Relatório da CPI da Covid-19: entenda os principais pontos!

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Relator do caso, Renan Calheiros (MDB-AL), lê o relatório final ao lado do presidente Omar Aziz (PSD-AM) e do vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP). Imagem: Edilson Rodrigues/Agência Senado.
Relator do caso, Renan Calheiros (MDB-AL), lê o relatório final ao lado do presidente Omar Aziz (PSD-AM) e do vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP). Imagem: Edilson Rodrigues/Agência Senado.

No dia 20 de outubro de 2021, o relator da CPI da Covid-19, Renan Calheiros (MDB-AL) fez a leitura oficial do relatório final da comissão após aproximadamente 6 meses de investigações. Neste post, vamos te explicar os principais destaques do relatório da CPI e suas implicações. Porém, antes disso, vale a pena trazer um breve contexto sobre o assunto.

Primeiro, o que é mesmo uma CPI? Esta sigla significa “Comissão Parlamentar de Inquérito”. As CPIs são um instrumento de investigação do poder legislativo, isto é, da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, em que se forma uma comissão temporária para apurar fatos de grande importância para a política nacional.

Você pode saber mais em nosso texto sobre o que faz uma CPI!

Em abril de 2021, o ministro do STF Luís Roberto Barroso determinou a instauração de uma CPI que apurasse as possíveis falhas do Governo Federal no enfrentamento à pandemia, incluindo apontar os possíveis responsáveis por isso. Com isso, a comissão ficou conhecida como CPI da Covid-19, composta por 11 senadores federais, entre governistas e oposição.

Se você quiser se aprofundar nesses tópicos, recomendamos nossos textos sobre o processo completo de instalação da CPI da Covid e os 5 pontos principais investigados pela mesma comissão.

Dito isto, vamos entender melhor o relatório final da CPI?

Visão geral do relatório final da CPI da Covid-19

Com um total de 1.179 páginas, o primeiro relatório final da CPI da Covid foi apresentado em 20 de outubro de 2021 por Renan Calheiros (MDB-AL), relator do caso. O documento, dividido em 16 capítulos, incluindo investigados e provas, pode ser acessado na íntegra no site do Senado Federal.

Inicialmente, 70 pessoas e 2 empresas seriam indiciadas pela CPI. No entanto, 4 pessoas foram removidas desta versão do relatório final e 66 continuaram apontadas com algum tipo de crime identificado pela comissão. 

Ao todo, foram 15 macro assuntos principais investigados ao longo da CPI da Covid, são eles: 

  • Gabinete paralelo;
  • Imunidade de rebanho;
  • Tratamento precoce;
  • Oposição às medidas não farmacológicas;
  • A falsa alegação de supernotificação por Covid-19;
  • Recusa e atraso na aquisição das vacinas;
  • Crise do estado do Amazonas e a falta de coordenação do Governo Federal;
  • O caso Covaxin;
  • Hospitais federais do Rio de Janeiro;
  • Caso VTC Operadora Logística LTDA – VTCLOG;
  • Análise orçamentária da pandemia no Brasil;
  • Indígenas;
  • Impactos da pandemia sobre as mulheres, a população negra e os quilombolas;
  • Desinformação na pandemia (Fake news);
  • Prevent Senior.

Além disso, mais de 20 crimes foram identificados em todo o relatório, atribuídos aos indiciados, quais foram:

  • Homicídio;
  • Crime de perigo para a vida ou saúde de outrem;
  • Crime de epidemia;
  • Crime de infração de medida sanitária preventiva;
  • Omissão de notificação da doença;
  • Charlatanismo;
  • Incitação ao crime;
  • Falsificação de documento particular;
  • Falsidade ideológica;
  • Uso de documento falso;
  • Emprego irregular de verbas ou rendas públicas;
  • Corrupção passiva e ativa;
  • Prevaricação;
  • Advocacia administrativa;
  • Usurpação de função pública;
  • Fraude ao contrato (Dispensa de licitação);
  • Organização criminosa;
  • Comunicação falsa de crime;
  • Fraude processual;
  • Crimes de responsabilidade;
  • Improbidade administrativa e lei anticorrupção;
  • Crime contra a humanidade.

