Artigo Quinto

PUBLICADO EM:
24 de novembro de 2020

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Inciso LXXVIII – Princípio da duração razoável do processo

"A todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação"

PRINCÍPIO DA DURAÇÃO RAZOÁVEL DO PROCESSO

O inciso LXXVIII do artigo 5º da Constituição Federal prevê o dever de observância ao princípio da duração razoável do processo. Isso significa que está assegurado aos cidadãos brasileiros o máximo de agilidade em seus processos judiciais para que o acesso à justiça seja o melhor possível. 

Quer saber mais sobre como a Constituição Federal define este direito e por que ele é tão importante? Ou descobrir o seu histórico e sua aplicabilidade na prática? Então, continue conosco! A Politize!, em parceria com a Civicus e o Instituto Mattos Filho, irá descomplicar mais um direito fundamental nessa série do projeto “Artigo Quinto”.

Para conhecer outros direitos fundamentais, confira a página do projeto, uma iniciativa que visa tornar o direito acessível aos cidadãos brasileiros, por meio de textos com uma linguagem clara.

DESCOMPLICANDO O INCISO LXXVIII

Imagem representando o princípio da duração razoável do processo | Artigo Quinto

O inciso LXXVIII do artigo 5º, promulgado pela Constituição Federal de 1988, define que:

a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”

Esse inciso estabelece o direito de todo indivíduo à duração razoável do processo, determinando ao Estado o máximo de agilidade na condução de seus processos judiciais e administrativos, para que a realização da justiça seja feita da melhor e mais célere maneira possível.

De acordo com o texto do inciso, isso deve acontecer tanto em processos judiciais quanto administrativos. Os processos judiciais estão relacionados ao universo do Poder Judiciário, cuja condução é feita por autoridades especialmente independentes com especiais poderes de fazer valer as suas decisões: os juízes. 

Já os processos administrativos são conduzidos no âmbito da própria Administração Pública, na maioria das vezes por órgãos e entes que integram o poder executivo. Mas, ocasionalmente, também podem ser conduzidos pelos poderes legislativo e judiciário, que, nessas situações, exercem função atípica administrativa. Exemplos de procedimentos administrativos são recursos a multas de trânsito, impugnações a autos de infração fiscal, inquéritos policiais, entre outros.

Portanto, independentemente de sua natureza, é fundamental que haja celeridade na tramitação do processo, ou seja, que os procedimentos necessários para o seu desenvolvimento ocorram de maneira ágil. É, assim, direito de todo e qualquer indivíduo que a sua demanda administrativa ou disputa judicial seja resolvida da forma mais justa e eficiente possível. Isso porque, muitas vezes, o tempo torna ainda mais graves os conflitos e os danos em discussão no processo, razão pela qual se afirma, com frequência, que “justiça tardia não é justiça”.

Entretanto, a previsão da agilidade da tramitação não significa que o processo precisa ser feito às pressas, sob o risco de serem violadas as garantias constitucionais, outros princípios processuais – como a ampla defesa, o contraditório e o devido processo legal e todas as regras e instrumentos que lhes são próprios. –Todas as etapas, sem exceção, devem ser guiadas pela máxima de que o processo deve durar apenas o tempo necessário.

Efetivamente, como todo processo é também uma reconstrução histórica de fatos e de suas distintas versões, apresentadas pelas partes processuais, o uso correto do tempo é indispensável para que se apure corretamente o que aconteceu. Além disso, garante às partes condições adequadas para conhecer as alegações existentes e produzir provas, bem como para requerer que as autoridades as produzam. 

Do mesmo modo, com vistas a prevenir erros judiciários e a consequente perpetuação de injustiças, deve ser dado às partes o tempo necessário para a apresentação dos recursos cabíveis previstos em lei. 

Por fim, é preciso que as autoridades administrativas e judiciais responsáveis pela apreciação dos processos tenham as condições adequadas para analisar  os recursos interpostos com a devida cautela, a fim de que as decisões sejam o mais justas possível.

Ora, o princípio da razoável duração do processo é um direito do indivíduo e deve ser interpretado e aplicado em seu benefício, e não em seu desfavor. Por isso, é importante ressaltar que o Estado, sob a justificativa de buscar uma suposta duração razoável do processo, não pode prolongar desnecessariamente um processo, tampouco a autoridade estatal, seja ela judicial ou administrativa, pode violar as garantias fundamentais do indivíduo, como o direito ao devido processo legal. É essencial lembrar que esse direito pertence ao indivíduo em relação ao Estado, e não o contrário.

HISTÓRICO DO PRINCÍPIO DA DURAÇÃO RAZOÁVEL DO PROCESSO

No âmbito internacional, a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica), da qual o Brasil é signatário, apresenta, desde 1969, o princípio da duração razoável do processo. De acordo com o seu artigo 8º:

Toda pessoa terá o direito de ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou Tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou na determinação de seus direitos e obrigações de caráter civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza. (grifos nossos)

No Brasil, a Constituição Federal de 1988 representa um avanço na garantia do acesso à justiça, por meio da ampliação das garantias fundamentais, as quais haviam sido restringidas durante o período da ditadura militar. 

