Artigo Quinto

PUBLICADO EM:
17 de setembro de 2019

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Inciso XIX – Dissolução de associações

"As associações só poderão ser compulsoriamente dissolvidas ou ter suas atividades suspensas por decisão judicial, exigindo-se, no primeiro caso, o trânsito em julgado"

INCISO XIX – DISSOLUÇÃO DE ASSOCIAÇÕES

Para compreender a dissolução de associações, prevista no inciso XIX do artigo 5º, é preciso antes entender o conceito de liberdade de associação do inciso XVII. Isso porque o inciso XIX complementa tal liberdade ao tratar das hipóteses de dissolução das associações.

A liberdade de associação assegura que somos livres para criar ou participar de associações desde que seus fins sejam lícitos e que não tenham caráter paramilitar. Adicionalmente, a liberdade de associação prevê que o Estado não pode intervir em suas atividades e nem em sua administração. Você pode saber mais sobre o assunto nos posts sobre os Incisos XVII e XVIII. 

Tais conteúdos são do projeto Artigo Quinto, resultado de uma parceria entre o Instituto Mattos Filho, a Civicus e a Politize!, que criaram uma série de materiais sobre o artigo 5º da Constituição de 1988, que trata dos direitos individuais de todos os cidadãos do país.

O QUE DIZ O INCISO XIX?

Cinco mulheres, de diferentes etnias, conversando sentadas em cadeiras, formando um círculo | Dissolução de associações – Artigo Quinto
Somente na Constituição de 1934 que foi garantida a necessidade de decisão judicial para a dissolução de associações | Dissolução de associações – Artigo Quinto

O artigo 5º, em seu inciso XIX, afirma que:

XIX – as associações só poderão ser compulsoriamente dissolvidas ou ter suas atividades suspensas por decisão judicial, exigindo-se, no primeiro caso, o trânsito em julgado;

Segundo o artigo 5º da Constituição, os indivíduos podem se associar livremente, desde que as associações sejam lícitas e não tenham caráter paramilitar (inciso XVII). Se preencherem tais requisitos, as associações são livres e o Estado não poderá interferir nem na criação nem no funcionamento delas (inciso XVIII). Também  não poderá obrigar a permanência ou a saída de qualquer pessoa dessas organizações (inciso XX).

O inciso XIX define que a suspensão ou a dissolução de associações de forma compulsória só poderá ocorrer por decisão judicial, ou seja, após o devido processo legal e com uma decisão final de um juiz. 

Já para a efetiva dissolução de associações, é necessário ainda o trânsito em julgado da decisão judicial, que significa que a decisão não pode mais ser modificada.

O trânsito em julgado pode ocorrer por três motivos principais: (a) já foram utilizados todos os recursos possíveis; (b) encerraram os prazos para recorrer; ou (c) foi efetivado um acordo entre as partes.

Se ocorrer a suspensão ou a dissolução de associações por vontade dos próprios associados, não há a necessidade do processo legal citado, sendo determinada a finalização voluntária da organização.

DISSOLUÇÃO DE ASSOCIAÇÕES NAS CONSTITUIÇÕES ANTERIORES

Jovem branco, de camiseta azul, fazendo sinal de "pare" com sua mão direita| Dissolução de associações – Artigo Quinto
É permitida a suspensão ou dissolução compulsória de associações com fins ilícitos ou de caráter paramilitar | Dissolução de associações – Artigo Quinto

A liberdade de associação, precursora da dissolução de associações, esteve ausente em apenas uma das Constituições brasileiras, a de 1824,  primeira de nossa história. 

A Constituição de 1891, a segunda do país, foi a primeira a tratar da liberdade de associação. A partir de então, todas as constituições previram a liberdade de associação. Contudo, nos momentos ditatoriais da história brasileira, houve mecanismos para restringir excessivamente esse direito. 

Foi apenas na Constituição de 1934 que se passou a exigir determinação judicial para a dissolução de associações (art. 13, n. 12). Mas essa previsão constitucional durou pouco, não constando da Constituição de 1937 (art. 122, n. 9).

A Constituição de 1946, no artigo 141, § 12, voltou a exigir decisão judicial para a dissolução de associações e a Constituição de 1967 continuou a prever essa garantia, embora se saiba que muitos dos direitos nela previstos acabaram sendo arbitrariamente restringidos, por conta da ditadura militar.