Quem são os principais indiciados pelo relatório da CPI?

Entre os 66 indiciados inicialmente pela CPI da Covid-19, destacam-se o presidente da República, Jair Bolsonaro, e seus três filhos que ocupam cargos eleitos, Carlos Bolsonaro (vereador pelo Republicanos-RJ), Flávio Bolsonaro (senador pelo Patriota-RJ) e Eduardo Bolsonaro (deputado federal pelo PSL-RJ).

Entre ministros e ex-ministros, são apontados nomes como Ernesto Araújo e Eduardo Pazuello, que já ocuparam as pastas de Relações Exteriores e da Saúde, respectivamente, e os atuais Marcelo Queiroga da Saúde, Onyx Lorenzoni do Trabalho e Previdência, Wagner Rosário da Controladoria-Geral da União e Walter Braga Netto da Defesa

Alguns deputados federais também aparecem na lista, como Bia Kicis (PSL-DF), Carla Zambelli (PSL-SP), Carlos Jordy (PSL-RJ), Osmar Terra (MDB-RS), Ricardo Barros (PP-PR). Além disso, vários assessores e ocupantes de cargos dentro de ministérios e secretarias do governo federal são indiciados pelo relatório.

A médica Nise Yamaguchi e o virologista Paolo Zanotto são alguns dos profissionais da área de saúde indiciados pela CPI, bem como os empresários Carlos Wizard (Wizard), Luciano Hang (Havan) e Otávio Fakhoury (Instituto Força Brasil). Por fim, alguns crimes são identificados como cometidos pelas empresas Precisa Medicamentos e VTCLog, além de médicos da Prevent Senior e empresários de organizações também investigadas pelo relatório.

Considerando a versão preliminar do relatório, quatro pessoas ficaram de fora da versão posterior, apresentada em 20 de outubro: Emanuel Catori, sócio da farmacêutica Belcher, Marcelo Augusto Xavier da Silva, presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai); Robson Santos da Silva, secretário especial de Saúde Indígena (Sesai), e Silas Malafaia, pastor evangélico. 

Os crimes apontados pelo relatório para o presidente Jair Bolsonaro

O presidente da República Jair Bolsonaro foi indiciado por 9 crimes, segundo o relatório, o qual merece um maior destaque neste texto por se tratar do Chefe do Poder Executivo Federal tendo cometido possíveis crimes no contexto da pandemia. Aqui vamos trazer a definição de cada crime como trazida pelas leis brasileiras mencionadas pelo relatório final da CPI da Covid-19.

Os crimes apontados para Jair Bolsonaro foram:

Possível crimeDefiniçãoReferência
Epidemia com resultado morte“Causar epidemia, mediante a propagação de germes patogênicos”Art. 267 do Código Penal
Infração de medida sanitária preventiva“Infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa”Art. 268 do Código Penal
Charlatanismo“Inculcar ou anunciar cura por meio secreto ou infalível”Art. 283 do Código Penal
Incitação ao crime“Incitar, publicamente, a prática de crime”Art. 286 do Código Penal
Falsificação de documento particular“Falsificar, no todo ou em parte, documento particular ou alterar documento particular verdadeiro”Art. 298 do Código Penal
Emprego irregular de verbas públicas“Dar às verbas ou rendas públicas aplicação diversa da estabelecida em lei”Art. 315 do Código Penal 
PrevaricaçãoRetardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoalArt. 319 do Código Penal 
Crimes contra a humanidade: extermínio, perseguição e outros atos desumanos“O “extermínio” compreende a sujeição intencional a condições de vida, tais como a privação do acesso a alimentos ou medicamentos, com vista a causar a destruição de uma parte da população”;“Por “perseguição” entende-se a privação intencional e grave de direitos fundamentais em violação do direito internacional, por motivos relacionados com a identidade do grupo ou da coletividade em causa”;“Outros atos desumanos de caráter semelhante, que causem intencionalmente grande sofrimento, ou afetem gravemente a integridade física ou a saúde física ou mental”.Art. 319 do Tratado de Roma
Crimes de responsabilidade: Violação de direito social e Incompatibilidade com dignidade, honra e decoro do cargo“violar patentemente qualquer direito ou garantia individual constante do art. 141 e bem assim os direitos sociais assegurados no artigo 157 da Constituição”;“proceder de modo incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo.”Lei nº 1.079, de 10 de abril de 1950
Fonte: Senado Federal – Relatório Final da CPI da Covid-19. Elaboração: Autor.

