesse contexto, o departamento jurídico atua na:

  • Defesa da estatal em ações trabalhistas;
  • Elaboração e revisão de políticas internas para colaboradores;
  • Negociação com sindicatos;
  • Prevenção de passivos (dívidas) trabalhistas.

O(a) advogado(a) que tiver interesse na área precisará conhecer em detalhe a legislação trabalhista, a jurisprudência atualizada e as práticas de gestão de pessoas aplicáveis ao contexto das empresas estatais.

Direito Ambiental e Sustentabilidade

Especialmente em setores como energia, infraestrutura e saneamento, a atuação jurídica na área ambiental é estratégica. Nessa frente, os(as) profissionais trabalham para:

  • Obter e manter licenças ambientais necessárias para as atividades da empresa;
  • Gerenciar riscos e evitar danos ambientais;
  • Defender a empresa em processos relacionados ao meio ambiente;
  • Oferecer suporte legal a iniciativas de sustentabilidade e práticas de ESG (ambiental, social e governança).

Trata-se de uma área em forte expansão que exige atualização constante.

Proteção de dados 

As empresas estatais, assim como todas as organizações públicas e privadas, devem garantir que suas práticas de tratamento de dados estejam em conformidade com a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD). Por isso, o jurídico precisa acompanhar todas as etapas do processo, incluindo:

  • Implementação de programas de governança em privacidade;
  • Elaboração de políticas internas;
  • Gestão de riscos relacionados a dados pessoais;
  • Atendimento a titulares de dados e interação com a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD).

Essa é uma área promissora, inclusive para advogados(as) em início de carreira.

Como ingressar em empresas estatais?

Existem três caminhos principais:

1. Concurso público

Diversas empresas públicas e sociedades de economia mista realizam concursos para cargos jurídicos.

  • Exemplo: concursos da Petrobras, Eletrobras, Correios, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, entre outros.

2. Processo seletivo

Algumas estatais contratam por processo seletivo, especialmente para cargos na área de compliance, LGPD, integridade ou para realização de projetos temporários.

3. Advocacia privada (consultorias e escritórios especializados)

Escritórios especializados em Direito Público, PPPs, concessões, regulatório e contencioso estratégico prestam serviços com frequência às empresas estatais. Trabalhar nessas bancas pode ser uma excelente porta de entrada para profissionais que desejam conhecer de perto a dinâmica dessas organizações.

Considerações finais

Você é um(a) profissional que busca trabalhar com temas de grande relevância para o país, além de contribuir para a integridade, transparência e boa governança das organizações públicas? Então, atuar no setor jurídico de uma empresa estatal pode ser uma oportunidade estratégica para você!

O principal desafio está em compreender a dupla lógica dessas instituições: ao mesmo tempo em que precisam ser empresas competitivas, também cumprem o papel de instrumentos de políticas públicas e estão sujeitas às regras do setor público.

Nesse contexto, a atuação jurídica exige visão estratégica, compromisso ético e um conhecimento jurídico interdisciplinar que permita transitar entre as dimensões pública e empresarial.

Gostou de conhecer mais sobre as possibilidades para profissionais do Direito em empresas estatais? Deixe seu comentário! Vamos adorar saber sua opinião e conhecer suas experiências.

Continue acompanhando o nosso Guia de Carreiras Jurídicas e descubra outros caminhos de atuação no setor público!

Autora: Carla da Silva Oliveira

Fontes:

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