Após esse período turbulento da nação brasileira, a Constituição de 1988, também conhecida como Constituição Cidadã, trouxe duas importantes inovações à liberdade de associação, estipuladas no inciso XIX do artigo 5º. São elas: a exigência de trânsito em julgado da decisão judicial para determinar a dissolução de associações, e não a mera determinação judicial, bem como a necessidade de um processo legal para estipular a suspensão dessas mesmas organizações.

A IMPORTÂNCIA DA DISSOLUÇÃO DE ASSOCIAÇÕES NO BRASIL

O inciso XIX do artigo 5º da Constituição Federal é uma garantia fundamental importante para a segurança jurídica e democrática da população brasileira. 

Para a suspensão de associações, isto é, para paralisar as atividades das associações de maneira compulsória, o inciso XIX exige uma decisão judicial. Isso garante a possibilidade de defesa e de eventual reversão da suspensão anterior. 

Já para a dissolução de associações, ou seja, para haver o término da associação, além da decisão judicial, exige-se o trânsito em julgado. Em outras palavras, a decisão deve ser imutável e indiscutível, sendo esgotadas todas as possibilidades processuais de modificar o entendimento. 

Dessa forma, as associações são protegidas de possíveis arbitrariedades, conferindo-lhes alto grau de estabilidade, perenidade, liberdade e autonomia..

Mesmo a atuação judicial tem limites para interferir na vida interna das associações, estabelecidos na legislação que rege tais pessoas jurídicas. Entre as possibilidades de interferência estão: descumprimento de disposições legais sobre a regularidade de sua constituição ou sobre a lisura de suas atividades e, ainda, pela perseguição de fins vedados pela Constituição (nos termos do inciso XVII do artigo 5º da Constituição Federal).

Por exemplo, o Decreto-Lei nº 41 de 18 de novembro de 1966 prevê, em seu artigo 2º, hipóteses de dissolução para as associações com fins assistenciais e que recebem auxílio financeiro do Poder Público ou contribuições periódicas de cidadãos. 

Essas associações podem ser dissolvidas se deixarem de desempenhar efetivamente as atividades assistenciais a que se destinam, se aplicarem os valores recebidos como auxílio ou contribuição para fins diversos dos previstos nos seus atos constitutivos ou nos estatutos sociais, ou se ficarem sem efetiva administração por abandono ou omissão dos seus órgãos diretores.

Apesar da previsão de outras hipóteses, mantém-se a exigência do trânsito em julgado da decisão judicial para haver a dissolução efetiva da associação, conforme previsto na Constituição Federal.

GARANTINDO A SEGURANÇA JURÍDICA E A LIBERDADE

Neste texto, sobre a dissolução de associações, aprendemos um pouco mais sobre o exercício da liberdade de associação.

Associar-se é unir forças para conquistar objetivos comuns e até mesmo fortalecer a participação política. Por isso, as associações devem ser protegidas, não podendo o Estado as encerrar sem o devido processo legal. 

A liberdade de associação busca preservar a dignidade humana e princípios como a livre iniciativa, a autonomia da vontade e a liberdade de expressão. Proteger essas instituições contra as arbitrariedades do Estado, garantindo sua existência e sua estabilidade, é um dos marcos de nossa Constituição Federal.

  • Esse conteúdo foi publicado originalmente em setembro/2019 e atualizado em setembro/2023 com objetivo de democratizar o conhecimento jurídico sobre o tema de forma simples para toda população. Para acessar maiores detalhes técnicos sobre o assunto, acesse o Livro do Projeto Artigo Quinto.

Sobre os autores:

João Vitor Fogaça

Advogado de Organizações da sociedade civil

Talita de Carvalho

Membro da equipe de Conteúdo do Politize!.


Fontes:

Flávia de Campos Pinheiro. O conteúdo constitucional da liberdade de associação. Dissertação PUC-SP. 

Conteúdo Jurídico – Direito Fundamental à Livre Associação

Lex Juris – Artigo 5º todo dia

Editora Atualizar – CF88 – Art. 5º, XVII (Liberdade de Associação)

Enciclopédia jurídica da PUCSP – Liberdade de Associação

https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/57/edicao-1/decisao-judicial

https://alessandrastrazzi.adv.br/processo/transito-em-julgado-o-que-significa-isso/

https://www.youtube.com/watch?v=ud2qgOguEcQ

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