Vale ressaltar que 2 crimes foram removidos da versão final do relatório, os de homicídio qualificado e genocídio contra populações indígenas, por alguns parlamentares acreditarem não haver provas suficientes para sustentar a acusação desses crimes.

Críticas e reações ao relatório final da CPI da Covid-19

Senadores governistas trouxeram suas críticas aos pareceres trazidos pela comissão. Segundo Eduardo Girão (Podemos-CE), a CPI da Covid-19 focou apenas no governo federal e não se atentou ao papel dos estados e dos municípios no combate à pandemia. O mesmo Senador também alegou que várias pessoas indiciadas pelo relatório tiveram seus direitos de ampla defesa violados, uma vez que foram investigados, mas não ouvidos pela CPI.

Em contrapartida, o presidente da comissão, Omar Aziz (PSD-AM), alegou que os indiciados pelo relatório não são réus, ou seja, não são condenados, portanto, não seria obrigatório que os mesmos prestassem depoimentos.

Em mesmo tom, Marcos Rogério (DEM-RO) declarou que o objetivo da investigação – tratar sobre possíveis crimes e falhas cometidas apenas pelo poder executivo federal – era de gerar desgastes ao governo Bolsonaro. Diante desses argumentos, ambos os senadores, juntamente a Alessandro Vieira (Cidadania -SE), prometem apresentar relatórios diferentes aos propostos por Renan Calheiros, relator do caso.

Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), líder do governo no Senado Federal, apontou que a comissão agiu politicamente de maneira a incriminar Jair Bolsonaro, em argumento semelhante aos dos demais colegas governistas da casa legislativa. O mesmo defendeu as medidas adotadas pelo Presidente da República no combate à pandemia do coronavírus.

Mudanças podem ser sugeridas até a votação do relatório final, ocorrida em 26 de outubro. Neste sentido, o senador Eduardo Braga (MDB-AM) solicitou que o governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC-AM), fosse incluído na lista de indiciados pela CPI juntamente com outras autoridades que seriam responsáveis pelo caso da falta de oxigênio no mesmo estado. A Senadora Soraya Thronicke (PSL-MS) também sugeriu acrescentar à investigação as suspeitas de irregularidades ocorridas no estado do Mato Grosso do Sul em relação ao combate à pandemia.

E depois do relatório da CPI? 

O principal passo seguinte deste processo é a votação do relatório final, no qual o último documento da comissão sofre alterações, incluindo novos indiciados no caso. Durante as primeiras horas de votações em 26 de outubro, já se sabia que o número de indiciados do relatório final subiu para 80 pessoas e o documento havia aumentado para 1.287 páginas. Outras alterações ainda podem acontecer.

Entre os novos indiciados, já se encontram membros do Ministério da Saúde envolvidos com o processo de compra de vacinas pela Precisa Medicamentos e Covaxin, outras pessoas apontadas como disseminadoras de Fake News no contexto da pandemia, e membros do poder público no Estado do Amazonas, como o governador Wilson Lima (PSC-AM) e o ex-secretário de saúde amazonense Marcellus Campêlo.

Mediante a versão definitiva, votada pelos senadores, o relatório final da CPI da Covid-19 será encaminhado aos órgãos competentes para a tramitação de possíveis punições aos indiciados. Isso porque a comissão apenas investiga, mas não tem poder de condenação ou de denúncia.

Tem muita informação sobre a CPI né? Que tal revisar um pouco do processo de uma Comissão Parlamentar de Inquérito de maneira fácil em nosso infográfico abaixo?

Quem pode aplicar as punições?

Uma vez que a comissão parlamentar de inquérito possui poderes limitados, a última etapa de todo o processo é, após a votação final, encaminhar o relatório definitivo para autoridades que podem responsabilizar os indiciados pelos senadores.