Contudo, o princípio da duração razoável do processo não estava presente no texto constitucional original. Foi apenas no ano de 2004, por meio da Emenda Constitucional n. 45, que esse princípio foi adicionado ao artigo 5º.

Essa atualização surgiu como uma resposta necessária aos imensos volumes de trabalho dos tribunais, que resultam, muitas vezes, em uma tramitação lenta dos processos e na dificuldade de satisfação dos interesses submetidos à máquina do Judiciário dentro de um tempo adequado.

Contudo, é importante pontuar que já em 1995 houve um avanço no sistema Judiciário brasileiro. Em linha com o dever de assegurar uma rápida tramitação dos processos, por meio da Lei n. 9.099/95, foram estabelecidos os Juizados Especiais como órgãos destinados a lidar com as causas de menor complexidade. Neles, são adotadas regras distintas ao procedimento comum para acelerar a obtenção da solução de conflitos desse tipo. 

A IMPORTÂNCIA DO INCISO LXXVIII

O direito fundamental à duração razoável do processo está diretamente ligado ao direito de acesso à justiça e pode ser visto como uma decorrência do princípio do devido processo legal, pois, para que um processo esteja de acordo com a legislação, é imprescindível que ele não seja injustificadamente lento.

Isso fica evidente quando pensamos em processos de aposentadoria, por exemplo. Se um processo desse tipo demorar tempo demais junto à autoridade previdenciária ou em discussão judicial nos tribunais, a pessoa que solicitou tal benefício pode não mais estar viva quando o processo for concluído.

O INCISO LXXVIII NA PRÁTICA

Segundo a doutrina processualista, a garantia fundamental da duração razoável do processo tem três pilares essenciais, que, por sua vez, estariam divididos entre os três poderes do Estado. Desse modo, é de responsabilidade do:

  • Legislativo: editar leis que contenham prazos razoáveis para a prática dos atos processuais e que visem a aprimorar o funcionamento dos órgãos administrativos e judiciais responsáveis pela condução de processos;
  • Judiciário: não praticar atos dilatórios (que aumentam os prazos) injustificados e cuidar para que as partes processuais não os pratiquem, bem como evitar que processos permaneçam longos tempos nas estantes das secretarias das varas judiciais sem que sejam apreciados;
  • Executivo: providenciar todo o aparato necessário a uma efetiva e rápida concessão de resposta à demanda da parte (tecnologia adequada, pessoas qualificadas para ocuparem as funções estatais, preservação e aprimoramento permanentes da estrutura dos órgãos administrativos etc.).

Atualmente, para garantir o direito fundamental a um julgamento rápido, há uma forte ênfase na adoção de meios alternativos (ou adequados) de solução de conflitos, como a negociação, mediação, conciliação e arbitragem. De fato, o Código de Processo Civil de 2015 (CPC) estabelece que, em geral, o juiz, após o recebimento de um novo processo, deve designar uma audiência de conciliação e mediação, desde que seja um meio adequado para resolver o caso.

Essas audiências podem colocar fim ao conflito por meio de acordo entre as partes, satisfazendo de forma rápida a demanda e amenizando as despesas processuais do curso regular de uma ação.

Na prática, o princípio da duração razoável do processo busca acelerar a resolução das demandas e eliminar atos desnecessários ao longo do processo. Isso é alcançado por meio de institutos como a tutela provisória, que permite a concessão de pedidos antes da conclusão do processo, e o julgamento antecipado do mérito, que consiste em uma decisão adiantada quando se considera dispensável a produção de novas provas. Essas medidas visam agilizar o trâmite processual e alcançar uma solução mais eficiente.

Todavia, é importante ressaltar que, diante do excesso de litígios e da sobrecarga do poder judiciário, muitos processos ainda tramitam por um longo tempo até que venha a ser proferida uma decisão final que o encerre definitivamente. 

O próprio Estado tem uma responsabilidade importante nisso, pois muito do excesso de litígio acumulado nos tribunais brasileiros tem como uma das partes órgãos da administração pública direta e indireta, empresas públicas e concessionárias de serviços públicos. Assim, é preciso também que as autoridades trabalhem pela redução do volume de disputas desnecessárias.

Dada a compreensão da importância deste direito, em alguns casos em que a duração do processo é excessiva, a parte que for prejudicada pode requerer o direito à indenização pelos danos morais e patrimoniais provenientes da duração exorbitante do processo, de forma a equilibrar a balança da justiça.


CONCLUSÃO

Chegamos ao fim do texto de mais um inciso do projeto “Artigo Quinto”. Neste, você aprendeu sobre o princípio da duração razoável do processo e a sua importância para o acesso à justiça de todos os cidadãos brasileiros.

Esse conteúdo foi publicado originalmente em novembro/2020 e atualizado em setembro/2023 com objetivo de democratizar o conhecimento jurídico sobre o tema de forma simples para toda população. Para acessar maiores detalhes técnicos sobre o assunto, acesse o Livro do Projeto Artigo Quinto.


Autores:

Francine Canto

Lucas Henrique de Lucia Gaspar

Mariana Mativi


Fontes:

Instituto Mattos Filho;

Artigo 5° da Constituição Federal – Senado;

Emenda Constitucional nº 45 – Planalto;

Dicionário online de português – Dicio.

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