Para acusações de crimes comuns

Aqueles que ocupam cargos públicos e possuem foro privilegiado, como governadores, senadores, deputados federais e o presidente da república, e que são acusados de crimes comuns, são de responsabilidade da Procuradoria-Geral da República (PGR). Atualmente, o Procurador Geral da República é Augusto Aras, que é aliado do Presidente Jair Bolsonaro. 

Uma vez que a PGR recebe o relatório, o órgão pode denunciar os indiciados no Supremo Tribunal Federal (STF) caso julgue que há evidências suficientes para isso, ou iniciar um novo inquérito para investigar mais os suspeitos antes de oferecer esta denúncia. Vale ressaltar que esta denúncia só é encaminhada ao STF caso 342 deputados federais votem a favor dela na câmara. 

E se a PGR não oferecer denúncia? Bem, é possível que vítimas dos crimes cometidos possam utilizar das provas e análises oferecidas pelo relatório para encaminhar ações penais privadas diretamente ao STF. 

Para acusações de crimes de responsabilidade

Os crimes de responsabilidade que o presidente da república teria cometido serviriam como base para um novo pedido de impeachment. O pedido seria avaliado pelo presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), também aliado de Jair Bolsonaro, para decidir se a abertura do processo de impedimento seria votada ou não pela casa legislativa. Até o momento, mais de 130 pedidos de impeachment já foram feitos contra o presidente Jair Bolsonaro, os quais nenhum foi colocado na pauta de votação pelo presidente da Câmara.

Um processo de abertura de impeachment pela Câmara dos Deputados também precisaria da aprovação de 342 deputados federais para ser iniciado. Em seguida, seguiria o procedimento padrão de um impeachment. No entanto, não existe nada nas leis brasileiras que obrigue o presidente da Câmara dos Deputados a aceitar uma denúncia que abriria o processo. Apenas o STF, novamente, seria um órgão que poderia entrar em cena e decretar que Arthur Lira aceite uma das denúncias contra o presidente – contudo, esta é uma daquelas medidas que seriam mais improváveis de acontecer no momento.

Para acusações de crimes contra a humanidade

O Tribunal Penal Internacional (TPI) seria o órgão estrangeiro a receber o relatório da CPI da Covid para tratar sobre crimes contra a humanidade, baseado no Estatuto de Roma. Isto certamente causaria um maior dano à imagem que Jair Bolsonaro possui no cenário internacional. Porém, na prática, não se tem bastante certeza que esta denúncia produziria efeitos jurídicos imediatos sobre o Presidente da República, devido à complexidade que seria de demonstrar que o Estado brasileiro não dispõe de mais recursos de punição dentro do seu próprio sistema.

Conheça nosso canal do Youtube! Esse vídeo aqui também te explica o que acontece depois da CPI:

Propostas e mudanças legislativas

Para além dos indiciamentos gerados pelo relatório, a CPI da Covid também propõe mudanças e inovações nas leis brasileiras, sendo uma consequência direta dos fatos apurados durante os quase 6 meses de trabalho da comissão. Mais de 15 proposições legislativas serão apresentadas com o desfecho da CPI da Covid, as quais destacamos algumas logo em seguida.

Uma das principais propostas é de criar a chamada “Frente Parlamentar Observatório da Pandemia”, que seria um grupo permanente de fiscalização da gestão do combate à pandemia no Brasil, e também serviria como uma forma de monitorar os resultados da comissão parlamentar de inquérito da pandemia.

Outras medidas sugeridas pela CPI incluem: propostas de fortalecimento do Sistema Único de Saúde (SUS); uma lei que criminaliza quem produzir e propagar informações falsas nas redes sociais (as chamadas Fake News); a tipificação do crime de extermínio; uma pensão especial para atender pessoas de até 21 anos de idade que se tornaram órfãos de vítimas da pandemia; o estabelecimento de prazo para análise de pedidos de impeachment, entre outras proposições que podem ser encontradas no relatório final.

Conseguiu entender bem os principais pontos sobre o relatório final da CPI da Covid-19? Você possui alguma dúvida? Deixe nos comentários a sua opinião!

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Conteúdo escrito por:
Recifense, cidadão do mundo, e formado em Relações Internacionais pela Faculdade Damas (FADIC).

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